Biblio 3W
REVISTA BIBLIOGRÁFICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona 
ISSN: 1138-9796. Depósito Legal: B. 21.742-98 
Vol. XV, nº 890, 30 de septiembre de 2010

[Serie  documental de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana]

 

IntegraÇÃO EconOmicA-Cultural como SubsÍdio para o Planejamento TurÍstico da Área de Fronteira SÃo Borja-BRASIL / Santo TomÉ-ARGENTINA

 

Muriel Pinto
Geógrafo, Mestrando do Programa em Desenvolvimento Regional/ Bolsista CAPES, Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), Brasil
murielpinto@yahoo.com.br

Recibido: 24 de marzo de 2010. Aceptado: 20 de mayo de 2010.


Integração economica-cultural como subsídio para o planejamento turístico da área de fronteira São Borja –Brasil/ Santo Tomé-Argentina (Resumo)

A conceituação das fronteiras territoriais vem obtendo nas últimas duas décadas uma visão voltada para mobilidade de pessoas e produtos, tornando-se integradora, aberta, não sendo apenas militarizada, processo este que está gerando mudanças nas relações territoriais, sociais, econômicas, culturais, turísticas e de planejamento internacional. A fronteira em estudo São Borja-Brasil/ Santo Tomé-Argentina possui uma importância histórica na América do Sul, relacionada às (Missões Jesuíticas Guarani, Guerra do Paraguai e história política), fatores esses que materializaram uma grande quantidade de bens culturais locais. Sua localização geográfica propicia um destaque geopolítico na América Latina, pois é um corredor de comércio exterior e de fluxo de pessoas entre Brasil-Argentina-Paraguai-Chile. O devido estudo voltou-se para analisar os potenciais fronteiriços (fluxo de comércio exterior, relações comerciais urbanas, recursos culturais, proximidade de mercados emissores de turistas e políticas públicas governamentais disponíveis) como arranjos produtivos para o planejamento turístico integrado na devida fronteira.

Palavras - chaves: territórios pós-modernos, integração fronteiriça, fronteira Brasil-Argentina, identidade, turismo cultural


Economic and cultural integration to aid in trip planning turístic area boundary Sao Borja-Brazil / Santo Tomé-Argentina (Abstract)

The concept of borders has achieved over the last two decades a vision for mobility of people and goods, making it inclusive, open, not only being militarized, a process that is generating changes in the territorial relations, social, economic, cultural, tourist and international planning. The boundary study in Sao Borja-Brazil / Santo Tomé-Argentina has a historical importance in South America, related to the (Jesuit Missions Guarani, Paraguayan War and political history), factors which materialized a lot of cultural sites. Its geographical location provides a geopolitical prominence in Latin America, it is a corridor of trade and flow of people between Brazil-Paraguay-Argentina-Chile. The proper study turned to look at potential cross-border (stream of foreign commerce, trade urban, Historic-Cultural valuable, proximity of source markets and government policies are available) and production arrangements for the trip planning integrated border due.

Key words: postmodern territories, border integration, border Brazil-Argentina, identity, cultural tourism


Integración económica-cultural como contribución la planificación de turismo en zona de frontera Sao Borja-Brasil / Santo Tomé-Argentina (Resumen)

La conceptualización de las fronteras territoriales ha alcanzado en las últimas dos décadas una visión para mobilidade de personas y productos, haciéndose integradora, abierta, no ya sólo militarizada, proceso éste que está generando cambios en las relaciones territoriales, sociales, económicas, culturales, turísticas y de planificación internacional. La frontera en estudio São Borja-Brasil / Santo Tomé -Argentina tiene una importancia histórica en América del Sur, en relación con , factoresque se materializaron en una gran cantidad de sitios culturales(Misiones Jesuíticas Guaraníes, la Guerra del Paraguay y la historia política). Su situación geográfica ofrece una importancia geopolítica en América Latina, dado que se trata de un corredor de comercio y flujo de personas entre Brasil-Paraguay-Argentina-Chile. En el siguiente estudio se volverán a analizar los potenciales fronterizos (flujo de comercio exterior, relacionaes comerciales urbanas, recursos cuturales, la proximidad de los mercados emisores de turistas y las políticas gubernamentales disponibles), así como los arreglos productivos para el planeamiento turístico integrado en la frontera mencionada.

Palabras claves: territorios post-modernos, integración fronteriza, frontera entre Brasil y Argentina, identidad, turismo cultural


O estudo possui como área de análise a faixa de fronteira São Borja, Rio Grande do Sul, Brasil / Santo Tomé, Corrientes, Argentina, estas cidades-gêmeas estão regionalizadas respectivamente na Mesorregião Sudoeste do Rio Grande do Sul – Brasil e na Sub-Meseta de Misiones na Província de Corrientes – Argentina, estando às mesmas na área de abrangência da região Histórica das Missões Jesuíticas Guarani.

 

Figura 1. Localização da fronteira São Borja-Brasil/ Santo Tomé-Argentina
Fonte: Atlas do Mercosur (2000), adaptado pelo autor.

 

À formação dos aglomerados urbanos nas áreas fronteiriças do sul da América Latina possuem relação com disputas territoriais, relações comerciais, culturais, entre outros. A faixa de fronteira em estudo possui uma conjuntura marcada por repetidas lutas, com participações na Guerra Guaranítica e Guerra do Paraguai, sua situação geográfica na divisa do Rio Uruguai, sempre foi de grande interesse geopolítico, pois está no epicentro do Conesul, estando distante dos principais pólos demográficos e econômicos regionais Porto Alegre e Corrientes respectivamente.   

[...] Situada na tríplice fronteira Brasil-Uruguai-Argentina, a atual microrregião da Campanha surgiu como a herdeira americana de confrontos peninsulares históricos entre as coroas ibéricas, especialmente no período que se estendeu do final do século XVII ao início do século XIX. Ela corresponde à faixa de fronteira cuja progressiva dilatação, fruto de diversos tratados diplomáticos, culminou com a criação do estado-nação do Uruguai (1826), configurando em buffer zone entre o Império do Brasil e as Províncias Unidas do Rio do Prata, mais tarde Argentina. Por essa razão, ainda hoje, a metade sudoeste do estado do Rio Grande do Sul é conhecida pela denominação de Fronteira (Silveira:17).

Reconhecendo á importância em termos históricos, culturais e políticos do devido local, em 10 de Outubro de 1992 o então Governador do Estado do Rio Grande do Sul-Brasil, Alceu Collares, intitulou São Borja como cidade Histórica da devida Unidade Federada do Brasil. Dentro de todos esses requisitos Histórico-Culturais reconhecidos pela administração pública, se pode citar importantes acontecimentos históricos que perpassaram no local como: Período Reducional (Redução Jesuítica Guarani de São Francisco de Borja -1682)[1], notabilizou-se como ponto estratégico na Guerra do Paraguai[2]dentro do território brasileiro e ganhou dimensão nacional principalmente por ter sido o berço do trabalhismo e por cidade natal dos ex-presidentes da República Federativa do Brasil (Getúlio Vargas e João Goulart)[3], além de manter lanços culturais ligados as tradições gaúchas[4]. Já Santo Tomé é conhecida como capital do folclore correntino, além de possuir manifestações culturais ligadas as Reduções Jesuíticas Guarani.

As fronteiras territoriais nas épocas de hoje, estão relacionadas a um conceito de integração, mobilidade e abertura para as relações comerciais, culturais, sociais e econômicas. Com o advento da globalização a sociedade passou a homogeneizar suas relações, contrapondo os conceitos mais antigos de fronteiras, que simbolizavam á separação, proteção, quase sempre voltado para ações militares. Esse processo crescente de inter-relações nas fronteiras globais surgido no inicio da década de 90, gerou conseqüências na devida faixa fronteiriça, a partir da construção da ponte da integração e do Centro unificado de fronteira (aduanas integradas) em 1997, a fronteira São Borja-Santo Tomé consolidou-se como um corredor de exportação e de passagem de fluxo turístico.

Procurando contribuir com o planejamento regional da respectiva área fronteiriça, o artigo objetiva-se em analisar a recente integração das relações econômicas e culturais locais como fatores estratégicos para o planejamento turístico regional.


Pós-modernidade,  territórios e Integração Fronteiriça

Esse século XXI vem nos trazendo algumas interrogativas em relação ao sistema social e econômico atual, tanto a crise econômica surgida no final de 2008 como a crise de identidade, crise ambiental são exemplos práticos de que novas reflexões devem ser feitas sobre esse sistema produtivo e seus reflexos nessa sociedade confusa.

Esse mundo da técnica, da ciência e da informação que as áreas urbanas vêm presenciando hoje, surge num período de mudança de paradigma na relação sistema produtivo e tecnologia. A produção industrial tradicionalmente detentora das tecnologias mais inovadoras, acaba perdendo espaço para produção da informática e robótica. Beck (1997) argumenta que “modernização reflexiva” significa a possibilidade de uma (auto) destruição criativa da sociedade industrial, surgindo um período pós-industrial da modernização ocidental, podendo ser definida como sociedade de risco.

Beck (1997:12) traz algumas considerações, referente à nova estrutura pós-moderna descrevendo que “este novo estágio, em que o progresso pode se transformar em auto-destruição, em que um tipo de modernização destrói outro e o modifica, é o que eu chamo de modernização reflexiva”.Esse sistema social e econômico que vivemos hoje, conhecido como globalização vem acentuando o dinamismo entre  relações sociais, econômicas e ambientais no globo, fatores que vem gerando conseqüências na sustentabilidade global, relações sociais, no progresso técnico e econômico nesse inicio do século XXI.

Para Hall (2003:67), “a Globalização integra e conecta comunidades e organizações em novas combinações de espaço-tempo”. O autor comenta ainda que as conseqüências da globalização no contexto das identidades culturais são visíveis (desintegração das identidades com crescimento da homegeneização cultural, as identidades nacionais e locais estão sendo reforçadas pela resistência ao sistema, possibilitando o surgimento de novas identidades híbridas).

A chamada compreensão do espaço-tempo se enquadra como sendo um impacto marcante da globalização sobre a identidade. Essa aceleração das ações globais, faz sentir que as distâncias territoriais sejam menores, influenciando nos sistemas de representação da identidade, pois todo meio de representação (escrita, pintura, fotografia, entre outros) deve traduzir seu objeto em dimensões espaciais (localização geográfica) e temporais (tempo histórico) (Hall, 2003).

Todas essas conseqüências sociais, econômicos e ambientais da chamada pós-modernidade são visíveis nas formações territoriais globais.

Para Haesbaert (2008), o território tem a ver com poder, mas não apenas o tradicional “poder político”, mas sim ao poder no sentido mais concreto (dominação político-econômico), quanto ao poder no sentido mais simbólico (funcional a apropriação mais subjetiva e/ ou cultural simbólica).

O espaço social aparece de maneira difusa por a sociedade e pode, assim, ser trabalhado de forma genérica, o território e os processos de desterritotialização devem ser distinguidos através dos sujeitos que efetivamente exercem poder, que de fato controlam esse(s) espaço(s) e, conseqüentemente, os processos sociais que o(s) compõe(m) (Haesbaert, 2008). O autor nos mostra que as relações sociais dentro de um determinado território podem ser definidas como relações de poder, podendo ser compreendido por ações de “anti-poder” até por atos que identifiquem um poder simbólico, sendo que nesse processo de relação de poder, o território e territorialização devem ser trabalhados na multiplicidade de poderes analisando também a multiplicidade de agentes e sujeitos envolvidos.

O processo relacional nos territórios como vimos é marcado por relações de poder, a principal forma de relação entre o homem e a natureza, ou melhor, entre o homem e o meio, é dada pela técnica. As técnicas são um conjunto de meios instrumentais e sociais com os quais o homem realiza sua vida, produz e, ao mesmo tempo, cria espaço (Santos, 2002). Conforme Santos (2002), uma questão necessária para ser verificada é o papel do fenômeno técnico na produção e nas transformações do espaço geográfico, pois através dos objetos a técnica torna-se história no momento da sua criação, entremeando-se nas condições (econômicas, socioculturais, políticas, geográficas) locais, onde o espaço deve ser visualizado como um híbrido de formas-conteúdos (meio técnico e meio geográfico, produzem o meio geográfico).

A partir do inicio da década de 90 com o avanço da economia de mercado as regiões e localidades se colocam no epicentro dos acelerados processos da globalização gerando competitividade entre as mesmas.  A partir desse período começa a surgir um novo regionalismo em diversas regiões do globo, gerando um espaço hegemônico, dependente das agendas neoliberais.

Fernández e Dellabrida, argumentam sobre a inserção de regiões periféricas no processo da globalização: El dinamismo de las regiones/ localidades em el contexto del processo globalizador y su inserción em dicho processo quedan superditados a la adecuada articulación de dichos elementos, fundantes de los processos de associativid, con los processos de aprendizaje, conocimiento-formales y tácticos – e innovación (2008:495).

Essa visão de um novo regionalismo global, acabou gerando a necessidade dos territórios desenvolverem um sistema de relações voltados cooperação/ interação inter-empresarial e inter-institucional (torna-se uma interatividade viável para inserção da aglomerações produtivas regionais/ locais nas redes globais). Dentro desse processo associativo entre os territórios que descrevem os autores, é de fundamental importância que os territórios periféricos procurem reduzir os desequilíbrios territoriais, combinando a competitividade com o desenvolvimento social e regional.

Para Amin (2008:333), a não abertura do local para o global pode ser descrito como:

Lo local sigue siendo percibido com el espacio de lo intimo, lo familiar, lo cercano, lo encarcanado; es decir, como um espacio esencialmente separado y distinto del espacio global (que se concibe como lo hegemônico). La imagem resultante es aquella de um mundo de configuraciones territoriales que hacen lugar a la fureza, de ataque y defensa territorial, de diferencias de escala, de espacios contenedores.

As fronteiras territoriais hoje são marcadas por configurações espaciais heterogêneas, composta por uma mobilidade perceptiva de “entra e sai”, impactantes pelo alcance, influencia e duração dos movimentos populacionais, não sendo mais descritas necessariamente como territoriais ou escalares. Silveira (2004, p.17), “define as áreas de fronteiras como membranas através das quais as pessoas, bens e informações podem circular e podendo ser aceitas ou não pelo estado”.

 Conforme Amin (2008) está surgindo um conjunto de ações que estão transformando as cidades e regiões em espaços interligados em redes globais conectados por influencias distantes, gerando fluxos transnacionais de idéias, informação, conhecimento, dinheiro, pessoas e influencias culturais.


Identidade e Turismo Cultural

A identidade linha central do artigo, pode ser conceituada como a fonte de significado e experiência de um povo, sendo que à relação de seus atores sociais no processo de construção do significado, possui base em um conjunto de atributos culturais inter-relacionados a partir de uma identidade primária, podendo ser formada e originada através de identidades legitimadoras (origina a sociedade civil), de resistência (origina a formação de comunidades) e de projeto (produz sujeitos contra a comunidade e mercado) (Castells, 2000).

Segundo Silva (2000), a identidade pode ser descrita por uma relacão marcada pela diferença e por símbolos (em geral materiais) sendo que seu processo de construção é tanto simbólico como social, salientando que nos períodos atuais a globalização alterou mudanças nos padrões de produção e consumo, que por sua vez vem produzindo identidades novas e globalizadas, que pendem para visões de resistência (fortalecimento das identidades nacionais e locais) ou de homogeneidade (enfraquecimento do comunitarismo e localismo). Com essa visão conceitual o autor acaba trazendo para a discussão a questão de que uma identidade é construída por uma diferença simbólica relativa a outras identidades, que nas épocas de hoje volta-se para estudos e conceitos com uma definição essencialista, ou seja, defende um conjunto de características que não se altera ao longo do tempo (história construída como verdade imutável, fixa), proliferando estereotipias e alteridades nas narrativas culturais.

As diferenças culturais e as estratégias discursivas na construção da identidade estão cada vez mais se utilizando de termos essencializados, de traços fixos e estáticos, uma questão crucial nas políticas culturais e educativas parece ser, atualmente, interrogarmos acerca das representações acerca da alteridade que nos convertem em aliados de certos discursos e práticas culturais binárias, que procuram construir a identidade através da diferença do outro (Duschatzky e Sklyar, 2001).  Os autores tentam repassar uma visão contextual de como está se construindo as identidades através da alteridade de discursos carregados de conceitos materializados, carregados de estereótipos, pois as diferenças culturais costumam ser explicadas em conceitos palpáveis, estratégia essa a qual a alteridade é utilizada para definir melhor o próprio território proibindo formas híbridas de identidade, desautorizando a troca, negando a usurpação do lugar que corresponde à normalidade, materialização essa que vem gerando um processo de aculturação e auto-reprodução de produtos culturais.

Hall (2003), da alguns passos no processo de construção da identidade salientando que o “sujeito previamente vivido como tendo uma identidade unificada e estável, está se tornando fragmentado; composto não de única, mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias e mal resolvidas”. Esse surgimento de novas identidades descritas por Hall são preocupações de Silva (2000), que relata a necessidade de examinar a forma como as identidades são formadas e os processos que estão aí envolvidos. Implica também perguntar em que medida as identidades são fixas ou, de forma alternativa, fluídas ou cambiantes.

A definição da identidade brasileira vem sendo um tema discutido em grande escala nos últimos anos em virtude da melhor visualização de do nosso país no cenário internacional e pelo aumento das políticas culturais nacionais. A afirmação de identidades regionais no Brasil pode ser encarada como uma reação a homogeinização cultural e como uma forma de salientar diferenças culturais (Oliven, 1992). Essa visão defendida por Oliven nos permite fazer uma interpretação de que no Brasil à identidade nacional passa pela diversidade cultural, não-essencializada que respeita as diferenças regionais/ estaduais, relação essa que permeou por muito tempo o debate sobre o nacional e regional no território brasileiro.

Como foi exposto acima a identidade pode ser conceituada como a fonte de significado e experiência de um povo, marcada pela diferença e por símbolos em geral materializados. Essa materialização da identidade acaba gerando os produtos do sentir, do pensar e do agir dos humanos, ou seja, potencializa bens do Patrimônio Histórico-Cultural (esculturas, pinturas, textos escritos, peças de etnológicos, arquivos e coleções bibliográficas e os produtos mais tradicionais como os monumentos), entrelaçados com a expressão do modo de pensar, sentir, agir e reagir de um indivíduo de uma comunidade ou de uma nação, ou seja, manifesta-se em uma relação social através de culto, culinária, indumentária, arte, artesanato e arquitetura.

O patrimônio Histórico-Cultural é a principal potencial turístico do Turismo Cultural, que segundo Oosterbeeck (2007: 183), “é um espaço de culto da diversidade e da memória e do tempo”. O turismo cultural destaca-se pela mobilidade (circuitos entre locais ou visita a partir de um local central), seu objetivo central busca a identidade do território visitado (arte, história, patrimônio, personagens históricas e míticas, costumes, ciências, tecnologia, língua e religião) (Oosterbeeck, 2007).

Embora grande parte da vitalidade do turismo proceda do Patrimônio cultural, deve-se evitar que este seja considerado unicamente como uma mercadoria a serviço do turismo. Deve-se haver um meio termo que satisfaça as demandas dos grupos implicados (pesquisadores e conservadores, governos, empresários, prestadores de serviços turísticos e população local), sendo que o investimento na informação para que o turista obtenha maior interesse na cultura da região que visita, é algo imprescindível nas épocas de hoje (Arizpe, Nalda, 2003). Conforme os autores, em qualquer projeto de turismo cultural é indispensável que desde o planejamento se incorpore, como participantes na conservação ou como agentes econômicos, a população local (sua resposta ao processo de conservação dependerá de sua relação simbólica com o patrimônio e das possíveis expectativas que essa valorização possa gerar, e também pelas possibilidades que se abram para as mesmas na tomada de decisões e participação ativa na elaboração de projetos no processo de desenvolvimento regional).

Esse século XXI é caracterizado pela afirmação da transnacionalização da economia global, que certa forma pode ser descrito também pela formação de uma cultura transnacional, onde o turismo é considerado como um dos elementos prepulsores (Rodrigues, 2001). Para Rodrigues (2001), vem havendo desde o inicio desse novo século um interesse característico pelo diferente, por lugares inusitados, tendo na cultura um conjunto de processos simbólicos dos quais se aprende, se reproduz e se transforma uma estrutura social, partindo das palavras de Oosterbeck (2007, 183) “os tempos são outros, e as frustrações do século que se acaba abrem caminho a um retomar do turismo cultural, não como turismo de massas, mas como um destino alternativo população”.

Segundo o Ministério do Turismo do Brasil (Mtur)[5] “o turismo cultural compreende as atividades turísticas relacionadas á vivência do conjunto de elementos significativos do Patrimônio histórico e cultural e dos eventos culturais, valorizando e promovendo os bens materiais e imateriais da cultura”. O Mtur ainda define como os principais atrativos dessa tipologia turística os sítios históricos (centros históricos, quilombos), edificações especiais (arquitetura e ruínas), obras de arte, espaços e instituições culturais (museus, casas de cultura), festas e festivais populares, gastronomia típica, artesanato e produtos típicos, música, dança, teatro e cinema, feiras e mercados tradicionais, saberes e fazeres (causos e trabalhos manuais), realizações artísticas (exposições, ateliês), eventos programados (feiras e outras realizações artísticas, ou culturais e gastronômicas).


A Ponte da Integração São Borja – BR/ Santo Tomé – AR: uma ligação estratégica para o planejamento fronteiriço

A Ponte da Integração São Borja – BR/ Santo Tomé – AR, foi construída sobre o Rio Uruguai em 1997, facilitando as relações socioeconômicas entre as áreas fronteiriças, interrompendo um ciclo histórico do transporte hidroviário[6] que existia entre as duas cidades. A partir de sua construção e da abertura das fronteiras pela globalização, percebe-se um aumento do fluxo de veículos na divisa, fatores esse que vem dando uma grande contribuição para o aumento das relações comerciais, culturais e sociais locais. Juntamente com o surgimento da Ponte da Integração, foi criado o primeiro centro unificado de fronteira do Mercosul (aduana brasileira e argentina integradas).

Figura 2: Ponte da Integração São Borja-Santo Tomé
Fonte: Mercovia S.A

Essa obra de engenharia além de incrementar as relações comerciais entre Brasil, Argentina e os demais países do Conesul, serve também de opção para o descongestionamento de fluxo de cargas entre as cidades de Uruguaiana – BR e Passo de Los Libres – AR, estando realizando ligação terrestre entre os Portos de Rio Grande (no Oceano Atlântico) e os Portos de Antofogasta e Iquique no Chile (no Oceano Pacífico). Remontam dos anos 30 as primeiras incursões e tentativas e até mesmo o ex-presidente Getúlio Vargas chegou a cogitar a ligação binacional, mas foi o circuito Uruguaiana – Passo de Los Libres que anos mais tarde acabou ganhando a travessia Brasil – Argentina.

A construção da Ponte da Integração, em 11 de Dezembro de 1997, contou com iniciativas pioneiras ocorridas em São Borja e Santo Tomé, demonstrando que os dois países estão aptos para realizarem obras de infra-estrutura em conjunto. O traçado e a localização são estrategicamente privilegiados, sendo que o eixo São Borja-Santo Tomé fica no epicentro do Conesul Americano, repartindo distâncias entre os portos de Paranaguá (Brasil) e Rio Grande (Brasil), no lado brasileiro, e a ligação São Paulo-Buenos Aires – Córdoba (Argentina) – Mendoza (Argetnina) - Santiago do Chile, fica encurtada em 230 Km em relação à conexão São Paulo – Porto Alegre – Uruguaina – Passo de Los Libres (Argentina).


Quadro 1
Fluxo de caminhões na Aduana de fronteira São Borja-Santo Tomé

Mes

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Janeiro

493

663

990

1165

1060

1427

1608

2175

2962

3594

4999

3434

4945

Fevereiro

804

522

1663

1232

1205

1781

1709

2403

3984

4466

5213

3905

5572

Março

1265

777

1584

1385

1720

2333

2465

3511

4744

5750

6005

5298

 

Abril

1343

836

1370

1690

2176

2327

2218

3640

4958

5547

6538

5113

 

Maio

1606

1241

1418

1863

2276

2254

3036

3810

4815

5704

6809

5636

 

Junho

1379

1192

1381

1620

1917

1811

2970

3493

4236

5238

6192

5486

 

Julho

1426

1290

1480

1369

1848

1500

2352

3431

4756

5004

6234

5668

 

Agosto

1617

1242

1515

2054

1718

1848

2475

3386

4485

5521

6713

5877

 

Setembro

1683

1190

1770

1766

1470

1893

2428

3281

4716

5564

6527

5747

 

Outubro

1403

1277

1601

1891

1716

2038

2420

3752

4926

5839

6136

6177

 

Novembro

913

1282

1599

1540

1975

1778

2606

3736

4725

5750

5623

6352

 

Dezembro

754

1427

1434

1387

1565

1761

2562

3569

4449

5386

3846

5886

 

Total

14686

12939

17805

18962

20646

22751

28849

40187

53756

63363

70835

64579

10517

Fonte: Mercovia S.A

A aduana integrada de fronteira São Borja-Santo Tomé, como mostra o quadro 1, está se consolidando a cada ano como uma rota atrativa para o fluxo de caminhões que sai do Brasil, como os que entram nele pela fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul, onde a média de fluxo de caminhões nos últimos quatro anos na devida aduana foi de entorno de 63.000 mil veículos pesados.


Quadro 2
Fluxo de Veículos leves internacionais na aduana de fronteira São Borja-Santo Tomé
[7]

Mês

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Janeiro

7007

9285

17352

20513

5318

5896

9000

11436

12968

18793

17170

28961

23732

Fevereiro

3445

5344

8496

10287

2401

3025

4427

5332

6678

11433

12424

16252

12162

Março

1471

2559

2545

2478

1579

1172

1285

1620

2291

3634

4154

4101

Abril

1804

1774

1913

1680

1159

984

1150

995

1786

1731

1680

2029

Maio

1567

1478

1321

1140

1438

895

944

903

1200

1221

1793

1619

Julho

1710

1292

1291

1317

1352

932

1135

788

1210

1192

1433

1377

Junho

1795

1694

2107

1996

1514

1099

1325

1141

1645

1558

2221

1140

Agosto

1496

1399

1363

1428

1029

847

1099

650

1160

1202

1847

1152

Setembto

1544

1848

1419

1203

1228

939

1247

843

1437

1562

1531

1693

Outubro

1573

1995

1491

1389

1079

1038

1352

1089

1600

1526

1775

2002

Novembro

1156

1664

1178

1214

775

863

958

757

1398

1518

1350

1639

Dezembro

2280

2659

3255

2035

1740

1887

1926

2049

3389

3198

3507

3670

Total

26848

32991

43731

46680

20612

19577

25848

27603

36762

48568

50885

65635

35894

Fonte: Mercovia S.A


Segundo dados apresentados pela Mercovia S.A, o tráfico de veículos leves internacional vem apresentando uma sazonalidade em seu tráfico, principalmente na estação do verão. Nos últimos três verões (2007, 2008 e 2009), o fluxo de veículos internacionais nos meses de janeiro e fevereiro, somou 105.033 veículos, representando um movimento 42,66 por cento superior à somatória dos fluxos dos outros meses dos respectivos anos, pois nesses períodos ocorrem as férias coletivas tanto no Brasil como na Argentina, Paraguai e Chile. Com a melhora do cenário econômico argentino, nota-se um maior translado de turistas na aduana integrada de fronteira, que se deslocam em grande escala para o litoral norte do RS e de SC. Os veículos brasileiros[8] também dão alguma contribuição para o aumento desse fluxo em uma pequena escala.

Para não ficar apenas no plano do intercâmbio comercial e de transportes, a ponte da Integração São Borja – Santo Tomé[9] poderá se tornar estratégica na dinamização de novas alternativas sociais e econômicas para região, se for pensada como ferramenta para o planejamento transfronteiriço, buscando integrar o comércio exterior com o planejamento turístico,  atividades de geração cultural, voltados para articulação de políticas binacionais.


Relações economicas, culturais e Turísticas na fronteira Brasil/ Argentina

Relações econômicas

As duas municipalidades fronteiriças que estão fazendo parte desse estudo São Borja-Brasil/ Santo Tomé-Argentina, são duas cidades gêmeas localizadas no território histórico das Missões Jesuíticas Guaranis, perfazendo um limite natural através do Rio Uruguai. De 1997, com a construção da Ponte da Integração São Borja/ Santo Tomé e da aduana integrada de fronteira vem sendo alterada as características da devida faixa de fronteira agora se voltando para as relações de comércio exterior e aumento do fluxo de pessoas, deixando para trás a idéia de fronteira fechada, voltada para proteção nacional, tornando-se uma região transfronteiriça.

As Cidades-gêmeas podem ser definidas como núcleos urbanos localizados de um lado e de outro do limite internacional, cuja interdependência é, muitas vezes, maior do que de cada cidade com sua região ou com o próprio território nacional, sem que estejam necessariamente em condição de fronteira seca, formando uma conurbação ou ocupando posições simétricas à linha divisória. Elas têm forte potencial de atuar como nódulos articuladores de redes locais, regionais, nacionais e transnacionais (Machado, 2006).

A partir de 1997 a faixa fronteiriça começou a concentrar funções aduaneiras, de controle e fiscalização de diferentes fluxos que as atravessam, prestando serviços principalmente para destinos a grandes centros regionais da América do Sul, como São Paulo e Buenos Aires, tornando-se claro a demanda regional de melhorias na infra-estrutura aduaneira. Por serem áreas estratégicas tanto para os Governos brasileiro, argentino e para o Mercosul, as funções desempenhadas por estas cidades são subordinadas a ações de caráter não-locais (Carneiro, 2009).

 As outras formas de interações diplomáticas e estratégicas como (interações locais e sub-regionais), são pouco utilizadas na devida fronteira São Borja-Santo Tomé, principalmente pela distância da rede de circulação, pela falta de entes que possam articular esses intercâmbios e também pela história do povoamento das mesmas.

As cidades-gêmeas também podem criar vínculos fortes em escala local, em decorrência de práticas culturais, políticas, comerciais, etc. Nas cidades situadas no limite internacional, diferentes tipos de interações transfronteiriças locais são consolidados, porém, simultaneamente há uma subordinação às políticas decididas à distância, devido à “importância estratégica da fronteira”. Tais políticas às vezes limitam e outras aumentam as chances de interação em escala local. (Carneiro, 2005: 2).

Um dos principais fatores que dão suporte a integração dos povos nas linhas limítrofes do sul do Brasil, são as relações comerciais. A conjuntura econômica na faixa de fronteira do Brasil Meridional é de grande mobilidade, pois tem profundas relações com as mudanças cambiais e as crises econômicas dos países envolvidos, ou seja, o ciclo de demanda de pessoas de um lado para outro de uma determinada divisa territorial, relaciona-se com a desvalorização cambial de uma moeda nacional ou com maior poder aquisitivo de um determinado país em relação a outro.

Quadro 3
Fluxo de veículos locais na aduana de fronteira São Borja-Santo Tomé
[10]

Mês

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Janeiro

4483

4412

4912

4746

2326

7892

7456

8673

14932

19920

18430

12572

16404

Fevereiro

4258

4255

4580

4045

2430

7491

6962

8099

14469

19095

17077

11759

14923

Março

3874

4724

4168

4129

4791

6175

6675

8206

16108

21278

18402

11586

Abril

3769

4310

4040

3833

8019

5828

6770

8233

16974

12773

17484

11894

Maio

2866

4297

4035

3841

10583

6415

6425

9081

17398

15097

18514

11970

Junho

3617

4269

4064

4345

9921

6114

6286

9222

16429

15420

16370

12457

Julho

4093

4002

4530

4614

10476

6295

6281

10042

17693

16019

17851

9776

Agosto

4030

4437

4181

4400

8200

6233

6026

9029

17083

16948

18112

12381

Setembro

3672

4266

3904

3721

6102

5809

6246

10128

17128

16885

16689

13684

Outubro

3866

4566

4137

4305

5788

6173

6826

11034

18189

17134

14076

15461

Novembro

3455

4138

3973

4388

6598

6558

6770

11689

18134

17480

12839

14800

Dezembro

4207

5309

5156

2829

9258

8690

9335

15773

22923

21014

14143

18696

Total

46190

52985

51680

49196

84492

79673

82058

119209

207460

209063

199987

157036

31327

Fonte: Mercovia S.A

As relações comerciais entre São Borja e Santo Tomé vêm apresentando uma variabilidade nas últimas décadas, em virtude das crises cambiais e econômicas que enfrentadas pelos seus países. Os são-borjenses[11] no século XXI, estão sendo vistos em grande número em Santo Tomé, freqüentando lojas de roupas, sapatos, açougues, eletroeletrônicos, supermercados, restaurantes, postos de combustíveis, festas e em um cassino[12].

Conforme os dados apresentados pela Mercovia S.A, o fluxo de veículos locais vem tendo um aumento considerável desde 2005, que registrou a passagem de 119.209 veículos, que se comparados com a média de fluxo de 2006 até 2009, 193.000 passagens, teve um incremento de 73% na mobilidade fronteiriça, relacionada principalmente com a queda da cotação do peso em relação ao real, gerando num aumento da movimentação de brasileiros para o lado argentino.

Falar em contrabando na fronteira oeste do Sul do Brasil nos remete fazer um resgate histórico de um dos principais processos potencializadores para o desenvolvimento socioeconômico da Região do Prata, pois tanto as ações contrabandistas platinas como as gaúchas podem muito explicar a interação mercantil que uniu em dada época numa só idéia de interesse a extração e comercialização de couros e a movimentação no espaço meridional do Brasil, de diversos animas. (Colvero, 2004).

Ao se resgatar todas as relações e ações do contrabando na área de fronteira São Borja/ Santo Tomé, procurou-se levantar: as formas de translado dos produtos, quais os tipos de contrabando, entre outros.

Ao analisarmos as formas de translado dos produtos oriundos do contrabando na devida faixa fronteiriça, procuramos partir de um princípio geográfico básico que a divisa territorial, entre as duas localidades, é formada por limite natural, o Rio Uruguai. Utilizando á ferramenta da história oral, constatou-se que o translado dos produtos contrabandeados via Rio Uruguai, perpassou sobre diversas formas: a nado, com embarcações de pequeno porte, balças[13] e agora mais recentemente via Ponte da Integração.

Seguindo essa mesma linha de pensamento, para ter-se uma melhor visualização das relações econômicas entre as respectivas localidades, parte-se para um princípio básico, fazer uma contextualização histórica voltada para a construção da principal via de ligação terrestre entre os dois municípios na atualidade, a Ponte da Integração São Borja – BR/ Santo Tomé – AR[14].

As regiões de fronteira são áreas que vem sendo constantemente fiscalizadas nas épocas de hoje, tanto no território argentino, como no brasileiro, em virtude do translado ilegal de diversas mercadorias.

Colvero, da alguns passos em relação ao contrabando na fronteira oeste do RS, salientando que:

[...] A região da fronteira oeste do Rio Grande do Sul teve sobretudo a partir do século XVIII, grande participação no tráfico de mercadorias que eram contrabandeadas da regiões vizinhas e que passavam ou, pelo menos, eram escondidas nessa região por não haver patrulhamento, tampouco fiscalização (2004:173).

Os produtos contrabandeados e adquiridos em maior escala, de Santo Tomé para São Borja são: combustíveis (gasolina e óleo diesel), bebidas (cervejas[15], vinhos e refrigerantes), roupas[16], alimentos, eletroeletrônicos, eletrodomésticos, animais, armas e munições.


Quadro 4
Comparação de Preços dos produtos argentinos com os brasileiros

Produtos

Países

 

Brasil

Argentina

Gasolina (l)

R$ 3,00

 R$ 1,40

Óleo Diesel (l)

R$ 2,00

R$ 1,40

Cervejas

                       R$ 1,42            (600 ml)

                        R$ 1,50 (1000ml)

Açucar (Kg)

R$ 1,80

R$ 1,00

Óleo de Soja (l)

R$ 2,00

R$ 1,20

Fonte: Elaboração própria.

 

A localização geográfica da devida área de fronteira, proporciona ligações entre Brasil-Argentina-Paraguai-Chile, o que vem credenciando essa área de fronteira a ser um corredor com grande fluxo de caminhões (ano todo), fluxo de turistas argentinos, chilenos e paraguaios no verão (destino litoral brasileiro), turistas brasileiros (destino Reduções Jesuíticas argentinas, Posadas, Buenos Aires, Paraguai e Chile). Esses fatores são indícios estratégicos que podem contribuir para uma visão de planejamento turístico fronteiriço.  

O mercado fronteiriço é uma variante do turismo local e do turismo receptivo limítrofe. Do primeiro porque a demanda provém de populações próximas, e do segundo porque estes mesmos viajantes partem de cidades instaladas num país estrangeiro. (Boullon, 2005).

Relações Culturais

A devida faixa de fronteira possui um Patrimônio Histórico-Cultural relacionado principalmente com cinco períodos históricos que perpassaram nos locais: Reduções Jesuíticas Guaranis, Guerra do Paraguai, Brasil República, Lutas por independência e surgimento da figura do gaúcho. Esses bens patrimoniais originados pelo contexto histórico e cultural acabam juntamente com a localização geográfica regional (Região de Pampa), contribuindo com a formação da identidade da respectiva fronteira, identificada com a cultura gaucha,tornando-se conseqüentemente em atrativos turísticos dos locais.

Figura 3. Similaridade dos recursos patrimoniais fronteiriços
Fonte: PINTO, Muriel (2009)

 

As duas municipalidades possuem uma gama de atrativos patrimoniais relacionados com o período reducional (séc. XVII). Como não poderia de ser diferente esse contexto das Reduções Jesuíticas Guaranis[17], gerou uma série de recursos patrimoniais no local, como: valorização do período reducional pelas instituições culturais[18], diversificação de monumentos[19], confecção de materiais artesanais e contribuiu com a criação de festas populares[20].

Figura 4. Monumento do Tricentenário da Redução de São Francisco de Borja.
Fonte: Elaboração do autor

 

 

Figura 5: Artesanato gaucho (Santo Tomé).
Fonte: Elaboração do autor

 

Ainda analisando os atrativos que possuem peculiaridades na sua conjuntura histórica, observou-se que tanto São Borja como Santo Tomé mantém laços culturais ligados as tradições gaúchas[21], cultivando manifestações folclóricas em comum[22] como: na dança típica (chamamé), no canto típico (chimarrita), nas vestimentas (bombacha, alpargata, boina, chiripá, lenço, cinto, entre outros), na bebida típica (chimarrão ou mate), na gastronomia (churrasco, pucheiro) e nas festas populares (festivais musicais)[23].

Figura 6: Museu da Guerra do Paraguai (São Borja).
Fonte: Elaboração do autor

 

 

Figura 7: Túmulo de ex- Presidente João Goulart (Turismo fúnebre).
Fonte: Elaboração do autor

                 

Na área em estudo inventariou-se que São Borja e Santo Tomé possuem alguns bens culturais ligados a líderes políticos, militares[24] e resquícios da Guerra do Paraguai. Na área territorial de São Borja quantificaram-se atrativos relacionados ao período republicano brasileiro, mais precisamente com a passagem dos ex-presidentes da República (Getulio Vargas e João Goulart). Já em Santo Tomé enumeraram-se atrativos ligados ao líder General San Martín[25].

Figura 8: Arquitetura Santomenha (imóvel detalhes mais rebuscados).
Fonte: Elaboração do autor

 

 

Figura 9: Arquitetura Samborjense (imóvel com valor históico).
Fonte: Elaboração do autor

 

Toda essa diversificação do Patrimônio histórico-cultural que ocorreu na devida faixa de fronteira trouxe grande contribuição em seu contexto arquitetônico[26], pois se verifica ao longo do perímetro urbano dos locais, inúmeros imóveis , que possuem profundas relações com os períodos históricos que se perpassaram, confrontando com suas respectivas classes sociais.

Entre os imóveis nota-se que as residências localizadas em áreas centrais do perímetro urbano possuem uma similaridade arquitetônica, com elementos mais rebuscados e com um excelente estado de conservação[27](ver figura 8). Em contrapartida evidenciou-se um contingente significativo de imóveis, que possuem uma arquitetura mais singela, com uma conservação de mal estado, mas de grande importância histórica[28](ver figura 9).

A classificação do funcionamento turístico das respectivas cidades foi analisada conforme as características turísticas locais que se enquadravam nos tipos de centros de: distribuição, estada, escala, excursão, diversão e compras, seguindo metodologia proposta por Boullón (2005).

Quadro 5
Classificação dos atrativos turísticos locais-regionais conforme as características de seu funcionamento

Tipo funcionamento
Características
Relação com São Borja/ Santo Tomé
DISTRIBUIÇÃO
Destaca-se por pussir em sua própria área territorial e dentro de sua raio de influência (2 horas de tempo), contendo atrativos culturais e naturais.

* Pólos emissores de turistas:  

* Reduções Jesuíticas do Brasil, Argentina e Paraguai;

* Cidade de Posadas (Argentina) e Encarnación (Paraguai);

* Praia de água doce de Itúzango-Argentina;

* Carnaval fora de época de Uruguaiana (Brasil);

*Atrativos receptivos de turistas no local:

* Eventos culturais (Carnaval de São Borja e Santo Tomé);

* Festivais musicais de São Borja, festivais artísticos, Semana farroupilha de São Borja e bens culturais relacionados (missões e ex-presidentes).

ESTADA
Caracteriza-se por possuir um um único tipo de atrativo principal (praias, esqui na neve, pesca, águas termais ou jogos de azar). * Pesca no Rio Uruguai em São Borja, Santo Tomé e Garruchos e estadia em virtude dos atrativos referente ao Cassino de Santo Tomé.
ESCALA
São as cidades que localizam-se em pontos intermediários dos corredores turísticos, estabelecendo uma comunicação entre os lugares de mercado emissor e centros de estada. * Tanto São Borja como Santo Tomé servem de passagem para caminhoneiros que vão para Argentina, Paraguai e Chile, assim como ponto de cruzada para turistas que vão para o litoral brasileiro, Buenos Aires, Foz do Iguaçu, Encarnacion (Paraguai), Posadas e Corrientes.
EXCURSÃO
Recebem geralmente turistas por menos de 24 hs, servindo como atrativo de outros centros turísticos principais.

* Atrativos turísticos de São Borja em geral são procurados por turistas que possuem como destino principal o sítio arqueológico São Miguel das Missões (Patrimônio Cultural da Humanidade).

DIVERSÃO
Recebe pessoas de outros centros urbanos próximos, que se dirigem durante os finais de semana e em períodos de férias, permanecendo por menos de 24 hs.

* Festas em casas noturnas, semana Farroupilha, Carnaval, festivais musicais e rodeios de  São Borja;

* Rio Uruguai (esportes aquáticos, pesca e banho);   

* Restaurantes, bares, sorveterias e cafererias de São Borja e Santo Tomé;

* Feiras agropecuárias (Fenaoeste de São Borja).

COMPRAS
Destaca-se por receber pessoas interessadas em realizar compras de produtos (alimentícios, bebidas, eletroeletronicos, artesanato, combustível, entre outros).

* Santo Tomé (vem recebendo nos ultimos um numero maior de brasileiros em virtude da desvalorização do cambio), destacando pela venda de produtos alimenticios (carne, doces, cervejas, vinhos, acuçar), artesanato do gaucho (botas, alpargatas), combustível (gasolina e diesel) e produtos de limpeza;

* São Borja serve como centro de compras para alguns municiípios menores como Garruchos, Maçambará, santo Antônio das Missões e Itacurubi.

 

De acordo com a localização geográfica da área em estudo, raio de influência (2 horas de distância-tempo) do mercado emissor, e os atrativos turísticos encontrados no território em questão, avaliam-se as cidades fronteiriças da seguinte forma:

1) Atrativos que possuem características distribuição de turistas num âmbito local-regional: possui uma quantidade de atrativos culturais e naturais cuja quantidade e hierarquia poderá justificar na permanência média dos turistas entre 2 noites que poderá ser estendida a 5 ou mais (demanda pouco cíclica, que necessita de um sistema constante de promoção, que só em casos excepcionais terá um tamanho grande de demanda).

 

Quadro 6
Atrativos turísticos de (São Borja-Santo Tomé) com características para distribuição de turistas


Carnaval de São Borja e Santo Tomé

- Carnaval no cais do porto de São Borja (Carnaval popular com duração de 3 dias, que reúne entorno de 10.000 pessoas por noite) e carnaval nos clubes sociais (apresentam 5 noites de carnaval, com uma média 50 blocos carnavalescos, atraindo tanto para os blocos como para as entidades sociais pessoas oriundas de outras regiões do estado do RS e do Brasil).

- Carnaval de Santo Tomé (Ocorre nos dois finais de semanas anteriores e posteriores ao carnaval brasileiro, atraindo turistas de São Borja e de outras municipalidades argentinas).

Festivais Musicais de São Borja

- Ronda de São Pedro (festival musical nativista com duração de três dias), Festivais de Musicas de Carnavais (duração de dois dias).

Festivais artísticos de Santo Tomé e São Borja

- Festival do Folclore Correntino

- Festival São Borja em Dança

Semana Farroupilha de São Borja

- Pela sua localização geográfica na região da Campanha Gaúcha (pampa), a população de São Borja cultiva as tradições gaúchas com diferencial pampiano, o que acaba atraindo pessoas de outras regiões para os 7 dias de bailes,  jantares dançantes e desfile temático.

Fonte: Elaboração própria

 

Como se pode observar a tipologia de centros de distribuição turística não apresentou muitos atrativos relevantes para área em estudo. Os atrativos locais estão em fase de melhor planejamento (organização, divulgação) como, (Carnaval de São Borja e Santo Tomé, Semana Farroupilha de São Borja) ainda atraindo um demanda pouco significativa, no que diz respeito aos atrativos que estão no raio de proximidade local se pode destacar os potenciais relacionados as Reduções Jesuíticas guarani Brasil-Argentina-Paraguai), estes são atrativos que vem tendo um índice maior de demanda turística num âmbito regional, gerando também uma maior articulação com a devida faixa fronteiriça.

 

Quadro 7
Atrativos turísticos com características para serem centros de distribuição localizados no (raio de 2 horas distância-tempo)

Praia de Itúzango

Praia de água doce localizada no Rio Paraná, distante entorno de 140 Km da fronteira São Borja-Santo Tomé.

Posadas-Argentina

A cidade de Posadas na Argentina vem atraindo ultimamente um numero interessante de turistas, em virtude de suas atrações de diversão (casas noturnas) e através de seu comércio, está distante entorno de 150 Km da devida fronteira.

Encarnación-Paraguai

Cidade paraguaia que faz fronteira com Posadas na Argentina vem atraindo constantemente os turistas voltados para o turismo de compras. 

Reduções Jesuíticas do Brasil

- As localidades de Santo Ângelo, São Miguel das Missões,São Lourenço, São João Batista, São Nicolau e São Luiz Gonzaga, vem atraindo turistas em geral voltados para estudos (grupos escolares), que geralmente costumam percorrer outras Reduções jesuítas localizadas mais distante como São Borja e Santo Tomé.

Reduções Jesuíticas da Argentina e Paraguai

Argentina: Reduções de Santa Ana, San Inácio Mini (Patrimônio Cultural das Humanidade)

Paraguai: Reduções de Jesus de Tavaregue e Santissíma  Trinidad (Patrimônio Cultural da Humanidade).

Carnaval fora de época de Uruguaiana

A cidade de Uruguaiana localiza-se entorno de 2 duas horas da fronteira São Borja-Santo Tomé, no local vem sendo realizado um desfile carnavalesco com dois dias de duração, com grande destaque no cenário nacional e estadual,atraindo turistas de diversas regiões do Brasil e do estado do RS.

Cassino de Libres

Libres é uma municipalidade argentina que faz fronteira com Uruguaiana (Brasil), seu Cassino é reconhecido pelo sua comodidade e bom atendimento.

Fonte: Elaboração própria

 

2)     Atrativos que possuem características se tornar estada de turistas:

São caracterizados por motivarem uma estada de 5 ou mais noites. O tamanho do centro de estada varia de um tipo para outro.

 

Quadro 8
Atrativos turísticos com características para estada de turistas em (São Borja-Santo Tomé)

Pesca no Rio Uruguai

- Em São Borja e Santo Tomé (O Rio Uruguai geralmente vem gerando atratividade em virtude de ser um local propicio para pesca esportiva (tranqüilidade e diversidade de peixes, como dourado).

Cassino de Santo Tomé

Na Argentina os jogos de azar são legalizados, o que permite definir o Cassino de Santo Tomé como uma atratividade turística na respectiva fronteira, o local possui um infra-estrutura interessante, contando também com um Cassino hotel, já existe na Argentina um Rota Turística denominada Rota dos Cassinos

Fonte: Elaboração própria

Entre os atrativos apresentados como potenciais de estada de turistas, a pesca esportiva no Rio Uruguai apresenta maior possibilidade de abarcar as 5 noites de estada, visto que é observado não em grande escala o fluxo de pescadores no Rio Uruguai, já o cassino de Santo Tomé, por mais que possua um rede hoteleira de suporte, torna-se uma atratividade que gera uma demanda periódica, não possuindo características para uma estada em número maiores de dias.

 

Quadro 9
Atrativos que definem São Borja-Santo Tomé centros de escala turística

Fluxo de argentinos, paraguaios e chilenos no sentido ida-volta para o litoral brasileiro no verão

No verão a partir do inicio de dezembro é constante o fluxo de turistas para o litoral brasileiro, sendo que muitos principalmente do interior da Argentina (Iguazú, Santa Fé, Rosario, Córdoba, Santiago de Del Estero, Jujuy, Salta,Mar Del Plata, Tucumán, Mendoza e Bariloche) adentram no Brasil, via São Borja- Santo Tomé.

Caminhoneiros que realizam o comércio exterior

O fluxo de caminhões na aduana integrada de fronteira possui uma média de 50.000 caminhões/ ano, pessoas estas que necessitam se alimentar, dormir e se divertir, nicho interessante para um melhor planejamento turístico fronteiriço.

Ponto de cruzada de turistas para Posadas, Encarnación, Foz do Iguaçu e Buenos Aires

Os principais acessos para Buenos Aires, Posadas, Encarnación (Paraguai) e Foz do Iguaçú (Brasil), são via Porto Xavier-Brasil (via balça), Porto Mauá (via balaça) e Uruguaiana e São Borja (via ponte), onde São Borja está mais próximo do Paraguai e de Posadas para turistas oriundos do norte do RS.

Fonte: Elaboração própria

Essas características apresentadas para a tipologia de funcionamento de escala turística se mostram estratégicas no que tange a priorização de potenciais turísticos para devida faixa de fronteira, em virtude da grande mobilidade que existe na fronteira Uruguaiana-Libres, a ponte da integração São Borja- Santo Tomé vem sendo cada vez mais utilizada como um corredor alternativo para escoamento de produção e transição de pessoas na fronteira Brasil-Argentina. No que diz respeito ao comércio exterior, é de grande valia pensar em integrar o fluxo de pessoas envolvidas na locomoção de produtos (caminhoneiros) com a prestação de serviços alimentícios, de hospedagem e de lazer locais, visto que o desembaraço[29] acaba deixando os caminhões parados na aduana de fronteira por um período variado.

O fluxo de veranistas (argentinos, paraguaios e chilenos) com destino as praias do Rio Grande do Sul e Santa Catarina é constante durante três meses do verão, principalmente em (dezembro, janeiro e fevereiro). Esses turistas viajam uma grande quantidade de quilômetros até chegar litoral, necessitando de paradouros para descansar, se alimentar e realizar a manutenção de veículos, o que torna a área em estudo um lugar estratégico para recepção dos estrangeiros visto que é uma das principais portas de entradas para o Brasil.

3)     Atrativos que possuem características para atratividade de excursões:

Estes potenciais funcionam como atrativos do centro principal, sendo que este se torna o seu mais importante mercado emissor.


Quadro 10
Atrativos que vem gerando atratividade de excursões

Atrativos culturais de São Borja

Instituições culturais (Museu Getúlio Vargas, Museu Guerra do Paraguai, Museu Apparício Silva Rillo, Museu Ergológico de Estância, Museu João Goulart), artesanato típico (lã), gastrônimia típica (pescado do Cais do Porto, carne de ovelha), Monumentos (cemitério municipal e Mausoléu de Getúlio Vargas).

Atrativos culturais de Santo Tomé

Museu missioneiro, gastrônimia típica (pastelarias, pizzarias e sorveterias), artesanato típico (endumentárias gaúchas)

Fonte: Elaboração própria


A atratividade de excursões tanto para Santo Tomé como para São Borja, são oriundas de atrativos turísticos identificados com as Reduções Jesuíticas Guarani e líderes políticos. Para São Borja as excursões acabam vindo do principal mercado emissor regional (o sítio arqueológico de São Miguel Arcanjo), perfazendo na seqüência um tour pelas principais áreas identificadas como antigas reduções (Santo Ângelo, São Nicolau, São Luiz Gonzaga, São Lorenço, São João Batista e São Borja), onde buscam conhecer em território samborjense atrativos culturais da cidade reconhecida pelo maior numero de recursos patrimoniais das Missões[30]. No território samborjense os turistas vem atrás da rica história e cultura perpassada no local, materializada nas suas instituições culturais (representando as missões, cultura gaúcha, presidentes e Guerra do Paraguai), monumentos que identificão os líderes políticos sepultados em São Borja (túmulo de João Goulart e Leonel Brizola e mausoléu de Getúlio Vargas). As excursões que acabam chegando em Santo Tomé na sua grande maioria são originadas da demanda turística originada em São Borja.

4)     Características que podem destacar Santo Tomé como um centro de compras:

A municipalidade de Santo Tomé a partir da última desvalorização cambial e da crise econômica da República Argentina, acabou como vimos anteriormente atraindo uma demanda crescente de brasileiros interessados na compra de produtos alimentícios, roupas, bebidas, combustível e carnes. Esse aumento excessivo do consumo de samborjenses no comércio santomenho acabou contribuindo com a estruturação, organização e criação de novos estabelecimentos comerciais no território de Santo Tomé, diversificando e qualificando os tipos de serviços locais.

Essa melhor organização dos setores comerciais do lado argentino vem mudando o cenário urbano local (melhorias nas vias de acesso, maior empregabilidade e maior crescimento imobiliário), credenciando Santo Tomé a ser um centro de compras da faixa de fronteira em estudo, fator esse que já vem sendo evidenciado, pois muitos turistas que vem a São Borja estão passando a fronteira para realizar compras com valores acessíveis no comércio santomenho.


Análise conclusiva...

O desafio que se impõe com esse estudo é afirmar que as faixas de fronteiras devem ser vistas atualmente como áreas territoriais estratégicas para o planejamento regional do Mercosul, a gênese das áreas urbanas das cidades de fronteira possuem relação direta com a comercialização ilícita de mercadorias e com o desenvolvimento do comércio, fatores esses que nesse mundo globalizado vem contribuindo para uma maior circulação de pessoas nos limites do Brasil com a Argentina e Uruguai.

Na respectiva área em estudo verificou-se haver uma inter-relação entre a variação da balança cambial de um país e a construção da ponte da integração, com o comércio e contrabando nessa região de fronteira, sendo assim uma povoação vem obtendo privilégios nas relações comerciais em detrimento de outra (São Borja em relação a Santo Tomé), mas em contrapartida o lado argentino vem obtendo benefícios econômicos (aumento da arrecadação local).

Uma reflexão que pode ser feita refere-se ao estreitamento de relações entre os dois contingentes populacionais, o que não era muito comum tempos atrás, ou seja, a fronteira esta se abrindo para uma integração social, cultural e econômica, mas um fator ainda vem dificultando a maior interação entre os contingentes fronteiriços, que é a cobrança da tarifa (R$ 7,00 para veículos locais) para passagem na aduana de fronteira, além das rivalidades históricas entre argentinos e brasileiros.

São Borja e Santo Tomé se encontram numa posição estratégica no escoamento de produtos e pessoas através da ponte internacional. Podemos citar dados levantados pela Mercovia S/A (entidade gestora da aduana de fronteira), onde o fluxo de veículos leves internacionais e caminhões quantificaram em 2009, uma média de 130.000 veículos. Estamos falando de um considerável número de pessoas que cruzam a fronteira na busca de experiências novas e a possibilidade de freqüentar um ambiente peculiar, cultura local, gastronomia típica, comprar artesanatos típicos, entre outras diversas formas de intercâmbio cultural. São pessoas que precisam parar para se alimentar, dormir, descansar e seguir viagem, porque não aproveitar essa fatia de mercado mais eficientemente no nível de consumo em turismo?

Podemos citar esforços do Governo Federal no sentido de intensificar essa integração entre países através do turismo, como o Programa 1163 de responsabilidade do Ministério do Turismo, intitulado Brasil: Destino Internacional, que visa criar uma estratégia bem estruturada de inserção internacional do Brasil no mercado turístico, com metas definidas e avaliação de resultados eficiente. A promoção do Turismo brasileiro no mercado internacional terá como conceito estratégico a diversificação da imagem do país. Outra ação que podemos mencionar é a número 4034, que visa dar apoio à comercialização e ao fortalecimento do Turismo no Brasil através de um maior incremento do produto turístico brasileiro no mercado internacional. Tal ação é de responsabilidade da EMBRATUR, fundamentada pela lei 8.181/1991, MP 103/2003 e DEC 4653/2003.

Nesse sentido vale à pena expor que o Plano Nacional de Desenvolvimento regional (PNDR) em vigor na República Federativa do Brasil, destaca a faixa fronteiriça brasileira como área considerada prioritária para criação de planos de desenvolvimento. A faixa de fronteira merece relevo por sua importância estratégica no objetivo maior da integração econômica sul-americana. A unidade de articulação das ações federais nas sub-regiões selecionadas é conhecida como “Mesorregião Diferenciada”, que se constitui como espaço institucional de formação de consensos.

Nos últimos anos vem se discutindo a temática criação de roteiros turísticos integrados na América do Sul, principalmente no que diz respeito à potencialização de atrativos culturais através do turismo cultural.  No ano de 2009 foi elaborada através do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histório e Artístico Nacional do Brasil), Diretoria nacional de Patrimônio e Museus da secretaria de Cultura da Presidência da Argentina e UNESCO, a proposta inovadora para o planejamento integrado do turismo na Latino América, foi lançado e discutido a criação de projeto de itinerários culturais – inclusive para meio turístico para o Mercosul, baseado em experiências da Argentina e do Brasil.  Esse projeto possui como seus principais objetivos identificar itinerários culturais da região para converte-los em projetos concretos de desenvolvimento regional sustentável; fomentar ações articuladas e sustentáveis de preservação e salvaguarda do Patrimônio Cultural e valorização turística dos itinerários culturais; proporcionar condições para fomentar a melhoria da qualidade de vida das comunidades detentoras do patrimônio existente da região e promover a integração dos valores culturais compartilhados como uma via para integração e do dialogo intercultural dos países da região.

Outra política brasileira que vem dando destaque para áreas de fronteira é Programa de desenvolvimento da faixa de fronteira (PDFF), ação está que visa estimular a integração e fortalecimento regional a partir das características políticas e propósitos em comuns. Segundo o Ministério da Integração Nacional a faixa de fronteira brasileira apresenta problemas como, baixo índice de desenvolvimento econômico, dificuldade de acesso a bens de serviços públicos, falta de coesão social e precárias condições de cidadania, suas principais prioridades voltam-se para a dinamização econômica, fornecimento de infra-estrutura econômica e social, melhorias nas condições de cidadania, fortalecimento dos atores locais, procurando o aproveitamento das peculiaridades da organização social e das características produtivas locais.

Portanto, propomos a realização de um estudo que servirá como base para a comprovação de que a área de fronteira supracitada está perfeitamente integrada para realização em conjunto de um planejamento regional, realizando políticas internacionais em conjunto, voltadas para o surgimento de novas alternativas econômicas e sociais nos locais.

Como propostas para o planejamento turístico da fronteira São Borja-Santo Tomé:

1-     Criar um Plano fronteiriço de desenvolvimento turístico;

2-     Gerar informações (publicação e divulgação) de dados referentes aos atrativos e serviços turísticos das duas localidades em conjunto (elaborar levantamento turístico das cidades gêmeas, obter informações referente à demanda turística fronteiriça, oferecer informação turística sobre o município em seu próprio âmbito, informar com prévio acordo sobre os produtos turísticos do outro município limítrofe).

3-     Planejar instrumentos de facilitação binacional, destinados a agilização da entrada, deslocamento e saída de turistas e seus equipamentos (orientações, regulamentos, acordos), visando aumentar o consumo dos serviços turísticos disponíveis.

4-     Realizar instrumentos de promoção turística integrada (materiais publicitários, cartilhas turísticas, sites, folderes, relações públicas, organização de eventos turísticos e promover os potenciais turísticos do mercado emissor), procurando definir a imagem turística da fronteira em relação à demanda.

5-     Criar um núcleo binacional de planejamento turístico, responsável pela busca de recursos nacionais, internacionais e do setor privado (elaboração de projetos, programas ações e estratégias) e para realização de estudos técnicos (diagnósticos, pesquisas, publicações científicas, entre outros). Esse núcleo poderá ser criado através da articulação entre os municípios e as instituições de ensino superior dos locais.

6-     Fazer uma gestão dos prestadores de serviços turísticos, criando um banco de dados, referente ao funcionamento, preços e qualidade dos serviços prestados.

7-     Gerar programas de capacitação para mão-de-obra turística (formação, especialização e aperfeiçoamento), num nível básico, médio ou superior.

As propostas acima são estratégias que visam uma integração das ações das duas municipalidades no que toca ao planejamento turístico, nos quais devem buscar promover o desenvolvimento harmonioso do espaço turístico, visando incrementar a demanda e as vendas.

Como foi comentado nesse estudo é recente acentuação das relações sociais e econômicas na devida fronteira, sendo que elaboração em conjunto de políticas públicas (vem sendo realizadas políticas integradas na área da vigilância sanitária) são mais recentes ainda, fator esse que poderá ser um empecilho para o desenvolvimento das ações propostas, algumas ações já vem sendo realizadas no âmbito local como (promoção, divulgação, alguns programas de capacitação de mão-de-obra). O município de São Borja a partir de sua integração na Rota Missões vem realizando estratégias visíveis no planejamento turístico local, já possuindo um plano turístico municipal.

Notas  

[1] Primeiro dos Sete Povos das Missões, fundado em 1682, que ainda eram completados pelas Reduções de: São Miguel Arcanjo, São João Batista, São Lourenço, São Ângelo Custódio, São Nicolau e São Luiz Gonzaga.

[2] São Borja/ RS, foi á primeira localidade do país a ser invadida pelas tropas paraguaias, comandadas pelo Ditador Solano Lopez, no data de 10 de junho de 1865.

[3] Também abriga o corpo de Leonel Brizola, importante líder trabalhista, que Governador dos Estados do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro.

[4] São Borja está localizada na Região da Campanha e na Fronteira-Oeste do RS, áreas que tem suas economias baseadas na lida do campo, voltadas para a pecuária e diversos cultivos agrícolas. Essas regiões supra citadas são conhecidas por cultivarem ferrenhamente as tradições gaúchas valorando a dança, artesanato, músicas, indumentárias, etc.

[5] Brasil. Ministério do Turismo, 2008, p.23.

[6] As balças eram a forma de transporte utilizada entre os dois locais, podendo salientar ainda outras formas de embarcações de pequeno porte (caiques, barcos). As relações comerciais desenvolvidas com a utilização de embarcações é conhecida por comércio formiga.

[7] Veículos leves Internacional - Trànsito de carros, motos e ònibus que cruzaram a fronteira, tanto do Brasil como da Argentina, com a placa de fora.

[8] As pessoas que vem passar as férias de verão em São Borja, geralmente não passam a fronteira com seus veículos, por terem que pagar uma tarifa alfandegária mais cara, em virtude de possuírem placas de outras localidades.

[9] Ver quadro 1, fluxo de veículos leves internacionais na Aduana integrada de fronteira.

[10] Carros, motos e ônibus com placas de São Borja e Santo Tomé.

[11] Denominação que é dada para quem é natural de São Borja/ RS.

[12] Atração que vem atraindo um grande contingente de são-borjenses.

[13] O “Formigueiro” foi um local argentino tradicional nas relações comerciais entre São Borja e Santo Tomé, na época em que o transporte sobre o Rio Uruguai era feito através das balças.

[14] Construção civil, construída no primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso, possuindo o único Centro Unificado de Fronteira da América Latina.

[15] Na Argentina as cervejas são engarrafadas em vasilhames de 1000 ml ( 1 litro ), o que acaba aumentando a sua comercialização para os brasileiros.

[16] Contam os mais antigos, que muitos estudantes são-borjenses que residiam em Porto Alegre/ RS, faziam alguns trabalhos informais na capital gaúcha, vendendo calças jeans procedentes da Argentina.

[17] Dentro do contexto do estudo concluiu-se que Santo Tomé possui um contingente de atrativos patrimoniais relacionados com o período reducional em maior escala comparado com São Borja.

[18] Possuem uma tipologia do acervo variada (estatuárias, peças arqueológicas, artes visuais, estudo papel) e uma satisfatória quantidade de objetos museológicos).

[19] Os monumentos identificados com a valorização das Reduções jesuíticas aparecem em maior escala em Santo Tomé.

[20] Tanto em São Borja como em Santo Tomé se realiza festivais musicais. Um dos instrumentos mais utilizados nessas festividades é o acordeón (gaita), introduzido na região pelos jesuítas, que ensinavam os índios os procedimentos para sua fabricação. Está técnica continua sendo utilizada na Província de Corrientes, constituindo-se numa das principais matérias-primas do artesanato correntino.

[21] Tanto o gaúcho argentino como o uruguaio é conhecido como gaucho.

[22] Ver figura 10.

[23] m São Borja realiza-se a Ronda de São Pedro (renomado festival de musicas nativistas que reúne artistas renomados de diversas regiões do RS e do Brasil), a Barranca (festival musical que possui como local de sua realização as margens do Rio Uruguai). Em Santo Tomé realiza-se o Festival do Folclore correntino.

[24] Ver figuras 8 e 9.

[25]Líder argentino responsável pela libertação da América espanhola.

[26] Os imóveis antigos constituem-se nos atrativos que apareceram em maior escala no devido inventário (ver mapa patrimonial).

[27] Localizam-se nas áreas centrais das cidades (propriedade de classes sociais de maior poder aquisitivo).

[28] Localizam-se em áreas periféricas das municipalidades.

[29] Processo realizado para libareção da carga.

[30]Segundo, IPHAN, IAPH,URI, 2009.

 

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[Edición electrónica del texto realizada por Laura Oliva Gerstner]



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Ficha bibliográfica:

PINTO, Muriel. Integração economica-cultural como subsídio para o planejamento turístico da área de fronteira São Borja-Brasil / Santo Tomé-Argentina. Biblio 3W. Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales. [En línea]. Barcelona: Universidad de Barcelona, 30 de septiembre de 2010, vol. XV, nº 890. <http://www.ub.es/geocrit/b3w-890.htm>. [ISSN 1138-9796].