IX Coloquio Internacional de Geocrítica

LOS PROBLEMAS DEL MUNDO ACTUAL.
SOLUCIONES Y ALTERNATIVAS DESDE LA GEOGRAFÍA
Y LAS CIENCIAS SOCIALES

Porto Alegre, 28 de mayo  - 1 de junio de 2007.
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

 

ASPECTOS DA FRATURA SOCIOESPACIAL

NA CIDADE DE PORTO ALEGRE

 

Álvaro Luiz Heidrich

Instituto de Geociências

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

alvaro.heidrich@ufrgs.br

 


 Resumo

 

Argumenta-se sobre três aspectos interligados, que modificam o espaço social em escala local: a globalização, como uma dimensão da integração sócio-econômica; a construção e perda de vínculos entre a sociedade e o território; e a criação de objetos técnicos específicos que viabilizam a articulação local-global.  Nesse contexto, o impacto sobre o espaço social além de se caracterizar por adensamento técnico e intensificação de fluxos, também interfere no cotidiano e nas práticas sócio-espaciais. Na escala local se amplia a perda de coesão comunitária e a modificação do cotidiano, pelos novos padrões de consumo, habitação e lazer. Resulta desta dinâmica a reprodução de um espaço, e provavelmente, um sujeito fraturado: um, se integra à rede global e, outro, vive do espaço local, onde a reprodução social depende diretamente do espaço imediato, próximo e vizinho. Esta pesquisa busca caracterizar o espaço social nesta fratura, analisando situações de vizinhança absoluta e segregação sociocultural.

 

Palavras chave: fratura socioespacial, espaço social, globalização

 

Palabras clave: fractura socio espacial, espacio social, globalización

 

Keywords: breaking socioespacial, social space, globalization

 


 

 

Muito embora não sejam todas as cidades que reúnam as condições para se configurarem como nós ou centralidades da globalização, como as chamadas cidades globais (Sassen), em geral o espaço social da cidade tem sido afetado por esta nova condição. A globalização, como temos visto, repercute por todos os espaços e pode ser compreendida como uma reunião de processos que se caracterizam por diversos fatores. Destacam-se evidentemente os aspectos da transnacionalização, que além do intercâmbio maior de capitais e mercadorias entre diversas economias, tem se caracterizado pela influência de monopólio nos mercados locais e a tendência de homogeneização de padrões de consumo, antes mais diferenciados por aspectos culturais ou condições técnicas. Além destes aspectos, destaca-se o adensamento de comunicação como um dos fatores mais relevantes que influenciam e fortalecem a atual dinâmica de integração sócio-econômica em âmbito global.

 

A cidade é, em essência, um fato geográfico “novo” desde sua origem, da mesma maneira que as transformações técnicas e econômicas atuais, trazem a compressão espaço-tempo (HARVEY). Na origem, a cidade agiu como uma força “gravitacional” que permitiu colocar em pouca extensão as dinâmicas que se realizavam entre distantes lugares e extensas áreas (SINGER). Quanto mais a cidade estiver distante da técnica, mais ainda ela é o lugar exclusivo da integração. Porém, quanto mais perto, mais ela é seu centro.

 

Nesse sentido, o argumento que pretendemos desenvolver neste trabalho procura demonstrar alguns aspectos mais gerais da transformação do espaço social da cidade. Nossa compreensão, como se procura demonstrar a seguir, é de que três fatores se entrelaçam para produzir a nova espacialidade urbana: o amplo processo de integração sócio-econômica, os mecanismos de criação e perda de vínculos com o território e a criação de objetos técnicos específicos para a articulação global-local.

 

 

1 - A cidade, a globalização e o espaço social

 

A globalização faz concorrer entre si os sistemas nacionais e regionais de normatizações, exercendo uma espécie de “pressão” para a integrar – para que todas as trocas comerciais posam ocorrer sob as mesmas regras. Trata-se de uma combinação entre reestruturações econômicas, políticas governamentais que vêm favorecer a transnacionalização, adoção de progresso tecnológico e reestruturação organizacional nos sistemas de comunicação e transportes.

 

As modificações difundidas pelo meio técnico-científico-informacional (SANTOS, 1997) têm contribuído para a formação de novas espacialidades. Assim, por exemplo, a predominância cada vez maior das redes em detrimento da importância do território e o surgimento de espaços de fluxos que se estruturam em lógica distinta dos espaços de lugares (CASTELLS, 2001), têm comprometido o sentido dos lugares, das imediações, das vizinhanças, ou seja, do espaço social da cidade. Este, não é, entretanto, um problema exclusivo do momento da globalização. É, em sentido maior, um problema ligado ao crescimento urbano, ao grau cada vez maior da integração socioeconômica, que não se reduz ao viés do global.

 

Essa integração tem sua dialética, já que também produz isolamento. Quer dizer, ao mesmo tempo em que se participa cada vez mais dos planos mais gerais de articulação da sociedade, cada vez menos as ações são pessoais, comunitárias e a coletividade se mantém por causa das estruturações e dos reconhecimentos formais.

 

O espaço social de hoje se distingue pela peculiar incorporação de tecnologia, que modifica as conexões entre lugares e facilita a realização de fluxos. Nesse sentido, a integração proporcionada pela globalização estabelece que a participação a uma espacialidade integral, tanto de lugares como de fluxos, depende da acessibilidade do lugar e das pessoas ao meio técnico científico-informacional. Além disso, opera-se uma transformação fundamental nesta dinâmica: a comunicação, um elemento importante na estruturação da comunidade (LEDRUT, 1968, p. 260), passa a ser cada vez mais impregnada pelo absolutismo da informação. Não se tem, desta forma, a mesma equivalência em termos de vivência entre as diferentes temporalidades do espaço social urbano.

 

Em nossa compreensão, isto muda substancialmente a geografia, pois estar no lugar, não significa mais vivê-lo. Estar e viver, se distinguem, então? Este é um dos problemas que afetam diretamente o espaço social, pois, originalmente a cidade é um corpo que compreende as relações de um coletivo.

 

Não é uma soma de coisas, nem uma destas em particular. Tampouco é um conjunto de edifícios e calçadas, nem sequer de funções. É uma reunião de homens que mantêm relações diversas. Por certo, tais relações se estabelecem mediante a espacialidade, isto é, por meio das coisas que formam determinado espaço, e isto ao menos na mesma medida em que o fazem por meio da linguagem. Assim mesmo, se constituem sobre a base da espacialidade. Mas o espaço somente tem significado em relação à vida coletiva dos homens que ocupam os lugares. (...) Por conseguinte, a cidade não é uma coisa, um objeto; nem sequer uma máquina que deva funcionar com fluidez; é uma comunidade humana, uma coletividade territorial, uma população estabelecida de maneira mais ou menos duradoura em um espaço até certo ponto bem delimitado, cujos membros mantém relações de interdependência regidas por determinadas instituições (LEDRUT, op. cit., p. 23-24).

 

O problema, entretanto, é que as mudanças interferem exatamente neste sentido. A cidade como uma comunidade territorial, com um sentido geral de finalidade se mantém em seus vínculos formais e de modo mais efetivo, sua dinâmica esfacela o conjunto em realidades socioespaciais de se estranham.

 

Que espaço social é esse e que transformações são essas?

 

Por um ponto de vista, o espaço social compreende a distribuição dos objetos, os equipamentos, a urbanidade, as relações e dinâmicas espaciais, como de centralidade e periferia, por exemplo. Compreende também, as relações sociais em uma dada circunscrição, ou como propõe FRÉMONT (1984), “o conjunto de relações sociais especializadas”. Para LEFEBVRE (1984), o espaço [social] é produzido pelo entrelaçamento das práticas espaciais das pessoas e grupos sociais, a representação hegemônica que se faz do espaço e os espaços de representação, ou vividos.

 

Uma outra compreensão, com origem em reflexões mais distanciadas da geografia da cidade, atualmente se apresentam comprometidas com esta, pois nos levam ao entendimento de que as inconsistências da sociedade provocam a sua perda de sentido, para uma decomposição. No seu lugar, então, permanece um espaço. Para uns, é socialidade (MAFESSOLI, 2004), para outros, espaço social (BOURDIEU, 1989).

 

Pode-se acrescentar, também, que na completa confusão dos destinos dos espaços públicos, da exacerbação das individualidades e singularidades, da invasão completa do nosso mundo particular pelas necessidades dos outros, externadas como gerais, este também se perde (SENNET, 1988). E, com ele, se esvaem as referências da política e dos sensos e códigos da civilidade. Neste lugar, o que permanece é um espaço social, então. Enquanto o encontro da sociedade no espaço se resolveu pela identificação deste com o espaço do Estado-Nação as garantias eram asseguradas, com base na concepção a perda da autonomia individual é compensada pelo ganho da autonomia do espaço social (SEMPRINI, 1999, p. 98). O problema maior se revela com as profundas transformações do espaço social, quando a concepção moderna não encontra mais formas de garantir que o cidadão é mais importante que o indivíduo, quando não se reconhece a diferença como um valor inquestionável. Neste momento são os símbolos e os valores que passam a reconfigurar o espaço. Nesse novo espaço a cultura ganha a dimensão antes perdida para a o universo econômico-político tradicional – na verdade, moderno (SEMPRINI, op. cit., p. 121).

 

Nas cidades de condição metropolitana, dois aspectos são reveladores das atuais transformações do espaço: uma particular dinâmica de expansão urbana, que combina suburbanização e periferização, e a multiplicação de centros.  Para VIDAL-KOPPMANN (2006, p. 16) a dinâmica suburbanização/periferização se apóia na combinação entre a distinta condição sócio-econômica dos atores e na ruptura da continuidade do tecido urbano. O policentrismo da cidade atual faz parte, ao mesmo tempo, dessa tendência de ruptura do tecido urbano, de desconcentração da cidade. Para GOTTDIENER (1993, p. 229),

 

[tal] processo envolve ao mesmo tempo aglomeração e descentralização dispersas numa escala regional em expansão. (...) Encadeando as milhares de atividades ao longo do espaço regional estão modos hierárquicos de organização social ligados por telecomunicações, campos eletrônicos de processamento de informação e pela troca maciça de população através das formas de transporte.

 

Em sentido geral, o espaço social se constitui como uma recriação realizada sobre o seu primado, o espaço anterior. Como criação e recriação, é objeto de contínua transformação, à medida que incorpora novas propriedades e condições advindas da ação social. Sucessivamente a humanidade tem criado novas configurações que se acrescem ao espaço e alteram a condição de vida social e tais recriações implicam no aparecimento de mudanças na sua própria relação o espaço. Esta dinâmica, a nosso ver, pode ser entendida pela constituição de vínculos territoriais. Os vínculos territoriais se fazem por aquilo que se consegue realizar externamente, por onde cada um pode se relacionar com o outro (HEIDRICH, 2006).

 

Com este raciocínio as modificações no espaço social urbano, no momento em que se estabelecem novos vínculos, como as geografias que criam novas centralidades, espaços de consumo e habitação fechados, a nova espacialidade tende a anular prerrogativas da temporalidade anterior, como relações de vizinhança e até formalidades sociais que codificaram a vida coletiva. Tudo permanece em relação porque se trata de espaço, mas nem tudo está organicamente interligado por que a forma geográfica não garante a solidariedade e a integração local. A técnica permite interligar, mas depende da ação, do evento e o que se nota é que a transformação da cidade pelas novas formas da geografia, tende a multiplicar territorialidades, como resultado da criação de novos vínculos.

 

Desta forma, considera-se a situação atual da integração sócio-econômica como um novo espaço social que, portanto, vem alterar as condições de vínculo da sociedade com o espaço existente até então. Observa-se, por exemplo, que na escala local, da cidade e do “bairro”, os processos atuais resultam na perda da atual coesão comunitária. Evidenciam-se rupturas da solidariedade territorial construída para o mundo moderno: as relações originadas pela convivência dos grupos no mesmo território são anuladas pelo uso tecnologias e disciplinas novas.

 

SOJA (2001) chama este fenômeno de exópolis, no qual os efeitos das novas formas de urbanização, associadas à globalização, passam a converter a cidade simultaneamente em interior-exterior e exterior-interior. Desta forma, se fortalecem a estratificação social e as desigualdades econômicas e sociais. Trata-se de uma dialética entre uma geografia de conexões ou fluxos e, de lugares. São os aparatos técnicos que a compressão espaço-tempo e, por isso, nem todos os lugares participam em condições equivalentes deste condicionamento. Assim, a integração proporcionada pela globalização se afasta dos imperativos originais do território e, ao fazer isso, cria a condição de que a participação a uma geografia integral, de territórios e de redes, depende da acessibilidade do lugar e das pessoas ao meio técnico-científico-informacional.

 

 

2 – Alguns aspectos observados em Porto Alegre

 

Porto Alegre tem se caracterizado por sua condição metropolitana em vários aspectos e, particularmente, no período recente as modificações em seu espaço urbano têm demonstrado tendências comuns aos espaços urbanos de alta concentração, como a de se tornarem em centros de serviço de grande magnitude (BENKO, 1996). Outros aspectos que revelam as modificações recentes dizem respeito ao quadro ocupacional e do crescimento demográfico. Como observou MAMMARELLA, em Porto Alegre e sua respectiva região metropolitana, além do rearranjo espacial da economia ocorrem “mudanças significativas na estrutura da ocupação, caracterizadas pela retração das ocupações no setor secundário e pelo aumento de atividades no setor terciário” (2000, p. 171).  Observa-se, em relação a sua periferia, um crescimento demográfico mais lento, em parte coerente com o encarecimento do solo urbano da capital e em parte, coerente com  as dinâmicas de rearranjo econômico recentes (HEIDRICH & UEDA, 2006).

 

BARCELLOS, MAMMARELLA E KOCH observaram, com base na definição de uma tipologia dos socioespaciais, que entre 1980 e 1991 eleva-se a participação de espaços de nível médio superior e popular (2004, p. 202). Para as autoras, “tais alterações correspondem, em grande parte, à deterioração dos espaços no centro da capital e a investimentos imobiliários voltados para a população de renda mais elevada em bairros que anteriormente abrigavam moradia de camadas de renda média e baixa, e ao incremento da função comercial de alguns bairros” (p. 210). Além destes aspectos, também têm ocorrido uma profunda transformação nos espaço de moradia das camadas de alta renda: a privatização, por meio da implantação de condomínios fechados, que passam a ignorar a rede urbana local (UEDA, 2006). Nota-se, porém, que tais conjuntos permitem a participação numa integração relativa e tecnicamente opcional, à medida que são providos de sistemas de “segurança” que selecionam as conexões locais e de sistemas de comunicação que articulam a moradia a espacialidades não locais.

 

Neste sentido, entendemos que o conhecimento desse novo espaço social da metrópole pode ser enriquecido e complementado pela compreensão de seu cotidiano. É com esta intenção que se buscou caracterizar alguns aspectos de sua estrutura para esta cidade, considerando-se três dimensões básicas influenciadas pelas técnicas de adensamento de tessituras: o consumo, a comunicação e o convívio.

 

Como se tem visto, o consumo, a habitação, o lazer, entre outras práticas cotidianas, consolidam-se como maneiras completamente segmentadas de realização, não apenas localmente segregadas, mas como uma diacronia local-global.  Na escala da cidade ou do bairro os processos por este meio têm proporcionado até mesmo a perda do vínculo comunitário, já que se permite a substituição da contigüidade física pelo tempo compartilhado.

 

Em análise desta situação na cidade de Porto Alegre, observou-se especialmente cinco aspectos de significativa coerência a este argumento, que envolvem: o uso de meios de informação, meios de pagamento, o local de consumo, o tipo de lazer e relações de vizinhança.

 

 

Há tendência geral de ocorrer distanciamento das formas tradicionais das relações sociais e com o “meio espacial”, tendendo para a adoção de recursos tecnológicos modernos (tabela 1) no extrato socioespacial[1] médio e superior, com maior intensidade no médio-superior e superior. Ao mesmo tempo em que se registra maior individualidade, formalidade e impessoalidade nas relações, também aproxima as pessoas de uma integração mais global (tabelas 2 e 3). Nos extrato socioespacial inferior (operário e popular, principalmente), conservam-se as formas mais tradicionais de reprodução do cotidiano, muito embora já apareçam sinais de alguma mudança, como: algum uso de cartão de crédito e um pequeno, mas existente uso de internet.

 

Tabela 1 - Meios de Informação de uso predominante, por extratos sócio-espaciais.

Porto Alegre - 2001 (percentual relativo às observações por extrato)

Meios de Informação

Extratos sócio-espaciais

Superior

Médio-Superior

Médio

Médio-Inferior

Operário

Popular

TV a cabo

76,47

58,33

52,38

26,08

4,34

5,88

TV aberta

23,52

41,66

47,61

82,00

95,65

94,11

Internet

70,58

45,83

38,09

12,00

0,00

5,88

 

Tabela 2 - Meios de pagamento predominantes, por extratos sócio-espaciais.

Porto Alegre – 2001 (percentual relativo às observações por extrato)

Meios de Pagamento

Extratos sócio-espaciais

Superior

Médio-Superior

Médio

Médio-Inferior

Operário

Popular

Cartão créd.

52,94

25,00

52,38

32,00

17,39

11,76

Cheque

17,64

29,16

23,08

32,00

17,39

0,00

Dinheiro

29,41

45,83

23,80

36,00

65,21

88,23

                       

 

Tabela 3. Local de consumo predominante, por extratos sócio-espaciais.

Porto Alegre – 2001 (percentual relativo às observações por extrato)

Local de Consumo

Extratos sócio-espaciais

Superior

Médio-Superior

Médio

Médio-Inferior

Operário

Popular

Shopping

100,00

75,00

47,61

88,00

21,73

5,88

Centro da cidade

0,00

8,33

14,28

0,00

0,00

5,88

Comunidade

0,00

16,66

38,09

12,00

78,26

88,23

                       

                                              

Tabela 4. Lazer predominante, por extratos sócio-espaciais, em Porto Alegre – 2001

(percentual relativo às observações por extrato)

Meios de Pagamento

Extratos sócio-espaciais

Superior

Médio-Superior

Médio

Médio-Inferior

Operário

Popular

Cinema

18,51

13,15

3,57

8,33

0,00

0,00

Conv. Familiar

0,00

10,52

14,28

8,33

44,44

22,72

TV

37,03

23,68

14,28

44,44

18,51

31,81

Futebol

0,00

2,63

1,78

0,00

3,70

4,54

 

 

O lazer é influenciado pelo nível de renda, e isto influencia as relações, pois o convívio familiar é significativo nos extratos inferiores e pouco nos demais (tabela 4). As relações de vizinhança são mais formais e eventuais no extrato socioespacial superior, mais intensas no médio e há certo equilíbrio nos extratos inferiores (tabela 5).

 

Tabela 5. Relações de Vizinhança, segundo a intensidade, por extratos sócio-espaciais.

Porto Alegre – 2001 (percentual relativo às observações por extrato)

Contatos

Extratos sócio-espaciais

Superior

Médio-Superior

Médio

Médio-Inferior

Operário

Popular

Intenso

5,88

25,00

47,61

20,00

34,78

29,41

Médio 

35,29

29,16

33,33

12,00

47,81

41,17

Eventual

58,82

45,83

19,04

68,00

17,39

29,41

 

Assim, enquanto é a tecnologia, a característica do meio e o nível de renda que influencia isto nos extratos superiores, pode-se supor que as indicações variáveis nos inferiores devem ser explicadas tanto pela maior necessidade de solidariedade local, como pelo grau mais elevado de violência urbana e conseqüente exposição das pessoas a mesma. De maneira sintética, pode-se concluir que no extrato médio há dupla experiência, ou seja: vive-se uma situação de relações com a localidade relativamente fortalecida, bem como se observação participação numa integração socioeconômica mais global. As tecnologias (televisão por cabo e Internet) e os espaços de consumo (shoppings) reforçam esse processo, facilitando a articulação com a sociedade em geral, em detrimento das relações comunitárias, bem como também se potencializam as relações através de mercado.

 

 

3 – Considerações

 

Uma consideração torna-se necessária se levarmos em conta que uma cidade se constitui num espaço social que ao mesmo tempo reproduz finalidades coletivas e usos particulares e de diferentes comunidades (LEDRUT, 1968). O que vimos acima revela que especialmente e cidade de condição metropolitana vem apresentando modificações técnicas, socioeconômicas e geográficas que passam a caracterizar as finalidades coletivas como funcionalidades de um espaço em que o estranhamento, a segregação e a fratura é seu aspecto mais comum.

 

O cotidiano social tem se modificado, em função de incorporações técnicas e de novos padrões de uso do espaço, como no âmbito do consumo, da habitação e do lazer. De um lado os lugares tornam-se pontos articulados em âmbito global e, de outro, a solidariedade territorial-local é cada vez mais seletiva. Apesar disto, a fratura socioespacial e, em diversos casos, os microterritórios, estão presentes num único espaço social, porém, em planos que não se reconhecem. Esta então, deve ser a marca do espaço social da temporalidade do meio técnico científico-informacional: de permitir a existência de uma geografia absoluta em planos diferenciados e de geografias relativas, pois estão localizadas em contigüidade, mas parcialmente e relativamente vividas. Muito embora a desigualdade, o estranhamento e a segregação permaneçam assentados em razões de várias ordens (moral, econômica, ética, etc.), as técnicas e as disciplinas de hoje dizem que o que não está no mesmo plano não entra em conflito.

 

 

 

 



Nota:

 

[1] Adota-se a identificação, de extratos socioespaciais, elaborados por Kock, Mammarella e Barcellos (2001), que definem áreas com predominância de características socioeconômicas predominantes, como o espaço social, discutido anteriormente. A partir de uma definição preliminar baseada na compreensão de espaço social de Pierre Bourdieu, RIBEIRO  e LAGO (2000),  propõem esta mesma equivalência. Tais extratos são subdivididos em Superior, Médio-superior, Médio, Médio-inferior, Operário e Popular.

 

 

 

Referências:

 

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VIDAL-KOPPMANN, Sonia “Reestructuración económica y nuevos territorios urbanos en las periferias metropolitanas de América Latina – el caso de Buenos Aires” In: SILVEIRA, R. L. L. da, PEREIRA, P. C. X. & UEDA, V. (Orgs.) Dinâmica imobiliária e reestruturação urbana na América Latina. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2006, pp. 14-44.

 


 

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