Biblio 3W
REVISTA BIBLIOGRÁFICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona 
ISSN: 1138-9796. Depósito Legal: B. 21.742-98 
Vol. XVII, nº 979, 5 de junio de
2012
[Serie  documental de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana]

 

ANÁLISE COMPARADA DOS PROGRAMAS ESTADUAIS DE AGROINDUSTRIALIZAÇÃO NA AGRICULTURA FAMILIAR BRASILEIRA (1995 – 2008)

 

Valdemar João Wesz Junior
Doutorando do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Sociedade e Agricultura pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ).
Assistente de Pesquisa do Observatório de Políticas Públicas para Agricultura (OPPA/CPDA/UFRRJ).  
jwesz@yahoo.com.br

Recibido: 20 de abril de 2011. Devuelto para revisión: 10 de septiembre de 2011. Aceptado: 10 de enero de 2012.


Análise comparada dos programas estaduais de agroindustrialização na agricultura familiar brasileira (1995 – 2008) (Resumo)

A partir do processo de democratização no Brasil, novos programas foram elaborados na perspectiva de construir mecanismos de intervenção governamental diferenciados para o meio rural[1]. O objetivo desse artigo é analisar as políticas públicas estaduais direcionadas às agroindústrias familiares no Brasil, observando comparativamente as continuidades e rupturas desses programas no que se refere aos instrumentos de intervenção implementados, ao perfil das iniciativas produtivas apoiadas e às características do público beneficiário. Os resultados deste trabalho apontam que os programas estaduais de agroindustrialização familiar têm desempenhado um papel importante no apoio às novas estratégias de reprodução dos agricultores no meio rural, mobilizando vários instrumentos de intervenção. Contudo, o alcance dos programas ficou centrado fundamentalmente nos agricultores familiares capitalizados, organizados e com uma trajetória no processamento dos produtos agropecuários.

Palavras chave: políticas públicas, meio rural e agroindústria familiar.


Análisis comparativo de los programas estaduales de agroindustrialización de la agricultura familiar brasileña (1995 – 2008) (Resumen)

A partir del proceso de democratización de Brasil, nuevos programas han sido desarrollados con el fin de crear mecanismos de intervención gubernamentales distintos para el medio rural. El objetivo de este trabajo es analizar las políticas estaduales dirigidas a la agroindustria familiar en Brasil, teniendo en cuenta las continuidades y rupturas de estos programas en lo que se refiere a los instrumentos implementados, al perfil de las iniciativas productivas incentivadas y a las características de los beneficiarios. Los resultados muestran que los programas estaduales de agroindustrialización familiar han desempeñado un papel importante en el apoyo a las nuevas estrategias de reproducción de los agricultores en las zonas rurales, movilizando diversos instrumentos de intervención. Sin embargo, el alcance de los programas se centra principalmente en los agricultores familiares capitalizados, organizados y con una trayectoria en la transformación de productos agrícolas.

Palabras claves: políticas públicas, medio rural e agroindustria familiar.


Compared analysis of state programs of agroindustrialization in brazilian family run agriculture (1995 – 2008) (Abstract)

New programs have been elaborated with the intent of building differentiated mechanisms of governmental intervention for the rural milieu since the process of democratization in Brazil.

The aim of this article is to analyze the state public policies directed to family run agroindustries in Brazil, observing comparatively the continuities and disruptions of these programs in relation to the implemented intervention instruments, the type of productive initiatives which were supported, and the features of the beneficiary public. The results of this paper point to the fact that state programs have performed an in important role in supporting new strategies for the reproduction of farmers in the rural milieu mobilizing several intervention instruments. Yet the reach of the programs was fundamentally centered in capitalized family farmers which were already organized and had a trajectory in processing agricultural products.

Key-words: public policies; rural milieu; family run agroindustry.


A partir do processo de democratização no Brasil, novos programas foram elaborados na perspectiva de construir mecanismos de intervenção governamental diferenciados para o meio rural, notadamente a partir da consolidação da agricultura familiar enquanto público prioritário. Nesse sentido, a década de 1990 tornou-se um marco no cenário das políticas brasileiras destinadas ao meio rural, principalmente pela inclusão de novos públicos beneficiários (pequenos produtores rurais, agricultores sem terra, indígenas, quilombolas, pescadores, mulheres, jovens rurais, etc.); pela introdução de uma nova forma de gestão das políticas governamentais (dimensão territorial, participativa e descentralizada); pela criação de novos focos de intervenção (combate à pobreza, promoção da segurança alimentar, apoio à infraestrutura, disponibilização de serviços básicos, redução dos impactos ambientais, etc.) e; pela inclusão de novas atividades e ocupações (agroindustrialização, artesanato, turismo rural, geração de energia, etc.).

Uma das atividades produtivas que ganhou espaço nas políticas públicas direcionadas ao meio rural a partir da segunda metade da década de 1990 foi a agroindustrialização em pequena escala. Essa ocupação passou a entrar na agenda de intervenção a partir da “convicção que se expandiu entre as organizações de representação da agricultura familiar de que esta não tinha mais espaço nas grandes cadeias de commodities, dada a tendência de exclusão ou a insuficiência dos níveis de renda gerados”[2]. Entretanto, o reconhecimento da agroindústria enquanto uma atividade fundamental na reprodução social da agricultura familiar não ficou restrito à pauta de discussão dos movimentos sociais, pois esta percepção passou a ser enfatizada em diversos espaços acadêmicos e político-governamental.

O reconhecimento da agroindústria familiar[3] enquanto uma estratégia de reprodução dos agricultores está vinculado com o seu caráter diferenciado, pois nesta atividade a inserção mercantil acontece de um modo distinto dos esquemas tradicionais de produção de commodities, uma vez que os produtores passam a desenvolver de forma conjunta a produção da matéria-prima, a agroindustrialização da produção e a comercialização do artigo final[4]. Esta perspectiva ganhou mais projeção diante da reestruturação dos mercados agroalimentares, onde se tornou crescente a demanda por produtos orgânicos, com denominação de origem e da agricultura familiar, que passaram a ser associados à tradição, à natureza, ao artesanal e ao local – conjunto de valores agora premiado pelo mercado consumidor[5]. Este contexto destaca a valorização dos produtos das pequenas agroindústrias, oferecendo aos agricultores de base familiar a oportunidade de adentrarem em mercados de nichos específicos.

Paralelamente, a agroindústria familiar tem se consolidado enquanto uma estratégia de desenvolvimento rural, haja vista a sua importância na geração de empregos no campo, no acréscimo da renda das famílias, na minimização da vulnerabilidade econômica dos agricultores, na redução do êxodo, na preservação das culturas e tradições locais, no fortalecimento do mercado de proximidade e na produção agroindustrial sobre bases mais sustentáveis[6]. Além disso, o beneficiamento da produção realizada pelos próprios agricultores tem papel ímpar no enfrentamento da oligopolização dos mercados e na redução dos preços presentes no sistema agroalimentar[7].

É importante ressaltar ainda que não estamos nos referindo a uma atividade sem expressividade ou com baixa importância econômica para o meio rural brasileiro. Fernandes Filho e Campos[8], baseando-se no Censo Agropecuário 1995/96, afirmaram a existência no Brasil de 887.411 propriedades familiares que processavam para venda algum tipo de produto, o que abrange 18,3% do total dos estabelecimentos nacionais. Em termos do valor das principais receitas, os produtos da agroindústria familiar somavam em torno de R$ 1,4 bilhão (aproximadamente 2,5% do PIB agropecuário e 6% do PIB gerado pela agricultura familiar em 1996). Além disso, a contribuição média do processamento para a renda familiar era de R$ 451,58 por propriedade (aproximadamente quatro salários mínimos).

A grande abrangência da agroindústria familiar no meio rural brasileiro, sua expressividade nas receitas nacionais e sua importância nas estratégias de desenvolvimento para o campo acabaram tornando-a objeto de políticas públicas nas mais diferentes escalas federativas (nacional, estadual e municipal). No plano federal foi criado em 1998, dentro do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), uma linha específica de crédito rural direcionada à implantação, apoio e fortalecimento de pequenas agroindústrias (Pronaf-Agroindústria). Além disso, em 2003, foi implementado o Programa de Agroindustrialização da Agricultura Familiar, que inovou ao intervir em múltiplas linhas de ação (financiamento, legislação, capacitação, tecnologia e comercialização) na escala federal.

Não obstante, a maior incidência tem sido de programas estaduais, que são favorecidos pela sua proximidade com os atores diretamente envolvidos na operacionalização das ferramentas de intervenção (assistência técnica, agências bancárias, etc.). Como a agroindústria familiar é uma atividade recente do ponto de vista da intervenção estatal e que ainda encontra um ambiente institucional desfavorável pela prematuridade das políticas públicas direcionadas ao seu apoio, é fundamental essa proximidade entre os gestores dos programas e o seu nível executivo. Desde 1995 até 2008 foram criados oito programas estaduais direcionadas às pequenas agroindústrias rurais no Brasil, distribuídas entre as regiões Sul (RS, SC e PR), Centro-Oeste (DF, MS e MT) e Sudeste (RJ e MG). 

O objetivo desse artigo é analisar as políticas públicas estaduais direcionadas às agroindústrias familiares no Brasil, observando comparativamente as continuidades e rupturas desses programas no que se refere aos instrumentos de intervenção implementados, ao perfil das iniciativas produtivas apoiadas e às características do público beneficiário. Para a realização da pesquisa foram utilizados documentos oficiais disponibilizados pelos programas, além de outras fontes secundárias que tratavam destes mecanismos de intervenção (trabalhos acadêmicos, materiais midiáticos, etc.).

O artigo mobiliza como abordagem analítica o referencial das políticas diferenciadas de desenvolvimento rural, que traz elementos de suma importância para compreender mudança no papel, no desenho e nas formas de intervenção direcionada ao campo brasileiro. Este exercício tem o intuito de situar o surgimento de programas diferenciados centrados nas atividades de agregação de valor, demonstrando a ruptura com as políticas agrícolas mais tradicionais, pautadas basicamente na oferta de crédito e na garantia de preços. 

As políticas diferenciadas de desenvolvimento rural

A segunda metade do século XX representou um marco no cenário das políticas públicas para agricultura brasileira. Neste período, novas ferramentas foram criadas e implementadas, sobressaindo-se até meados de 1990 o Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) e a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM). Embora cada instrumento tenha apresentado um peso diferenciado conforme o período, ambos os programas cumpriram um papel determinante na “transformação da base técnica dos estabelecimentos agrícolas, no aumento da produtividade do setor, na consolidação dos complexos agroindustriais e cadeias agroalimentares e na integração dos capitais agrários à orbita de valorização do capital financeiro”[9].  Com efeito, é consenso na literatura especializada que as políticas setoriais voltadas à agricultura privilegiaram os grandes e médios produtores, espacialmente localizados na região Sul e Sudeste do país e com produção destinada à exportação.

Esta orientação excluiu da política agrícola brasileira importantes segmentos das populações que viviam no meio rural e que estavam envolvidos com a atividade agropecuária. Assim, os produtores menos capitalizados tiveram pouco ou nenhum benefício dos programas setoriais, já que estes instrumentos não eram dirigidos aos grupos empobrecidos e não integrados à modernização produtiva[10]. A exclusão da maioria dos pequenos agricultores acontecia pelas próprias condições financeiras e operacionais, inadequadas para esse público[11]. Esta situação “avessa”, em especial no crédito rural, estava presente nas formas de pagamento do financiamento, nos elevados custos de transação, nas dificuldades com a transição burocrática, na ausência de avalistas e na alta aversão ao risco. Outro fator que refletiu sobre a baixa participação dos agricultores familiares no acesso ao crédito foi o desinteresse dos agentes financeiros em trabalhar com as operações de baixo valor[12].

O reconhecimento dos limites da política agrícola para os produtores menos capitalizados, o aumento das reivindicações dos movimentos sociais sobre a alteração do modelo de intervenção direcionado ao campo e o início do processo de redemocratização brasileira proporcionaram um ambiente fértil à discussão das “políticas diferenciadas de desenvolvimento rural” na segunda metade da década de 1980. Para Delgado[13], estes programas representam, em princípio, “tentativas de integração da política agrícola e agrária, procurando levar em conta a especificidade dos segmentos empobrecidos e não integrados do campesinato e a necessidade de desenhar políticas que atendam a suas particularidades”. Neste escopo, a atuação dos programas orienta-se para as regiões que enfrentam problemas de decadência econômica e marginalidade social, onde os beneficiários são conformados por setores mais frágeis e empobrecidos, situados em zonas rurais desfavorecidas[14].

Como o público dos programas diferenciados possui baixo rendimento produtivo, pouca capacidade competitiva e grande instabilidade econômica, o crédito barato e farto voltado simplesmente à questão agrícola (setorial) não basta por si só. Isso porque, são agricultores que apresentam várias dificuldades para sua reprodução social e que detém uma baixa qualidade de vida. Esta situação cria uma série de demandas nem sempre relacionadas à questão produtiva, pois existem pendências emergentes e intransferíveis. Portanto, o investimento exclusivo em crédito rural aos produtores empobrecidos pode ser uma ferramenta limitada que não auxilia na melhoria das suas condições de vida, servindo inclusive para reafirmar a situação de precariedade das propriedades[15]. Para Delgado, o que se faz necessário, suplementando o crédito, são estratégias de longo prazo que busquem superar as ineficiências estruturais. Para este autor, é fundamental que as políticas diferenciadas promovam a participação da população rural através da descentralização das atividades estatais, contemplando ações que reconheçam a heterogeneidade social e produtiva dos agricultores e de suas respectivas regiões[16].

Deste modo, mesmo que a maioria das políticas diferenciadas tenha incidido sobre as condições de produção, é consenso que o apoio não deve ser resumido a essa forma de intervenção, ou seja, é preciso atuar com outras ferramentas que propiciem aos atores beneficiados as condições materiais de reprodução da família e da propriedade[17]. Nesse sentido, Buainain ressalta a necessidade dos programas agirem a partir de várias entradas (produção, capacitação, assistência técnica, etc.), onde a comercialização não pode ser desconsiderada nas políticas direcionadas aos agricultores mais marginalizados. A atuação no acesso ao mercado deve desobstruir um dos principais gargalos presentes nas propriedades menos capitalizadas, já que a venda dos produtos em quantidades reduzidas e sem um elevado grau de padronização vai refletir no baixo preço pago, o que afeta diretamente a lucratividade dos agricultores[18].

Embora existam problemas e desafios no processo de criação e implementação das políticas diferenciadas para o meio rural são indiscutíveis os avanços presentes nesta esfera de intervenção nas últimas duas décadas[19]. A partir de 1985 e com maior ênfase na década de 1990, surgem alguns programas que se aproximam desta perspectiva menos tradicional de intercessão, onde o público atingido são os agricultores tradicionalmente marginalizados pelas políticas convencionais. Entre os mecanismos de apoio implementados, podem ser citados: o Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o Programa de Geração de Emprego e Renda (Proger-Rural) e o Programa Especial de Crédito para a Reforma Agrária (Procera)[20]. Além destas intervenções, ganhou importância no espaço rural a política de previdência rural.

A partir destes programas precursores, novas ferramentas foram sendo criadas, implementadas e melhoradas, passando a incluir novas atividades e ocupações (agroindustrialização, artesanato, turismo rural, atividades não-agrícolas, etc.). Observando esta trajetória, podemos dizer que os programas direcionados ao meio rural passaram por transformações no cenário recente, perdendo em parte aquela visão exclusivamente setorializada, creditícia e elitizada. Contudo, é preciso reconhecer que os mecanismos de apoio pautados na agricultura, instrumentalizados através dos financiamentos e focalizados para os grandes proprietários, ainda continuam sendo majoritários no montante de recursos aplicados (enquanto que na safra 2010/11 foram disponibilizados R$ 16 bilhões de crédito para os produtores familiares brasileiros, na agricultura empresarial esse valor alcançou R$ 100 bilhões). Mesmo assim, as políticas públicas diferenciadas apresentaram avanços de grande envergadura na trajetória brasileira, embora seja um processo em construção e com muitas pendências a serem contornadas.

Uma das atividades a ganhar espaço nas políticas públicas direcionadas ao meio rural a partir da segunda metade da década de 1990 foi a agroindustrialização em escala familiar. Raupp aponta que a matriz de sustentação desta ocupação está calcada no campo econômico – por ser uma estratégia produtiva e de geração de renda centrada na agregação de valor à produção agropecuária – e social – pela geração de uma série de externalidades positivas para a comunidade local[21]. Neste sentido, os “empreendimentos agroalimentares de pequeno e médio porte constituem um componente central para uma estratégia de desenvolvimento assentada em atividades econômicas promotoras de eqüidade e de inclusão social, em bases sustentáveis”[22].

Realizada a contextualização das políticas diferenciadas de desenvolvimento rural e a inserção das atividades de agregação de valor nas suas agendas, passaremos a análise dos programas estaduais direcionadas às agroindústrias familiares no Brasil.

Programas de agroindustrialização da produção na agricultura familiar: as políticas estaduais

Entre 1995 e 2008 foram criadas oito políticas públicas estaduais direcionadas às agroindústrias familiares no Brasil, distribuídas entre as regiões Sul (RS, SC e PR), Centro-Oeste (DF, MS e MT) e Sudeste (RJ e MG), conforme pode ser visto no Quadro 1 e na Figura 1. Isso significa que 72% dos Estados pertencentes a essas três regiões criaram ferramentas específicas para a agregação de valor, o que demonstra o comprometimento dos governos com a iniciativa produtiva. Entretanto, nenhum programa foi encontrado nas federações do Norte e Nordeste brasileiro, apontando para um processo desigual na distribuição espacial das políticas públicas de agroindustrialização. Esta ausência está vinculada a múltiplos fatores, que inclui desde a falta de interesses políticos para desenvolver a agregação de valor, a presença de outras prioridades de incentivo pelas políticas públicas, a baixa mobilização das organizações sociais no apoio a esta atividade, a insuficiência de recursos financeiros mobilizados pelos estados, entre outros.

 

Figura 1 – Estados brasileiros com programas de agroindustrialização para agricultura familiar
Fonte: Elaboração do autor.

 

Quadro 1 - Programas estaduais de agroindustrialização na agricultura familiar brasileira

 

Nome do Programa

Sigla

Estado

Ano de atuação

1

Programa de Verticalização da Pequena Produção Agrícola

PROVE

DF

1995-1998

2

Programa de Verticalização da Pequena Produção Agropecuária

PROVE – PANTANAL

MS

1999-2006

3

Programa da Agroindústria Familiar

PAF

RS

1999-2002

4

Programa de Desenvolvimento da Agricultura Familiar pela Verticalização da Produção

DESENVOLVER

SC

1998-2001

5

Programa da Agroindústria Familiar Fábrica do Agricultor

FÁBRICA DO AGRICULTOR

PR

1999-2010

6

Programa Social de Promoção de Emprego e Renda na Atividade Rural

PROSPERAR

RJ

2002-2010

7

Programa de Apoio à Agregação de Valor e Desenvolvimento Rural

PROVEMAIS

MT

2003-2010

8

Programa de Desenvolvimento da Agroindústria Artesanal de Alimentos e do Artesanato Rural

MINAS ARTESANAL

MG

2006-2010

Fonte: Elaboração do autor.

 

Ainda que os programas apresentem alguma similaridade no foco de atuação e na estrutura de intervenção, cada política mantém suas particularidades. Diante disso, optamos por apresentá-las de modo individual.

Programa de Verticalização da Pequena Produção Agrícola (Prove/DF) – 1995 a 1998

A primeira iniciativa governamental direcionada especificamente às agroindústrias familiares aconteceu no Distrito Federal através do Programa de Verticalização da Pequena Produção Agrícola (Prove/DF), que foi implementado entre 1995 e 1998 durante o Governo Cristovam Buarque e coordenado pela Secretaria da Agricultura do Distrito Federal (SADF). Este mecanismo de intervenção foi planejado a partir de uma situação emblemática de pobreza rural que assolava uma significativa parcela dos agricultores do DF, que eram excluídos de qualquer política pública de foco econômico e produtivo[23].  A partir deste contexto, começou a ser articulado um programa de geração de renda e emprego através da produção verticalizada. Deve-se considerar ainda o empenho particular do então secretário da agricultura, que por ter experiência na atividade de agroindustrialização foi um dos principais responsáveis pela criação do Prove/DF[24].

O objetivo geral do Prove/DF era “inserir o pequeno produtor rural no processo produtivo, com incentivos à produção e ao processamento dos produtos in natura de origem animal e vegetal, de modo a agregar valor à produção, aumentar a renda familiar e gerar empregos”[25]. As metas iniciais do programa previam a instalação de 300 agroindústrias de base familiar, a geração de 2.400 empregos diretos e o envolvimento de mais de 5.000 pessoas[26]. Embora as atividades do Prove/DF tenham iniciado em 1995, ele só foi institucionalizado no início de 1998, pela Lei n. 1.825.

O público beneficiário do Prove/DF ficou delimitado nos “produtores rurais excluídos” que obedeciam aos seguintes critérios: 80% da renda líquida deveria ser originada do meio rural, a renda per capita líquida não poderia ser superior a 1/2 salário mínimo (R$ 50,00 para aquele período), a mão-de-obra exógena precisaria ser menor ou igual ao trabalho familiar, a área agricultável não poderia superar 20 hectares e a moradia deveria ser na propriedade ou próxima dela[27].

As estratégias de implementação do Prove/DF voltaram-se para cinco grandes eixos: oferta de crédito rural, modificação das legislações, capacitação dos agricultores, acesso ao mercado e disponibilização de tecnologias apropriadas. Ambas as iniciativas foram construídas visando preencher as principais dificuldades encontradas pelas agroindústrias no seu estágio inicial.

A disponibilização de uma linha de crédito para a construção das agroindústrias familiares foi uma das iniciativas do Prove/DF de maior visibilidade, principalmente pelo fato desta ser uma atividade recente para a maioria dos beneficiários e por contemplar um público com baixos níveis de renda. Entre 1995 e 1998 o programa passou por diferentes fases nas condições de financiamento, ampliando os valores dos projetos, o período de carência e o prazo de pagamento, além de incorporar a correção monetária na taxa de juros. Paralelamente, a fonte dos recursos foi alterada, pois inicialmente era oriunda do Banco de Brasília, depois passou para o Pronaf e, por fim, foi para o Funsol (Fundo de Solidariedade para Geração de Emprego e Renda)[28].

A necessidade de mudanças no crédito rural foi fruto da prematuridade do Prove/DF, que não possuía um ambiente institucional e organizacional propício para o apoio às agroindústrias familiares. Além disso, foram poucas as inovações na desburocratização do acesso ao financiamento, principalmente pelo desinteresse do Banco de Brasília em trabalhar com a população “excluída”[29]. Paralelamente, a incorporação da correção monetária na taxa de juros no último período do programa acabou inviabilizando o oferecimento do crédito em condições diferenciadas para o público descapitalizado e sem garantias patrimoniais, tornando o Prove/DF menos atrativo e indiferente dos demais financiamentos. Até o final do programa foram financiadas 120 agroindústrias através de 134 contratos, sob um montante de R$ 873.504,59[30].

 Além do crédito, o Prove/DF desenvolveu ações no campo das legislações, atuando em duas frentes. Na primeira frente, as ações acompanharam as agroindústrias durante a sua criação até a sua formalização, realizando a vistoria prévia e a inspeção dos estabelecimentos, além da análise da qualidade dos produtos. Na segunda frente, procurou-se ajustar as normas da legislação às condições do público atingido pelo programa[31]. Dentro deste segundo eixo destaca-se um significativo avanço na legislação sanitária para produtos de origem vegetal, que flexibilizou sensivelmente a sua inspeção, e a estratégia de regularização das agroindústrias enquanto microempresa, reduzindo a incidência de imposto de 17% para 4%. Essa segunda ferramenta atingiu um resultado significativo, pois cobriu 40% das unidades de beneficiamento vinculadas ao Prove/DF.

Outra estratégia disponibilizada foi a capacitação e o treinamento dos agricultores envolvidos no programa. Em termos quantitativos os resultados destas ações foram muito significativos, pois atingiram 92% dos produtores beneficiados pela política[32]. Entretanto, foram observados alguns problemas com os técnicos que capacitavam os produtores, já que muitos não estavam preparados para trabalharem com essa atividade (que envolve desde produção e processamento até legislações e comercialização) e com esse público (pois existiam agricultores analfabetos).

De forma complementar as iniciativas supracitadas, o Prove/DF teve uma preocupação muito forte com a comercialização dos produtos. Entre as várias estratégias utilizadas pelo programa, devemos destacar a disponibilização de transporte para o recolhimento das mercadorias, análise de qualidade, viabilização dos espaços de venda (Quiosques dos Produtores, Ceasa, rede de mercado estatal e a negociação com outros estabelecimentos comerciais), estratégias de marketing (a criação do selo “Prove: Produtos de Brasília”) e aquisição de embalagens e insumos.

Por último, cabe destacar as ações do Prove/DF no campo das tecnologias e infraestrutura. Uma das preocupações dos gestores do programa foi oferecer aos agricultores construções de baixo custo para que o empreendimento se tornasse viável no curto prazo. Além disso, foram obtidos alguns resultados na adaptação de equipamentos para a pequena escala, fruto de um convênio com o CNPq. Contudo, um dos problemas de maior envergadura nessa instância não estava no interior da agroindústria, mas na infraestrutura básica (água de qualidade, energia elétrica, estradas e transporte)[33].

Até o final de 1998 foram implantadas 120 agroindústrias no Distrito Federal (40% das metas), beneficiando diretamente 178 famílias e criando 712 postos de trabalho. O volume de recursos utilizados chegou ao montante de R$ 1,9 milhão[34]. Embora os valores tenham ficado abaixo das metas, os resultados do Prove/DF foram expressivos, seja em relação ao público atingido pela política, seja pelo tipo de iniciativa produtiva apoiada ou pelo perfil diversificado das estratégias de intervenção desenvolvidas.

Entretanto, com a posse do novo governo no Distrito Federal em 1999 o Prove deixou de existir[35]. Essa medida abalou grande parte das agroindústrias, principalmente aquelas em construção, pois acarretou o fechamento dos pontos de comercialização, a retirada do transporte que levava os produtos da agroindústria até o comércio, a saída da assistência técnica, o rompimento com a fonte de financiamento, etc.[36]. O encerramento das atividades do programa provocou, um ano após o seu encerramento, o fechamento de 10% das suas unidades. Nesse mesmo período, 53% das agroindústrias permaneciam em funcionamento, enquanto que as demais estavam em construção e sem muitas perspectivas com o término do Prove/DF[37].

Já no final de “2003 todas as agroindústrias do Prove/DF haviam encerrado suas atividades regulares”[38]. Esta situação é reflexo da ausência de uma estratégia sustentável e de médio prazo no momento em que a política foi operacionalizada, pois a maioria das ações do programa ficou centralizada e dependente do governo. Um exemplo disso foi a venda das mercadorias, onde “o Estado assumia, quase que totalmente, a comercialização dos produtos, pois comprava sempre toda a sua produção através da rede de supermercados estatal. Desta maneira, o produtor acomodou-se e passou a dirigir seus esforços somente para a fase de produção, descuidando do resto da cadeia”[39]. Assim sendo, a superproteção do governo com os agricultores mais marginalizados acabou prejudicando a continuação das agroindústrias com o encerramento do Prove/DF.

Mesmo que os resultados tenham praticamente desaparecido atualmente, não é possível deixar de lado o êxito do Prove/DF em alguns aspectos. Neste sentido, destaca-se a sua iniciativa precursora, já que foi a primeira política de maior envergadura destinada especificamente às agroindústrias familiares. O ônus disso foi o elevado grau de dificuldade e limitação enfrentado pelo programa, já que não existia nenhuma ferramenta semelhante que permitisse um aprendizado anterior, ao mesmo tempo em que existia um ambiente institucional e organizacional imaturo para esse tipo de iniciativa. Além disso, o público beneficiado pelo Prove/DF era formado por agricultores excluídos dos processos sócio-econômicos e das políticas públicas presentes até então, o que dificultava ainda mais a sua operacionalização diante dessas especificidades.

Mesmo com este resultado pouco animador no número de unidades em funcionamento após 10 anos de seu encerramento, deve-se destacar que o Prove/DF serviu de base e estímulo para a criação de novos programas com esse enfoque, principalmente no âmbito estadual (Prove/Pantanal, ProveMais, PAF, etc.), os quais serão analisados a seguir.

Programa de Verticalização da Pequena Produção Agropecuária do Estado do Mato Grosso do Sul (Prove/Pantanal) – 1999 a 2006

O Programa de Verticalização da Pequena Produção Agropecuária do Estado do Mato Grosso do Sul (Prove/Pantanal) foi criado em 1999 durante o primeiro Governo José Orcírio Miranda dos Santos (Zeca do PT) e foi coordenado pela Secretaria de Estado da Produção (Sedrop). A criação da política foi impulsionada pela exclusão de uma significativa parcela de pequenos produtores que deixaram de ter acesso ao mercado de produtos in natura diante da globalização dos mercados[40]. Com isso, a agregação de valor passou a ser interpretada como uma alternativa a esse cenário, estimulando a incorporação do Prove/DF no Mato Grosso do Sul a partir da sua adaptação às condições estruturais, institucionais e organizacionais.

Conforme o Decreto n. 9.983 que criou o Prove/Pantanal, o objetivo dessa política foi inserir o pequeno produtor rural no processo produtivo, concedendo-lhes incentivos à produção e ao processamento dos produtos in natura de origem animal e vegetal, de modo a agregar maior valor a estes, aumentando a renda familiar, fixando a família na terra e gerando empregos no campo. A meta inicial, para o final de 2002, era financiar 340 agroindústrias familiares individuais e 10 agroindústrias coletivas.

Embora o Prove/Pantanal tenha perdurado por oito anos, durante os dois mandatos do governador Zeca do PT, ficou evidente a ruptura na concepção do programa entre o primeiro (1999-2002) e o segundo mandato do governo (2003-2006). Reconhecendo a necessidade de tratar essa política a partir dos seus diferentes momentos, será discutido inicialmente o primeiro período e, posteriormente, serão apontadas as mudanças sofridas nos rumos do Prove/Pantanal a partir de 2003.

Entre 1999 e 2002 o público-alvo voltava-se para os “pequenos produtores rurais excluídos” enquadrados em critérios semelhantes aos descritos no Distrito Federal. A diferença estava na ampliação da renda dos beneficiários (que era de ½ salário mínimo bruto per capita no Prove/DF e que no Prove/Pantanal passou para um salário) e na necessidade dos agricultores produzirem, pelo menos, 50% da matéria-prima a ser processada. Ambas as medidas foram incrementadas para amenizar dois problemas encontrados na política precursora: público muito pobre que precisa de ações de médio prazo, o que dificulta a continuação das atividades após o término de um programa de quatro anos; muitas agroindústrias acabaram fechando porque dependiam exclusivamente da matéria-prima externa à propriedade. Nesse sentido, o programa sul-mato-grossense utilizou a experiência do Distrito Federal para avançar na configuração do público-alvo.

Assim como no Prove/DF, as ações implementadas pelo Prove/Pantanal podem ser agregadas em cinco grupos: crédito, legislação, infraestrutura, comercialização e capacitação. Dentre essas iniciativas, a concessão de financiamento para os agricultores foi a que obteve maior atenção por parte dos gestores durante o primeiro período do programa, sendo concebido como uma estratégia fundamental para o desenvolvimento das agroindústrias familiares. O crédito ofertado pelo Prove/Pantanal teve como fonte de recursos, até o final de 2002, o Fundo de Investimento Social (FIS)[41] e a intermediação bancária estava sob a responsabilidade do Banco do Povo[42]. Para o acesso ao financiamento não era exigida nenhuma garantia material, somente a comprovação do enquadramento e a presença de um avalista[43], além de um projeto de viabilidade financeira do empreendimento – que nem sempre apresentava qualidade técnica[44].

Além do crédito rural, foram dispensadas algumas ações sobre a alteração das legislações, cuja medida de maior envergadura foi a diferenciação do tratamento tributário ao pequeno produtor rural participante do Prove/Pantanal, dispensado do pagamento de ICMS (Decreto n.10.310 de 4 de abril de 2001). Complementarmente, foi oferecido um apoio técnico para a legalização da atividade através da obtenção da licença sanitária e ambiental[45]. Mesmo com essas medidas, o tempo de fiscalização por parte dos órgãos responsáveis era demasiadamente longo, ocupando todo o período de carência do crédito.

Outra esfera que ganhou destaque no Prove/Pantanal foi a de infraestrutura, que se baseou inicialmente nos moldes do Prove/DF: prédio pré-fabricado de fácil transporte que atendia as exigências requeridas pela fiscalização. Entretanto, a maioria dos produtores selecionados se mostrou contrário a utilização desse tipo de edificação, o que fez com que os gestores do programa revissem as estratégias desenvolvidas nessa área[46]. Com a reorientação, muitos empreendimentos foram construídos fora das normas sanitárias e ambientais, o que condicionou no encerramento de uma parcela significativa de empreendimentos após a sua fiscalização[47].

As ações implementadas no campo da comercialização foram estruturadas em três linhas: a primeira linha se centrou nas atividades pré-venda (criação e confecção de rótulos, escolha e aquisição das embalagens, etc.); a segunda linha esteve voltada na divulgação dos produtos por meio do Selo Prove/Pantanal e; a terceira linha se deteve no apoio à comercialização através dos mercados locais, supermercados, feiras, exposições, pontos turísticos, etc.[48]. Embora o acesso ao mercado tenha ganhado destaque no primeiro período do programa (1999 a 2002), uma avaliação feita pelos gestores apontou que as maiores dificuldades encontradas pelos agricultores estiveram vinculados com esse elo da cadeia produtiva.

A última esfera de ação do Prove/Pantanal voltou-se ao acompanhamento técnico dos agricultores, onde foram oferecidos cursos de boas práticas na fabricação, manipulação de alimentos, gerenciamento, etc.. Nessa linha de intervenção, assim como nas demais, eram beneficiados somente os produtores que haviam acessado o crédito para a agroindústria, o que sugere que o programa tenha sido voltado para a construção de novas unidades, deixando de fora as unidades já instaladas ou que não necessitavam de financiamento.

Até o final do primeiro período do Prove/Pantanal foram implantadas 175 agroindústrias (50% das metas), que beneficiaram diretamente 230 famílias de agricultores e geraram aproximadamente 620 ocupações. Além disso, 90% dos projetos eram individuais e 43% localizavam-se em assentamentos. O montante gasto pelo programa até o final de 2002 estava próximo dos R$ 3 milhões[49].

Embora os saldos do programa tenham sido significativos pela construção de várias agroindústrias familiares controladas por pequenos produtores rurais excluídos, os resultados posteriores do Prove/Pantanal foram frustrantes. Por um lado, muitas agroindústrias acabaram paralisadas pela falta de recursos ou por ordem dos órgãos de fiscalização; por outro lado, os níveis de inadimplência foram aumentando rapidamente, subindo de 20% em 2003 para 93% em 2006[50].

Em meio a este cenário, o programa chegou a um paradoxo: “continuar buscando a inclusão a qualquer custo, mesmo colhendo mais fracassos do que sucessos, ou partir para a busca de produtores com determinado perfil, de forma que se aumente a probabilidade de êxito. A alternativa escolhida foi a segunda”[51]. Portanto, em vez de readequar as ferramentas de intervenção e manter o foco inicial que fora herdado do Prove/DF, a versão pantaneira optou por deixar de lado o público excluído (e que naquele momento estava em uma situação ainda mais problemática, pois ficou endividado).

Esta opção é central para entender a conjuntura de transição do Prove/Pantanal entre o primeiro e segundo mandato. Diante do horizonte desanimador, os gestores perderam o enfoque nos agricultores excluídos, pois consideraram como opção mais favorável trocar de público em vez de alterar a forma de intervenção. Isso significou, na visão dos formuladores do programa, que o problema não estava na estrutura da política e sim na ineficiência ou na incapacidade dos beneficiários de potencializarem as oportunidades. Com esta decisão os gestores demonstram que o programa estava isento de reparação e que o não êxito aconteceu por causa do público. O exercício contrário (observar que o público estava delimitado, mas as ações foram incondizentes com as suas especificidades) foi desconsiderado, já que reformular o Prove/Pantanal a partir desta opção apresentava-se muito mais difícil e demandaria um esforço muito mais elevado para um governo recém reeleito.

A mudança no foco do Prove/Pantanal a partir de 2003 pode ser vista no apoio preferencial aos empreendimentos rurais já existentes e legalizados, deixando de lado a instalação de novas unidades e os estabelecimentos informais. Essa medida aumentou os resultados positivos obtidos pela política, pois restringiu suas ações nas unidades que praticamente independiam do Prove/Pantanal. Concomitantemente, o programa sofreu algumas modificações nos seus critérios de delimitação do público-alvo, passando a utilizar as normas do Pronaf, além da alteração do seu perfil, pois começou a buscar os “agricultores empreendedores”. Com este processo, o Prove passou a trabalhar com os produtores mais capitalizados e “preparados” para o envolvimento com as atividades de agroindustrialização.

Assim, as ações desenvolvidas pelo Prove/Pantanal no segundo mandato foram mantidas, ainda que tenham sofrido um generalizado enfraquecimento e algumas modificações nas esferas de atuação. O crédito é o melhor exemplo das alterações ocorridas, já que passou a ser vinculado totalmente ao Pronaf e, com isso, o agente financeiro ficou estabelecido no Banco do Brasil (BB). Ainda que as condições financeiras tenham se tornado mais atrativas (ampliação do montante de recursos, da carência e da data de pagamento), tornou-se mais difícil a aprovação dos projetos. De 2003 até meados de 2006, somente oito agroindústrias foram financiadas em quase quatro anos, o que evidencia o grau de dificuldade sofrido pelos agricultores familiares para o cumprimento das exigências bancárias e burocráticas[52]. Apesar dos dados irrisórios no número de empreendimentos financiados junto ao Pronaf, se alcançou um dos objetivos do programa nessa segunda fase: a presença da adimplência em todos os contratos[53].

Com o fraco desempenho do número de financiamentos, o enfoque do Prove/Pantanal acabou privilegiado a capacitação dos produtores e a comercialização das suas mercadorias. Ambas as estratégias reiteravam a opção em qualificar as agroindústrias já existentes, diferentemente do que vinha acontecendo até 2002. Além disso, o montante de recursos dispensados para o programa e o número de recursos humanos para o seu funcionamento foram reduzidos sensivelmente. Estas escolhas levantam a hipótese, que não poderá ser comprovada neste trabalho, de que o governo optou por conservar o Prove/Pantanal após a reeleição, já que era uma proposta firmada no período eleitoral, mas o manteve enfraquecido e diluído, diferentemente do primeiro momento. Isso fica evidente nos resultados obtidos, pois participaram no primeiro período do Prove/Pantanal 175 agroindústrias familiares (100% financiadas) e no segundo momento foram incluídas mais 31 unidades (25% financiadas).

O programa encerrou com 206 agroindústrias cadastradas, onde apenas 61 estavam em funcionamento (29,6%) e o restante encontrava-se paralisada (42,7%), fechada (8,6%) ou em construção (23,3%)[54]. Isso demonstra a baixa taxa de sobrevivência das unidades apoiadas pelo Prove/Pantanal, fruto da incompatibilidade apresentada no primeiro período entre as ações planejadas pelos gestores e o perfil do público escolhido. Para inflamar ainda mais essa situação, tratava-se de uma atividade nova para a maioria dos agricultores, o que exigia uma série de competências que dificilmente poderiam ser absorvidas nos cursos de capacitação.

Portanto, predominava um despreparo por parte dos agricultores (que não detinham o conhecimento necessário para desenvolver a atividade de beneficiamento), dos técnicos (que subestimaram as dificuldades presentes no âmbito das agroindústrias familiares) e dos gestores do programa (que não dimensionaram o desafio de congregar produtores empobrecidos com a sua inserção nos mercados de produtos prontos para o consumo).  Ao incorporar a maioria das ferramentas utilizadas pelo Prove/DF, o Prove/Pantanal trouxe também alguns equívocos, que foram repetidos novamente, como a incompatibilidade entre as ferramentas de intervenção e o público-alvo.

Programa da Agroindústria Familiar (PAF/RS) – 1999 a 2002

O Programa de Agroindústria Familiar (PAF/RS)[55] foi implementado no Rio Grande do Sul pela Secretaria da Agricultura e Abastecimento (SAA), entre 1999 e 2002, durante o Governo Olívio Dutra. Dentre as motivações apresentadas para a sua construção foi destacada a possibilidade dos agricultores familiares avançarem sobre todas as etapas da cadeia produtiva, deixando de serem somente os responsáveis pela produção de matéria-prima. Aliado a isso, destacou-se o acúmulo histórico das formas de processamento da produção primária no interior das pequenas propriedades gaúchas. Esta bagagem poderia potencializar o sucesso do programa, pois qualificaria os empreendimentos com uma experiência inicial, ao mesmo tempo em que atrairia outros agricultores familiares para esta atividade.

Diferentemente do Prove/DF e do Prove/Pantanal que tiveram o seu surgimento ligado fundamentalmente a uma opção de governo, o PAF/RS foi construído a partir do envolvimento e da participação dos movimentos sociais, entidades de representação e ONGs vinculados com a agricultura familiar. Ao inserir no plano de governo a pauta de reivindicações destes agentes, o programa procurou agregar uma legitimação política, ao mesmo tempo em que usufruiu do acúmulo e da experiência destas organizações neste campo de atuação.

O objetivo do PAF/RS era apoiar os agricultores familiares nas atividades de agregação de valor aos seus produtos, melhorando a renda e as condições gerais de vida de suas famílias, bem como, contribuir para o desencadeamento de um processo de desenvolvimento sócio-econômico em nível regional e municipal. As metas estabelecidas para o programa pretendiam atingir cerca de 30.000 famílias com um gasto aproximado de R$ 120 milhões. Esta política pública foi institucionalizada pelo Decreto n. 40.079 de maio de 2000.

O público do PAF/RS se delimitou, num primeiro momento, aos agricultores familiares enquadrados no Pronaf (proprietários, parceiros, meeiros e arrendatários) e, num segundo período, incluiu também os agricultores assentados da reforma agrária, indígenas e remanescentes de quilombos – embora a participação desse grupo de beneficiários tenha sido reduzida. Neste escopo foram priorizados os agricultores que já pertenciam a algum tipo de organização vinculada com o beneficiamento da produção (agroindústrias operando em condições precárias ou informais), demonstrando que a preferência era oferecer um salto qualitativo nas unidades já existentes em vez de implementar novos projetos. Outra opção tomada pelo PAF/RS foi trabalhar com empreendimentos que fossem constituídos por grupos de agricultores, porém esta condição se mostrou inconsistente para ser tratada como pré-condição a nível estadual, o que levou a relativização deste critério. Deve-se destacar ainda que na proposta original do programa o beneficiário deveria produzir pelo menos 80% da matéria-prima processada, mas este valor foi reduzido a 50% posteriormente (igualando-se ao Prove/Pantanal).

As ações implementadas pelo Programa de Agroindústria Familiar podem ser agrupadas em quatro diferentes estratégias: oferta de crédito, divulgação e comercialização dos produtos; capacitação e acompanhamento dos agricultores e; mudança das legislações.

O financiamento das agroindústrias familiares teve, de forma paralela, duas fontes de recursos: o Feaper (Fundo Estadual de Apoio ao Desenvolvimento dos Pequenos Estabelecimentos Rurais) e o Pronaf através das linhas Agregar, Integrado Coletivo e Investimento. Embora a intermediação bancária tenha ficado sob a responsabilidade do Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul), alguns ralos projetos foram aprovados no Banco do Brasil (3,6%), Cresol (1%) e Sicredi (0,5%). Embora existissem duas fontes de recursos, as condições financeiras foram igualadas para evitar sobrecarga em uma delas.

Ao longo da vigência do PAF/RS foram financiados 214 empreendimentos sob um montante de recursos de R$ 6,5 milhões[56]. Ainda que os resultados tenham sido satisfatórios, os saldos ficaram muito abaixo do previsto pelos gestores do programa. Entre os empecilhos apresentados, destaca-se: o não enquadramento de alguns dos agricultores nas normas do Pronaf; a necessidade de garantias patrimoniais (inicialmente era 1,5 superior ao valor financiado, mas depois foi reduzido para 0,5); a falta de tradição dos agentes bancários locais em financiar tal tipo de empreendimentos; a falta de agilidade no processo de contratação dos financiamentos e; a impossibilidade de compra de equipamentos usados (norma do Conselho Monetário Nacional).

Um dos trunfos do PAF/RS na esfera do crédito foi a disponibilização paralela de duas diferentes fontes de financiamento, uma federal e outra estadual. Embora isso tenha ocorrido no Prove/DF e no Prove/Pantanal, o diferencial do caso gaúcho é que as fontes foram operacionalizadas conjuntamente e de modo complementar, enquanto que nos outros casos optou-se pelos recursos do Pronaf somente após a saída do mecanismo anterior. Com essa estratégia, o PAF/RS deteve uma flexibilidade maior no direcionamento dos contratos, possibilitando a implantação de um número maior de agroindústrias. Um exemplo disso é que os recursos do Feaper foram utilizados nos projetos que não dispunham de garantias suficientes e onde existia um risco mais elevado pela especificidade da atividade. Já o Pronaf foi empregado naqueles contratos cujos produtos detinham uma tradição histórica e que apresentavam um maior grau de viabilidade econômica. Assim, foi obtida uma ampliação do público e do número de agroindústria a partir do conciliamento de ambas as fontes[57].

Em paralelo ao crédito, o PAF/RS implementou algumas ações de divulgação e comercialização dos produtos das agroindústrias familiares. Deve-se destacar a aquisição de embalagens para as agroindústrias (atendendo 50 projetos), a disponibilização gratuita do Código Nacional de Barras (contemplando 83 empreendimentos) e o apoio direto na organização de feiras e exposições. Outra estratégia que beneficiou as agroindústrias familiares que detinham a legalização sanitária foi a criação do selo “Sabor Gaúcho” (Figura 2). Este instrumento de apelo comercial atingiu 126 unidades e teve como propósito identificar aos consumidores a região geográfica de origem do produto (o Estado do RS) e a categoria social dos fabricantes (agricultores familiares com pequenas agroindústrias).

Outra linha de ação implementada pelo PAF/RS foi o acompanhamento das agroindústrias e a capacitação dos agricultores por instituições parcerias ao programa (Emater/RS, prefeituras, cooperativas, ONGs, STRs, etc.). Assim, foram executadas atividades de incentivo e fortalecimento das iniciativas de agregação de valor através de cursos, seminários e viagens de intercâmbio. Nesta esfera de atuação, o governo passou a compartilhar o processo de implementação da política com atores não-estatais, incluindo-os no desenvolvimento do PAF/RS.

Figura 2 – Selo utilizado nos produtos vinculados ao PAF/RS
Fonte: Raupp (2005)

Por fim, cabe destacar as ações do programa sobre as diferentes legislações. No campo sanitário, a regulamentação da Lei estadual n. 10.691 reduziu as exigências de infraestrutura para montagem de uma agroindústria, permitindo o uso de equipamentos de baixo custo. Em relação à legislação ambiental foi estabelecido um convênio que definiu que o acompanhamento e a vistoria das plantas agroindustriais com até 250m2 passariam a ser feitos pela Emater de forma gratuita. No âmbito fiscal/tributário foi aprovado o Decreto n. 40.248, que autorizou a comercialização dos produtos das agroindústrias familiares através da emissão de nota pelo Bloco de Produtor Rural. Esta iniciativa fez com que os agricultores não perdessem a sua condição de segurados especiais da Previdência Social.

As ações implementadas pelo PAF/RS atingiram aproximadamente 800 agroindústrias (26,8% foram financiadas[58]) e 2.719 famílias (9,1% das metas), sob um montante de 8,4 milhões (7% das metas). Apesar de apresentar um saldo positivo, o resultado do programa ficou abaixo do que era esperado pelos seus gestores.

Com o término do governo em 2002, o PAF/RS não foi renovado e todas as ações deixaram de ser operadas. Embora não existam dados sobre a taxa de sobrevivência dos empreendimentos, acredita-se que a saída do suporte governamental tenha sido menos prejudicial do que nos dois programas já analisados, os quais apresentaram muitas unidades paralisadas. Esta hipótese está ligada ao público beneficiado pela política gaúcha, que atingiu de forma majoritária as unidades com uma trajetória de vários anos organizadas em grupo, onde os agricultores já apresentavam um certo grau de capitalização e infraestrutura prévia. Assim, o programa atuou muito mais no sentido de melhorar as agroindústrias e enquadrá-las no aparato legal do que no intuito de estimular a constituição de novas unidades ou de inserir os agricultores pauperizados.

Já no Prove/DF e no Prove/Pantanal (1999-2002) a opção foi outra, uma vez que os beneficiários foram os produtores mais marginalizados dos processos econômicos e sociais, que trabalhavam de forma individual e que não apresentavam muita experiência na produção e na comercialização de produtos processados. Neste caso, a presença do Estado era decisiva para manter os agricultores na atividade, até porque foi criada uma dependência contínua das ferramentas de intervenção. Portanto, os cursos de capacitação, a assistência técnica e os financiamentos não foram suficientes para oferecer no prazo disponível a autonomia e a sustentabilidade necessária aos “pequenos produtores excluídos”.

Programa de Desenvolvimento da Agricultura Familiar pela Verticalização da Produção (Desenvolver/SC) – 1998 a 2001

O Estado de Santa Catarina, diferentemente das outras federações, detém um acúmulo de políticas públicas direcionadas às agroindústrias familiares. Embora tenha havido alguns programas que não tiveram a sua base organizacional dentro da Secretaria da Agricultura e Desenvolvimento Rural de SC[59], pode-se destacar dois mecanismos de incentivo implementados pelo governo estadual: o Programa Catarinense da Indústria Rural de Pequeno Porte (Proind) e o Programa de Fomento e de Desenvolvimento da Pequena Agroindústria Familiar e Pesqueira (Propagro). O primeiro (Proind) foi lançado em 1996 e disponibilizou linhas de crédito específicas para a atividade, mas não apoiou nenhum projeto pela presença de condições financeiras impróprias aos pequenos empreendimentos[60]. Diante disso, foi implementado no final de 1998 o Propagro, que se institucionalizou pela Lei Estadual n. 10.731. Dentre as ações programadas estava a concessão de crédito aos agricultores através do Fundo de Desenvolvimento Rural (estratégia semelhante aos outros três programas já discutidos acima) e a implementação de um selo de qualidade (Sabor Colonial – Figura 3) para as agroindústrias legalizadas[61]. Como esta política foi fundada no último momento do então governo proponente, nenhuma ação foi executada.

Os quatro programas citados acima estavam atuando em Santa Catarina de forma desarticulada e não atendiam a toda demanda existente. Na perspectiva de combater este isolamento e incrementar novas medidas de apoio aos empreendimentos é que surgiu o Programa de Desenvolvimento da Agricultura Familiar Catarinense pela Verticalização da Produção (Desenvolver/SC), que foi proposto para atuar na assessoria e no acompanhamento técnico das pequenas agroindústrias rurais[62].

Figura 3 – Selo criado e institucionalizado pelo Propagro/SC[63]
Fonte: Mior (2005).

O objetivo do Desenvolver/SC foi fomentar a verticalização da produção rural proveniente da agricultura familiar através da criação e consolidação de indústrias rurais de pequeno porte, usando como instrumento a geração e difusão de tecnologias apropriadas. A meta prevista era criar 141 agroindústrias familiares e reestruturar 212 unidades, além de gerar 760 postos de trabalho e implementar o Serviço de Inspeção Municipal (SIM) nos municípios envolvidos.

Diferentemente do Prove/DF, Prove/Pantanal e PAF/RS, o Desenvolver/SC foi uma iniciativa que não teve como entidade proponente, organizadora e administrativa a Secretaria da Agricultura do Estado. Isso porque, foi criado por organizações não-governamentais, prefeituras municipais e outras organizações públicas, que ao todo somaram 50 parceiros[64]. Neste contexto, a ausência de um ator centralizador conduziu a criação de um Conselho Estadual que foi a instância máxima de deliberação e era composto por representantes das entidades participantes[65]. Além disso, o programa contou com o apoio do CNPq, que disponibilizou 70 bolsas de fomento tecnológico.

Outra diferenciação entre o Desenvolver/SC e os demais programas já apresentados está na distribuição espacial da política catarinense, pois as suas estratégias foram direcionadas somente à 32 municípios que já apresentavam uma bagagem na atividade de agroindustrialização. A proposta era apoiar as ações já existentes que estavam sendo coordenadas por agricultores familiares enquadrados no Pronaf. Nesse sentido, o enfoque do Desenvolver/SC foi na qualificação dos empreendimentos e no assessoramento técnico dos agricultores que conheciam, mesmo que minimamente, as atividades de processamento da produção.

As ações implementadas pelo Desenvolver/SC podem ser estruturadas em dois grandes blocos: acompanhamento e capacitação dos agricultores e a criação de tecnologias apropriadas para as pequenas agroindústrias[66]. No primeiro caso, aconteceu a implementação de atividades de formação e qualificação dos beneficiários em várias esferas, incluindo desde a implantação do empreendimento e a sua adequação às normas existentes até a orientação sobre produção (qualidade da matéria-prima), processamento (diferenciação dos produtos) e comercialização (estratégias de marketing). Paralelamente, o Desenvolver/SC executou algumas ações de aprimoramento tecnológico, adequando os equipamentos à realidade das agroindústrias familiares e barateando os seus custos de produção. Ao todo, foram criadas e adaptadas mais de 30 máquinas específicas para a atividade de beneficiamento[67].

Ao final do programa haviam sido acompanhadas 275 agroindústrias, sendo que 188 foram implantadas com o auxílio dos técnicos do Desenvolver/SC (utilizando o Pronaf-Agregar como fonte dos recursos) e 87 foram readequadas dentro dos padrões exigidos pela legalização. Ao todo, mais de 1.000 famílias de agricultores foram beneficiadas por essa política, que gerou 2.283 ocupações[68].

Em relação aos demais programas estaduais já discutidos acima, o Desenvolver/SC foi a ferramenta de apoio que obteve maior sucesso no cumprimento das metas estipuladas. Este saldo é reflexo, em grande medida, da opção assumida pela política pública em oferecer aos beneficiários um acompanhamento com base em ações já existentes. A escolha em não incrementar mecanismos paralelos foi facilitada pela bagagem de programas já existentes em Santa Catarina e pelo perfil dos produtores atingidos.

Mesmo com a obtenção de resultados positivos, uma pesquisa realizada após o término do Desenvolver/SC apontou que 71% dos agricultores beneficiários mostravam-se incapazes de continuar na atividade sem o auxílio da política[69]. Apesar da experiência catarinense lograr de um público mais preparado, deter um histórico de programas na atividade e apresentar um contexto local fértil, os problemas são semelhantes ao que foi visto no Prove/DF e Prove/Pantanal. Isto demonstra as enormes dificuldades e os permanentes desafios em construir e implementar políticas de agroindustrialização na agricultura familiar. Mas, no caso do Desenvolver/SC, o ponto de maior diferenciação está no envolvimento e na gestão da política por organizações não-governamentais, prefeituras municipais e outras organizações públicas. Isso possibilita que as iniciativas de intervenção deixem de depender exclusivamente do governo estadual, o que amplia as possibilidades de sustentabilidade das ações implementadas.

Programa da Agroindústria Familiar (Fábrica do Agricultor/PR) – 1999 a 2010

O Programa da Agroindústria Familiar (Fábrica do Agricultor/PR) surgiu em 1999 durante o governo de Jaime Lerner, sendo coordenado pela Secretaria da Agricultura e do Abastecimento (SEAB). Diferentemente das demais políticas já apresentadas no plano estadual que não mantiveram a continuidade das suas ações após a mudança do governo, o programa paranaense permanece atuante. Esta durabilidade tem condicionado o fortalecimento das formas de intervenção, ao mesmo tempo em que possibilitou a inclusão de um crescente número de beneficiados.

 O objetivo geral do programa é agregar valor aos produtos agrícolas através da implantação, modernização ou adequação de pequenas e médias unidades agroindustriais, gerando emprego e renda, bem como inserindo os agroempreendedores de forma profissional e com competitividade no mercado, tendo como premissa a sustentabilidade social, econômica e ambiental[70]. Até o final de 2010 pretende-se atingir mais de 4 mil agroindústrias familiares em todo Estado e realizar 120 feiras de divulgação dos produtos vinculados com o programa.

O público beneficiário do Programa Fábrica do Agricultor/PR ficou delimitado nos agricultores familiares enquadrados no Pronaf e nos agroempreendedores familiares. No primeiro caso estão os produtores familiares em transição e consolidados, enquanto que os agricultores periféricos não foram incluídos[71]. No segundo grupo estão os agroempreendedores, que são formados por pessoa física ou jurídica nos regimes de Micro-empresa ou Empresa de Pequeno Porte[72]. Neste caso, as agroindústrias podem estar localizadas no meio urbano, serem operadas exclusivamente por mão-de-obra contratada e deter apenas 25% da matéria-prima.

A delimitação do público-alvo do Fábrica do Agricultor/PR apresenta uma grande diferença em relação ao que foi visto nos demais programas estaduais. No caso dos agricultores familiares, a política paranaense ficou mais próxima da opção seguida pelos demais Estados sulistas. Entretanto, a inclusão dos agroempreendedores familiares foi inédita para aquele período, pois deixou de ter nos agricultores o público exclusivo e passou a abranger empreendimentos localizados no meio urbano e sem o vínculo com o campo. Para que este grupo não congregasse a maioria dos esforços da política, lhe foi restringido o uso máximo de 20% da força de trabalho dos técnicos e 30% dos espaços das feiras, buscando calibrar e garantir o apoio aos agricultores familiares.

Outra opção assumida pelo Fábrica do Agricultor/PR é sobre os segmentos que já possuíam alguma experiência de agroindustrialização. O programa “não procura fomentar novos produtores, mas sim, novos produtos, estimulando os produtores que já tenham tradição em alguma atividade de transformação, legalizando e potencializando-os”[73]. Embora isso se assemelhe ao PAF/RS e ao Desenvolver/SC, existe uma diferença clara: no caso gaúcho e catarinense a experiência era uma condição importante, mas não era excludente, diferentemente do que acontece no Paraná, que tem optado impreterivelmente por aquelas famílias com algum envolvimento prévio no processamento da produção agropecuária. Esta escolha, além de tornar a política menos onerosa, tem aumentado as suas chances de êxito.

A estrutura organizacional do Fábrica do Agricultor/PR, assim como no Desenvolver/SC, foi pautada nos conselhos municipais, regionais e estadual. É nesta esfera que deve transitar qualquer decisão ou iniciativa a ser implementada ao longo do programa. Portanto, os conselhos são os espaços deliberativos da política.

As ações implementadas pela política paranaense podem ser agregadas em três grandes grupos: apoio à legalização das agroindústrias, capacitação dos agricultores e acesso aos mercados. Ainda que no documento referencial do programa esteja descrita a opção de oferecer o crédito através do Pronaf e da Agência de Fomento do Estado do Paraná (Fundo Estadual de Micro-Crédito), nenhum dado sobre o número de financiamentos foi disponibilizado. A informação que foi obtida junto aos técnicos do Fabrica do Agricultor é de que o Pronaf, com o seu fortalecimento, acabou sendo a fonte exclusiva de crédito.

Uma das ações de maior envergadura desenvolvida pelo Fábrica do Agricultor/PR é a legalização das agroindústrias. Como a grande maioria dos empreendimentos paranaenses estava em situação informal, o programa optou em criar o “kit agilidade”. A iniciativa busca articular, de forma ágil e desburocratizada, os diversos órgãos governamentais responsáveis pelos processos de registros, fazendo com que os beneficiários do programa obtenham em um pequeno espaço de tempo a formalização da agroindústria na ótica jurídica, fiscal, tributária, sanitária e ambiental[74]. É importante destacar a originalidade e a importância desta medida, uma vez que fomenta a legalização das unidades de forma inovadora e rápida. Outra iniciativa nesta esfera foi sobre a comercialização dos produtos com Nota de Produtor Rural, o que garante aos agricultores participantes do programa um tratamento tributário diferenciado (Decreto n. 3.927 de 2004).

Além da legislação, o programa oferece aos produtores e agroempreendedores cursos de capacitação e profissionalização na área de produção, transformação, gerenciamento e acesso ao mercado. Até 2007 a política orientou 38.768 agricultores através de cursos, seminários e dias de campo. Como os produtores já detinham experiência na atividade, isso possibilitou a inclusão de um número maior de beneficiados, pois a capacitação acontece de modo mais ágil diante da habilidade prévia dos participantes[75].

Por último, cabe destacar as iniciativas direcionadas ao acesso dos mercados e à divulgação dos produtos. As ações foram prioritárias desde o início do programa e vem se consolidando ao longo dos anos. O Fábrica do Agricultor/PR supõe que os agricultores já estejam participando do mercado local, o que faz com que a política proponha-se “a manter e incrementar os canais de comercialização já estabelecidos, aumentando a capacidade de concorrência com produtos diferenciados”[76]. Dentre as medidas elencadas estão as estratégias de marketing, que vão desde a mobilização dos consumidores até a qualificação das embalagens. Além disso, o programa disponibiliza um selo aos agricultores contemplados pela política, identificando assim os produtos integrados ao Fábrica do Agricultor/PR (Figura 4).

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Outra iniciativa direcionada ao acesso dos mercados diz respeito à criação de espaços específicos para a comercialização dos produtos. Nesse sentido, foi originada a Feira Sabores do Paraná, tanto em escala regional como estadual, beneficiando mais de 500 agroindústrias familiares até o início de 2009 em suas mais de 150 edições. Além disso, o programa fez um convênio com 60 supermercados (incluindo as grandes redes do setor), onde foram enviadas gôndolas exclusivas para os produtos do programa[77]. Por fim, cabe destacar a instalação de 11 centros regionais de comercialização, que são espaços específicos para a venda dos produtos vinculados à política[78].

Desde o início do programa até o final de 2008 foram apoiadas 2.500 agroindústrias familiares em todo Estado (Figura 5). Este expressivo resultado é reflexo das ações contínuas do Fábrica do Agricultor/PR por pelo menos três mandatos (1999 – 2010), o que permite que as ações sejam construídas com maior solidez. Além disso, a preferência pelo público experiente, a articulação da política com os conselhos municipais e a opção em atuar com maior ênfase na esfera da comercialização contribuíram para a obtenção de resultados até então não vistos nos demais programas estaduais de agroindustrialização.

 

 

Programa Social de Promoção de Emprego e Renda na Atividade Rural (Prosperar/RJ) – 2002 a 2010

O Programa Social de Promoção de Emprego e Renda na Atividade Rural (Prosperar/RJ) [79] foi criado no final do Governo de Anthony Garotinho (2002) e mantido pelos dois governos subseqüentes. A coordenação da política pública está a cabo da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Pesca e Abastecimento (Seappa) e conta com o auxilio técnico da Emater-Rio e da Pesagro (Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro). Um dos principais motivos para a criação do programa foi o elevado índice de informalidade das agroindústrias familiares fluminenses, pois existiam mais de 900 unidades em funcionamento e aproximadamente 80% não eram legalizadas[80]. Como o PAF/RS e o Fábrica do Agricultor/PR já haviam avançado de forma significativa no processo de formalização dos pequenos estabelecimentos agroindustriais, o governo optou por implementar uma política semelhante ao que fora encontrado nos estados sulistas.

O Prosperar/RJ tem como tem como objetivo “aumentar a oferta de postos de trabalho, através da abertura de linhas de financiamentos a projetos de investimento e custeio de produtores rurais, agroindústrias e suas diversas formas de organização, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro”[81]. A meta do programa é reduzir sensivelmente os índices de informalidade dos empreendimentos em funcionamento. O programa foi institucionalizado pelo Decreto n. 30.779 em março de 2002.

O público-alvo do programa ficou estabelecido “nos produtores rurais, pessoas físicas ou jurídicas e suas diversas formas de organização, e agroindústrias que adquiram a matéria prima do Estado do Rio de Janeiro”[82]. Esta delimitação genérica demonstra uma grande flexibilidade na definição dos beneficiários, ao contrário dos outros programas estaduais que optaram por uma demarcação mais incisiva no momento de escolher o público atingido pela política. 

Assim como o PAF/RS, o Prosperar/RJ está estruturado em quatro diferentes estratégias de ação: oferta de crédito, mudança das legislações, acesso ao mercado e capacitação/acompanhamento dos agricultores. O primeiro bloco é destinado para a construção, adequação, ampliação ou melhoria das agroindústrias familiares. O financiamento tem, de forma paralela, duas fontes de recursos: o Fundes (Fundo de Desenvolvimento Econômico e Social) e o Pronaf-Agroindústria. A manutenção de ambas as fontes está vinculada com o público beneficiário do Prosperar/RJ, que é mais amplo do que a delimitação do Pronaf. Nesse sentido, o Fundes detém condições de enquadramento mais flexíveis, pois inclui os agricultores com rendas maiores e que possuem ocupação fora da agricultura[83]. Destaca-se que os projetos de viabilidade técnica são construídos com o auxílio da Emater-Rio e a intermediação bancária tem sido operacionalizada pelo Banco do Brasil. Até o final de 2008 o Prosperar/RJ financiou 60 agroindústrias familiares em todo o Estado.

No que tange as legislações, o Prosperar avançou em dois aspectos. O primeiro movimento foi no sentido de diferenciar as normas sanitárias para os produtores vinculados à política, reconhecendo o perfil diferenciado das indústrias de pequeno porte. Entretanto, foram poucos os resultados operacionais, já que as exigências higiênico-sanitárias continuam as mesmas, alterando somente o número de documentos exigidos[84]. A segunda medida incrementada pelo Prosperar/RJ foi na legislação tributária, que isenta em 100% o ICMS dos produtos agroindustrializados, como já havia ocorrido no Prove/Pantanal, PAF/RS e Fábrica do Agricultor/PR. Com esse incentivo o agricultor não perde a condição de segurado especial do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pois a comercialização acontece pelo Bloco do Produtor Rural.

Na esfera da comercialização o programa fluminense optou por ações que possibilitem a abertura de novos mercados, onde o agricultor é o agente responsável pela manutenção desses espaços. Essa opção foi tomada a partir dos exemplos não exitosos, como foram o Prove/DF e o Prove/Pantanal, que criaram uma grande dependência do Estado enquanto mediador entre a produção e a comercialização. Por isso, as ações se centraram na oferta de alguns circuitos específicos para os produtos do programa, como é o caso das feiras locais e regionais. Outra estratégia utilizada foi incentivar os comerciantes a adquirir os produtos da agroindústria familiar. Neste caso, os estabelecimentos que compram a mercadoria dos beneficiários do Prosperar/RJ obtêm um crédito de 7% no ICMS[85]. Esta medida torna os produtos processados mais competitivos, sem com isso reduzir a lucratividade dos agricultores.

Por último, cabe destacar as ações de capacitação e acompanhamento dos agricultores através da disponibilização de cursos na área de produção da matéria-prima e de boas práticas de fabricação. Complementarmente, é oferecida assessoria técnica durante o processo de legalização das agroindústrias. Desde o início do programa foram treinados mais de 800 agricultores e técnicos[86].

Até o final de 2008 o Prosperar/RJ beneficiou 80 agroindústrias familiares, sendo que 75% destas acessaram o financiamento para a atividade. Ainda que o programa tenha originado algumas medidas inovadoras, como foi o credito de ICMS aos comerciantes, os dados referentes ao número de empreendimentos apoiados não foram muito expressivos se comparado com as demais políticas estaduais apresentadas anteriormente. Além disso, o interesse do programa fluminense em reduzir o número de agroindústrias que operavam de modo informal acabou não agregando muitos resultados significativos, pois atingiu somente 11,4% desta meta.

Programa de Apoio à Agregação de Valor e Desenvolvimento Rural (ProveMais/MT) – 2003 a 2010

O Programa de Apoio à Agregação de Valor e Desenvolvimento Rural (ProveMais/MT) foi criado em 2003 durante o Governo Blairo Maggi no âmbito da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Rural (Seder). A política surgiu a partir de um projeto de lei proposto pelo deputado Ságuas Moraes, que argumentava sobre a importância da criação de agroindústrias familiares para diminuição do êxodo rural e das desigualdades sociais. A institucionalização do ProveMais/MT aconteceu no final de 2004 (Decreto n. 4.930).

Os beneficiários do programa são as “associações, cooperativas, sindicatos rurais, sindicato dos trabalhadores rurais e demais entidades envolvidas com a agricultura familiar”[87]. Desta forma, o público é restrito aos produtores organizados de forma associativa e que estejam legalmente constituídos, excluindo os projetos individuais ou que sejam encaminhados por grupos informais. Além disso, só podem participar as agroindústrias que estão de acordo com a legislação sanitária vigente. A medida restringe sensivelmente o número de beneficiários, pois são pré-requisitos que limitam a participação da grande maioria dos agricultores familiares do Mato Grosso. Ao contrário dos outros programas estaduais que foram criados para formalizar os grupos e legalizar as agroindústrias, o ProveMais/MT tratou estas condições como pré-requisito para a entrada do público na política.

Outra diferença do programa mato-grossense em relação às demais políticas estaduais aconteceu nas estratégias e ações implementadas. Isso porque, o ProveMais/MT disponibilizou somente crédito rural, não intervindo na legalização, comercialização e capacitação. A opção restringiu-se na oferta de recursos em condições subsidiadas, pois não foi cobrada nenhuma taxa de juro sobre o montante financiado. O apoio creditício é oriundo do Governo do Estado através de um convênio firmado entre a Seder e a MT Fomento (Agência de Fomento do Estado de Mato Grosso).

Entre 2003 e 2008 o ProveMais/MT financiou 21 agroindústrias familiares vinculadas com associações e cooperativas, onde os investimentos alcançaram aproximadamente R$ 600 mil[88]. Ao considerar os resultados obtidos ao longo desse período, podemos dizer que o saldo obtido foi modesto, já que não chegou a beneficiar três empreendimentos por ano. Esta situação está vinculada com o recorte do público beneficiário do programa, que não está adaptado à realidade dos agricultores familiares mato-grossenses. 

Programa de Desenvolvimento da Agroindústria Artesanal de Alimentos e do Artesanato Rural (Minas Artesanal/MG) – 2006 a 2010

O Programa de Desenvolvimento da Agroindústria Artesanal de Alimentos e do Artesanato Rural (Minas Artesanal/MG) [89] foi criado em 2007, durante o segundo mandato do Governo Aécio Neves, e ficou sob a coordenação da Secretaria de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa). Esta política foi institucionalizada pelo Decreto n. 44.545, com o objetivo de “dar suporte à geração de renda familiar por intermédio de incentivo à industrialização de alimentos e de artefatos rurais, com característica artesanal”[90].

Entre as metas estipuladas pelo programa está a implantação ou reforma de 700 agroindústrias artesanais, a capacitação de 6.500 agricultores familiares e artesãos rurais, a formação de 500 extensionistas e a disponibilização de 100 unidades de comercialização. A previsão é que sejam investidos na política cerca de R$ 6 milhões a partir dos recursos oriundos do Banco do Brasil, Sebrae-MG e Governo do Estado. O público a ser beneficiado pelas ações do Minas Artesanal/MG ficou delimitado nos agricultores enquadrados no Pronaf que possuem produtos agroindustrializados registrados no órgão sanitário competente[91]. Este último requisito, em especial, acaba restringindo a participação mais generalizada dos produtores mineiros, pois condiciona o acesso às unidades legalizadas e com uma infraestrutura prévia (assim como ocorreu no ProveMais/MT).

Este recorte do programa nos agricultores formalizados está vinculado com as ações de intervenção da política pública, que estão centradas basicamente na capacitação dos beneficiários e na comercialização dos produtos artesanais. No que se refere ao crédito, o programa propôs informar a existência de linhas específicas e compatíveis com a realidade dos produtores, mas não vai estar diretamente envolvido com essa ferramenta, assim como está acontecendo com o Fábrica do Agricultor/PR e como ocorreu no Desenvolver/SC. No caso da geração de tecnologias para os pequenos empreendimentos acontece da mesma forma: os executores orientam sobre a disponibilidade, mas não detém o controle nem a responsabilidade sobre este eixo.

Dentre as ações direcionadas à capacitação, tem sido privilegiado o treinamento dos agricultores familiares e dos técnicos nas áreas de tecnologia da produção, processamento agroindustrial e gestão do empreendimento. Entretanto, é no elo da comercialização que se concentram as maiores iniciativas do Minas Artesanal/MG. Destaca-se a participação em feiras locais, regionais e estadual, a confecção de embalagens dentro das normas e a disponibilização do Selo Minas Artesanal aos produtos cadastrados no programa (Figura 6).

Embora não tenham sido disponibilizados os dados sobre o número de agroindústrias beneficiadas pelo Minas Artesanal/MG, a informação coletada durante a V Feira da Agricultura Familiar e Reforma Agrária (Rio de Janeiro, 2008) junto aos policy-makers do programa é que os resultados foram modestos até o final de 2008, sendo que o principal fator responsável está vinculado com o critério de delimitação do público-alvo, que ficou restrito aos empreendimentos legalizados. Com isso, as possibilidades de ampliação do número de beneficiários ficaram reduzidas. Esta hipótese foi confirmada em um recente estudo conduzido pela  Emater-MG, que constatou que das 15.243 agroindústrias artesanais de alimentos encontradas em Minas Gerais, somente 6% estão formalizadas sanitariamente. Diante disso, o Programa Minas Artesanal/MG está passando por um reordenamento das suas ações e do seu público.

A imagem “http://www.agricultura.mg.gov.br/imagens/martesanal1.gif” contém erros e não pode ser exibida.
Figura 6 – Selo utilizado nos produtos pertencentes ao Minas Artesanal/MG
Fonte: Seapa (2007).

 

Os instrumentos de política e o público beneficiário nos programas estaduais

Após a apresentação individual de cada programa estadual direcionado ao apoio das agroindústrias familiares, cabe-nos analisar as diferentes opções assumidas por estes mecanismos de intervenção no que diz respeito aos instrumentos de política e ao público beneficiário. O propósito deste tópico é apontar os encontros e desencontros entre os distintos programas abordados, destacando a presença de determinados perfis da política pública de agroindustrialização.

A primeira dimensão a ser tratada refere-se aos instrumentos de intervenção. Neste escopo, como já foi visto anteriormente, os programas de agroindustrialização da agricultura familiar apresentam uma diversidade de ações, pois desenvolvem ferramentas relacionadas ao crédito rural, legislações, capacitação, tecnologia, infraestrutura e comercialização. Entretanto, nem todas as ações estiveram presentes na totalidade das políticas. O único programa analisado que implementou todos os instrumentos acima destacados foi o Prove/DF. No oposto está o ProveMais/MT, que executou ações restritas na área dos financiamentos (Quadro 2).

Quadro 2 – Síntese dos instrumentos de ação (linhas de intervenção) dos programas estaduais de agroindustrialização na agricultura familiar brasileira

Programas Estaduais

Crédito (Pronaf)

Crédito (linhas próprias)

Legis-lações

Capa-citação

Tecno-logia

Infra-estru-tura

Merca-dos

Prove/DF

X

X

X

X

X

X

X

Prove - Pantanal/MS

X

X

X

X

 

X

X

PAF/RS

X

X

X

X

   

X

Desenvolver/SC

X

   

X

X

   

Fábrica do Agricultor/PR

X

 

X

X

   

X

Prosperar/RJ

X

X

X

X

   

X

Minas Artesanal/MG

X

   

X

   

X

ProveMais/MT

 

X

         
 Fonte: Elaboração do autor.

 

O instrumento de política que esteve presente em todos os programas estaduais foi o crédito rural, embora o Desenvolver/SC, o Fábrica do Agricultor/PR e o Minas Artesanal/MG não tenham disponibilizado linhas próprias. Esses três mecanismos optaram por orientar os agricultores sobre a oferta do financiamento do Pronaf, eximindo-os assim de terem que arcar com os problemas e as dificuldades operacionais presentes neste instrumento. Os demais programas criaram linhas próprias para a oferta de crédito a partir dos fundos estaduais, embora quase todas as políticas – com exceção do ProveMais/MT – tenham recorrido aos recursos do Pronaf. É importante destacar que os recursos do Pronaf são federais e isso possibilita para os programas uma complementação nos valores, o que se torna um elemento importante visto que o crédito é a modalidade muito custosa e geralmente os recursos financeiros estaduais são insuficientes e/ou escassos.

Pode-se dizer que o PAF/RS e o Prosperar/RJ foram os exemplos bem sucedidos, pois mantiveram a fonte federal de forma paralela e complementar aos fundos do Estado. Como já havíamos comentado anteriormente, isso possibilitou a inclusão de mais contratos, pois foram flexibilizadas as condições de enquadrabilidade do público beneficiado no caso fluminense e de viabilidade econômica no caso gaúcho.

O segundo instrumento que esteve presente na maioria dos programas estaduais está relacionado à alteração das legislações e ao acompanhamento dos agricultores na obtenção do registro. Nesta esfera, o Prove/DF, Prove/Pantanal/MS, PAF/RS e Prosperar/RJ foram as políticas que conseguiram modificar algumas normas que interferiam diretamente na formalização dos empreendimentos familiares. Paralelamente, o Fábrica do Agricultor/PR foi o mecanismo de intervenção que apresentou uma iniciativa exemplar nesta aresta, pois criou o “kit agilidade”, uma iniciativa que articulou de forma rápida e desburocratizada diversos órgãos governamentais, fazendo com que as agroindústrias fossem formalizadas em um curto espaço de tempo. No oposto estão o ProveMais/MT e o Minas Artesanal/MG, que não incluíram esta ferramenta porque as suas ações foram restritas às agroindústrias já legalizadas, ou seja, era um problema já “resolvido” para o público beneficiário. O Desenvolver/SC, por sua vez, não trabalhou com as legislações porque já haviam sido implementados programas anteriores que tinham alterado algumas normas específicas, ainda que isso não invalidasse a proposta de intervir sobre o marco legal.

A capacitação foi o instrumento que esteve presente em sete dos oito programas estaduais. O resultado demonstra a preocupação generalizada dos gestores em disponibilizar aos beneficiários treinamentos específicos à iniciativa produtiva desenvolvida. Esta ferramenta foi direcionada aos agricultores que estavam iniciando na atividade, pois possibilitava o primeiro contato com a agroindustrialização através dos cursos de boas práticas de fabricação, legislação, gestão, comercialização, etc. Os produtores mais experientes também foram incluídos neste mecanismo de intervenção através da capacitação nas áreas de diferenciação dos produtos, ampliação dos mercados e redução dos custos de produção. O único programa que não disponibilizou este instrumento foi o ProveMais/MT, que ficou restrito na oferta de crédito rural.

Outra ferramenta que obteve apoio em 75% dos programas estaduais foi a comercialização dos produtos e o acesso ao mercado. Este acompanhamento por parte das políticas públicas sobre os últimos elos da cadeia deve-se às dificuldades apresentadas pelos agricultores em administrar a venda de mercadorias prontas para o consumo. Embora alguns programas tenham se envolvidos na confecção das embalagens dos produtos (Prove/DF, Prove-Pantanal/MS e PAF/RS), as ações de maior incidência voltaram-se para a disponibilização dos espaços de venda e a confecção de um selo de identificação das mercadorias apoiadas pelas políticas (Prove/DF, Prove-Pantanal/MS, PAF/RS, Fábrica do Agricultor/PR, Minas Artesanal/MG e Prosperar/RJ). Uma iniciativa inovadora foi desenvolvida pelo programa fluminense, pois os estabelecimentos que compram a mercadoria dos beneficiários obtêm um crédito de 7% no ICMS. Esta estratégia tornou os produtos do Prosperar/RJ mais competitivos no mercado sem com isso reduzir a lucratividade dos agricultores.

O quinto instrumento presente nas políticas estaduais é voltado ao campo da tecnologia, onde o Prove/DF e o Desenvolver/SC foram os únicos programas a implementarem ações na área de adaptação de máquinas e equipamentos às agroindústrias familiares. Em ambos os casos, o CNPq foi o agente financiador da iniciativa através do Programa de Apoio às Tecnologias Apropriadas (PTA). As demais políticas optaram pelo não envolvimento com esse escopo de atuação, o que reduzia os seus portfólios de ações e permitia uma focalização mais intensiva nas ações supracitadas.

O último instrumento de intervenção encontrado foi na área de infraestrutura, que esteve presente somente no Prove/DF e no Prove/Pantanal (1° período). A distribuição restrita aos dois programas se deve ao fato dessas políticas serem as únicas a trabalharem com os agricultores mais marginalizados, o que significa que foi uma ação construída para atender as especificidades dos beneficiários. Por outro lado, alguns programas como o Minas Artesanal/MG e ProveMais/MT optaram por não inserir esta ferramenta nos programas porque o público atingido já era provido por estes recursos, pois a participação na política estava condicionada a disponibilização de uma infraestrutura prévia.

Portanto, torna-se evidente os diferentes mecanismos de intervenção presentes nos programas estaduais, abrangendo com isso uma série de arestas da atividade de agroindustrialização. Os instrumentos foram estabelecidos inicialmente no Prove/DF e depois foram reproduzidos e/ou alterados pelas outras políticas públicas, buscando sempre minimizar os principais problemas presentes nas atividades de agregação de valor. Além de uma readaptação do programa inicial (Prove/DF), os demais mecanismos foram sendo alterados conforme as especificidades estaduais e as características do público delimitado pela política.

Em relação ao público beneficiário dos programas estaduais foram assumidas diferentes opções de intervenção, criando algumas disparidades significativas entre as políticas neste escopo de atuação. A partir disso, estabelecemos a presença de três grupos de programas a partir das distintas opções assumidas no que tange o público-alvo e a iniciativa produtiva apoiada (Quadro 3).

O primeiro grupo é composto pelo Prove/DF e Prove/Pantanal (1° período). Neste caso, o recorte do público-alvo ficou nos agricultores marginalizados, que operavam de forma individual e que na maioria dos casos ainda não haviam acessado crédito para produção. Neste estrato era baixa a incidência de produtores com experiência na atividade de agroindustrialização e quando isso ocorria o empreendimento não apresentava estrutura própria, pois era operado de modo informal e a comercialização era baseada em um mercado de proximidade.

O segundo grupo é formado pelos programas que optaram por trabalhar com os critérios do Pronaf enquanto marco delimitador do seu público-alvo. Entretanto, os resultados demonstraram que havia um recorte mais específico que o Pronaf, pois foram beneficiados principalmente os agricultores familiares capitalizados, organizados e com experiência na atividade. Para tanto, os programas desse estrato se dividem em dois subgrupos:

i)     PAF/RS, Desenvolver/SC e Prosperar/RJ – privilegiavam os agricultores organizados, com experiência e infraestrutura prévia. Contudo, esses critérios não excluíam a construção de novas agroindústrias por parte dos agricultores que ainda não desempenhavam a atividade anteriormente;

ii)   Prove/Pantanal (2° período), Fábrica do Agricultor/PR e Minas Artesanal/MG – o foco estava em melhorar e qualificar os empreendimentos já existentes, desconsiderando os agricultores sem experiências e que ainda não tivessem um envolvimento inicial com esse tipo de mercado. No caso sul mato-grossense e mineiro os critérios foram ainda mais rígidos, pois foram beneficiadas somente as agroindústrias já legalizadas.

O terceiro grupo é formado pelo Fábrica do Agricultor/PR, Prosperar/RJ e ProveMais/MT. Estas políticas deixaram de ter nos agricultores familiares o público exclusivo dos programas, pois passaram a abranger os estabelecimentos localizados no meio urbano, que operavam com mão-de-obra contratada, que não detinham matéria-prima própria e que possuíam uma renda bruta acima do que foi delimitado no Pronaf. Diante disso, é possível afirmar que os programas atuavam de forma paralela com empreendimentos de agregação de valor que não se enquadram na delimitação “agroindústria familiar”. Neste caso, o foco estava no produto e não no produtor.

A identificação desses três grupos de políticas demonstra as diferentes opções assumidas pelos programas em relação ao público beneficiado. Neste sentido, a discussão sobre a heterogeneidade das atividades de agroindustrialização acaba sendo útil para compreender que a maioria dos mecanismos de intervenção contempla somente uma fração das iniciativas produtivas amparada pelo termo “agroindústria familiar”, deixando de lado uma importante parcela dos empreendimentos. Esta problemática confirma que os programas estaduais têm privilegiado as unidades mais consolidadas em detrimento daquelas iniciativas que se apresentam de maneira complementar às demais atividades da propriedade.

Esta opção dos programas pelo “grupo mais fácil” está relacionada à diminuição dos obstáculos encontrados durante a implementação da política. Além disso, os resultados alcançados com as agroindústrias consolidadas tornam-se mais evidentes no curto prazo se comparado com os empreendimentos menos estruturados nas questões produtivas, econômicas, legais e mercadológicas. Esta escolha reduz os entraves operacionais e financeiros dos mecanismos de intervenção, pois quanto melhor estruturado o público-alvo menor vai ser a necessidade de recursos e maior será o saldo do programa.

Já os programas que estão voltados às agroindústrias complementares na propriedade encontram mais barreiras e dificuldades durante a sua implementação. Esta situação pôde ser observada no Prove/DF e Prove/Pantanal (1° período), onde foram obtidos resultados desanimadores diante do descompasso entre o público atingido pelo programa a as ferramentas de intervenção. Entretanto, isso não significa que este público deva ser excluído das ferramentas de intervenção dessa natureza. O que estamos afirmando é que os instrumentos de política pública precisam estar adaptados às especificidades encontradas pelos beneficiários, caso contrário os resultados continuaram sendo frustrantes. Desta forma, torna-se clara a relação de proximidade entre as ferramentas de intervenção e o público-alvo, demonstrando a necessidade de uma sintonia entre ambas as dimensões para o êxito da política.

 

Quadro 3 – Síntese do público beneficiário dos programas estaduais de agroindustrialização

 

Programas estaduais

Características do público beneficiário dos programas

1º grupo

Prove/DF e Prove/Pantanal (1999-2002)

·      Agricultores mais marginalizados, com baixa renda e reduzida escolaridade;

·      Agroindústrias que operam, na grande maioria dos casos, de forma individual;

·      Produtores com pouca ou nenhuma experiência na atividade;

2º grupo

 PAF/RS, Fábrica do Agricultor/PR, Desenvolver/SC,
Prosperar/RJ, Prove/Pantanal (2003/06) e Minas Artesanal/MG

·      Agricultores familiares enquadrados nos critérios do Pronaf;

·      Produtores capitalizados, com experiência na atividade e com infraestrutura prévia;

·       Agricultores familiares que, na maioria das vezes, já estavam organizados em grupos
formais ou informais;

3º grupo

 Fábrica do Agricultor/PR, Prosperar/RJ e ProveMais/MT

·      Agricultores familiares não são o público exclusivo dos programas;

·      Compreendem-se estabelecimentos localizados no meio urbano e que operavam
com mão-de-obra contratada;

·      Agroindústria poderia comprar toda a matéria-prima utilizada.

Fonte: Elaboração do autor.

 

Ao analisar os distintos instrumentos e o público atingido pelos programas estaduais, o que se observa é que, por trás destes elementos, estão presentes variadas concepções acerca da atividade de agroindustrialização na agricultura familiar. Enquanto que algumas políticas, como foi o Prove/DF e Prove/Pantanal (2° período), percebiam a agregação de valor e a verticalização enquanto uma atividade de superação da pobreza e da marginalidade – mas sem excluir aqueles produtores mais organizados e capitalizados – outros programas compreendiam a agroindústria como uma ocupação exclusiva de um público “mais seleto” e “preparado”, o que tornava a oferta de crédito e a ampliação do mercado as principais ferramentas de fomento.

Atualmente é esta segunda perspectiva que tem predominado nas políticas estaduais mais recentes, limitando do apoio estatal uma importante parcela da agricultura familiar brasileira interessada na verticalização da produção. Nesse sentido, pouco se avançou na percepção de que a agregação de valor dos produtos agroalimentares poderia contribuir com a reprodução dos agricultores em situação de vulnerabilidade socioeconômica, desde que os programas fossem conduzidos em consonância com as particularidades desse público.

Considerações finais

As políticas públicas de agroindustrialização da agricultura familiar têm uma importante contribuição às novas formas de intervenção no meio rural, pois atuam de modo diversificado ao aplicar diferentes instrumentos de apoio de forma multisetorial, não os restringindo a base agrícola. Os oito programas estaduais direcionados às agroindústrias familiares apresentaram um saldo significativo, pois beneficiaram aproximadamente 4 mil empreendimentos desta natureza (90% na região Sul do país). Entretanto, algumas políticas ficaram restritas a um determinado governo, o que provocou o encerramento do programa após a mudança da gestão. Para aqueles agricultores menos estruturados, a ruptura desses instrumentos significa a paralisação do empreendimento diante das dificuldades estruturais que envolvem a atividade, as quais não podem ser eliminadas sem ferramentas de médio e longo prazo.

A mobilização de um “mix” de ações e ferramentas, fugindo daquele padrão mais tradicional pautado exclusivamente no financiamento da produção, apresentou-se como uma importante inovação dos programas estaduais. Além disso, trabalho demonstrou a diversidade de beneficiários cobertos pelas políticas apresentadas. Ainda que 25% dos programas (Prove/DF e Prove/Pantanal) tenham focalizado seus instrumentos nos produtores mais empobrecidos e sem experiência na atividade de agroindustrialização, a grande maioria das políticas estaduais centrou-se nos agricultores familiares capitalizados, organizados e com uma trajetória no processamento dos produtos agropecuários. Além disso, 1/3 dos programas deixaram de ter nos agricultores familiares o seu público exclusivo e passaram a abranger os estabelecimentos localizados no meio urbano, que operavam com mão-de-obra contratada, que não detinham matéria-prima própria e que possuíam uma renda bruta bem acima do que foi delimitado no Pronaf.

Em suma, os programas estaduais de agroindustrialização familiar que estiveram em vigor entre 1995 e 2010 desempenharam um papel importante no apoio às novas estratégias de reprodução dos agricultores no meio rural, embora sua cobertura tenha se centrado fundamentalmente em um público restrito. Assim, um dos principais desafios destas políticas é buscar alternativas que superem esta orientação centrada em alguns grupos de beneficiários, procurando ampliar a sua atuação para estratos da população rural que atualmente se encontram à margem destes processos e destes instrumentos.

 

Notas

[1] Esse trabalho é resultado da dissertação de mestrado do autor defendida junto ao Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ). O autor agradece ao prof. Dr. Sergio Pereira Leite, pela orientação da dissertação, e ao CNPq e Faperj, pela bolsa de estudo.

[2] Raupp, 2005, p. 1.

[3] O termo agroindústria familiar refere-se a “uma forma de organização em que a família rural produz, processa e/ou transforma parte de sua produção agrícola e/ou pecuária, visando, sobretudo, a produção de valor de troca que se realiza na comercialização” (Mior, 2005, p. 191).

[4] Maluf, 2001.

[5] Wilkinson, 2003.

[6] Wesz Junior, Trentin e Filippi, 2009.

[7] Maluf, 2001.

[8] Fernandes Filho e Campos, 2003.

[9] Leite, 2001, p. 53.

[10] Bianchini, 2005.

[11] Buainain, 1997.

[12] Maluf, 1999.

[13] Delgado, 2001, p. 27.

[14] Sumpsi, 2002.

[15] FAO/ONU, 1995.

[16] Delgado, 2001.

[17] FAO/ONU, 1995.

[18] Buainain, 1997.

[19] Delgado, 2001.

[20] No caso dos programas de crédito (Pronaf, Proger-Rural e Procera) é importante destacar que a situação diferenciada não está somente no público atingido, mas também nas condições do financiamento, já que as taxas de juros são menores, existe um maior período de carência, o prazo para o quitamento pode ser prorrogado e é comum a presença de rebate para os agricultores menos capitalizados.

[21] Raupp, 2005.

[22] Maluf, 2004, p. 300.

[23] Brandão, 2001.

[24] Oliveira, 2000.

[25] SADF, 1998, p. 5.

[26] SADF, 1998.

[27] Oliveira, 2000; Duarte, Brasil e Salviano, 2002.

[28] Para uma análise mais aprofundada sobre a mudança nas condições financeiras do Prove/DF ver Oliveira (2000).

[29] Oliveira, 2000.

[30] Carvalho, 1998.

[31] Oliveira, 2000

[32] Duarte, Brasil e Salviano, 2002.

[33] Carvalho, 1998.

[34] Carvalho, 1998.

[35] O término do Prove/DF está relacionado com o modo de construção do programa, que aconteceu fundamentalmente em função de uma pessoa (secretário da agricultura) e não das organizações de representação dos agricultores. Com isso, a opção do novo governo de cancelar a política ficou facilitada porque essa medida não provocaria a mobilização dos movimentos sociais ou sindicais na defesa do programa.

[36] Orsi, 2001.

[37] Oliveira, 2000.

[38] Carvalho, 2005, p. 6.

[39] Orsi, 2001, p. 49-50.

[40] Araújo, 2002.

[41] O FIS foi criado em 2000 para destinar parte dos recursos arrecadados através da cobrança de impostos para obras na área social.

[42] Araújo (2002).

[43] Prove-Pantanal adotou o sistema de “aval cruzado”, onde dois pequenos proprietários rurais participantes do programa se avalizam entre si.

[44] Cypas e Yazaki, 2006.

[45] Araújo, 2002.

[46] Araújo, 2002.

[47] Cypas e Yazaki, 2006.

[48] Araújo, 2002; Cypas e Yazaki, 2006.

[49] Santos, 2006; Araújo, 2002.

[50] Cypas e Yazaki, 2006.

[51] Cypas e Yazaki, 2006.

[52] Cypas e Yazaki, 2006.

[53] Tanto no Prove/DF como no Prove/Pantanal a entrada do Pronaf como fonte dos financiamentos acabou agregando algumas dificuldades, seja na enquadrabilidade dos agricultores ou nos resultados obtidos.

[54] Cypas e Yazaki, 2006.

[55] A discussão sobre o Programa de Agroindústria Familiar está baseada no trabalho de Raupp (2005).

[56] Dentre as 214 agroindústrias financiadas pelo PAF/RS, 131 foram grupais (61%), 11 cooperativas (5%) e 72 individuais (34%), sendo que o número médio de famílias por projetos ficou em 12,7. Esse resultado comprova que a opção em apoiar os projetos coletivos se manteve ao longo dos quatro anos, ainda que de forma não exclusiva. Essa conjuntura aponta para uma situação contrária ao que esteve presente no Prove/DF e no Prove/Pantanal, pois nesses casos foi elevada a supremacia de contratos individuais.

[57] Entre as 214 agroindústrias implantadas, 45% dos contratos foram oriundos do fundo estadual (Feaper) e o restante foi originário das linhas do Pronaf (55%). Além disso, os financiamentos via Feaper tiveram destaque em 2001, enquanto que em 2002, diante da crise econômica do Rio Grande do Sul, o Pronaf foi a fonte mais utilizada.

[58] Enquanto que no Prove/DF e no Prove/Pantanal a grande maioria das agroindústrias apoiadas acessou o crédito, no PAF/RS esse saldo se mostrou bem abaixo dos demais. Isso demonstra que muitos empreendimentos gaúchos já estavam em pleno funcionamento no momento em que o programa foi executado ou dispensaram a presença de financiamento pela disponibilidade de recursos próprios.

[59] Dentre as políticas criadas em Santa Catarina que não foram propostas pela Secretaria pode-se destacar o Programa Agroindústria de Pequeno Porte, implementado em 1994 pelo Cepagro (Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo), e o Projeto de Agregação de Valor aos Produtos e Serviços Oriundos da Agricultura Familiar e Pesca Artesanal de Santa Catarina, que foi organizado pela Epagri (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina) (Prezotto, 2005).

[60] Schmidt e Turnes, 2002.

[61] Mior, 2005

[62] Schmidt e Turnes, 2002.

[63] Com a desativação do Propagro, a Apaco (Associação dos Pequenos Agricultores do Oeste Catarinense) e a UCAF (Unidade Central das Agroindústrias Familiares do Oeste Catarinense) assumiram o Selo Sabor Colonial e definiram os critérios para o seu uso.

[64] Mior, 2005.

[65] Schmidt e Turnes, 2002.

[66] Diferentemente do Prove/DF, Prove/Pantanal e PAF/RS, o Desenvolver/SC não disponibilizou uma linha de crédito específica, não propôs a alteração das legislações e não intermediou o acesso aos mercados. A perspectiva do programa catarinense era de oferecer orientações sobre essas esferas a partir da capacitação dos agricultores. Um exemplo disso pode ser visto nos financiamentos, onde o Desenvolver/SC optou por esclarecer aos beneficiários as linhas disponíveis (Pronaf-Agroindústria e Pronaf-Agregar) em vez de criar um mecanismo paralelo.

[67] Schmidt e Turnes, 2002; Mior, 2005.

[68] Schmidt e Turnes, 2002.

[69] Schmidt e Turnes, 2002.

[70] SEAB, 2009.

[71] Gusi, 2000.

[72] Em 1999 o teto da arrecadação bruta anual poderia alcançar R$ 1,2 milhão nos regimes de Micro-empresa ou Empresa de Pequeno Porte.

[73] Del Grossi e Graziano da Silva, 2000, p. 10.

[74] SEAB, 1999.

[75] Del Grossi e Graziano da Silva, 2000.

[76] Del Grossi e Graziano da Silva, 2001, p. 16.

[77] Embora essa medida apresente uma semelhança com o que foi implementado no Prove/DF, existem algumas diferenças importantes. Na política paranaense foi criada uma associação de produtores para gerir a manutenção desses espaços, a entrega dos produtos, etc. Isso ofereceu uma maior autonomia aos beneficiários, além possibilitar aos gestores do programa o envolvimento em outras esferas de maior prioridade. Já no Distrito Federal era o governo que mantinha os espaços de comercialização, o que prejudicou a continuidade dessa estratégia com o término do Prove/DF.

[78] SEAB, 2009.

[79] Embora o nome contenha a designação de política social, o Prosperar/RJ está dentro dos programas setoriais na Secretaria da Agricultura, Pecuária, Pesca e Abastecimento (Seappa).

[80] Seappa, 2002.

[81] Seappa, 2002, p. 1.

[82] Seappa, 2002, p. 1.

[83] Essa informação foi obtida junto ao gestor do Prosperar/RJ durante a V Feira da Agricultura Familiar e Reforma Agrária no Rio de Janeiro/RJ (novembro de 2009).

[84] O Estado do Rio de Janeiro Rural, 2008.

[85] Seappa, 2008.

[86] Seappa, 2008.

[87] Seder, 2008, p. 1.

[88] Seder, 2008.

[89] De forma paralela ao Programa Minas Artesanal/MG, que abrange todos os produtos artesanais, existem no Estado políticas específicas para a cadeia do queijo (Programa de Apoio aos Queijos Tradicionais de Fabricação Artesanal) e da cachaça (Programa de Produção de Cachaça de Qualidade).

[90] Seapa, 2007, p. 1.

[91] Seapa, 2007.

 

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[Edición electrónica del texto realizada por Miriam Hermi Zaar]

 

Ficha bibliográfica:

WESZ JUNIOR, Valdemar João. Análise comparada dos programas estaduais de agroindustrialização na agricultura familiar brasileira (1995 – 2008). Biblio 3W. Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales. [En línea]. Barcelona: Universidad de Barcelona, 5 de junio de 2012, Vol. XVII, nº 979. <http://www.ub.es/geocrit/b3w-979.htm>. [ISSN 1138-9796].



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