IX Coloquio Internacional de Geocrítica

LOS PROBLEMAS DEL MUNDO ACTUAL
SOLUCIONES Y ALTERNATIVAS DESDE LA GEOGRAFÍA
Y LAS CIENCIAS SOCIALES

Porto Alegre, 28 de mayo - 1 de junio de 2007
Universidade Federal do Rio Grande do Sul



O Eldorado tardio: ouro verde e mortes

 

Márcia Siqueira de Carvalho

Departamento de Geografia

Universidade Estadual de Londrina

marcar@uel.br




O Eldorado tardio: ouro verde e mortes (Resumo).

 

O artigo trata dos aspectos das doenças e causas de mortes dos participantes da frente de povoamento e da fase de ocupação do Norte do Paraná (início da década de 1930). De sertão à imagem de abundância fortemente relacionada ao imaginário agrário, esta última foi reforçada na propaganda de um projeto de colonização visando reproduzir uma imagem de fertilidade da região. Ambas antecederam a construção de uma terceira imagem da região - a do Eldorado cafeeiro na década de 1950. A análise de documentos históricos e dos livros de inumações de três cemitérios entre os anos de 1932 a 1946 mostraram uma mortalidade infantil elevada, muitas mortes sem causas identificadas e sem atendimento médico, além da precariedade da saúde. A proposta é de apresentar um contraponto entre a construção da imagem de um espaço agrícola a partir da década de 1930, e a questão da insalubridade através das  doenças e mortes dos participantes dessa experiência.

 

Palavras–chave: Norte do Paraná; doenças; mortes.

 



Late Eldorado: green gold and deaths(
Abstract).

 

The article deals with the aspects of the illnesses and causes of deaths of the participants of the settlement front and the early phase of occupation of the North of the Paraná (beginning of the 1930 decade). From hinterland to the image of abundance strong related to the agrarian imaginary, this last one was strengthened by the announcement of a settling project aiming to reproduce an image of fertility of the region. Both had preceded the construction of one third image of the region - of the coffee Eldorado in the decade of 1950. The analysis of historical documents and books of burials of three cemeteries between the years of 1932 the 1946 had shown a high infantile mortality, many deaths without identified causes and medical attendance, beyond the precariousness of the health. The proposal is to present a comparison between the construction of the image of an agricultural space from the decade of 1930, and the question of the insalubrity through the illnesses and deaths of the participants of this experience.

 

Keywords: North of Parana, illness; deaths.

 



Eldorado tardio: oro verde y muertes (
Resumen).

 

El análisis de documentos y de libros históricos de entierros de tres cemeterios entre los años de 1932 y 1946 había demostrado una alta mortalidad infantil, muchas muertes sin causas identificadas y sin atención médicay la precariedad de la salud. Buscamos incorporar la construcción de la imagen de un espacio agrícola a partir de la década de 1930 y las enfermedades y muertes de los participantes de esta experiencia.

 

Palabras clave: Norte del Parana, enfermidades; muertes.



 


Ocupação territorial e doenças: onde o Sertão precede à Terra da Promissão

 

“Sertão”, já se viu, designava não apenas os espaços interiores da Colônia, mas também aqueles espaços desconhecidos, inaccessíveis, isolados, perigosos, dominados pela natureza bruta, e habitados por bárbaros, hereges, infiéis, onde não haviam chegado as benesses da religião, da civilização e da cultura.” (...) No início do século XIX, em Portugal a palavra “sertão” esvaziou-se dos significados que tivera para os portugueses (espaços amplos, desconhecidos, longínquos), tornando-se sinônimo de “interior”. (Janaina Amado. Região, Sertão, Nação. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol.8, n.15, 1995, p. 145-151.)

 

A história da expansão territorial pode ser desenhada a partir de várias combinações. Como uma orquestra que tem vários conjuntos de instrumentos musicais e em cada trecho da sinfonia há destaque e sobreposição sobre os demais, é somente a reunião de todos e no final da execução da sinfonia que podemos analisar e reter este conjunto. Antes do concerto há necessidade dos ensaios e da afinação dos instrumentos. Esta metáfora descreve bem a maneira escolhida de tratar o assunto. Temos análises geográficas sobre a região do Norte do Paraná e os temas: processo de ocupação, agricultura e população na fase pioneira. A análise economicista ou a baseada na psicologia dos imigrantes, desde que não seja tomada como a determinante sobre as demais, é um momento da sinfonia, mas não pode ser considerado como spalla. Uma parte da nossa preocupação – a saúde, a vida e a morte dos imigrantes no norte do Paraná na sua fase inicial de ocupação – foi tocada por Monbeig. Até que ponto um ambiente insalubre afetou a população e que preço ela pagou em vidas foi o nosso ponto de partida.

 

O conceito de salubridade é importante para entendermos as doenças no tempo e no espaço paranaense:

 

“não é a mesma coisa que saúde, e sim o estado das coisas, do meio e seus elementos constitutivos, que permitem a melhor saúde possível. Salubridade é a base material e social capaz de assegurar a melhor saúde possível dos indivíduos. E é correlativamente a ela que aparece a noção de higiene pública, técnica de controle e de modificação dos elementos materiais do meio, que são suscetíveis de favorecer ou, ao contrário, prejudicar a saúde. Salubridade e insalubridade são o estado das coisas e do meio enquanto afetam a saúde; a higiene pública – no século 19, a noção essencial da medicina social francesa é o controle político-científico deste meio”. (FOUCAULT, 1986, p. 214)

 

Julgamos que é necessário, para entendermos as doenças, recuar bastante no tempo desse processo de ocupação da região (“sertão”), que ocorreu em épocas diferentes e de maneira descontínua.

 

Em 1610, sob domínio espanhol, existiam 13 reduções jesuíticas na Província del Guairá, algumas distribuídas pelos vales dos rios Paranapanema, Iguaçu e Tibagi, todas destruídas pelos bandeirantes no final do século XVII. (STIER, 1980, 48-49).  No século XVIII a região norte paranaense então pertencia à província de São Paulo. Dois documentos importantes, a Carta Chorografica dos Dous Sertões do Tibagi e Ivahy datada de 1770 (YAMAKI, 2003, p.6) e Diário de Navegação de Teotônio José Juzarte (JUZARTE, 1999), são subsídios para atestar a parca ocupação, as doenças existentes nos vales e as dificuldades de colonizar o hinterland (“sertão”). O Diário trata da viagem de dois meses, iniciada no ano de 1769 em Porto Feliz (São Paulo) para o presídio Nossa Senhora dos Prazeres situado no rio Iguatemi (Mato Grosso do Sul), e da estadia de dois anos neste posto avançado na disputa de limites entre Portugal e Espanha. O relato descreve a seqüência de febres e sezões durante a viagem feita pelos rios Tietê, Paraná e Iguatemi, ora por água, ora por terra para ultrapassar as cachoeiras.  As doenças começaram a aparecer ainda antes da partida - uma diarréia ("corrução") que atingiu homens, mulheres e crianças (11/4/1769), e acompanharam os monçoeiros nos relatos de Juzarte. Em 15 de abril, no amanhecer após uma noite de tempestade, revelou-se a morte de uma criança, a penúria de alimentos, o cuidados com os doentes e "a gente já a este tempo ia fraca" (JUZARTE, 1999, p. 37).

 

A junção do rio Tietê com o rio Paraná é descrita como um lugar assustador: águas pestilentas, local sujeito aos vários tipos de febres, fértil em insetos, imundícies e bichos, onde as águas represadas congregam a podridão pelo clima doentio (JUZARTE, 1999, p. 60-61). As privações aumentaram pela seqüência de pragas sucessivas: ratos, pulgas, mosquitos, todos eles vetores de transmissão de doenças, além de grilos e gafanhotos. A mortalidade crescente deixou os habitantes mais vulneráveis aos "castelhanos e Gentio Cavaleiro". A expedição de Juzarte à Cuiabá foi acompanhada de ataques de mosquitos e mutucas "que deixavam a gente como se tivesse bexigas, além disso, o grande sol que nos abrasava, nos obrigava a beber água daqueles pântanos a qual era muito amargosa" (JUZARTE, 1999, p. 92). Em outubro de 1769 foram contabilizados trinta e sete mortos e sessenta doentes. As doenças impediam o trabalho na construção do forte e no cultivo das terras, situação que se agravou no ano de 1770. Em abril aconteceu a situação mais crítica, acompanhada da intervenção para tornar as residências menos insalubres, o que não alterou a situação de decadência do local:

 

"se mandaram defumar todas as casas, com breu, e não se ouvia mais que gemidos, gritos, confissões, e absolvições, sem remédio, nem de Botica, nem de subsistência alguma, para os doentes que são todos os moradores desta Praça, soldados pagos, e pedestres (JUZARTE, 1999, p. 100).

 

Índios, castelhanos e o uso de rios como via de ligação com a província de Mato Grosso seriam os motivos de uma nova incursão nas terras do norte paranaense.  No início do século XIX, e mais freqüente após a segunda metade, uma série de aldeamentos indígenas foram fundados no estado do Paraná (Quadro 1). O agrupamento dos indígenas, através da catequese por padres capuchinhos, estava previsto no contexto de tornar os vales dos rios mais seguros para a navegação. O projeto atendia aos interesses do Barão de Antonina em criar uma rota comercial até o Mato Grosso, via norte do Paraná, sendo “o primeiro passo para a liberação dos imensos territórios dos índios Kaingang e Kayová nos vales destes rios” (MOTTA, 2000, p. 4), ou seja, Tibagi, Paranapanema, Paraná, Samambaia e Ivinheima. Além disso, a reunião de indígenas em alguns pontos específicos esvaziou outras áreas por eles freqüentadas, esvaziando-as para que fazendeiros nelas se instalassem.

 

 

Aldeamentos

Localização

Ano

Não Instalado

Santa Teresa

 rio Paranapanema e Paraná

1857

X

N. S. do Loreto

Rio Pirapó e Paranapanema

1855-1862

 

Santo Inácio

Rio Santo Inácio e Paranapanema

1862-1878

 

Santa Isabel

(foz) Rio Tibagi e Paranapanema

1857

X

S. Pedro de Alcântara

Rio Tibagi

1855-1895

 

S. Jerônimo

Campos do cacique kaingang Inhoó

1859-1920

 

Catanduvas

Na picada de Guarapuava a Foz do Iguaçu

1891

 

Chagu

Minkriniarê ou Xongu

1859-1861

 

Guarapuava

Koran-bang-rê

1810

 

Palmas

Kreie-bang-rê

1857

 

S. Thomas de Papanduva

Território Xokleng

1875-1878

 

Quadro 1. Aldeamentos indígenas e localização no Estado do Paraná

Fonte: MOTTA, 2000, p. 42.

 

 

O aldeamento São Pedro de Alcântara[1], vizinho da colônia militar de Jataí (respectivamente situados na margem esquerda e direita no baixo curso do rio Tibagi), começou a tomar corpo a partir do trabalho do frei capuchinho Timóteo de Castelnuovo. Fundado em 1854, reuniu os índios na tentativa de evitar os ataques e possibilitar a manutenção de colonos e soldados na colônia militar. Chuvas, secas e a precária comunicação com o exterior pesavam no desenvolvimento dos núcleos, mas a localização estratégica durante a Guerra do Paraguai demandava a fixação definitiva de agricultores. A  concessão de lotes de 500 braças de terras devolutas (1 braça = 2,20 metros; 500 braças = 24,2 ha) prevista em relatório de 1865 se concretizou em 1866 na distribuição de 36 lotas de uma légua[2] aos colonos e operários em Jatahy (STIER, 1980, p. 66-67). A população na colônia militar oscilou de 108 (1855) a 401 (1895), e em 1893 frei Timóteo contava 1.315 mil índios no aldeamento S. Pedro de Alcântara. O abandono e o isolamento dos núcleos e o declínio das colônias militares após a proclamação da República atingiram o núcleo do Jataí. Nesse período, mão-de-obra escrava havia sido substituída por braços imigrantes e núcleos coloniais haviam se estabelecido no sul do Brasil, coexistindo com “sertões”, expansão da cafeicultura, índios e caboclos e ambientes insalubres.

 

Buscamos informações a este respeito, sob a ótica da necessidade de criar um ambiente adequado ao processo de modernização que consideramos a partir da criação da Lei de Terras e Colonização de 1850. A escolha dessa data é fruto da instauração da terra como mercadoria e do trabalho livre imigrante no Brasil para as lavouras de café. Futuramente, a construção de estradas de ferro, a expansão da cafeicultura, a reurbanização das cidades fariam parte de um conjunto que estava diante de uma população adoecida e com altas taxas de mortalidade.

 

No início do século XX, a expansão territorial em direção às novas frentes necessitava da erradicação de ambientes insalubres, porém as cidades também estavam dominadas por epidemias e endemias. A descoberta da microbiologia e das reais causas de determinadas doenças, somada aos esforços do governo brasileiro no seu controle através da criação dos institutos Butantã e Oswaldo Cruz, trouxe resultados efetivos às condições de saúde das populações urbanas. Em destaque aquelas das cidades portuárias onde o contato e o contágio eram mais freqüentes. Também devemos levar em conta as reformas urbanas realizadas sob a ótica do higienismo, através das quais as cidades tiveram os centros re-urbanizados com a demolição de velhos cortiços e abertura de avenidas. A conjugação do higienismo com o eugenismo, através de Belisário Penna, aponta o seu foco para o sertão e os problemas de saúde. (SILVA. 2004, p. 5) Entre a cidade e o sertão, a área de influência necessária ao fornecimento ou ligação para a modernização econômica:

 

O impacto das endemias na primeira década do século XX se fazia sentir essencialmente nas  cidades. Tanto foi que a malária, doença do sertão e de pequenas cidades, somente foi alvo de ações sistemáticas quando dificultava projetos de grande importância, como a modernização do porto de Santos, a construção de uma estrada de ferro no sertão mineiro e a construção da adutora de água para o Rio de Janeiro, em Cachoeiro do Macacu, na serra fluminense. País com um vasto, desconhecido e inexplorado sertão, o Brasil ainda era uma constelação linear de cidades ao longo da costa (SILVA. 2003).

 

As endemias e epidemias como obstáculo à expansão econômica devem ser associadas à idéia de uma missão colonizadora e civilizatória do braço estrangeiro na agricultura brasileira, inaugurada com a Lei de Terras e Colonização de 1850. Da cidade para o campo, pensou-se que a marcha das epidemias, que obedeciam ao avanço das plantações de café, poderia ser detida, pelo menos em relação à febre amarela. (Ivano, 2002, p. 61 e 62) Pelo retardo na iniciativa de erradicação das endemias, o processo de ocupação de estados da região sul do Brasil dar-se-ia num contexto em que o branqueamento[3] da população brasileira necessitaria do controle das doenças do sertanejo. A relação entre branqueamento e erradicação da insalubridade está presente no relatório da Estatística Demographo-sanitaria da Capital (1910) e do estado (1909)  no qual

 

O Paraná que vê na corrente immigratoria toda a sua esperança no futuro não póde deixar de procurar pela salubridade do solo chamar para si a preferência do estrangeiro. (LOYOLA. 1910, p. 4).


Doenças e mortes no Paraná

 

A saúde dos habitantes paranaenses desde a metade do século XIX eram afetada de sobremaneira pelas condições sócio ambientais. Pelo menos desde 1862 e 1867 foram identificadas incidências de febre intermitente na localidade de S. Pedro de Alcântara, com 12 mortes em cada um daqueles anos (DALLEDONE, 1989, p. 207). Não só nessa região os problemas sanitários eram graves. Surtos de febre amarela atingiram os habitantes de Paranaguá nos anos de 1854, 1857 (361 casos com 37 óbitos), 1870, 1876 (30 casos com 18 óbitos), 1877, 1878 (479 casos com 54 óbitos), 1879; de Antonina em 1870 (61 mortes), 1873, 1874, 1875, 1877, 1878; e de Morretes em 1870 e  1878.  (DALLEDONE, 1989, p. 185)

 

Frei Timóteo de Castelnouvo, em cartas datadas de 8 e 16 de janeiro de 1877 enviadas ao presidente da província do Paraná, descreveu detalhadamente o início de uma epidemia de “bexiga” (varíola) trazida por um indígena que havia se infectado na vila do Tibagy em outubro de 1876. Frente à doença, alguns fugiram do local pelo “Tibagy abaixo ao sertão”, daí o temor do frei:

 

... deve-se ter medo que os índios Caiguas que se espalharão pelo Paraná, e para a Província de S. Paulo levem este orrivel flagello (sic)  e entre seus ermãos do sertão e mesmo entre nosso povo de S. Paulo (...) (MOTTA, 2000, p. 91)

 

Onde não houve o isolamento dos doentes, as mortes foram mais numerosas, a partir de um relatório feito pelo mesmo frei a respeito do não aparecimento dos índios kaingang (coroados) no aldeamento há um ano:  “que é mais provável – que a epidemia do anno pasado havida em todos estes sertões das febres intermitentes e perniciosas tinham quase acabado pela morte seu grande numero”. (MOTTA, 2000, p. 95).

 

Em relatório de 1895, o inspetor geral de higiene atestava a falta de materiais e de funcionários em Curitiba e cidades litorâneas para o controle de doenças como varíola (surto entre os soldados do 39º Batalhão de Infantaria), febre amarela,  sarampão, pneumonias, entre outras. Ele alertava para a perda dos investimentos feitos pelo estado na imigração e colonização  porque a falta de cuidados hygienicos concorre para que a cifra da mortandade, tanto entre os nacionaes como entre os emigrados, seja elevadíssima (REIS, 1895, p. 4). Naquele ano só existiam delegados de higiene nas cidades da Lapa, Ponta Grossa e Antonina. As influências climáticas e sociais contextualizavam as doenças presentes no citado relatório. As chuvas constantes e o calor em Curitiba no mês de janeiro, (a temperatura média ficou entre 26 a 29 graus centígrados e a temperatura mínima não inferior a 25 graus centígrados) propiciaram a redução pela metade da mortandade que costumava acontecer em anos anteriores. Mas elas foram responsabilizadas pelas enterites produzidas nas creanças pela alimentação artificial; alguns casos de febre typhica e de paludismo. O período de sêcca extraordinaria em abril se estendeu até agosto quando secos os poços, fontes e vertentes, resultou na pessima qualidade dágua que bebia a população (o que) determinou gastro enterites, algumas mui graves, dysenterias, as diversas manifestações do paludismo e febres typhicas (REIS, 1895, p. 6 a 8).

 

Dados dos Relatórios da Estatística Demographo-sanitaria do estado do Paraná nos informam que entre 1902 e 1903 ocorreram 99 mortes no município de Jataizinho (nove por tétano, oito por vermes intestinais e em trinta e uma delas a causa não foi definida). Em Tibagy, elas atingiram trinta e oito óbitos dos quais onze não tiveram as causas identificadas. Em 1909, o município de Jacarezinho apresentou 181 óbitos, dos quais 82 não tiveram causas definidas, mas foram identificados a bronquite crônica (10 mortes), o tétano (11 mortes) e o sarampo (10 mortes).  O município de Tibagy no mesmo ano apresentou 25 mortes, das quais 20 não tiveram as causas identificadas.  Na mesma época a malária grassava entre os habitantes Alambari (atual Cambará) levando-os à morte (MOREIRA, 1935), e Loyola destacou a mortalidade infantil no Relatório de 1911:

 

desde que começou o Estado a fazer estatística de óbitos, a mortalidade de crianças de 0 a 5 anos tem conservado uma proporção approximada a 50% do obituario geral. Verdade que as moléstias pulmonares são muito comuns nas crianças em clima como o nosso, porem o numero de suas victimas é muito reduzido em relação ao das diversas enfermidades que tem por sede o apparelho digestivo. As gastrites e enterites diversas são a causa dessa hecatombe infantil.  (LOYOLA. 1910, p. 5)

 

A malária foi uma das doenças citadas nos relatórios elaborados por médicos do Instituto de Manguinhos em 1916-17, numa visita ao estado do Paraná.  Vários surtos foram detectados nos anos de 1911, 1914, 1917 e 1924 no Norte do Paraná. Em outra fonte as epidemias, iniciadas em 1908, foram mais freqüentes: 1912, 1913, 1914, 1915 e 1917, tendo sido esta última a mais grave (ARAÚJO, 1919, p. 250). O impaludismo estava generalizado, endêmico na região e em áreas mais afastadas, no Paraná e fora dele:

 

Geograficamente o impaludismo abrange todo o litoral paranaense, a mesopotâmia do Itararé, Paranapanema e Tibagi, e toda a baixada do rio Paraná (...) Pelas informações que obtivemos parece ter sido o município do Tibagy, na sua zona fronteira e mais próxima do Paranapanema, primeiro foco do impaludismo do interior. (Moreira, 1935, p. 265)

 

Do Jathay para baixo até a fronteira com Mato Grosso e Paraguay o clima é quente. O estado sanitário dessa zona é sempre mais ou menos precário. Em abril de 1917 encontrámos 90% da população do Jathay soffrendo de impaludismo, mal endemo-epidemico neste distrito há mais de 10 anos. (...) Ainda em abril e maio deste ano tratamos lá algumas dezenas de impaludados. (MOREIRA, 1935, p. 102)

 

Duas décadas mais tarde, a malária no interior do Paraná ameaçava não apenas a população, mas a economia e os esforços da definição da estrutura fundiária, descrita no relatório do 10º Comissariado de Terras datado de 1935 em relação à região de Reserva, no Tibagy:

 

É bem de ver que a célula mater (...) naquela região é a cultura de milho e conseqüentemente criação de suínos, ... a falta de suínos para a exportação, devido ao desanimo e conseqüente abandono á criação pela razão dos baixos preços anteriores e o desaparecimento de muitos colonos nacionais victimados pela maleita que ceifou milhares de vidas até a última metade de 1934. (...) A despeito da crise por que tem passado a população impaludada do inter-land, as medições estão sendo feitas, ainda que os interessados não possam satisfazer os compromissos conforme são obrigados.

 

Apesar da doença ser freqüente e anterior, a sua generalização foi atribuída à chegada do ramal da estrada de ferro Sorocabana à cidade de Cerqueira César e às vizinhanças do Salto Grande do Paranapanema, divisa entre os estados de São Paulo e Paraná. Nesta última cidade ela teria sido detectada vinte e cinco anos antes do registro em livro publicado em 1919. A migração da doença teria ocorrido através dos contatos comerciais estabelecidos entre os habitantes de Jatahy e os de Salto Grande, por canoeiros e remeiros de batelões que seguiam na direção dos rios Paraná e Ivinheima, até se internarem nas zonas reconhecidamente palúdicas mattogrossenses (Araújo. 1919, p. 226).Sem tantos detalhes, Araújo confirma a forma espacial da disseminação:

 

pelas informações que obtivemos parece ter sido o município do Tibagy, na sua zona fronteira e mais próxima do Paranapanema, primeiro, primeiro foco do impaludismo do interior. (Araújo, 1919, p. 265).

 

Como o rio Ivinheima era um foco antigo de malária, porque não pensar na hipótese de que ela possa ter vindo de lá, através dos canoeiros? Devemos levar em conta que a malária, até o final do século XIX, estava presente em todo o território nacional, mais freqüentemente nas áreas litorâneas, “poupando apenas alguns segmentos dos estados sulinos” (Camargo, 2003). Em 1946 esse quadro ainda permanecia o mesmo, só ausente em regiões altas, nos extremos meridionais do país. (FERREIRA e LUZ, 2003 p.134)


A construção da Terra da Promissão

 

Os mapas do Paraná nos auxiliam a compreender quais eram as expectativas que as estradas de ferro deveriam cumprir na integração territorial e no crescimento econômico. Num deles, datado de 1912, foram traçadas várias concessões feitas no Paraná das quais se destaca a ligação da cidade de Ponta Grossa ao Paranapanema com ramal nas margens do rio Tibagi e outro nas do rio Laranjinha, cortando na direção norte-sul a parte nordeste do sertão. Outros dois projetos das concessões atravessavam o noroeste paranaense: um deles uniria as cidades de Jacarezinho e Sete Quedas (ramal concedido à Sorocabana pelo Governo Federal) e o outro partiria da cidade de Ponta Grossa até chegar até Guaíra, atravessando o divisor Piquiri-Ivai. (ITCF, 1990. p. 8) Em 1919, os novos trilhos reais se restringiam a um pequeno trecho entre Guaíra e Porto Mendes, contornando o Salto das Sete Quedas, de propriedade do Mate Laranjeira para facilitar a exportação da erva mate de Mato Grosso para o mercado argentino (ITCF, 1990, p. 9). A frente pioneira esteve ligada à expansão da estrada de ferro, visto que a ampliação da Estrada de Ferro Sorocabana e a sua conexão com a Estrada de Ferro São Paulo-Paraná, em Ourinhos, viabilizou a inserção desse sertão à malha ferroviária mais ampla, ao Mato Grosso e Bolívia.  Simultâneo ao discurso de Carlos Chagas (CHAGAS, 19210 e uma década após o relatório da elevada mortalidade infantil em Alambari (atual Cambará), os capitalistas paulistas responsáveis pelas plantações de café em solo paranaense, no Norte Pioneiro, já projetavam um ramal ferroviário unindo Ourinhos (Sorocabana) à ex-colônia militar do Jataí (E. F. São Paulo – Paraná). Em 1924 um trecho de 23 quilômetros havia sido inaugurado. (ITCF, 1990, p. 10). A oeste do rio Tibagi, em mapa de mesma data, nas cabeceiras do ribeirão das Abóboras, região próxima a Jatahy e S. Pedro de Alcântara, localizava-se o povoado de São José, na realidade uma fazenda (ITCF, 1990, p. 12).  A ferrovia teve papel primordial para a ocupação do norte do Paraná. Em 1925 a Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP) comprou terras do Governo do Estado que anteriormente pertenceram à Concessão Ferraz (possuidora de um ramal ferroviário) e em 1928 adquiriu a Cia. Ferroviária São Paulo-Paraná (CFSPPr), cujo acionário majoritário era Barbosa Ferraz. A nacionalização das ferrovias brasileiras em 1939 teve papel fundamental para que a CTNP em 1943 se desfizesse da ferrovia, como de todo o projeto de colonização. (OBERDIEK, 1997, p. 56) Os trilhos e o trem que chegaram em 1932 em Jatahy[4]. No ano de 1935 era inaugurada a ponte sobre o rio Tibagi e as estações de Londrina e Nova Dantzig (Cambé). No ano seguinte o trem chegava até a Rolândia.

 

A imagem de uma Terra da Promissão foi elaborada como base para o progresso individual dos seus futuros agricultores e expressa através da propaganda para a venda das terras pela Companhia de Terras Norte do Paraná: títulos da terra seguros, fertilidade e salubridade, boas estradas de ferro e de rodagem e “água de uma pureza invulgar” (ARIAS. 1998, 28).

 

A fertilidade da terra, elemento constante na descrição das matas virgens, expressão da exuberância da natureza, recua até a carta de Pero Vaz de Caminha, e freqüentemente traz em si uma associação ao Paraíso Terrestre (Eden). Em tempos modernos, a fertilidade é medida pela metáfora do pedaço do paraíso ou como a Terra da Promissão. Os solos de terra roxa estruturada são reais, e a existência de determinadas espécies vegetais comprovariam essa qualidade, como por exemplo, a figueira branca. Ligada à fertilidade estava a abundância de águas pelo grande número de rios que pela definição da estrutura agrária cada propriedade rural receberia esse benefício. Fotos em propaganda retratavam imensos mamoeiros e até uma couve-flor tendo como escala um bebê. Imagens definitivas provavam a qualidade da terra.

 

Vendeu-se junto com as terras a promessa de que nelas estavam “o rumo para o melhor futuro” (Arias. 1998, 31). Desde a compra do lote o agricultor seria dono da riqueza representada pelas espécies herdadas da natureza sob a forma de toras de madeiras (caviúna, pau d’alho, perobas, ipês) e quando vendidas financiariam a implantação das lavouras. Fase encerrada, as terras estariam abertas às lavouras de milho, algodão, feijão e café, embora este último ainda não tivesse recebido a valorização no mercado internacional do pós-guerra. A idéia de prosperidade vinha grafada nas propagandas tendo como principal exemplo a cidade de Londrina.

 

Outra garantia era a legitimidade do título da terra e o parcelamento de seu pagamento. A venda dos lotes passou por diversas fases, ora dando prioridade para estrangeiros, ora voltando-se para pequenos agricultores familiares nacionais, em especial, mineiros e paulistas.

 

A estrada de ferro foi parte imprescindível do projeto de colonização. Foi a facilitadora para a chegada e saída de produtos, tendo sido durante o período inicial o fator de valorização das terras. À medida que os novos lotes (e mais afastados) eram vendidos as terras, rurais e urbanas, se valorizavam ainda mais. As estradas de rodagem e a de ferro ficaram sob a responsabilidade da CTNP, na fase do capital inglês (até 1943). As estradas de rodagem dispostas na parte mais altas (espigões) seguiam um planejamento ligar os agricultores aos distritos, patrimônios e cidades, e garantiriam o escoamento das madeiras e da produção. Entretanto, as chuvas que caíam na Terra da Promissão transformavam-nas em atoleiros imensos, apesar do trabalho de manutenção. O mesmo solo rico transformava-se num lamaçal pegajoso para as rodas dos automóveis e caminhões.

 

A salubridade anunciada não existia, se pudermos traduzir dessa maneira as precárias condições enfrentadas numa região que tinha o seu histórico de doenças e mortes. Na propaganda ou em reportagens estava presente a associação entre clima e ambiente saudável, livre de doenças. Porém, tanto era freqüente a malária que os sítios das cidades ficavam preferencialmente afastados das margens dos rios. A temperatura do ar também foi um elemento elogiado, parte do clima temperado, embora fosse motivo de preocupação para a expansão cafeeira a ocorrência de geadas.

 

A propaganda atendia ao público estrangeiro e nacional. Aos alemães que mais tarde viriam a se instalar na Colônia Roland (Rolândia), se pedia o trabalho necessário e pesado da roça, mas não encontrariam crises econômicas e acontecimentos políticos, e poderiam “viver bem e em paz”. E mais:

 

O terreno seria levemente ondulado, cortado  todavia pelos profundos vales dos ribeirões, de ótima terra roxa, tendo em média 600 metros de altitude, livre de malária (grifo nosso), e estaria tão rendoso que o café, aqui produzisse mais do que poderia dar no estado de São Paulo. (PRÜSER. 1957, p. 124)

 

Aos nacionais, destacava-se o fato de não existirem formigas – “Não há saúvas” – mas era pedido aos novos habitantes o seu trabalho incansável. A leitura mais cuidadosa do texto a seguir leva à idéia da passagem do Caos à Ordem (e ao Progresso), da natureza (rude) à necessidade da rudeza humana para domá-la transformando-a numa Terra da Promissão. O texto traz o título sugestivo – Trinta e uma nacionalidades:

 

Nesta terra em que não ha saúvas, os homens trabalham como ellas, num labor continuo e organizado.

 

Luctando contra as interminas e régias florestas, os agricultores aproveitam a vitalidade de seus musculos para fazer grandes derribadas de agrestes mattas, semeando em seguida o chão fertil, e de tal modo, preparam o futuro para o merecido descanço no inverno da vida.

 

Reza a historia sacra que quando a humanidade em sua maior expressão de ambição e vaidade, tentou alçançar os céos por meio de elevadissima e engenhosa torre, que tomou a denominação de Babel, Deus para castigar essa peccadora humanidade, fez com que os sacrilegos constructores não mais se entendessem, dando um idioma diferente a cada um, impedindo assim, o proseguimento daquela obra. Entretanto, no bemdito sólo londrinense, nas roxas terras destas paragens, homens de 31 nacionalidades diversas, confraternisados, se comprehendem perfeitamente na collaboração do rude trabalho agricola, cooperando dessa forma para o engrandecimento da terra de promissão que é esta região paranaense, cujo continuo e formidavel desenvolvimento, não é de modo algum tolhido pelo Todo-Poderoso; ao contrario, recebe as bençãos do Senhor que nos fez a dadiva desta terra fecunda, e que reuniu neste canto da patria brasileira, homens de boa vontade, de todas as raças, de todos os credos, e cuja unica ambição é a de progredir pela labuta honesta e aqui se fixar com a nobre finalidade (GOMES. 1938,  p. 76)


Mortes na Terra da Promissão

 

Trataremos da comparação da causa de mortes a partir de fontes de quatro cemitérios localizados no patrimônio londrinense do Heimtal (1931-37), na cidade sede de Londrina (1932-43), em Cambé (1936-47) e em Rolândia (1932-43). A principal dificuldade foi agrupar causas de mortes muitas vezes de difícil classificação. Uma solução possível foi a verificação da idade e a comparação com a causa da morte. Entretanto surgiram novas dúvidas. Como classificar a morte de um recém-nascido cujo óbito foi dado como morte natural? Nesse caso preferimos classificá-lo como natimorto.

 

Outro recurso foi a verificação do mês do óbito. Constatou-se que as mortes aumentavam sensivelmente no período compreendido entre novembro a fevereiro, geralmente envolvendo aquelas causadas por infecções causadas através das águas em contato interno ou externo ao corpo. Dessa maneira foram agrupadas as diarréias, intoxicações alimentares, toxicoses alimentares e desinterias. Outras correlações foram feitas a partir de entrevista com médicos tradicionais da cidade, como  peritonite e malária, agrupando-as quando possível.

 

A especificidade de alguns dados diz respeito à Cambé. São relativos somente às mortes de crianças com menos de 5 anos de idade, mas que tiveram uma representação expressiva sobre o total de mortes no período. Sobre as mortes ocorridas no Heimtal 67,5% delas foram de crianças com menos de 5 anos. Para Londrina, os mortos acima acima de 10 anos somados aos raros de idade ignorada representaram 32,8% entre 1932 e 1943.

 

Heimtal, ou “o Vale da Vida”, agrupava perto de 120 famílias de alemães e foram de grande imprtância para o abastecimento de alimentos à cidade de Londrina. Os dados colhidos apontam para muitas mortes sem assistência médica, 61,9% dentro da totalidade de 194 óbitos ocorridos no período. Desse total, 67,5% eram de crianças com menos de 5 anos de idade.

 

Em Londrina a análise foi realizada a partir de determinadas causas específicas em função do universo ser maior: 3 mil mortes entre 1933 a maio de 1943. Destas, 2.100 foram de crianças até 10 anos de idade (70%). A mortalidade infantil sempre foi bastante elevada, sendo que em 1935 a mortalidade de crianças com menos de 5 anos atingiu 67,5% do total. À medida em que os anos passaram ocorreu uma inversão no número de causas de mortes não identificadas: antes predominantes, depois em queda. Também foi observado que não houve uma relação constante entre o entre o ritmo de crescimento da população e o do número de mortes por ano. Este último superou o do crescimento populacional nos anos de 1935, 1936 e 1938 (Quadro 2). A ausência de assistência médica  para identificação da causa da morte sempre superou os casos identificados em todos os anos, apesar do pequeno hospital da CTNP e de médicos particulares na cidade.

 

O agrupamento das principais causas de morte em Londrina reduzindo o universo para uma amostra de quase 50% do total (de 3.000 para 1.464) revelou o quadro do predomínio de doenças como disenterias e diarréias, pneumonias e bronco pneumonias, toxicoses e intoxicações alimentares, colapsos cardíacos, malárias, tuberculoses, entre outras. Uma situação parecida com as mortes em Cambé, onde 26,6% delas foram causadas por doenças infecto parasitárias e em 26,7% não houve assistência médica. Em Rolândia as causas das mortes alteram o perfil, as gastroenterites tiveram a mesma participação dos problemas cardíacos e ambos encabeçam a lista com 17,8% e 17,7% respectivamente, seguidos pelos natimortos e pneumonias (Ver Quadro 3). A exceção em Rolândia é o pequeno  número de óbitos sem assistência médica.

 

 

Londrina 1933-1942

 

Mortes número

 

População Total número

Mortes aumento

índice

 

Pop Total aumento

índice

1933

44

...

100

...

1934

58

7500

132

100

1935

107

15000

243

200

1936

231

20527

525

274

1937

150

29090

341

388

1938

249

32000

566

427

1939

345

60775

784

810

1940

311

75296

707

1004

1941

347

95000

789

1267

1942

262

100000

595

1333

Quadro 2: Ritmo de crescimento do número de mortes e de população em Londrina (1933 - 1942).
Org. Márcia Siqueira de Carvalho.

 

 

Heimtal 1931/1937

Rolândia 1936/1948

Cambé 1936/1947(mortes infantis)

 

Londrina 1932/43

causas mortis

número

%

número

%

número

%

número

%

aparelho respiratório

 

 

 

 

97

6,6

 

 

anemia

 

 

19

1,1

 

 

21

1,4

caquexia

 

 

 

 

 

 

28

1,9

câncer

 

 

30

1,7

 

 

 

 

causas externas*

 

 

91

5,2

19

1,3

19

1,3

coqueluche

3

1,5

0

0,0

 

 

27

1,8

debilidade congênita

 

 

170

9,7

 

 

34

2,3

derrame cerebral

2

1,0

 

 

 

 

 

 

epilepsia

2

1,0

 

 

 

 

 

 

febre amarela

 

 

1

0,1

 

 

 

 

gastrenterites/disenterias/toxicose

34

17,5

311

17,8

 

 

313

21,4

impaludismo/malária

1

0,5

6

0,3

 

 

36

2,5

infecto parasitárias

 

 

 

 

449

30,3

 

 

insuf.cardíaca/cardíaco

7

3,6

310

17,7

43

2,9

124

8,5

meningite

 

 

 

 

 

 

24

1,6

natimorto

 

 

285

16,3

329

22,2

 

 

natural

5

2,6

 

 

 

 

 

 

perinatal

 

 

 

 

83

5,6

 

 

outras **

0

0,0

34

1,9

52

3,5

21

1,4

pneumonia

14

7,2

253

14,5

 

 

157

10,7

sem assist. médica/sem info

120

61,9

123

7,0

408

27,6

571

39,0

tétano/gangrena

2

1,0

2

0,1

 

 

13

0,9

tifo/peritonite

 

 

114

6,5

 

 

42

2,9

tuberculose

4

2,1

 

 

 

 

34

2,3

TOTAL

194

100,0

1749

100,0

1480

100,0

1464

100,0

Quadro 3. Principais  causas de mortes em Londrina, Heimtal, Rolândia e Cambé.

Fonte: Almeida, 1997; Andrade, 1998; Livros de Inumações dos Cemitérios de Rolândia e de Londrina.


 

Conclusão

 

A região que seria conhecida na década de 1950 como o Eldorado, cuja riqueza era formado pelos cafezais (ouro verde), tem uma parte de sua história literalmente enterrada. A propalada Terra da Promissão que atraiu imigrantes nacionais e estrangeiros não foi na história o local da terra sem males, aquela buscada guaranis. Desde as primeiras tentativas de estabelecimento as doenças e mortes atingiram os seu habitantes ou quem passava por seus caminhos. Nem mesmo a substituição das trilhas pelos trilhos transformou imediatamente as condições de salubridade. A partir da década de 1930 esse amplo espaço era uma fronteira a ser ocupada baseada na propriedade privada e na pequena produção mercantil, e parte dele a partir de empresas de colonização. Ao lado da fertilidade do solo e da ausência de pragas agrícolas, muitas cruzes foram plantadas por agricultores que cultivavam lavouras temporárias e de subsistência aguardando o crescimento de cafezais. Pelos dados levantados e analisados, a Terra da Promissão não foi o berço adequado às primeiras gerações aqui nascidas. Basta verificar a elevada mortalidade infantil de causas geralmente desconhecidas ou por doenças causadas por contaminação hídrica, resultado da precariedade da infra-estrutura – água tratada e esgotos- e das condições sociais e culturais. 



Notas


[1] De acordo com Deffontaines (2004. p. 122) em relação às origens das cidades, Jatahy é um caso clássico de aglomeração de origem militar em função da zona de influência espanhola. A Colônia São Pedro foi um caso de aldeamento sob a responsabilidade de religiosos. Foram estabelecidas a Colônia Militar do Jataí, em 1855, e os aldeamentos indígenas de São Pedro de Alcântara (1855) e São Jerônimo da Serra (1859). Nos anos de 1844 a 1860, destacam-se as explorações dos rios paranaenses e sertões adjacentes, realizadas pelo sertanista Joaquim Francisco Lopes. (Cardoso, 1986. p. 56).

[2] 1 légua de sesmarias corresponde a 3.000 braças, ou seja, 6.600 metros. Encontramos ainda para a medida de uma légua o equivalente a 4.356 hectares.

[3] Na fase inglesa  da CTNP - até 1942 - a venda de terras para estrangeiros alcançou 47% do total. Após esta data (1943-1974) a participação de compradores estrangeiros foi reduzida para 12%. (Obderdiek, 1997, p. 70).

[4] As estações de Cambará, Leoflora, Ingá (atual Andirá), Bandeirantes, Cornélio Procópio, os pontos de apoio de água e lenha Pirianito (Uraí), Frei Timóteo, até chegar a Jataí.

 

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