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REVISTA BIBLIOGRÁFICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona 
ISSN: 1138-9796. Depósito Legal: B. 21.742-98 
Vol. XV, nº 895 (24), 5 de noviembre de 2010

[Serie  documental de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana]

 

A CIDADE METROPOLITANA DO RIO DE JANEIRO E AS PERSPECTIVAS COM OS JOGOS OLÍMPICOS

 

Floriano Jose Godinho de Oliveira
Profesor de la Universidade do Estado do Rio de Janeiro


Recibido: 15 de mayo de 2010. Devuelto para revisión: 18 de agosto de 2010. Aceptado: 30 de septiembre de 2010.


A cidade metropolitana do Rio de Janeiro e as perspectivas com os Jogos Olímpicos (Resumo)

A organização dos jogos olímpicos na cidade de Barcelona, de 1986 até 1992, demonstrou a viabilidade de associar os investimentos públicos destinados ao evento com recuperação e ampliação da infraestrutura e serviços urbanos na cidade. Indo além das expectativas, a estratégia da administração pública da cidade de Barcelona, que também exercia forte influência na administração da área metropolitana, por meio da presidência da Corporação Metropolitana, deixou um importante legado em termos de infraestrutura e urbanização em seu espaço metropolitano. Isso demonstra que a gestão democrática dos recursos destinados às obras olímpicas, deve deixar um legado social não só à cidade do Rio de Janeiro, mas para toda a população que habita essa metrópole.    

Palavras chave: cidade metropolitana, área metropolitana, metropolização


The city Rio de Janeiro's metropolitan and prospects with the Olympic Games (Abstract)

The Olympic Games’ organization in the city of Barcelona, from 1986 to 1992, demonstrated that associating public investments addressed to the event with recovery and enlargement of infrastructure and urban services in the city is viable. Going beyond expectations, the strategy of the city of Barcelona’s public administration, that exerted strong influence in the public administration of the metropolitan area as well, through the presidency of Metropolitan Corporation, left an important legacy in terms of infrastructure and urbanization of its metropolitan space. That demonstrates that a democratic management of resources destined to Olympic works, should leave a social legacy not only to the city of Rio de Janeiro, but to the population living in this metropolis.

Key words: metropolitan city, metropolitan area, metropolization


Os Jogos Olímpicos geram muitas expectativas quanto à produção de novos equipamentos e serviços urbanos na cidade que abriga o evento, bem como propicia uma excelente oportunidade de revisão dos projetos e planos urbanísticos presentes no ordenamento do território. Essa expectativa se amplia quando consideramos que os jogos, embora concentrados em uma cidade, envolvem uma rede de serviços e infra-estrutura que atravessa toda a metrópole. Consideramos metrópole um espaço muito além da cidade central que lhe dá origem, pois, são assim consideradas porque se constituem como “uma mancha urbana” e que forma o que podemos caracterizar como um aglomerado urbano ou área metropolitana.

Para preparar a cidade, são seis anos de obras para a produção da infra-estrutura específica para os jogos, como alojamentos, centrais de abastecimentos, centros de comunicação, complexos poliesportivos, estádios, recuperação de lagoas etc. Mas, a preparação exige também a produção de equipamentos e ampliação dos serviços para atender aos milhares de turistas que habitarão a cidade durante o evento. Há que se ampliar e modernizar os meios de transportes coletivos para a rápida e eficiente circulação das pessoas, adequar suas instalações de atendimento de saúde emergencial e hospitalar, ampliar seu sistema de segurança pública, treinar e especializar milhares de pessoas para a gestão dos serviços etc.

Para tudo isso ocorrerá muitos investimentos públicos, com recursos oriundos de todas as escalas de gestão e administração pública: local, estadual, nacional e, em grande medida, internacional. Esses recursos, por serem públicos, devem ser usados com vistas ao futuro, para além dos jogos olímpicos, pois todos os investimentos ficaram para sempre na cidade e devem ser coerente com o espírito olímpico: promover a integração social e procurar melhorar a qualidade de vida dos cidadãos que habitam a cidade.

A preocupação com o legado social dos jogos deveria ser o sentimento alimentador das ações e decisões dos membros do comitê e todos os demais responsáveis pela organização dos jogos. Todavia, pelo menos em termos de fazer avançar a democratização das decisões e definições espaciais das localizações dos equipamentos e locais de realizações dos jogos, não há nada de olímpico no comitê gestor desses jogos. Em 2016 os jogos se realizarão exclusivamente nos limites territoriais da cidade do Rio de Janeiro e, certamente, mobilizarão seus 6 milhões de habitantes. Mas, evidentemente, o evento influirá na vida de todos os 11 milhões que habitam a área metropolitana do Rio de Janeiro. Assim, defendemos que os investimentos que serão realizados devem ter em conta toda a população e a cidade real, que, há muito apresenta um tecido urbano já bastante integrado e que forma uma mesma unidade urbana com os dezenove municípios vizinhos, que compõem a área metropolitana do Rio de Janeiro. 

Para demonstrar a intensidade das relações e fluxos cotidianos entre essas cidades, destacamos um indicador que contribui na explicitação do grau de integração e dependência existente entre esses municípios. Enquanto na cidade do Rio de Janeiro apenas 1,24% da população economicamente ativa, entre 15 a 65 anos, que trabalha ou estuda, o fazem fora de seu município. Nos demais municípios de sua área metropolitana esse índice é alarmante, acima de 30%, o que demonstra a alto índice de deslocamento diário forçado da força de trabalho residente nessa metrópole. Em alguns municípios, como Japeri, o deslocamento diário é de 46% da PEA; nos municípios de São João, Nilópolis e Mesquita o deslocamento forçado chega a 44% dos que trabalham ou estudam e em municípios com Itaboraí, São Gonçalo e Queimado a migração diária varia entre 35 e 38% da PEA[1].

Dados como esses indicam a necessidade de discutir essa realidade sócio-espacial a partir de algumas questões mais abrangentes: (i) qual é, hoje em dia, o real limite territorial da cidade e, por que não dizer, da metrópole do Rio de Janeiro? (ii) Como a estrutura urbana do Rio de Janeiro é de uma concentração muito elevada de moradores por Km2, não seria mais correto projetar a infra-estrutura para circulação durante os jogos olímpicos em direção a metrópole, para o interior, e não para um único bairro, litorâneo, que concentrará grande parte dos jogos? (iii) A concentração dos investimentos na Barra da Tijuca não gerará, no futuro, uma densidade populacional muito acima do normal, como hoje ocorre com Copacabana ou outros bairros da zona sul?

A resposta a essas indagações é uma só: tanto o prefeito da cidade quanto o governador do estado do Rio de Janeiro não conseguem, ou não têm interesse, em se desvencilharem do domínio dos setores imobiliário e de transportes, que influem nas decisões referentes às políticas públicas na metrópole. O planejamento na cidade, definitivamente, não está voltado para os interesses de sua população.          

Vamos focar nossa reflexão no que nos parece a mais aviltante das decisões tomadas até agora. Segundo estatísticas da Prefeitura do Rio de Janeiro, em 2005, 76,47% dos deslocamentos diários em transportes de massa na cidade do Rio de Janeiro são feitos em ônibus, 11,67% em metrô e 8,54% em trens urbanos[2]. Para os jogos olímpicos, segundo o Comitê Executivo, dos 29 bilhões de reais que serão investidos na preparação da cidade, 40% será aplicado no setor de transportes, ou seja, algo em torno de 11 bilhões de reais. A maior parte desse recurso será aplicada na produção de três corredores expressos de ônibus, ironicamente batizados BRT (Bus Rapid Transit), ou seja, corredores expressos de ônibus segregados do tráfego comum. Mais irônico ainda é que um desses corredores será produzido sobre o traçado de uma antiga proposta de metrô de superfície, algo similar ao tram de Barcelona.

Os recursos destinados ao Metrô serão para estender a linha em direção à Barra da Tijuca, que deverão estar concluídas em 2016. Nenhum centavo será gasto para ampliar a rede em direção ao interior da cidade. A rigor, o que estamos presenciando é uma política de valorização do preço da terra e, conseqüentemente do mercado imobiliário, na área de expansão de habitação de alta renda na cidade, que é a Barra da Tijuca. Todos os projetos viários são para melhorar o acesso ao bairro: os três BRT tem como função facilitar a circulação interna e o acesso à Barra da Tijuca; a expansão do metrô é em direção ao bairro; a ampliação do sistema de rodovias é destinado a construir o corredor TransOeste, com a abertura do túnel da Grota Funda, facilitando o acesso a Santa Cruz e à saída sul da cidade. Enfim, é como se o restante da cidade não existisse ou que não houvesse nenhum problema a ser enfrentado.

Em uma cidade com o altíssimo número de habitação em favelas, o assunto só é tratado pela ótica da remoção do entorno das áreas em que serão realizados os jogos.

Acreditamos que, mantido o que tem sido anunciado até o momento, a cidade metrópole perderá a melhor oportunidade de conter e, em alguma medida, diminuir o quadro de problemas existentes. Por exemplo, invertendo a ordem de prioridade em transportes rodoviários, ampliando os sistemas ferroviários e metroviários; direcionando as políticas públicas de segurança para o conjunto da metrópole, em vez de apenas para o entorno das quatro áreas onde se concentrarão os jogos; ampliando os sistemas de atendimento médico-sanitário dos hospitais públicos de referência, em vez de realizar investimentos em convênios e subsídios aos setores privados de saúde.

Enfim, o que devemos reivindicar é que os recursos oriundos sejam aplicados para garantir a maior integração e melhoria geral dos serviços públicos de toda a metrópole. Consideramos que o sentimento que deve perdurar é que os jogos olímpicos não são “da” cidade, mas, “na” cidade núcleo da grande metrópole do Rio de Janeiro.

 

Notas

[1] IBGE, Censo 2000

[2] Instituto Pereira Passos, 2005.

 

Bibliografia

IBGE. Censo demográfico, 2000.

Jornal o Globo.<http://oglobo.globo.com/rio/mat/2009/11/21/corredores-prometem-revolucionar-transito-914870170.asp.>

Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro. Instituo Municipal de Urbanismo Pereira Passos. <http://www.rio.rj.gov.br/web/ipp>

 

[Edición electrónica del texto realizada por Miriam-Hermi Zaar]



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Ficha bibliográfica:

OLIVEIRA, Floriano Jose Godinho de. A cidade metropolitana do Rio de Janeiro e as perspectivas com os Jogos Olímpicos. Biblio 3W. Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, Vol. XV, nº 895 (24), 5 de noviembre de 2010. <http://www.ub.es/geocrit/b3w-895/b3w-895-24.htm>. [ISSN 1138-9796].