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X Coloquio Internacional de Geocrítica

DIEZ AÑOS DE CAMBIOS EN EL MUNDO, EN LA GEOGRAFÍA Y EN LAS CIENCIAS SOCIALES, 1999-2008

Barcelona, 26 - 30 de mayo de 2008
Universidad de Barcelona

A REDEFINIÇÃO DA CENTRALIDADE EM CIDADES MÉDIAS. LONDRINA E MARINGÁ NO CONTEXTO DA REESTRUTURAÇÃO URBANA E REGIONAL

William Ribeiro da Silva
Universidade Federal do Rio de Janeiro
williamribeiro@hotmail.com


A redefinição da centralidade em cidades médias. Londrina e Maringá no contexto da reestruturação urbana e regional (Resumo)

As relações entre as áreas centrais e a estruturação de espaços urbanos expressam-se por meio de centralidades que se constituem em diferentes níveis e dimensões e, por esta razão, extrapolam a escala desses espaços. Este processo, dialeticamente, redefine os papéis e as articulações entre as cidades, na rede urbana regional, e são, por esta, modificados e redefinidos, de tal modo que as relações de concorrência e complementaridade tendem a determinar a localização dos meios de consumo coletivo. O estudo dessas dinâmicas em duas cidades do Norte do Paraná revela que, ainda que se reconheçam determinantes e traços comuns às cidades atuais, há, entre elas, diferenças. Em Londrina constatou-se a tendência à dispersão da centralidade e, em Maringá, a sua concentração. Observou-se que com o aumento do grau de complexidade das redes urbanas e das densidades informacionais, novos arranjos espaciais e territoriais são delineados e as desigualdades urbanas são reforçadas, ampliando, justapondo e articulando as contradições entre a cidade do just in time e a cidade da sobrevivência. Em função deste fato, quanto mais complexos os processos e formas espaciais, maior a conformação da cidade multi(poli)cêntrica.

Palavras chave: Centralidade, estruturação urbana, Londrina, Maringá, rede urbana.


The redefinition of the centrality in intermediate size cities. Londrina and Maringá in the context of the urban and regional re-structuration (Abstract)

The relations between the central areas and the urban structuring are expressed through the centralities that occur in different levels and proportions, and for this reason exceed the scale of such areas. This process, dialectically, redefines the roles and the articulations among cities, in the regional urban system, and they are modified and redefined by it, in a way that competitive and complement relations tend to determine the location of the means of collective consumption. The study of these dynamics in two cities of North Parana shows that even recognizing determiners and similar aspects in present cities, there are differences between them. In Londrina, it was observed the tendency to centrality dispersal, and in Maringá the tendency to centrality concentration. It was observed that with the increase of the urban system complexity level and the information density, new area and territorial arrangements are made and urban inequalities are reinforced, amplifying, juxtaposing and articulating the contradictions between the just in time city and the city of survival. Due to this fact, the more complex the processes and area types, the bigger the conformity of the multi(poly)centric city.

Key words: Centrality, urban structuring, Londrina, Maringá, urban system.


Notadamente, com as modificações nos cenários políticos e econômicos do Brasil e do Mundo, consideráveis alterações nas lógicas espaciais são delineadas e reforçam tais processos. Assim, os impactos das novas tendências, em função das reestruturações econômicas posteriores aos anos de 1970, passam a configurar novos arranjos geográficos que garantem maior dinamicidade e velocidade à reprodução capitalista, encontrando nas cidades, sobretudo, nas metrópoles e a partir delas, lócus bastante apropriado.

Os territórios, por sua vez, assumem novas configurações, com novas lógicas que garantem a velocidade da reprodução e as diferentes operacionalizações capitalistas. O território das cidades é modificado e, por sua vez, modifica tais lógicas. As cidades assumem novas estruturações, entre elas: - incremento e adensamento de elementos, como o automóvel e os meios de comunicação e informação; - novas tecnologias de comunicação e transporte modificam as localizações das atividades produtivas, redefinem a estruturação das redes urbanas; novas dinâmicas e práticas de consumo, sendo o auto-serviço (hipermercados e supermercados) e os shopping centers, os maiores expoentes; - novos embates políticos e econômicos entre os diferentes agentes produtores do espaço urbano; - novas estratégias de incorporações urbanas; e - maior complexidade da divisão social e territorial do trabalho, produzem novas necessidades de fluxos, com direções, sentidos e intensidades modificados, alterando a circulação nas cidades e entre as cidades.

Tais modificações conduzem a um significativo aumento de complexidade na estruturação dos espaços urbanos, o que é sentido e se expressa por meio dos Centros Urbanos, pois estes representam, desde a origem das cidades, os nós, as convergências e as dispersões, as conexões e as articulações, os lugares das decisões e comandos, os lugares de encontros, ou seja, a essência das cidades.

O crescimento das metrópoles, impulsionado pela fase expansiva do capitalismo de base fordista, teve nos anos de 1960 e 1970 um momento particular. Considerando as cidades como produtos, condicionantes e meios da reprodução capitalista, elas são lócus de maiores possibilidades de otimização, onde se expressam as crises do sistema e se gestam as transformações subseqüentes. Surge, então, a economia de acumulação flexível, culminando com as transformações de que estamos tratando e com a redefinição da centralidade.

Mas que centralidade é esta? Aqui, anunciamos ao leitor que tal questão depende de outras duas: Centralidade de que e para quem?

Se os Centros Urbanos precisam ser entendidos levando em consideração o conjunto da estrutura urbana (Castells, 1975; 2000 [1972]), quando há o ganho de complexidade no tecido urbano, este termina por redefinir a centralidade de acordo com as lógicas da divisão social e territorial do trabalho. Assim, a cidade monocêntrica, onde a “área central” era o ponto de convergência geral, sofre mudanças, expressando maior complexidade, evidenciando e reproduzindo maiores diferenças socioeconômicas através dos processos de descentralização e recentralização com novas espacializações.

Refletindo sobre o período de mudanças nas cidades, Lefèbvre (1991[1968]), faz a seguinte afirmação:

“Atualmente, portanto, aprofunda-se um processo induzido que se pode chamar de a ‘implosão-explosão’ da cidade. O fenômeno urbano se estende sobre uma grande parte do território, nos grandes países industriais.
[...]
Este território está encerrado num tecido urbano cada vez mais cerrado, não sem diferenciações locais e sem ampliação da divisão (técnica e social) do trabalho para as regiões, aglomerações e cidades. Ao mesmo tempo, nesse tecido e mesmo noutros lugares, as concentrações urbanas tornam-se gigantescas; as populações se amontoam atingindo densidades inquietantes (por unidade de superfície ou habitação). Ao mesmo tempo ainda, muitos núcleos urbanos antigos se deterioram ou explodem. As pessoas se deslocam para periferias distantes, residenciais ou produtivas. Escritórios substituem os apartamentos nos centros urbanos. Às vezes (nos Estados Unidos) esses centros são abandonados para os ‘pobres’ e tornam-se guetos para os desfavorecidos. Às vezes pelo contrário, as pessoas mais abastadas conservam fortes posições no coração da cidade.” (Lefèbvre, 1991 [1968], p.10). (grifo nosso).

Portanto, a cidade que implodiu e explodiu, simultaneamente, passa ser produzida sob novas lógicas, sendo inclusive, geradora de novas dinâmicas. Novas diferenças passam a ser realizadas através do surgimento das especializações sociais e funcionais dos espaços.

A redefinição da centralidade é acompanhada por processos de descentralização e de recentralização, que movimentam fixos e fluxos e atribuem novas dinâmicas ao espaço urbano.

Descentralização e recentralização constituem-se em processos, portanto, relacionam-se a movimentos e a tendências. Retomando a afirmação de Lefèbvre (1999), para quem, não existe cidade nem realidade urbana que não possua um centro, concluímos que tais processos não são possíveis de ocorrência em separado. Um precisa estar acompanhado do outro, sendo processos simultâneos, que culminam na formação de novas áreas centrais, distribuídas, não igualmente, pelo tecido das cidades.

Nas palavras de Corrêa (1998),

“A descentralização aparece como um processo espacial associado às deseconomias de aglomeração da área central, ao crescimento demográfico e espacial da cidade, inserindo-se no processo de acumulação de capital. De certa forma, repete o fenômeno de centralização tornando a organização espacial da cidade mais complexa, com o aparecimento de subcentros comerciais e áreas industriais não-centrais.” (Corrêa, 1998, p. 128).

Assim, trata-se de um processo que contribui para a reestruturação das cidades, modificando as formas espaciais e atribuindo novos usos e ocupações às áreas. Tereza Barata Salgueiro (2001) analisa o processo de produção das cidades a partir da economia de acumulação flexível, afirmando constituir-se a cidade pós-moderna, conforme segue,

“[...] a transição para o novo regime de acumulação flexível se lê no território através do aumento da fragmentação. Em termos genéricos, pode caracterizar-se pela evolução da cidade para uma metrópole policêntrica constituída por vários pólos de emprego, de comércio, de serviços, de lazer, devido à desconcentração de actividades, e a redução da proeminência do centro principal. Nestas metrópoles assiste-se a uma valorização alargada de recursos, desde as novas acessibilidades ao prestígio ou às vistas, e uma diversidade de actuações, desde a produção de novos sítios à recuperação dos antigos, a movimentos antagônicos de desconcentração e de recentralização.” (Salgueiro, 2001, p. 115).

Para Corrêa (1998, p. 125), os fatores que possibilitam ou estimulam o processo de descentralização, são:

“- o aumento constante do valor da terra, impostos e aluguéis, afetando certas atividades que perdem capacidade de se manterem localizadas na área central; - congestionamento e alto custo do sistema de transportes e comunicações, que dificulta e onera as interações entre firmas; - dificuldades de obtenção de espaço para expansão; - restrições legais implicando na ausência de controle do espaço; - ausência ou perda de amenidades, afetando atividades e população de alto status, mas também deve-se às pressões contra determinados tipos de uso da terra, como indústrias poluentes, por exemplo.”

Assim, a cidade passa ser produzida, diante de novas contradições, num processo de acentuação das desigualdades e com crescentes graus de fragmentação espacial. Portanto, a produção da cidade passa por novos ritmos e com tendência,

a) à centralidade, através dos distintos modos de produção, das diferentes relações de produção, da tendência que vai atualmente, até o centro decisional, encarnação do Estado, com todos os seus perigos;

b) à policentralidade, à oniscentralidade, à ruptura do centro, à disseminação, tendência que se orienta seja para a constituição de centros diferentes (ainda que análogos eventualmente complementares), seja para a dispersão e para a segregação.(Lefèbvre, 1999 [1970], p.112-113).

E, com isso,

“[...] esse espaço urbano é contradição concreta. O estudo de sua lógica e de suas propriedades formais conduz à análise dialética de suas contradições. O centro urbano é preenchido até a sua saturação; ele apodrece ou explode. Às vezes, invertendo seu sentido, ele organiza em torno de si o vazio, a raridade. Com mais freqüência, ele supõe e propõe a concentração de tudo o que existe no mundo, na natureza, no cosmos: frutos da terra, produtos da indústria, obras humanas, objetos e instrumentos, atos e situações, signos e símbolos. Em que ponto? Qualquer ponto pode tornar-se o foco, a convergência, o lugar privilegiado. De sorte que todo o espaço urbano carrega em si esse possível-impossível, sua própria negação. De sorte que todo espaço urbano foi, é, e será concentrado e poli(multi)cêntrico.”(Lefèbvre, 1999 [1970], p. 46).

Sposito (1999b) refletindo sobre as idéias de Lefèbvre (1999) acerca da multi(poli)centralidade, assim, sintetiza:

La cetralité ainsi redefinie, reflete encore l’idée de concentration, que nous ayons um centre urbain ou que nous en ayons une expression territoriale multiple. Si nous avon la multiplication de centres, nous pouvons nous référer á une multicentralité. Mais il est nécessaire d’observer que ces différentes zones définissent différents dégrés de centralité. Ces degrés s’articulent, em fonction de différents niveaux de spécilisation fonctionnelle et de ségrégation sociale. Les zones rivalisent entre elles, dans la mesure ou chacune d’entre elles essaie d’amplifier as capacité d’attraction. Cette communaut/compétition d’intérêts, indiquant um niveau d’articulation qui ne correspond pas toujours à une complémentarité, peut nous permettre de parle de ‘polycentralité’” (Sposito, 1999b, p. 264-265). (grifos nossos).

As metrópoles possibilitam novas características à reprodução capitalista adquirindo novas lógicas que permitam maiores flexibilidades. Surge a cidade multicêntrica pela configuração de sobreposição de várias centralidades e por ela, configura-se a cidade policêntrica, pois há a diferenciação social e funcional de tais áreas. Com isso, os centros urbanos das cidades monocêntricas, podem ser redefinidos, tornarem-se “multi” e “poli”, porém, continuam sendo nós das relações urbanas e, portanto, devem ser entendidos em suas relações com o conjunto urbano, ainda que tenham processos de fragmentação, pois tal fragmentação possui justamente a origem do ganho de complexidade do conjunto urbano.

Porém, há que se destacar que tais processos foram primeiramente sentidos nas metrópoles, pois estas representam historicamente as melhores condições para a reprodução capitalista. Mas, a partir dos anos de 1990, no Brasil, alguns processos podem ser percebidos também em cidades médias, o que nos possibilita as seguintes reflexões:

a. O processo de implosão-explosão refere-se à sociedade urbana e não às cidades em si, sendo que é primeiramente sentido nas metrópoles pelo fato de estas serem centros de comandos da rede urbana, sobretudo, pela configuração da rede urbana a partir de relações de hierarquia rígida.

b. Sendo assim, os estilhaços de centralidade oriundos da implosão-explosão são inicialmente percebidos nas metrópoles, mas num segundo momento, são também encontrados em cidades médias e até pequenas. Desta forma, a centralidade urbana passou por uma redefinição, mas a rede urbana também.

c.Percebe-se que tais redefinições referem-se às espacialidades otimizadas da reprodução capitalista, com processos de desconcentração produtiva, de relocalizações e, sobretudo, da expansão espacial e territorial da modernização.

d. Com a modernização e para ela, há a expansão irrestrita do meio técnico-científico-informacional, derrubando barreiras à reprodução capitalista e conquistando novos territórios, sempre que necessário.

e. Pela modernização e para modernização, a implosão-explosão é sentida em cidades com diferentes participações na rede urbana, em diferentes áreas das cidades, com níveis e dimensões variados, com densidades múltiplas, ocorrendo, na quase totalidade, uma redefinição de lógicas e de centralidades.

f. No que tange à centralidade, as questões: “de que e para quem?” tornam-se fundamentais, já que os lugares tornam-se centrais para quem reproduz capitais a partir deles e para quem possui acesso a eles. Quando o acesso não é possibilitado, a centralidade não se realiza, ou melhor, a centralidade torna-se seletiva e a cidade passa a ser estruturada por uma nova lógica, a da criação de guetos, de enclaves etc. Assim, áreas que são parcelas de territórios urbanos tornam-se “cidades dos iguais”.

Em pesquisa a respeito da recente dinâmica urbana no Estado de São Paulo, Sposito (2004) faz a seguinte afirmação sobre a centralização e a descentralização:

- Nos setores industrial e comercial, a oscilação caracteriza o movimento, sendo clara a tendência à descentralização espacial das empresas, entre 1977 e 1986, é estável a participação relativa de São Paulo no Brasil e da aglomeração metropolitana de São Paulo no total estadual, entre 1996 e 2000.

- No setor de serviços, não há dados para as décadas de 1970 e 1980, mas a tendência no período 1996 a 2000, nas duas escalas da análise, é de centralização espacial das maiores empresas. Esse movimento de centralização / descentralização, no âmbito do estado, levanta três ordens de questões. Primeiramente, cabe discutir como vem se dando a descentralização espacial do capital, aqui medida pela sede das maiores empresas, no território paulista. Num primeiro momento, constata-se, nos setores comercial e industrial, que há desconcentração, em ritmo maior, e tendência à descentralização, ainda que menos intensa. Esses movimentos não podem ser interpretados como sinal de diminuição das disparidades regionais, ao contrário, contém, em seu bojo, a tendência à diferenciação geográfica [...] (Sposito, 2004, p. 251).

Assim, em nosso artigo, em que refletimos sobre duas cidades médias no contexto da rede urbana brasileira, encontramos os estilhaços da centralidade, que demonstram a ocorrência da implosão-explosão, do avanço da modernização, da ampliação da densidade informacional, de novos fluxos e relações econômicas e sociais, de concorrências e complementaridades. Porém, percebemos que tal processo não se territorializa de maneira similar em todas as cidades, ainda que possam ter surgido e se desenvolvido a partir de semelhantes processos de constituição, como é o caso de Londrina e de Maringá.

Os centros principais e suas centralidades

Encontramos dinâmicas diferenciadas nas cidades de Londrina e de Maringá no que se refere às expressões de centralidade. A primeira apresenta tendência a uma dispersão e a segunda a um reforço à concentração. Com formas espaciais distintas, em ambas se encontram as dinâmicas da modernização e dos tempos rápidos. Indicamos como explicações as suas diferenças, formas, funções e processos, analisando diferentes agentes, porém, aqui ainda propomos a análise dos papéis do poder público na redefinição da centralidade, para então, discutir as expressões de centralidades em ambas as cidades.

Na continuidade da análise da relação entre a estruturação urbana e a expressão das centralidades nas cidades de Londrina e de Maringá, temos, ainda, diferentes configurações quanto às ações do poder público municipal, sendo que refletem e reforçam as tendências já analisadas pelas atividades econômicas.

Em função das diferentes configurações e evolução da expansão territorial urbana, em Londrina houve a transferência, em fins dos anos de 1970 e início dos anos de 1980, da sede da administração municipal do Centro Principal para uma área, cuja localização, veio fortalecer a consolidação da área de expansão do Centro Principal. Em Maringá, mantém-se a mesma localização do Paço Municipal e das demais instalações da administração pública.

Outras diferenças encontram-se nas ações e direcionamentos das políticas públicas. Em Londrina, verifica-se a realização de obras e investimentos de reestruturação urbana, sobretudo, em áreas localizadas fora do Centro Principal, sendo esta uma tendência que se verifica, desde os anos de 1970, com a escolha da localização do campus da Universidade Estadual de Londrina; da área de implantação dos conjuntos habitacionais da Zona Norte e, recentemente, com os projetos de reestruturação no setor sudoeste da cidade, dando continuidade às obras realizadas no fim dos anos de 1980, com a construção de vias para integração da área onde foi edificado o Catuaí Shopping Center, como a construção da Avenida Ayrton Senna, a sobreposição da Avenida Maringá pelo Lago Igapó, para, também, servir de acesso ao referido shopping center.

Já, em Maringá, verifica-se o oposto, pois as grandes obras de reestruturação urbana localizam-se no Centro Principal, principalmente o recente projeto do “Novo Centro”, contínuo ao Centro Principal, que necessitou de grandes investimentos em infra-estrutura, seguindo a tendência de ampla valorização da terra urbana naquela área.

No entanto, ressalte-se que, nas duas cidades, não se detectam os processos de “degradação” ou “empobrecimento” de seus centros principais, sendo que, em ambos os casos, continuam freqüentando e residindo nestas áreas, camadas de poder aquisitivo de médio a elevado.

Entretanto, percebemos, em Maringá, algumas políticas que configuram processos de gentrification, sobretudo, relacionado à área de concentração de comerciantes populares, no prédio da antiga rodoviária e no seu entorno imediato. Existem projetos em fase de discussão para retirada do terminal de transportes urbanos do local e de demolição do prédio da antiga rodoviária para edificação de uma torre com salas comerciais. Assim, o Centro Principal de Maringá, tornar-se-ía, ao contrário da acepção conceitual sobre os centros Principais que articulam a estruturação do conjunto urbano, uma área com forte seletividade socioeconômica, pois a constituição da centralidade deste centro, para as camadas populares seria eliminada ou, ao menos, diminuída.

Porém, na atualidade, em ambas as cidades é possível verificar que os Centros Principais continuam realizando importantes papéis na articulação com o restante dos tecidos urbanos, de tal maneira realizam convergências e dispersões significativas, conforme apresentado no item sobre a circulação interna. Para tanto, realizamos a aplicação de enquetes, junto aos Centros Principais de Londrina e de Maringá para alcançarmos elementos que propiciem uma análise sobre seus freqüentadores[1]. Entre os resultados, encontramos alguns pontos que revelam lógicas subjacentes à centralidade e à estruturação do espaço urbano.

Tabela 1
Londrina e Maringá. Índice de escolaridade dos freqüentadores dos Centros Principais - 2004

 

Londrina

%

Maringá

%

         

1 Sem instrução

2

1

2

1

2. Ensino Fundamental. Incompleto

48

18

31

20

3. Ensino Fundamental Completo

22

8

10

6

4. Ensino Médio incompleto

33

22

29

19

5. Ensino Médio completo

94

38

53

34

6. Ensino Superior incompleto

30

12

14

9

7. Ensino Superior completo ou mais

23

15

11

7

Total

250

100

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Tabela 2
Londrina e Maringá. Renda familiar dos freqüentadores dos Centros Principais - 2004

 

Londrina

%

Maringá

%

         

1. Até 1 salário mínimo

139

56

74

49

2. De 6 a 10 salários mínimos

72

28

54

36

3. De 11 a 15 salários mínimos

12

3

11

7

4. De 16 a 20 salários mínimos

8

3

5

3

5. Acima de 20 salários mínimos

3

1

1

1

6. Não sabe ou não informou

13

6

5

2

7. Sem rendimentos

3

1

0

0

Total

250

100

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Observando as tabelas 1 e 2, percebemos que em ambas as cidades, o percentual de pessoas com escolaridades que variam do ensino fundamental ao médio, é predominante, o que corresponde aos indicadores de rendimento, que refletem um perfil socioeconômico popular. Assim, temos índices que demonstram contradições, pois revelam condições condizentes com outras realidades urbanas do Brasil.

Tal fato propicia a análise de que, em ambas as cidades, mesmo com formas e tendências espaciais distintas, seus Centros Principais continuam a expressar as contradições socioeconômicas, garantindo o importante papel de articulação com relação aos seus respectivos conjuntos urbanos.

Outro dado interessante para nossa análise refere-se à procedência dos freqüentadores dos centros principais de Londrina e de Maringá, conforme tabelas 3 e 4 a seguir.

Tabela 3
 Londrina. Local de residência dos freqüentadores do Centro Principal - 2004

 

Londrina

%

1. Londrina

204

82

 

Loteamentos de Londrina

   
 

Centro

36

14

 

Vila Nova

10

4

 

Bandeirantes

7

3

 

Cafezal

5

2

 

Cinco Conjuntos

7

3

 

Vivi Xavier

6

2

 

Santa Rita

5

2

 

Vila Brasil

5

2

 

Jd. Quebec

4

2

 

Jd. Pizza

4

2

 

Outros

121

48

     

2. Distritos de Londrina

4

2

3. Cambe

13

5

4. Ibiporã

 

8

3

5. Rolândia

 

3

1

6. Outros Municípios do Paraná

8

3

7. Outros Estados do Brasil

4

2

Total

   

250

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Tabela 4
Maringá. Local de residência dos freqüentadores do Centro Principal - 2004

 

Maringá

%

1. Maringá

100

67

 

Loteamentos de Maringá

   
 

Centro

14

10

 

Jd. Alvorada

10

6

 

Zona 7

8

5

 

Jd. Grevilha

5

3

 

Jd. Aeroporto

4

3

 

Jd. Novo Horizonte

3

2

 

Pq. Itaipu

3

2

 

Sanenge

3

2

 

Zona 6

3

2

 

Outros

57

38

     

2. Sarandi

12

8

3 Paiçandu

12

8

4. Mandaguaçu

1

1

5. Outros municípios do Paraná

11

7

6. Outros Estados do Brasil

2

1

Total

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

A procedência dos freqüentadores dos Centros Principais de Londrina e de Maringá é essencialmente local, tendo um alcance regional restrito aos municípios imediatamente próximos. Percebe-se, também, que há uma grande variedade entre os loteamentos de residência das pessoas, evidenciando que a centralidade destas áreas é referente ao todo o conjunto urbano. Porém, ressaltamos que estes dados da procedência dos freqüentadores do Centro Principal de Londrina e de Maringá devem ser entendidos através do pressuposto da redefinição da centralidade, pois com ela, surgem outras áreas às quais os fluxos passam a também convergirem e se dispersarem, ou seja, áreas centrais.

Com isso, explicamos os percentuais de freqüência de pessoas de outros municípios serem maiores no Centro Principal de Maringá do que no de Londrina, pois quanto à primeira, trata-se, praticamente, da única área com forte atração regional, enquanto que para Londrina, encontram-se bem delineadas, outras áreas que atraem tais fluxos, como nos eixos Bandeirantes-Souza Naves; Tiradentes-Maringá e Dez de Dezembro e no setor sudoeste, na freqüência ao Catuaí Shopping Center e seus arredores. Assim, nas cidades que apresentam tendências a multi(poli)centralidade, a medição da freqüência regional de pessoas no Centro Principal mostra-se insuficiente, necessitando-se da análise, também, em outras áreas.

Analisando a tabela 5, percebemos quer há uma sensível diferença no que se refere ao transporte utilizado pelos freqüentadores de ambos os centros principais, pois encontramos em Londrina uma predominância de pessoas que utilizam o transporte coletivo, enquanto que, em Maringá, temos uma maior presença de pessoas que se utilizam do automóvel. Assim, torna-se possível afirmar que as pessoas de Londrina que utilizam o automóvel como meio de transporte, procuram outras áreas para prática do consumo, o que veremos mais detalhadamente nas tabelas a seguir.

Tabela 5
 Londrina e Maringá. Meio de transporte utilizado para deslocamento aos Centros Principais - 2004

 

Londrina

%

Maringá

%

         

1. Automóvel

65

26

60

40

2. Ônibus

110

44

57

38

3. Moto

17

7

7

5

4. Pedestre

45

18

22

15

5. Carro e ônibus

4

2

1

1

6. Bicicleta

4

2

1

1

7. Carro e moto

2

1

1

1

8. Ônibus e moto

1

0

0

0

9. Ônibus e a pé

1

0

0

0

10. Não sabe ou não respondeu

1

0

1

1

Total

250

100

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Nas tabelas 6 e 7, encontramos outras nuances da centralidade dos centros principais de Londrina e de Maringá, pois, percebemos que, em ambas as cidades, não há grandes variações no que diz respeito aos bens e serviços pelos quais seus freqüentadores procuram, porém, quando analisados os motivos de escolha das áreas, percebemos algumas diferenças.

Tabela 6
 Londrina e Maringá. Bens e serviços procurados nos Centros Principais - 2004

 

Londrina

%

Maringá

%

         

1. Compras

48

18

42

28

2. Serviços

66

26

35

23

3. Lazer

24

9

20

12

4. Lazer e compras

16

6

17

11

5. Lazer e serviços

10

4

5

3

6. Compras e serviços

38

15

12

8

7. Compras, lazer e serviços

23

9

12

8

8. Trabalho

24

9

6

4

9. Estudar

1

1

1

0

Total

250

100

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Tabela 7
 Londrina e Maringá. Motivos de freqüentar os Centros Principais - 2004

 

Londrina

%

Maringá

%

         

1. Infra-estrutura

32

13

24

16

2. Localização

76

30

22

15

3. Preços

37

15

21

14

4. Variedade

64

26

73

49

5. Porque moro na cidade

15

6

5

3

6. Outros

26

10

5

3

Total

250

100

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Assim, em Londrina, a explicação desta freqüência é a localização, o que demonstra a importante centralidade garantida pela acessibilidade que os sistemas de transportes propiciam. Em seguida, comparecem a variedade e os preços, o que demonstra que os preços influenciam na opção de freqüentar o Centro Principal, mas com a explícita condição de variedades de mercadorias, fato que demonstra que a grande concentração de estabelecimentos no Centro Principal também é um elemento da expressão das centralidades, no caso, predominantemente, popular.

Já em Maringá, temos uma situação diferente, pois a indicação da variedade como sendo o principal motivo para a escolha de freqüência ao Centro Principal, constitui em um fato que revela que as pessoas encontram em tal área, a única opção para o consumo com variedade, conforme relatou um entrevistado[2]. Tal fato mostra-se mais evidente, quando comparadas as tabelas 8 e 9, que mostra as áreas indicadas pelos freqüentadores dos Centros Principais, como de alternativas ao consumo.

Tabela 8
Londrina. Áreas apontadas como alternativas ao consumo no Centro Principal - 2004

Áreas

Pessoas

%

1. Catuaí Shopping Center

63

25

2. O Centro como único lugar de consumo

54

22

3. Cinco Conjuntos (Zona Norte)

16

6

4. Comércio de vizinhança

14

6

5. Outras áreas

44

18

6. Não respondeu ou não sabe

57

23

Total

250

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Tabela 9
 Maringá. Áreas apontadas como alternativas ao consumo no Centro Principal - 2004

Áreas

Pessoas

%

1. O Centro como único lugar de consumo

73

49

2. Comércio de vizinhança

11

7

3. Cidade onde mora

9

6

4. Outras áreas

20

13

5. Não respondeu ou não sabe

37

25

Total

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Do total de 250 pessoas abordadas no Centro Principal, em Londrina, 54 (22%) afirmaram que esta área é a sua prioridade na escolha para o consumo, sendo que em Maringá, do total de 150 pessoas, 73 (49%) destacaram a respectiva prioridade ao Centro Principal. Nestas tabelas, encontramos uma forte diferença que evidencia hábitos espaciais quanto ao consumo, pois em Londrina, como áreas de alternativa ao consumo, foram apresentadas outras como Catuaí Shopping Center, Cinco Conjuntos (Zona Norte) e Comércio de Vizinhança. Enquanto que, em Maringá, apenas 26 % das pessoas abordadas, indicou uma outra área para o consumo. Tal fato contribui para o entendimento da dispersão e da reprodução da centralidade em Londrina e da concentração em Maringá.

Quando observadas as tabelas 10 e 11 a respeito da periodicidade da freqüência nos respectivos centros principais e do tempo médio de permanência neles, percebemos hábitos de consumo que não apresentam grandes diferenças, correspondendo aos indicadores dos perfis socioeconômicos.

Tabela 10
 Londrina e Maringá. Periodicidade dos freqüentadores na freqüência aos Centros Principais - 2004

 

Londrina

%

Maringá

%

         

3. Ao menos 1 vez por mês

31

12

45

30

2. Ao menos uma vez a cada duas semanas

16

6

7

5

1. Ao menos 1 vez por semana

76

30

27

18

5. Várias vezes por semana

97

39

54

36

6. Todos os dias

4

2

2

1

4. Sem periodicidade

25

10

14

9

8. Não sabe ou não respondeu

1

0

1

1

Total

250

100

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Tabela 11
Londrina e Maringá. Tempo médio de permanência de freqüentadores em seus Centros Principais, por ocorrência - 2004

 

Londrina

%

Maringá

%

         

1. Menos que 30 minutos

5

2

2

1

2. De 30 minuntos a 1 hora

28

11

17

11

3. De 1 a 2 horas

51

20

32

21

4. De 2 a 4 horas

85

34

53

35

5. Acima de 4 horas

78

31

46

31

6. Variável

1

0

0

0

7. Não sabe ou não respondeu

2

1

0

0

Total

250

100

150

100

Fonte: Pesquisa de campo, 2004.

Percebemos, portanto, que existem semelhanças, mas também, diferenças quanto aos freqüentadores dos centros principais de Londrina e de Maringá. Porém, cabe um destaque ao fato de que na cidade de Maringá, praticamente, não foram indicadas outras áreas como alternativas ao consumo no Centro Principal, enquanto que em Londrina, houve várias referências. Tal fato corresponde aos elementos referentes à disposição espacial e as áreas de concentração das atividades econômicas.

Sposito (2001b) destaca as principais transformações conjunturais que ocasionam os processos de descentralização e de recentralização: interesses imobiliários na construção de novos equipamentos comerciais e de serviços; acelerada expansão territorial urbana, gerando tecidos descontínuos e fragmentados; ampliação da diferenciação socioespacial; e melhoria das formas de transporte, com destaque para o aumento do uso do transporte individual.

Porém, percebemos que, em Maringá, mesmo diante das modificações conjunturais, há o reforço da centralidade no/do Centro Principal, propiciada por vários fatores, dentre os quais elencamos:

a.          Plano urbano com previsão para crescimento urbano, com avenidas largas e zoneamento funcional;

b.         Interesses privados na valorização das terras da área, com permanência de estoques, áreas para expansão contínuas e práticas de especulação;

c.          Legislação urbana bastante rígida quanto ao zonemanto funcional e quanto à imposição da cobrança de impostos que dificultam a localização para fins residenciais e/ou comerciais das camadas mais populares;

d.         Prioridade nas Políticas públicas com foco em investimentos em obras de infra-estrutura na área;

e.          Convergência absoluta do transporte coletivo urbano e do transporte individual;

f.          Concentração predominante e absoluta dos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços na área, inclusive públicos;

g.         Investimentos privados para instalação de shopping centers na área;

h.         Economia com inserção regional e articulações junto à rede urbana com a vinculação à área pela concentração de agências bancárias e escritórios de administração e contabilidade;

i.           Ausência de processos que conduzam à fragmentação do tecido urbano.

Por outro lado, em Londrina, verifica-se a tendência da dispersão da centralidade e da constituição de novas áreas centrais, sobretudo, em função dos seguintes fatores:

a.             Plano Urbano com rápida saturação do projeto inicial;

b.            Interesses privados na valorização de terras no Centro Principal, mas também, com elevado grau de importância, de áreas distantes para expansão urbana, com destaque à Zona Norte e ao setor Sudoeste;

c.             Ausência quase total de estoque de terras no Centro Principal e de possibilidades de expansão. Já se verifica um forte adensamento vertical.

d.            Legislação urbana bastante flexível, com ampla aprovação de novos loteamentos;

e.             Investimentos públicos com priorização de investimentos em obras de infra-estrutura em áreas de expansão, distantes do Centro Principal;

f.             Investimentos privados para instalação de shopping center de grande porte fora do Centro Principal;

g.            Há a convergência predominante do transporte coletivo urbano e do transporte individual, porém, encontra-se um processo de descentralização, com os terminais de bairro e com a presença de fluxos consideráveis de veículos em outras áreas;

h.            Concentração predominante dos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços no Centro Principal, o que mantém sua importância para o conjunto urbano, porém, com a existência de outras áreas com adensamento considerável;

i.              Economia com ingresso de capitais externos que redinamizam fluxos e atribuem maiores complexidades à estruturação do espaço urbano;

j.              Evidências de processos de fragmentação do tecido urbano.

Assim, os fatores arrolados confluem para a constatação de diferenças de complexidade na estruturação urbana, sendo que, principalmente para a cidade de Londrina, a análise da centralidade necessita da abordagem de outras áreas, pois expressam centralidades que variam funcional e socialmente.

Outros centros e outras centralidades. A multi(poli)centralidade

Com base nos elementos desenvolvidos até o presente momento, com o entendimento dos processos e formas espaciais e dos fixos e dos fluxos que dinamizam a produção e reprodução dos espaços urbanos de Londrina e de Maringá, entendemos que se trata de duas cidades com estruturações distintas, com dinâmicas e tendências que se diferenciam consubstancialmente, apesar da semelhança do processo de constituição da atual composição junto à rede urbana do Norte do Paraná.

Diante do exposto, verificamos uma tendência à ocorrência do processo de descentralização e de redefinição da centralidade, principalmente, na cidade de Londrina, e vários fatores já apresentados contribuem com tal ocorrência. Na cidade de Maringá, também podem ser verificados processos de formação de áreas que expressam centralidades alternativas ao centro principal, porém, suas ocorrências são bastante tênues, pois vários fatores direcionam para o reforço da centralidade do Centro Principal.

Com isso, percebemos como há a simultaneidade entre os processos de descentralização e de recentralização, que ocorrem por meios de movimentos dialéticos. A descentralização termina por induzir a criação de novas concentrações que irão expressar centralidades diferenciadas, ou seja, “todo lugar pode torna-se o vetor nulo” para usar as palavras de Lefèbvre (1999 [1970]). Assim, após a decorrência destes processos, detecta-se um significativo ganho de complexidade nas dinâmicas urbanas, em que as contradições sociais e econômicas tornam-se mais latentes e possíveis de perceber espacialmente. Assim, as novas centralidades contribuem para a maior diferenciação e para a maior imbricação entre a cidade do just in time e a cidade da sobrevivência.

Analisando as novas áreas centrais das cidades de Londrina e de Maringá, apontadas em várias partes desta tese e localizadas nos mapas 3 e 4, a partir dos respectivos layers de sobreposição, encontramos as seguintes formas espaciais, conforme classificações e conceituações propostas por Sposito (1991; 1998; 1999b, 2001b); Corrêa (1995b; 1998); Villaça (1998); Salgueiro (2001):

a. Áreas de expansão do Centro Principal : São áreas que representam a expansão territorial do Centro Principal, que podem se realizar por meio de zonas ou por meio de eixos. Tal expansão ocorre por meio de processos de valorização da terra urbana, por meio de cobrança de impostos que forçam a transformação de usos, realizando a modificação do uso residencial ao uso comercial ou de serviços, ou em processos em que se tem a convivência temporal destes. Assim, não é um processo de formação linear e tampouco harmônico, pois tem sua gênese nas buscas de maximização das possibilidades da reprodução capitalista. Portanto, são áreas que desempenham praticamente os mesmo papéis do Centro Principal, com, inclusive, semelhanças na paisagem. Nas cidades de Londrina e de Maringá, tais áreas foram formadas, sobretudo, em ocasião do rápido crescimento populacional e territorial e do adensamento das atividades econômicas. No entanto, como em Maringá havia a possibilidade de terras para expansão, foi possível a expansão do Centro Principal pela definição de zonas, enquanto que em Londrina, houve, principalmente, a formação de eixos.

b. Desdobramentos do Centro Principal : Estas áreas evidenciam o ganho de complexidade das atividades econômicas, que necessitam aumentar suas possibilidades de reprodução para além da simples concentração. Trata-se de uma necessidade de concentração com graus de especializações, ou seja, tais áreas concentram atividades tipicamente centrais, mas com especialidades funcionais, que com o ganho de complexidade podem também se especializarem socialmente. Com isso, há busca por áreas que possibilitem tais localizações, na procura por amenidades e facilidades de uma economia de aglomeração. Estas áreas de desdobramento não necessariamente são contínuas territorialmente ao centro principal, mas possuem suas gêneses ligadas a este. Na cidade de Londrina, comparecem com consideráveis graus de complexidades, já, em Maringá, são ainda bem modestos, com exceção da Avenida Colombo.

c. Subcentros : São áreas que possuem suas gêneses relacionadas ao adensamento demográfico de áreas, podendo ou não, decorrer de processos de segmentação do tecido urbano. Assim, para reconhecer áreas centrais deste tipo, é importante verificar a constituição de barreiras, que podem ser diversas, como: - distância; - dificuldades de acesso; - diferenças marcantes no padrão socioeconômico (muito elevado ou muito baixo); ou barreiras físicas. No entanto, trata-se de uma fragmentação com articulação junto ao tecido urbano, pois há a formação de uma área que tende a ser a “cidade dos iguais”, um paradoxo em si, pois a constituição da cidade é vinculada às diversidades da divisão social e territorial do trabalho sob diversas escalas. O processo refere-se, pois, a um ganho de complexidade da estruturação urbana, que tende a acentuar as diferenças sob novas formas espaciais, mais uma vez, contrapondo de maneira absolutamente articulada, as cidades do just in time e a da sobrevivência. Destacamos, portanto, que não se tratam de miniaturas ou de réplicas do Centro Principal, mas sim, de uma nova forma espacial com heterogeneidade funcional, mas com especialidade socioeconômica. Comparecem em Londrina, sobretudo, na Zona Norte, com elevado grau de complexidade e em outras áreas de maneira mais tênues. Em Maringá, as áreas apresentam baixa complexidade, constituindo-se, principalmente sob eixos.

d. Shopping Centers : Constituem em novos equipamentos urbanos de concentração de atividades comerciais e de serviços, com gênese e processos não necessariamente relacionados ao Centro Principal. Conforme já discutido no Capítulo 4, apresentam fortes influências sobre a expressão da centralidade, sobretudo, nas cidades médias. Tais dinâmicas marcam uma das maiores diferenças nas tendências de estruturação e de centralidade nas cidades de Londrina e de Maringá.

e. Subcentros Regionais : São áreas que ainda se mostram modestamente presentes nas cidades médias, sendo mais comuns nas metrópoles. Possuem suas origens geradas por meio de economias de aglomeração, em áreas por vezes distantes dos Centros Principais, com grandes complexidades funcionais, que expressam centralidades para todo o conjunto urbano, mas se distinguem deste por uma peculiaridade socioeconômica. Tal área chega a competir com o Centro Principal, pois apresenta uma atração que condiz com atividades centrais, constituindo-se, também, em importante nó da rede urbana regional. Encontramos a presença, ainda que em formação, somente na cidade de Londrina, não tendo ocorrência em Maringá. Trata-se da área do Catuaí Shopping Center e de seu entorno.

Assim, o surgimento de tais áreas torna mais complexa a estruturação das cidades, modificando os fluxos, separando diferenças e colocando a questão da possível superação da condição básica de existência das cidades, a convivência entre as diferenças. Tais processos são bastante diversos e não lineares, ocorrendo diante de lógicas que remontam a tempos diferentes.

Na articulação escalar. Concorrências e complementaridades

Para a reflexão da complementaridade dialética que realiza articulação escalar na expressão de centralidades entre a cidade e a rede urbana, leitmotif deste artigo, iremos retomar a discussão sobre as relações regionais entre Londrina e Maringá.

Resumindo, a constituição das cidades de Londrina e de Maringá foi parte do processo de loteamento do Norte do Paraná, implementado pela Companhia de capital inglês, a Companhia de Terras Norte do Paraná, iniciado nos anos de 1920. Tal loteamento, rural e urbano, foi realizado em paralelo com a expansão da economia paulista cafeeira, de leste a oeste. Assim, foram fundadas cidades, entre elas, quatro que seriam as principais cabeças da rede urbana em formação: Londrina, Maringá, Cianorte e Umuarama.

Estas cidades desempenhavam papéis de “bocas de sertão”, abastecendo com bens e serviços as cidades da região. Foi assim com Londrina e com Maringá. No entanto, quando estava para ocorrer, também, com Cianorte e Umuarama, houve a decadência da economia cafeeira e a modificação nas tendências de expansão das cidades e da rede urbana.

A cidade de Londrina apresenta em sua estruturação atual, marcas desta história, sendo que sua porção oeste mostra maior desenvolvimento econômico com a concentração das atividades de oferta de bens e serviços mais sofisticados e estabelecimentos hegemônicos, ou seja, marca a presença do circuito do just in time , herança de seu papel na formação das cidades ao seu oeste.

Em contrapartida, a estruturação atual da cidade de Maringá, também mostra as heranças desse passado. Seu setor leste é o que apresenta a maior concentração de estabelecimentos de oferta de bens e serviços mais sofisticados, com grande presença do circuito do just in time . Tal lógica se deve ao contato que a cidade de Maringá recebeu em seu início de constituição, originado de leste, ou seja, de Londrina. Quando a cidade de Maringá iria passar a desempenhar o papel de abastecimento de Cianorte e Umuarama, houve a decadência da economia cafeeira, e com ela, da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, que teve, então, seus planos modificados. Assim, a cidade de Maringá não chegou a mudar a localização de suas relações regionais para seu setor oeste.

Com isso, posterior às transformações conjunturais apresentadas nos capítulos anteriores, houve a possibilidade de que o setor Oeste de Londrina, sobretudo, as avenidas Tiradentes e Brasília e, posteriormente, a Rodovia Celso Garcia Cid e, no caso de Maringá, o setor leste, representado pela Avenida Colombo, passassem a desempenhar papéis regionais. Tais áreas, com facilidades para a acessibilidade regional, passaram a concentrar estabelecimentos, com predominância de atuação nesta escala.

Em entrevistas que realizamos junto aos estabelecimentos localizados nestas áreas, obtivemos informações que confirmam tais lógicas diacrônicas. Em Londrina, entrevistamos duas concessionárias de veículos, a Cipasa, localizada no Centro Principal de Londrina, fundada em 1958, e a Norpave, localizada na Avenida Tiradentes (Setor Oeste), fundada em 1969.

A localização destas empresas é bastante emblemática, pois a primeira remonta ao processo de centralização na cidade de Londrina e a segunda, ao processo de descentralização e recentralização, em que a escolha locacional havia mudado de padrões. “ Toda cidade cresce para o poente ” afirmou o senhor Antônio Carlos Castro Costa, Diretor da Norpave, em 2004. Deste discurso, percebemos uma lógica presente nas pessoas que participaram de tal processo, que era a imagem de que o progresso seguia em direção ao oeste, ou seja, nos rumos da expansão dos negócios da CTNP.

Em Maringá, entrevistamos uma concessionária de automóveis, localizada no setor Leste, na Avenida Tuiuti, com filial na Avenida Colombo. Fundada em 1975, a Zacarias Veículos demonstra o padrão de escolha locacional daquele momento, pois o Senhor Valdir, gerente administrativo, afirma que “não há melhor localização para quem precisa do mercado regional, foi assim no passado, e é assim hoje” (2005).

Ocorre que tais papéis regionais, originados no sentido da complementaridade da rede urbana, com o crescimento das cidades, passaram a ser, também, geradores de concorrências, já que as cidades de Londrina e de Maringá passaram a expressar crescentes graus de centralidade no compasso de seus crescimentos.

Daí a idéia dos “entre-olhares” urbanos, que já foi alvo de muitas polêmicas e disputas, em vários sentidos, desde políticas e econômicas até culturais e esportivas, quando as cidades possuíam times de futebol que disputavam com chances de vitória o campeonato paranaense.

Outro fator que veio a reforçar a centralidade regional e a ampliar as potencialidades dos “entre-olhares”, foi o projeto do Metronor, desenvolvido em fins dos anos de 1970 e início dos anos de 1980, que visava a criação de uma “Metrópole Linear do Norte do Paraná”. Tal projeto consistia em obras de duplicação da rodovia entre Londrina e Maringá, na duplicação das avenidas Brasília, Tiradentes e Colombo (Cunha, 2005).

Assim, encontramos relações de concorrências e complementaridades que articulam as escalas da cidade e da rede urbana, imbricando processos e formas espaciais que contribuíram para a formação de áreas que demonstram a crescente complexidade das cidades.

Na atualidade, encontra-se uma gama de estabelecimentos com algumas especialidades funcionais, sobressaindo-se o comércio de automóveis e de materiais de construção (tabelas 11 e 12).

Tabela 11
Londrina. Estabelecimentos localizados na Avenida Tiradentes – 2005*

 

Estabelecimentos

%

Materiais para Construção

20

12

Venda e Assistência de Carros, Motos, Tratores e Caminhões

16

9

Escritórios de administração e contabilidade

16

9

Bares, Lanchonetes e Restaurantes de alto padrão.

14

8

Funilaria, oficina mecânica e elétrica de carros e caminhões.

14

8

Vendas de peças e acessórios para carros

11

6

Bancos e Financeiras

8

5

Agência de transporte de carga

6

3

Materiais elétricos, ventiladores e iluminação.

6

3

Comércio de tintas

5

3

Decoração e Moveis de alto Padrão

5

3

Postos de Combustível e troca de óleo

5

3

Outros serviços

47

27

Total

173

100

*Levantamento realizado que exclui o setor da Avenida Tiradentes que apresenta predomínio da atividade industrial.
Fonte: Pesquisa de campo, 2005.
Organização: Flávio Augusto de Carvalho
Coleta de informações: Flávio Augusto de Carvalho; Julio César Março e Victor de Almeida Pereira.

Tabela 12
Maringá. Estabelecimentos localizados na Avenida Colombo – 2005*

 

Estabelecimentos

%

Venda e assistência de carros, motos, tratores e caminhões.

15

19

Funilaria, oficina mecânica e elétrica de carros e caminhões.

15

19

Vendas de peças e acessórios para carros

15

19

Materiais para construção

9

12

Bares, lanchonetes e restaurantes.

4

5

Decoração e móveis de alto padrão

3

4

Postos de combustível e troca de óleo

3

4

Outros serviços

13

17

Total

77

100

*Levantamento realizado junto ao setor da Avenida Colombo localizado a leste da Avenida São Paulo.
Fonte: Pesquisa de campo, 2005.
Organização: William Ribeiro da Silva

Percebemos, portanto, que os estabelecimentos que se encontram localizados nas referidas áreas, estão estreitamente vinculados às demandas da rede urbana, sendo, em sua maioria, de grande porte e com graus de especialidades. Ressalte-se que, no ramo de construções, de comércio e assistência para veículos automotores, existem muitas especialidades que não discriminamos nas tabelas por uma questão de priorizar a análise do conjunto.

Assim, por estarem distantes cerca de 90 km, disputam o mercado consumidor regional, sendo que, com tal dinâmica, devem se ampliar os graus de complexidade dessas áreas e iniciar um processo de especialização de perfil socioeconômico, fato que já pode ser observado na cidade de Londrina, com referência à localização de lojas de decoração e de revendas de automóveis importados, além da presença de restaurantes destinados a pessoas com alto poder aquisitivo, respectivamente consumidoras dos comércios citados anteriormente.

Notas

[1]Para a realização das enquetes, selecionamos uma amostragem baseada em critérios de tamanho populacional, sendo que chegamos ao número de 250 enquetes para Londrina, o que representa aproximadamente 0,05% da população total e de 150 enquetes para Maringá, o que representa também, aproximadamente, 0,05% da população total.

[2]Entrevista realizada nas ruas do Centro Principal de Maringá, em outubro de 2004.

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