IX Coloquio Internacional de Geocrítica

LOS PROBLEMAS DEL MUNDO ACTUAL
SOLUCIONES Y ALTERNATIVAS DESDE LA GEOGRAFÍA
Y LAS CIENCIAS SOCIALES

Porto Alegre, 28 de mayo - 1 de junio de 2007
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

 

EVOLUÇÃO E CONFLITOS DOS AJUSTES
ESPACIAIS AMAPAENSES

Jadson Luís Rebelo Porto[1]
Universidade Federal do Amapá
jadsopnporto@unifap.br



Evolução e conflitos dos ajustes espaciais amapaenses (Resumo)

O Estado do Amapá (Brasil) possui suas pedras angulares amalgamadas a uma rede de próteses tecnológicas/engenharia. Essas próteses (instrumentos artificiais implantados pelo homem), redes geográficas e ajustes espaciais (condições para a manifestação e mobilidade do capital) instalados no espaço amapaense garantiram um amplo processo de transformações nas estruturas econômicas e sociais neste ente federativo brasileiro. O escopo deste trabalho será de avaliar a criação destruidora desses aspectos na ocupação e (des)organização do espaço amapaense Para se chegar ao objetivo proposto, o trabalho será dividido em três partes: Introdução do setor energético na Amapá (após 1950); A influência das redes informacionais no cenário amapaense (diversificação produtiva após 1976); e os ajustes espaciais e o desenvolvimento amapaense.

Palavras-chave: Amapá, redes geográficas, próteses, ajustes espaciais,transformações espaciais.


Evolution and conflict of the Amapá spatial adjustments (Abstract)

The Amapá State has its angle rocks amalgamated to a network of technological /engineering prosthetic. These prosthetics (artificial instruments implanted by men), geographical network, and spatial adjustments (conditions for the capital manifestation and mobility) installed in the Amapá space will grant a wide transformation process in its economic and social structures. The scope of this work will be the evaluation of the destructed creation of these aspects in the occupation and (diso) organization of the Amapá space. To reach the proposed objective, this work will be divided in three parts: Introduction to the energetic sector in the Amapá State (after 1950); the influence of informational net in the Amapá scenery (diversification of production after 1976);  the Amapá spatial adjusts; and the Amapá development.

Key-words: Amapá, geographical net, prosthesis, spatial adjusts, spatial transformations.



O Amapá foi de fundamental importância para a colonização da Amazônia, seja pela defesa da entrada pelo rio Amazonas mediante a construção de fortes, seja pela instalação de núcleos urbanos (Macapá e Mazagão)
[2]. Esses, juntamente com a cidade de Belém[3], caracterizaram uma reafirmação da autoridade da coroa portuguesa sobre esta região, onde se estabeleceu o controle do canal norte (Macapá) e sul (Belém) do Rio Amazonas, garantindo o domínio da foz deste rio (COUTO; PORTO, 2006, p. 03).

O domínio da margem esquerda da foz do rio Amazonas historicamente trouxe interesses externos, seja pelos seus produtos exóticos, alimentícios, minerais, ou pelo acesso ao interior do continente sul americano. À medida que novos espaços amazônicos foram conquistados, ajustes espaciais foram instalados a fim de garantir a melhor e maior mobilidade dos fluxos comerciais tanto em escala regional, quanto internacional. No que se refere à escala nacional, tal condição tornou-se mais intensa somente a partir da década de 1940, quando foi criado o Território Federal do Amapá (PORTO, 1998; 2003).

Segundo Porto (2005; 2006), não se pode analisar os Territórios Federais somente como ação política, pois não abrange a sua real atuação, mas que se deve ter por pressuposto a inclusão dos seguintes aspectos: o uso de suas potencialidades naturais, geográficas, geopolíticas e políticas em um mundo configurado em rede; as suas interdependências com os demais entes federativos e suas respectivas temporalidades, integrantes de um mundo em constante conflito entre o global e o local; sua organização e ordenamento espacial; a gestão do seu espaço mediante os aspectos de ordenamento, a configuração e o planejamento territorial; e as suas relações e conflitos internos.

A hipótese a ser considerada neste artigo é a de que o Amapá é um Estado em construção, cujas propostas de “desenvolvimento” ligam-se às criações/construções de condições espaciais capazes de instalar redes de próteses tecnológicas e um sistema de engenharia que possibilitou a diversificação produtiva do seu espaço, produzindo também uma nova configuração territorial, o seu ajuste.

Por “ajustes espaciais” entende-se as adaptações que são efetivadas no espaço, visando a garantia da instalação, existência, fluidez, manifestação e reprodução do capital. Ao analisar o espaço amapaense sob os enfoques de ajustes espaciais, magnitude do estado e o uso do território, Porto et. al. (2007) sugerem que foram construídos condicionantes espaciais neste ente federativo. As condições criadas/construídas garantiram a criação, o planejamento, a organização e a instalação de mecanismos proporcionadores da (des)construção espacial, a fim de atender aos interesses e objetivos externos ao ritmo e vivência locais.

A partir da origem do Amapá como Território Federal, esses autores ao analisarem três abordagens sobre esses entes federativos (como entidades precárias, Estados em embrião e como resultados de ações), entendem que a precariedade implica na criação de condições para deixar de sê-lo; o embrião de Estado indica que deveriam ser construídas condições para a estadualização; e as ações garantiriam a formação de estruturas, a sua delimitação jurídica, e territorialização de suas relações de poder (op. cit. p. 15).  

Com a inserção de investimentos externos no espaço amapaense, várias condições deveriam ser instaladas para que o processo de produção no Amapá pudesse ser estimulado, tais como: o fornecimento de energia para que empresas se instalassem e ao consumo da população; a construção de eixos viários (rodovias e ferrovia) que não dependessem do fluxo dos rios; a implantação de um transbordo comercial que conectasse o local com o global (Porto de Santana) e; a atração de mão de obra para a ocupação de fronteira.

Para melhor entender tais situações, este artigo discutirá os seguintes tópicos: Introdução do setor energético na Amapá (após 1950); A influência das redes informacionais no cenário amapaense (diversificação produtiva após 1976); e os ajustes espaciais e o desenvolvimento amapaense.

O escopo deste trabalho será de avaliar a criação destruidora desses aspectos na ocupação e (des)organização do espaço amapaense. Mas para se chegar ao objetivo proposto, a questão orientadora deste trabalho será: Quais foram as ações público e privadas que estimularam a execução de ajustes espaciais capazes de realizarem movimentos de criação destruidora no espaço amapaense?


Introdução do setor energético no Amapá (após 1950)

Segundo Couto et. al. (2006, p. 11) a dinâmica dos ajustes espaciais no Amapá está diretamente ligada aos movimentos de criação destruidora implantados e estimulados pelas redes e sua influência sobre a expansão e mobilidade informacional no espaço amapaense. Um dos principais fatores para este comportamento deu-se pela instalação de sistemas de engenharia e redes de próteses tecnológicas neste espaço[4].

Assim, a influência das redes na expansão e mobilidade informacional no Amapá seria a responsável pela criação de um cenário propício apenas a exploração e não ao desenvolvimento que condenou o Amapá a ser apenas um grande negócio (não havendo o interesse de desfazê-lo) mantendo seu atraso em relação aos outros estados da federação.

A dinâmica do ajuste espacial no Amapá está diretamente ligada aos movimentos de criação destruidora, que tem se manifestado através da atuação das redes e sua influência sobre a expansão e mobilidade informacional no espaço amapaense (COUTO, et. al., 2006)

Segundo Couto e Porto (2006), a afirmação feita, justifica-se pela atuação do setor energético nas transformações espaciais do espaço amapaense decorrentes da inserção do capital internacional (atuação do Grupo CAEMI), e criou de uma rede de próteses (estradas; ferrovias; hidrelétrica; porto; etc.) que possibilitou a mobilidade informacional, criando condições para a manifestação do ajuste espacial. Com a criação da rede de próteses, tornou-se possível o aumento do consumo e distribuição de energia, assim como a diversificação das atividades produtivas[5], principalmente na exploração mineral. De acordo com esses autores, essa situação foi a responsável pela criação de um cenário propício apenas a exploração e não ao desenvolvimento.

Com a instituição do Território Federal do Amapá (1943), foram criadas diretrizes políticas e administrativas, infra-estruturas e incentivos para o desenvolvimento de atividades econômicas (pelo Governo Federal), principalmente voltadas ao setor do extrativismo mineral, “que em muito contribuiu para a estruturação econômica amapaense e para sua organização espacial” (PORTO, 2003, p. 115).

A função da União foi criar “ajustes espaciais”, mediante à intensidade da magnitude do Estado. Ou seja criou-se condições para que o capital se manifestasse e ganhasse movimento. Assim, Couto et. al. (2006) informa que a instalação da ICOMI engajou este ex-Território na economia global, caracterizando a gênese da exploração de recursos minerais (manganês) em larga escala na Amazônia com tecnologia moderna no período de 1957 a 1997.

Este engajamento na economia mundial (ação do capital internacional), é justificado quando Harvey (2005, p. 118) afirma que, “nas novas regiões, a superacumulação de capital exige um ajuste espacial, talvez mesmo à custa do capital nas regiões antigas”, a exemplo da atuação da empresa Bethlehem Steel Company que representava o interesse norte-americano em relação ao manganês da Serra do Navio.

Esta atividade direcionou e fundamentou a economia amapaense nos 40 anos de ação do projeto, como também teve relevante participação na exploração de outras potencialidades amapaenses, “seja na construção de infra-estruturas (ferrovia, porto, rodovia e uma usina hidrelétrica) com incentivo do Estado (via incentivos fiscais e aquisição de financiamento externo), seja na diversificação das atividades do Grupo por instituições e empresas” (PORTO, 1998 p. 8).

Couto e Porto (206) ao se referirem ao investimento no setor energético amapaense, relatam que a ICOMI está diretamente ligado à gênese deste setor, que consequentemente passa por evoluções (condições para manifestação do capital) dando início ao sistema de redes informacionais, sendo que as redes são entendidas como “um meio de produzir o território” (RAFFESTIN, 1981 apud MACHADO, 1998, p. 45). Logo, a rede é proteiforme, móvel e inacabada, e é essa falta de acabamento que ela tira sua força no espaço e no tempo: se adapta as variações do espaço e às mudanças que advêm do tempo. A rede faz e desfaz as prisões do espaço, tornado território; tanto libera quanto aprisiona. É o porquê de ela ser o “instrumento” por excelência do poder (RAFFESTIN, 1981, p. 204).

Partindo deste ponto de vista “a densidade e a diversidade das redes presentes no espaço geográfico seriam um fator essencial para determinar os limites do território” (MACHADO, 1998, p.46). Assim, “desenho, construção e utilização de uma rede dependem dos meios à disposição (energia e informação), dos códigos técnicos, sociopolíticos e socioeconômicos, assim como dos objetivos dos atores” (RAFFESTIN, 1981, p. 204).

Com a formação das redes decorrentes da implantação de infra-estrutura e da inserção do setor energético, os ajustes criados foram: a criação da Companhia de Eletricidade do Amapá - CEA, cujo objetivo foi garantir as necessidades energéticas da ICOMI para a extração de manganês, através da implantação de termoelétricas, e o primeiro levantamento do potencial energético da Amazônia (Rio Araguari), consequentemente iniciando a construção de uma prótese tecnológica na região (Usina Hidrelétrica do Paredão no Rio Araguari). Com a elevação da demanda e a distribuição de energia elétrica principalmente para o Município de Macapá assim como a instalação de novas usinas termoelétricas no Estado, a fim de atender à diversificação da produção e ao crescimento demográfico.

Segundo Porto (2003. p. 126), o inicio do setor energético no Amapá se encontra na minuta do contrato para a exploração do manganês, que em sua cláusula 43, determinava a ICOMI, aplicar no uso público, para instalações domiciliares, hospitalares, comerciais, industriais ou ilumina,ao de ruas, até trinta por cento (30%) da capacidade das instalações de energia elétrica que porventura viesse a montar para acionar as suas maquinarias de mineração, prevendo a origem e a necessidade de ajustes para o seu funcionamento, pois 70 por cento seria de outras fontes (leia-se Estado).


A influência das redes informacionais no cenário amapaense (diversificação produtiva após 1976)

Com a configuração das redes informacionais no espaço amapaense, ocasionados pela ação dos fixos e fluxos, este espaço passa por uma nova configuração territorial, seja esta ocasionada pelo ganho de próteses tecnológicas ou pelas construções de redes de circulação e comunicação os quais modelam território (RAFFESTIN, 1981, p. 204). Estes são inseparáveis dos modos de produção e que asseguram a mobilidade desses modos de produção, a exemplo das atividades executadas pela empresa ICOMI. Logo, a configuração territorial é o conjunto total, integral de todas as coisas que formam a natureza em seu aspecto superficial e visível; e o espaço é o resultado de um matrimônio ou um encontro, sagrado enquanto dura, entre a configuração territorial, a paisagem e a sociedade (SANTOS, 1997, p. 77).

Devido à nova configuração territorial do espaço amapaense, alavancado pela criação/construção de condições (PORTO, 2007) e pela ação dos ajustes espaciais (COUTO, et. al., 2006), tornava-se necessário ampliar a infra-estrutura do setor energético para haver a possibilidade de desenvolvimento, valorização e produção de novos territórios.

Porto (2002; 2003) esclarece a origem do setor energético amapaense, cujo período econômico amapaense de sua instalação deu-se no que o autor denominou de “gênese, estruturação produtiva e organização espacial (1943-1974)”. Neste período, segundo Porto (2003), houve a origem do investimento no setor elétrico, mediante a ações que pela criação de uma empresa de economia mista (a Companhia de Eletricidade do Amapá – CEA), em 1956 (para gestão da sua demanda, na implantação de termoelétricas visando atender a extração manganesífera), a fim de estimular a criação de um parque industrial, atendendo, ainda, a outros empreendimentos que se fizessem necessários; no primeiro levantamento do potencial hidrelétrico da Amazônia, no Rio Araguari[6]; e iniciando as obras de uma usina hidrelétrica neste Rio.

O início do setor energético amapaense encontra-se na minuta do contrato para a exploração do manganês[7], em sua cláusula 43. Este contrato foi revisto em 1950[8] e este assunto foi retomado na cláusula 38, sem qualquer mudança. Dado o conhecimento da potencialidade das jazidas do manganês e iniciada sua extração, o fornecimento de energia tornou-se fundamental.

Porto (2003, p. 127) também informa que para atender à demanda energética da empresa, em 1958 a ICOMI foi autorizada a instalar uma usina termoelétrica na mina da Serra do Navio e no Porto de Macapá, para uso exclusivo[9], enquanto a UHE do Paredão não era concluída. Com a expansão da demanda elétrica, causada pela produção da ICOMI e pelo aumento populacional da capital, o Governo Federal autorizou a CEA a ampliar suas instalações mediante a montagem de 3 grupos geradores a diesel, pelo Decreto n. 244, de 30/11/1961, a fim de garantir o fornecimento de energia à região, sendo que os mesmos somente foram instalados em 1965.

Este autor (2002) informa também que após 1985, a Centrais Elétricas do Amapá (CEA) mudou a função original de distribuidora para assumir também a capacidade geradora por termoelétricas.

Com a criação da ELETRONORTE (1973), objetivou-se encaminhar, concluir e colocar em operação a Usina Hidrelétrica do Paredão, provocando um cenário propício para o maior fluxo de distribuição e consumo energético, ocasionando a diversificação produtiva. Com isso, a conectividade energética foi estabelecida somente após 1976, com a construção da Usina Hidrelétrica do Paredão (Hoje denominada de Coaracy Nunes). Contudo tal contexto ocorreu somente no centro amapaense. A partir da segunda metade da década de 1990, a Eletronorte começa a ampliar esta conectividade para o norte amapaense, atingindo o Município de Calçoene em 2002. Os três municípios extremos amapaenses (Oiapoque, Laranjal do Jarí e Vitória do Jarí) ainda consomem energia termelétrico à diesel.

Com a diversificação produtiva foi impulsionada pelo aumento do fornecimento energético pela Usina Hidrelétrica do Paredão agora chamada de Coaracy Nunes – UHCN (concluída em 1976), inicia-se a Fase CEA/ELETRONORTE (pós 1976), sendo esta fase responsável pela “real” inserção dos sistemas de engenharia no espaço amapaense, pois este é formado pelo conjunto de fixos, naturais e sociais. Os sistemas de engenharia são entendidos aqui como “um conjunto de instrumentos de trabalho agregados à natureza e de outros instrumentos de trabalho que se localizam sobre estes, uma ordem criada para e pelo trabalho” (SANTOS, 1997, p. 79).

A influência dos sistemas de engenharias pode ser justificada, quando se compara a quantidade de empresas (instaladas nesse período), com a quantidade de localidades atingidas pela rede informacional, passando de um sistema de engenharia isolado (poucos pontos atingidos) para um sistema interdependente, uma interdependência crescente (vários pontos atingidos), pois neste momento ampliam-se o fornecimento de energia (decorrente da inserção de novas empresas) para pontos diferentes (municípios atingidos pelas empresas), que até então, três pontos do espaço amapaense foram beneficiados pela atuação da CEA (Macapá, Santana e Serra do Navio), os quais não eram conectados pelo setor energético, pois o seu fornecimento era feito por motores a diesel.

Já em relação à questão demográfica, Porto (2003, p. 132) afirma que o crescimento demográfico amapaense registrou uma taxa geométrica de 4,4 por cento, para o período de 1970 a 1980, e de 4,7 por cento, entre 1980 e 1990 (bastante acima dos dados referentes ao Brasil, de 2,5% e 1,9% respectivamente). Vale ressaltar que neste período (1976 a 1985), há uma continua expansão de todas as categorias ligadas ao setor energético, exceto a industrial. Este autor também informa (op. cit. p. 131) que o setor industrial registrou declínio acentuado (de 61,2%, para 16,8%) em dez anos (1976-1985), devido ao crescimento do consumo de outras categorias (residencial e do setor público) e à não ampliação do parque industrial no Amapá.

Após a estadualização (1988), o setor energético passou a atender principalmente as categorias “residencial” e “pública” (juntas corresponderam a 69,34% do consumo do Estado, em 2000). Em 2003, os valores registrados pela CEA indicam que 49,04 por cento do consumo energético é residencial; 3,97 por cento, industrial; 20,68 por cento comercial; e 26,30 por cento, público.

No período de 1988 a 2000, Porto (2003, p. 150) informa que o consumo elétrico no Estado triplicou, cuja expansão é explicada pelo crescimento demográfico do Estado; e influência da Área de Livre Comércio de Macapá e Santana (ALCMS). Este crescimento exigiu a busca de alternativas para sanar as necessidades energéticas do Estado, como a aquisição de mais uma turbina instalada na UHCN; propostas de construções de Pequenas Centrais Hidrelétricas, da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio (Rio Jari); e a conexão com a Usina Hidrelétrica de Tucuruí. Com a contínua expansão demográfica, as projeções elaboradas pela ELETRONORTE e o conseqüentemente o aumento do consumo de energia, o Amapá terá que buscar novamente, meios que praticamente dobrem o seu potencial energético para 2010.


Ajustes espaciais e o desenvolvimento amapaense

Após a criação do Território Federal do Amapá três períodos econômicos indicam as ações dos setores privados e públicos na aplicação de investimentos, repercutindo no aumento do movimento migratório, na sua urbanização, na sua reorganização espacial e na sua inserção na economia-mundo. Esses períodos são (PORTO, 2003): gênese, estruturação produtiva e organização espacial (1943-1974); planejamento estatal e diversificação produtiva (1975-1987); estadualização e sustentabilidade econômica (após 1988).

Em todos esses períodos foram criadas condições para a maior e melhor mobilidade do capital no espaço amapaense, seja na instalação de redes que garantisse a fluidez informacional; seja na formação e estruturação das atividades econômicas e a organização espacial amapaense, capitaneadas pelas atividades minerais; seja nas tentativas de organização espacial, que garantissem a atuação e a valorização dos investimentos instalados. Por outro lado, no que se refere à instalação propostas de planejamento ao espaço amapaense percebe-se somente intenções elaboradas pelos dirigentes, pois ainda hoje há vínculos das propostas de investimento e de desenvolvimento às decisões do Governo Central (PORTO, 2006, p. 23).

A partir da constituição de 1988, o Amapá passa a ser Estado da Federação (ganha autonomia em suas esferas), por esse motivo, as análises aqui apresentadas partirão do pressuposto de que um Território Federal é um embrião de Estado, e que o Amapá é um Estado em construção, e que este Estado possui suas pedras angulares amalgamadas a uma rede de próteses tecnológicas e em sistemas de engenharia.

O processo de estadualização fez com que o Amapá buscasse possibilidades de desenvolvimento principalmente econômico. Então em 1991, cria-se a Área de Livre Comércio Macapá e Santana - ALCMS, passando a se destacar as empresas importadoras no cenário amapaense. A ALCMS representou a possibilidade, da “abertura de um leque de oportunidades e perspectivas de negócios para a economia do Estado, tendo em vista as vantagens oferecidas pelos incentivos fiscais federais constantes do Decreto n. 517 de 1992 que regulamentou a ALCMS.” (SILVA; PORTO, 2005, p. 4-5).

Segundo Porto (2003), uma grande conseqüência da ALCMS foi à triplicação do consumo elétrico no Estado (1994 a 2000), este fator é explicado pelo crescimento demográfico, e pelo aumento da venda de eletro-eletrônicos e ar-condicionados[10], que apenas em 1996, multiplicou em 2,5 vezes este consumo. Por outro lado, o setor industrial entrou em um profundo declínio (61,2% em 1976 e 4,2% em 2000). A justificativa para tal fato, está “no encerramento das atividades do Grupo CAEMI, sendo estas as maiores consumidoras de energia elétrica no do Estado (ICOMI, AMCEL e CFA.” (PORTO, 2003, p. 149).

Por outro lado, no período de 1988-2003, aumentou a participação das categorias comercial (8,5% para 20,7%) e outros (de 12,1% para 26,3%) para o mesmo período, comportamento semelhante ao do setor residencial, porém com índices mais elevados (18,2% para 49,04% chegando atingir 51,1%, em 2000). Tal situação é explicada pelo crescimento demográfico estadual, cuja taxa geométrica foi de 4,7 por cento, para o período de 1980 a 1991, e de 5,7 por cento entre 1991 a 2000 (enquanto os índices brasileiros registravam, 1,9 e 1,6 por cento,  respectivamente), e pela criação de 11 municípios (PORTO, 2003, p. 149).

Partindo das considerações feitas acima, as “criações destruidoras” ocasionadas pelos ajustes espaciais, impulsionado pela construção de infra-estrutura e das redes informacionais, que provocaram a fluidez dos sistemas de engenharia, sendo que a fluidez é aqui considerada como a influência das redes nas transformações espaciais. Mesmo com esses fatores o Amapá não conseguiu obter um desenvolvimento, pois o setor residencial é o que mais cresce, provocando uma crise no setor de produção do Estado (seja este energético ou industrial) (COUTO, et. al., 2006).

Esses autores identificam o comportamento de cinco fatores que afetaram os ajustes espaciais amapaenses: a diversificação da economia; a influência do setor governamental; a ação do capital internacional; a questão ambiental; e a configuração espacial do Amapá decorrente da articulação dos fatores acima citados.

Desses, a questão ambiental tem chamado bastante atenção. Até o início da década de 1980, o cenário amapaense era atraente para novos investimentos, no que se refere à disponibilidade territorial, contudo a partir da instituição das questões ambientais, este espaço passou a causar o efeito de restrição em função da instalação de unidades de conservação e reservas indígenas no espaço amapaense. Hoje 58 por cento da área deste Estado é protegido.

Quanto ao contexto rodoviário, duas se destacam: a BR-156 e a AP-210. Ambas são de fundamental importância por se constituírem nos principais elos de interligação da malha rodoviária do Estado. No caso da BR-210, sua importância é estratégica por circundar a maior reserva ambiental de floresta tropical do mundo, o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque. Já BR-156, é a espinha dorsal do Estado, possuindo “cerca de 850 km de extensão (ligando o estado de Norte a Sul), mas grande parte não é pavimentada o que inibe, e muito, o transporte, sobretudo nos meses chuvosos (jan/jun)” (SILVA; RÜCKERT, 2005, p. 16), as duas rodovia juntas totalizam 1.267 km, estas possuem apenas 293 km (23%) pavimentados.

Segundo Silva e Rückert, (2005, p. 16-17), estima-se que com a pavimentação da BR-156 os municípios do Norte do estado serão beneficiados, pois os custos de deslocamento minimizados rebaterão diretamente no preço dos produtos locais, bem como o fluxo intermunicipal de todo o seu território. Esta pavimentação, aliada à construção da ponte binacional entre Oiapoque (Brasil) e Saint George (Guiana Francesa) (Figura 1), surge também o projeto de criação de integração interestadual por uma ponte ligando Laranjal do Jari (AP) a Monte Dourado (Almerim) (PA).

A ponte sobre o Rio Jari fará a ligação do Amapá ao Pará, é de grande interesse regional. Vale mencionar, que a região do extremo sul do Amapá (Mazagão, Laranjal do Jari e Vitória do Jari), é caracterizada como zona tampão, sendo este termo “aplicado às zonas estratégicas onde o Estado Central restringe ou interdita o acesso à faixa de fronteira, criando parques naturais nacionais, áreas protegidas ou áreas de reserva” (BRASIL, 2005, p. 145), ou seja, o governo pode criar uma dicotomia espacial de conflito entra as determinações da lei, e o povoamento local.

Remetendo-se a construção da ponte binacional entre Brasil e Guiana Francesa, destaca-se a relação existente entre Oiapoque e Saint Georges, já que essas, são caracterizadas como cidades-gêmeas[11], daí a particularidade de se constituírem em um alvo prioritário das políticas públicas para a zona de fronteira, enquadrando-se no Programa Faixa de Fronteira (2005), proposto pelo Ministério da Integração, localizadas no Arco Norte, na sub-região Oiapoque-Tumucumaque.


Figura 1. Rodovia Transguianense e projetos de pontes.

Fonte: Adaptado de www.portalterra.com.br (Acessado em: 16/11/2005).

 

A ponte binacional interligará as rodovias BR-156 e RN-2 (Route Nacional), favorecerá a integração dos dois países (fluxo de pessoas e mercadorias), já que haverá a abertura para o Platô das Guianas e Caribe, através da Transguianense (observado na figura 1) (integração de rodovias brasileiras e internacionais). O acordo de construção foi assinado pelos presidentes Lula (Brasil) e Chirac (França) em 14 de julho de 2005, em París na França, em comemoração do “Ano do Brasil na França”.


Considerações Finais

A execução dos ajustes espaciais no Amapá foi decorrente de dois condicionantes que realizaram atos de criação/construção que afetaram a apropriação e a configuração territorial amapaense: a participação do Governo Federal na criação de condições para a mobilidade do capital no espaço amapaense e implantar ajustes para melhor articular as redes criadas/construídas; e a atuação do capital internacional na exploração de comodities, com o estímulo do Estado, no uso do território.

Esses condicionantes integram uma gama de relações complexas que garantem a criação, o planejamento, a organização e a instalação de mecanismos proporcionadores da (des)construção espacial, a fim de atender aos interesses e objetivos externos em contra-posição ao ritmo e vivência locais. A partir de então, verifica-se que uma vez criada, constrói-se; uma vez construída, mantêm-se, atualiza-se, moderniza-se.

Quando se constrói algo, é para atender um determinado objetivo. Para se atingir este objetivo, mudanças são necessárias no contexto original, impondo-se novas realidades. Ao se transportar esta reflexão para sua manifestação espacial, percebe-se que a construção impõe novos ritmos e novos tempos, desconstruindo o então espaço primaz.

Tal situação remete à reflexão de que houve criações de cenários propícios apenas a exploração e não ao desenvolvimento que condenou o Amapá a ser apenas um grande negócio e mantendo seu atraso em relação aos outros estados da federação. Com isso, os ajustes foram executados para melhor atender o capital externo ao criar condições para atrair investimentos externos mediante incentivos fiscais, cessão fundiária, instalação de infra-estrutura, dentre outros.

Neste contexto, a dinâmica do ajuste espacial no Amapá está diretamente ligada aos movimentos de criação destruidora, que tem se manifestado através da atuação das redes e sua influência sobre a expansão e mobilidade informacional no espaço amapaense; à atuação do setor energético nas transformações espaciais do espaço amapaense decorrentes da inserção do capital internacional; e na criação de uma rede de próteses tecnológicas que possibilitou a mobilidade informacional, criando condições para a manifestação do ajuste espacial. Essa situação foi a responsável pela criação de um cenário propício apenas a exploração e não ao desenvolvimento.

Devido à influência de todos os fatores apresentados e a fluidez das redes na produção cada vez mais acelerada das “criações destruidoras” (os interesses do capital), Amapá é tido como um espaço de fundamental importância para o fornecimento de commodities para outras regiões. Neste sentido, o investimento em infra-estrutura visa manter a conectividade com o externo e não para proporcionar o desenvolvimento.


Notas


[1] Professor de Estudos Sociais e Ambientais da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP) e Coordenador do Projeto Interinstitucional “Percepções do Amapá”. E-mail: jadsonporto@unifap.br . Caixa Postal, 282, Macapá (AP) Brasil. CEP: 68906-970.

[2] “A fortificação de fronteira e a fraca ocupação populacional lusa foram os principais fatores que incentivaram a coroa portuguesa (...) a elevar em 1751, à categoria de vila o povoado de São José de Macapá , o núcleo circunjacente àquele forte que garantiria a continuidade da ocupação portuguesa na região (...)” (REIS, 1949, p. 33-4 apud PORTO, 2003, p. 106).

[3] “Sentindo-se ameaçado por inserções estrangeiras (...), a Coroa Ibérica adotou as ‘expedições guarda-costas’, que (...), expulsaram os franceses de São Luiz (1615) e fundaram o Forte do Presépio, originando a cidade de Santa Maria de Belém do Grão Pará (...).” (PORTO, 2003, p. 105).  

[4] Sobre sistemas de engenharias e próteses, vide Santos (1996).

[5] Sobre a atuação do capital internacional no Amapá, vide Porto (2003; 2006); Silva e Porto ( 2065); Porto et. al (2007).

[6] As condições legais para o estudo do aproveitamento da força hidráulica do Rio Araguari, para geração de energia, foram explícitas pelo Decreto n. 35.701, de 23 de junho de 1954, o primeiro diploma jurídico no aspecto regional a abordar a necessidade de conhecimento do potencial energético na Amazônia.

[7] Decreto n. 24.156, de 4 de dezembro de 1947.

[8] Decreto n. 28.162, de 31 de maio de 1950.

[9] Decretos n. 44.997 e n. 44.998, de 3 de dezembro de 1958.

[10] O produto eletro-eletrônico que mais se destacou em vendas nos anos de 1994 e 1998 foi o televisor, decorrente das copas de futebol nos EUA e França, respectivamente; que aliado à cotação do dólar baixo, os preços dos  aparelhos de ar-condicionado também se tornaram acessíveis.

[11] Cidades-gêmeas são “adensamentos populacionais cortados pela linha de fronteira – seja esta seca ou fluvial, articulada ou não por obra de infra-estrutura – apresentam grande potencial de integração econômica e cultural assim como manifestações ‘condensadas’ dos problemas característicos da fronteira, que aí adquirem maior densidade, com efeitos diretos sobre o desenvolvimento regional e a cidadania” (BRASIL, 2005, p.152).


Referências Bibliográficas

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