Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona.
ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. IX, núm. 194 (75), 1 de agosto de 2005

 

POLÍTICAS DE INTERVENÇÃO EM ÁREAS DE RISCO NO MUNICÍPIO DE CAMPINAS

 

Ana Luiza Roma Couto Serra

UNICAMP, Brasil

E-mail: aluiza@dglnet.com.br

 

Daniella Farias Scarassatti

UNICAMP, Brasil

E-mail: daniella@sigmanet.com.br

 

Fábio Giardini Pedro

UNICAMP, Brasil

E-mail: fgpedro@fec.unicamp.br

 

Jason Patrick Katz

UCLA, USA

E-mail: katzjp@ucla.edu

 


Políticas de intervenção em áreas de risco no município de Campinas (Resumo)

Dentre os inúmeros problemas que afligem os centros urbanos, destaca-se a dramática situação habitacional dos grupos sociais estabelecidos em áreas de risco.  Em sua maioria, estão assentados em zonas ambientalmente frágeis, impróprias à urbanização, não disputadas pelo mercado, distantes, em periferias com pouca acessibilidade e carentes de infra-estrutura. Tal condição representa um enorme desafio aos governos das cidades que devem formular e implementar políticas públicas relacionadas a estas situações inadequadas de uso e ocupação do solo. Neste sentido, ressalta-se o gerenciamento de riscos em assentamentos precários, remoção da população exposta e manejo das áreas removidas para impossibilitar sua reocupação. Na prática, trata-se de uma questão complexa que impõe medidas e realizações urgentes voltadas a romper com o conjunto de questões que perpetua o padrão excludente de desenvolvimento informal que se tornou a regra e não a exceção. Frente a este quadro, e em confluência com a necessidade de se garantir a inclusão social e espacial dessas comunidades à terra urbanizada, este artigo avalia,  a partir de um estudo de caso empírico, as formas de intervenção e os programas voltados à transferência e reassentamento de famílias que vivem em ocupações informais sujeitas a restrições ambientais no município de Campinas.

 

Palavras-chaves: áreas de rico, reassentamentos, políticas públicas, centros urbanos


Politics of intervention in areas of risk in Campinas (Abstract)

Most urban centers in Brazil contain a large marginalized population that live in slums, or in slum-like conditions on squatted land.  Many have taken to residing in risk- areas consisting of environmentally fragile lands unsuitable for development and as a consequence have little, or no way of obtaining access to the standard urban amenities available.  Local authorities thus face great difficulties in developing and implementing effective land use and housing policies that are inclusive of all constituents.  The quick resettling of these communities into affordable housing units has been a standard government practice, often creating complex socio-spatial problems in the process.  In this context, this work attempts to analyze and evaluate the various politics of intervention as initiated by the government, as well as the resettlement and housing programs for the marginalized communities residing in risk-areas, currently being undertaken in the city of Campinas.

 

Keywords: risk, resettlement, public policy, urban centers.


 

 

Introdução

 

Parcela considerável de municípios que compõem a rede urbana brasileira exibe processos informais de desenvolvimento urbano, em diferentes graus e intensidades.

 

Oriundos de uma práxis urbana excludente, estes processos irregulares de apropriação desse solo, traduzem-se em uma multiplicidade de situações com graves e profundos reflexos sociais, habitacionais, urbanísticos, ambientais e legais, espelhando, no nível do espaço, uma dinâmica cada vez mais insustentável.

 

 Assim, a realidade destes territórios requer a busca de propostas de planejamento e gestão urbanas que, ao mesmo tempo, rompam com as dicotomias do passado e criem condições de urbanidade para todos, o que, segundo Magalhães (2002), implica em trabalhar por uma eficiência urbanística que considere o todo da cidade e deixe de lado, políticas equivocadas de privilégio na distribuição espacial dos investimentos, sejam públicos ou privados.

 

Desta forma, o desafio que se coloca, é o comprometimento em todos os níveis de governo com políticas integradas e articuladas de acesso à cidade legal. Neste particular, como aponta Milton Santos (2005, pp. 140), “a vontade política é o fator por excelência das transfusões sociais”.

 

Neste contexto, políticas e programas que visem o enfrentamento da informalidade urbana, realizadas em um primeiro momento, a nível local, constituem fontes de experiências a serem avaliadas, para servirem de exemplo ou de aviso, especialmente em casos de erros ou fracassos.

 

Com este propósito, esta pesquisa analisa um programa desenvolvido pela Administração Municipal de Campinas para transferir 614 moradores oriundos de três assentamentos subnormais em áreas ambientalmente frágeis; as várzeas de rios, que deveriam ter sido de preservação permanente e onde a ocupação desordenada acirrou a relação causa-efeito entre a pobreza e a degradação ambiental.

 

Embora Campinas se constitua em um território extremamente privilegiado para a reprodução do capital, atraindo investimentos de vários setores da economia, a cidade apresenta um intenso quadro de dualidade na base material da vida social e do desenvolvimento.

 

Os resultados dessa dinâmica são verificados, entre outros, pelo número de indivíduos morando em condições precárias e irregulares, que segundo a Secretaria Municipal de Habitação (2004), é de cerca de 158.000 pessoas, em um universo de pouco mais de um milhão de habitantes.

 

Diante deste quadro, a construção de políticas e projetos coerentes e em sintonia com a realidade local é condição importante para afrontar esta realidade latente ou, ao contrário, fica-se com a impressão que diferentes grupos sociais pertencem a universos separados e têm demandas irreconciliáveis.

 

 

Territórios de Exclusão em Campinas: contextualização

 

O aumento da pobreza, o desenvolvimento de crescentes processos de ocupação informal, a fragmentação das cidades, bem como a segregação urbana, são desafios que se impõem aos formuladores de políticas urbanas no Brasil. Em Campinas, importante metrópole regional do interior do Estado de São Paulo, esses desafios encontram-se bem demarcados e refletem as desigualdades e contradições sociais relacionadas à sua formação histórica de produção e apropriação do espaço urbano, marcados por uma conjuntura expansiva com um forte componente especulativo nos negócios imobiliários.

 

Fundada, no século XVIII, como parte de uma estratégia maior, a montagem de uma agricultura significativa, baseada na produção açucareira para, através da agricultura, romper com o atávico despovoamento paulista (Santos, 1999), Campinas nasceu de um pouso à beira do caminho dos Goiases, rota secundária do ciclo da mineração. No início, eram apenas três ruas; a de cima, a do meio e a de baixo, abertas em um rossio de ¼ de légua desmembrada da propriedade de seu fundador e diretor da povoação. Era ele quem dividia os terrenos distribuindo-os a quem se dispusesse a construir, mediante auxílio às obras da matriz (Badaró, 1996). Entretanto, a doação dos terrenos para a construção seguia critérios de posse dos interessados e tamanho das casas que pretendiam erguer. Aos trabalhadores livres e pobres, em sua maioria agricultores, eram designados pequenos sítios fora do rossio, sem a configuração da ordenação dos bairros.

 

A vila do açúcar se transformou na cidade do café e a economia cafeeira conduziu a expansão e a transformação do território e das funções urbanas na cidade (Silva, 1996). Multiplicaram-se as casas no povoado, revelando, através das dimensões ou materiais ostentados nas fachadas, as marcas da posição social de cada um.

 

Cabe aqui assinalar que, no Brasil, o chamado “ciclo do café” envolveu duas formas distintas de organização da produção e da sociedade cafeeiras, separadas pela introdução do trabalho livre, baseado na imigração em massa de colonos europeus, em substituição ao trabalho escravo. Neste sentido, como estratégia para impedir que escravos libertos e imigrantes pobres se tornassem pequenos proprietários e privassem a economia cafeeira de força de trabalho, foi promulgada a Lei de Terras em 1850, que tornou a via da posse ilegal. A posse foi por um curto período de tempo, da suspensão da concessão de sesmarias, em 1822, até a promulgação da Lei de Terras, a única via de acesso à apropriação legítima das terras públicas, pois, o direito dos posseiros era reconhecido, caso as terras estivessem efetivamente cultivadas. Desta forma, a riqueza monetária tornava-se o único passaporte válido para a propriedade da terra.

 

Neste cenário, irá se configurar na cidade uma tensão entre ricos e pobres na busca de onde morar. A estes, serão destinados os cortiços ou as áreas designadas a abrigar instalações insalubres, não desejadas, junto ao núcleo urbano central; cemitérios, Lazaretos dos Morphéticos e dos Variolosos, Matadouro Municipal e também as habitações operárias (Serra, 2002).

 

A crise cafeeira de 1930 representou o fim de uma época. No cenário nacional, a oligarquia cafeeira era derrubada do poder pelo movimento revolucionário que conduziu Getúlio Vargas ao poder. Localmente, a elite fundiária, sempre atenta aos seus interesses, vai à busca de um “horizonte seguro para as inversões de capitais”(Caiado et al., 2002 pp. 124), transformando propriedades rurais em urbanas e investindo na construção civil.

 

Detentora de um projeto urbano para a cidade, esta elite, viu-o ameaçado ante a crescente expansão urbana. Neste sentido, era necessário um plano urbanístico que ordenasse esse crescimento. Assim, é feita a contratação, em 1934, do engenheiro Prestes Maia para estudar o plano para a cidade (Badaró, 1996). Executado ao longo de vinte anos por diversos e sucessivos governos, o plano de Prestes Maia foi reduzido a um “Plano de Melhoramentos Urbanos” voltado para a transformação radical do centro, com ênfase em questões viárias e estéticas (Caiado et al., 2002).

 

Segundo Badaró (1996), os melhoramentos executados não se destinaram à totalidade da população, à medida que as propostas atendidas foram aquelas de interesses das classes dominantes, em prejuízo das demais, relegadas ao plano da utopia ou da marginalidade. Para Santos (1999, pp.239), a afirmação do ante-projeto do plano, “como obra muito pouco aberta, objeto apenas de trocas políticas e negócios urbanos, interessaria às frações do capital local voltadas para a produção, apropriação e consumo do espaço, notadamente aquelas de caráter especulativo imobiliário”.

 

Para este autor, o plano representou o simulacro da cidade remodelada; “Nela não cabe o proletariado historicamente emergente da periferia mais distante e muito menos dos cortiços e fundos de quintal do centro da cidade” (Santos, 1999, pp. 241).

 

A partir de 1950, a urbanização da cidade, passou a se consolidar de forma mais intensa. Extensos loteamentos foram implantados fora da malha urbana consolidada, construindo uma periferia sem continuidade com a mancha urbana anterior (Caiado et al., 2002).

 

Na década seguinte, a cidade começou a receber grandes contingentes de trabalhadores oriundos do campo, sem o devido investimento em habitação, o que acarretou o surgimento das primeiras favelas no município. Nesta época, a imprensa local começava a cobrar da administração municipal, mais atenção aos bairros populares e a criticar a prioridade de investimentos em obras centrais. Atacava também a presença crescente de mendigos no centro e o surgimento das favelas, pedindo providências junto à polícia (Lopes, 1997).

 

Se em um primeiro momento, o surgimento das favelas na cidade, foi tratado como um caso de polícia, logo ficou claro que esta não daria conta de sua erradicação completa. Era também uma questão política, econômica e social o que requereria tratamento especializado (Lopes, 1997). Desta forma, em 1965, foi criada através de lei municipal, a Companhia de Habitação Popular de Campinas – COHAB – para resolver o problema da habitação popular. Em um contexto de demanda por habitações para trabalhadores de baixa renda, altos índices de migração, deterioração de serviços urbanos, a COHAB iniciou diversos programas de construção de vilas populares (Lopes, 1997). Um de seus primeiros programas, em 1969, o “Projeto Casas Transitórias”, em parceria com a Secretaria de Bem-Estar Social, prometia no curto prazo, diminuir o número de “favelados”, e a longo prazo, a completa erradicação das favelas. Consistiu na remoção de moradores de favelas, para residências provisórias, pagando aluguéis simbólicos, por um período que se julgava suficiente para habilitá-los à aquisição de casa financiada pelo Banco Nacional de Habitação – BNH (Fernandes & Oliveira, 2001), instituição federal de desenvolvimento urbano.

 

Transcorrido o prazo estimado, a casa deveria ser cedida a outra família. Embora, este programa fosse tido como modelo de combate às favelas, na realidade propiciou a liberação de espaços da cidade que se pretendia valorizar (Lopes 1997).

 

Contudo, foi a partir da consolidação de seu processo de desenvolvimento industrial e modernização agrícola, na década de 1970, que Campinas passou a apresentar um acentuado crescimento físico territorial, marcado por intensa horizontalização e periferização, com a formação de vazios urbanos retidos como reserva de valor.

 

Nesta década, os movimentos migratórios aparecem como necessários para o grande impulso industrial no município, palco privilegiado do processo de desconcentração industrial, a partir da Região Metropolitana de São Paulo, recebendo importantes investimentos. (Baeninger, 2001).

 

Foi neste contexto de intenso crescimento populacional, causado principalmente pelos fluxos migratórios que vieram abastecer de mão-de-obra, abundante e barata, o desenvolvimento industrial, que se formou uma enorme reserva de mão de obra, com uma série de demandas sociais.

 

Assim se consolidava o crescimento demográfico da periferia, que “fez surgir entre as regiões oeste e sul uma nova cidade, cujos limites ainda não se vislumbravam” (Cunha e Oliveira, 2002 pp. 356). Neste sentido, muito contribuiu a política executada pela COHAB de compra de terra barata e próxima às industrias, para viabilizar empreendimentos habitacionais populares.

 

No período atual, a cidade continua vivenciando produções espaciais segregacionistas em função do agravamento das desigualdades sociais, provocadas principalmente pela reestruturação do processo produtivo capitalista, que tornou disfuncional o modo de acumulação fordista e gerou modificações amplas em todas as esferas das relações sociais e de produção.

 

Dados compilados da Segunda Conferência Municipal de Habitação (2004), organizada pela Secretaria Municipal de Habitação, revelam um universo de mais de 15% da população da cidade morando em condições precárias e irregulares, desprovidas de infra-estrutura básica, em 200 loteamentos ilegais (clandestinos e irregulares), 85 núcleos de favelas e 56 ocupações em áreas públicas e particulares, totalizando 14,8% da área do município, que é de 796,4 km2. Quanto ao total de pessoas vivendo em áreas sujeitas a risco, não há dados sistematizados. Estima-se que 5.228 famílias vivem em condições de risco e destas 1.200 encontram-se em risco iminente.

 

Indubitavelmente, o crescimento das ocupações ilegais e das favelas no município é resultante de um processo histórico de urbanização orientado por uma lógica expansiva, seletiva e excludente. O produto desta dinâmica é um espaço revelador de contradições, através do uso do solo, da justaposição entre riqueza e pobreza, da segregação estampada na paisagem.

 

 

Compondo o Cenário: atores e conflitos

 

A história das áreas ocupadas mediante processos informais de desenvolvimento em Campinas é muito pouco conhecida e carente de informações adequadas, mesmo as representações cartográficas do município não as retratam. Neste contexto, quase não há registro disponível a respeito dos três núcleos habitacionais analisados neste trabalho. São eles; Núcleo da Vila Nogueira – Ruas Luiza de Gusmão e Moscou – e Novo Flamboyant – Rua Três do São João da Vitória, que se desenvolveram em áreas públicas de loteamentos destinados à população de baixa renda. Estas áreas, que já foram periféricas, atualmente são quase centrais e se transformaram em bairros residenciais de classe média e alta.

 

Em relação à divisão territorial estabelecida no Plano Diretor do Município[1] de 1995, integram a Macrozona 4 – Área de Urbanização Consolidada. Principal macrozona da cidade, abrange a região mais adensada do município e caracteriza-se por compreender toda a área central e bairros predominantemente de classe média e alta, concentrando o maior número de atividades urbanas (Prefeitura Municipal de Campinas, 1995).

 

Deve-se, possivelmente, a presença de equipamentos comerciais de abrangência regional, a escolha deste espaço por estes assentamentos, visando morar próximo de locais que concentram empregos, e o aproveitamento dos equipamentos públicos, como creches, escolas e postos de saúde.

 

O núcleo da Vila Nogueira localiza-se à margem direita da Bacia do Ribeirão Anhumas, que se encontra com um alto grau de comprometimento ambiental. Dois outros núcleos de assentamentos precários estão localizados aí; Núcleo Residencial Parque São Quirino e o Núcleo Residencial Dom Bosco. Estes núcleos são oriundos da década de 1970, com a construção de barracos em área de praça, tendo, porém se expandido em meados da década de 1980 (Prefeitura Municipal de Campinas, 1993).

 

Tentativas de erradicação parcial dos barracos localizados à beira do córrego, em áreas consideradas de risco, foram efetuadas em 1990, em conseqüência de fortes chuvas, que impuseram à prefeitura medidas emergenciais, no tocante a relocação das famílias mais atingidas.   No entanto, algumas famílias não se adaptaram às novas moradias e voltaram a se instalar nessas mesmas áreas (Prefeitura Municipal de Campinas, 1993).

 

Embora a interação entre os moradores das três áreas seja parcial, eles estão organizados para reivindicar melhorias, e cada área possui a sua associação de moradores, com presidentes ativos e dinâmicos.

 

Os domicílios nas ruas Luiza de Gusmão e Moscou são bastante precários, desprovidos de infra-estrutura, fruto da autoconstrução que emprega toda a família. Muitas vezes há um número excessivo de moradores por cômodos, em barracos que se equilibram na beirada do córrego. É muito alta a suscetibilidade a enchentes e a cada ano tragédias com inúmeros desabrigados e até mesmo com vitimas fatais se repetem.

 

Quanto à rua Três do Núcleo São João da Vitória, também conhecido como “Buraco do Sapo”, seu surgimento é contemporâneo aos outros dois, sendo sua localização próxima ao Shopping Iguatemi de Campinas. A precariedade das construções repete-se aqui; barracos construídos com restos de madeira, sem saneamento, estão expostos a desmoronamentos e deslizamentos que, igualmente, já produziram vitimas fatais.

 

Perpassando todos os núcleos, a violência está institucionalizada nestas áreas. A convivência com diferenças de renda consideráveis, em espaços muito próximos, gera conflitos e estigmas. Vítimas de atos praticados por bandidos que vivem e se escondem nos núcleos de favelas, muitos dos moradores do entorno formal, não distinguem bandidos de trabalhadores. Estes últimos, por sua vez, são também vítimas do sistema e têm que conviver em um ambiente de medo e insegurança imposto pela violência.

 

Desta forma, sob a égide da insegurança, os bairros se fecham ao convívio público, através de muros, cercas elétricas e vigilância constante, formando espaços privados, que diminuem o uso múltiplo do local, exasperando as disparidades sociais e realimentando a própria violência.

 

 

Analisando as Intervenções Propostas

 

A presente análise terá como eixo norteador a política municipal de habitação, e discutirá  as formas de intervenção, em um programa de habitação popular, ainda em curso, para transferir famílias que vivem em áreas de risco na cidade.

 

Assim, com o objetivo de transferir 614 famílias oriundas das áreas de risco mais comprometidas do município, especialmente os moradores das ruas Três, Luiza de Gusmão e Moscou (figura 1), a Prefeitura Municipal de Campinas em parceria com a COHAB, com o Governo do Estado de São Paulo, em um primeiro momento e a Caixa Econômica Federal – CEF –, viabilizam a construção de um empreendimento de interesse social, através do chamado Programa de Subsídio Habitacional –– PSH ––; o Loteamento Residencial Olímpia.

 

O PSH consiste em uma linha de crédito para custear construções habitacionais às famílias de baixa renda, cabendo ao poder público municipal, a responsabilidade em oferecer o terreno, realizar o cadastramento dos moradores e dotar de infra-estrutura o local.

 

O Residencial Olímpia terá, segundo técnicos da COHAB, 537 casas térreas com 42 m2 e 80 sobrados com 46 m2,, com valor médio de R$ 6.000,00, em área localizada ao norte da cidade, que apesar de se encontrar no perímetro urbano, apresenta características rurais. O entorno imediato é composto por várias propriedades rurais e seu acesso se dará por caminho não pavimentado, a cerca de um quilômetro da única via de acesso, que comporta também vários outros empreendimentos de interesse social. Esta via apresenta condições inadequadas de tráfego, em quase cinco quilômetros de mão única, sem sinalizações, passarelas para pedestres e iluminação.

 

Foram definidos para este loteamento, mas ainda dependentes de captação de recursos para sua viabilização, áreas para escola e creche, para sistema de lazer, comércio e estação de tratamento de água e esgoto.

 

Até o presente momento foram convocadas 274 famílias, que vivem em risco iminente, nas áreas em foco, para aderirem a este programa. A prestação a ser paga para cada família será em torno de R$ 52,00 mensais, para uma média de renda entre 1 e 4 salários mínimos, que atualmente é de R$ 260,00. Entretanto, as famílias deverão esperar até o final de 2005 para a conclusão das obras e se transferirem.

 

Estas famílias fazem parte de um cadastro realizado através de um conjunto de medidas, que incluiu: levantamento topográfico, ambiental, social e de legislação para viabilizar o projeto técnico de transferência e urbanização da área desocupada, para impedir novas ocupações.

 

Com o intuito de revisar sua política de habitação, a Prefeitura Municipal de Campinas organizou, a Primeira Conferência Municipal de Habitação, em março de 2002, em conjunto com diversos órgãos da prefeitura e dos movimentos populares de moradia.

 

Definem-se, neste momento, três eixos de atuação desta política, a saber: 1. regularização fundiária e urbana de assentamentos existentes; 2. produção de assentamentos e conjuntos edificados parcial ou integralmente novos; 3. um sistema permanente de participação popular nas decisões. Discutem-se, igualmente, as condições gerais a serem seguidas para a produção de novos empreendimentos de habitações de interesse social (Prefeitura Municipal de Campinas, 2002).

 

O primeiro eixo possui como objetivo principal transformar as áreas já ocupadas e em condições de habitabilidade em Núcleos ou Bairros urbanizados, contemplando o direto à posse ou direito real ao uso da terra, por meio da regularização cartorária e registro de lotes. Ainda esse, visa a aprovação do traçado urbano, arruamento e parcelamento do solo em lotes, projeto e execução da infra-estrutura urbana e a previsão de equipamentos públicos comunitários, sistemas de recreação e lazer.

 

No segundo eixo, são contemplados novos planos e a viabilização de empreendimentos coletivos idealizados pelo poder público municipal ou estadual, devendo estes oferecer qualidades urbanísticas e uma maior diversidade de produtos ou tipologias de edificações, destinados para população de baixa renda. Assim sendo, a proposta de tais projetos necessitará da participação dos futuros moradores nos estudos iniciais até a entrega das unidades, tendo em vista sempre a viabilidade técnica-econômica de sua implantação.

 

Com o terceiro eixo, pretende-se tornar cada vez mais eficaz a estrutura da SEHAB (Secretaria da Habitação) em articular ações e unir forças com a COHAB para o estreitamento das relações com os demais órgãos do governo, para desta maneira alcançar respostas adequadas à realidade das comunidades e assegurar sua participação na política, planejamento, projetos e execução de melhorias.

 

No tocante à formulação da política de habitação no município, alguns pontos foram ressaltados:

 

Ocupação das áreas ociosas da cidade: trata dos procedimentos a serem adotados pelos movimentos a serem organizados junto à prefeitura, com relação a glebas vazias dentro do perímetro urbano visando coibir o uso especulativo da terra. A identificação das áreas ociosas pode ser feita pela indicação dos proprietários, da prefeitura e dos movimentos de moradia. Por meio de editais de convocação pública a prefeitura promoveria as possíveis parcerias e condições gerais dos empreendimentos. A elaboração de projetos urbanos preliminares para cada área selecionada permitiria a viabilização da ocupação das áreas selecionadas.

 

Legalização de favelas e ocupações existentes: define as ações diretas e indiretas para que as favelas e ocupações recebam obras de infra-estrutura necessárias para serem regularizadas. Caberia a prefeitura a atualização das informações sobre favelas e ocupações para o desenvolvimento de planos e projetos de urbanização, permitindo assim o cálculo do custo de serviços e obras a serem realizadas. Posteriormente deveriam ser equacionados os obstáculos de regularização jurídica para permitir a regularização urbanística e urbanização das favelas e ocupações.

 

Produção pública de habitações de interesse social: compilação das condições gerais que a prefeitura junto com as companhias de habitação deveriam obedecer para produzir novos conjuntos habitacionais ou loteamentos populares de interesse social. Inclui ações para seleção e aquisição de terrenos ou glebas em zona urbana em espaços adequados a consolidação e adensamento da cidade. O planejamento e projeto dos empreendimentos de habitação de interesse social devem incluir obrigatoriamente estudo de viabilidade econômica, para permitir a contratação e execução de obras.

 

Empreendimentos coletivos produzidos em auto-gestão: solução para áreas adequadas ao uso residencial, ocupadas ou não, ou disponíveis para urbanização, a partir da ação do poder público e dos movimentos de moradia. A comunidade organizada ou grupos de auto-construtores, contrata a equipe técnica, discute o projeto, busca financiamento e administra e executa as obras de urbanização em sistema cooperativo. Cabe a prefeitura a orientação do grupo indicando equipes técnicas e financiadoras.

 

Políticas de subsídios através dos fundos municipais: estabelece formas de combinação do financiamento com contratos temporários de subsídios. Regulamenta operações consorciadas de créditos públicos e/ou privados, participação de ONGs e de setores empresariais, com o objetivo de assegurar o acesso à moradia, independente de renda. Caberá ao Conselho Municipal de Habitação a implementação de instrumentos da política municipal de subsídios habitacionais, como a regulamentação, fiscalização e acompanhamento de todas as ações referentes a estes subsídios.

 

Mecanismos gerais de participação popular: criação do Conselho Municipal de Habitação e indicações gerais para sua constituição e funcionamento. O Conselho Municipal de Habitação como principal órgão de participação popular deverá ser constituído por representantes do poder público das entidades da sociedade civil e por conselheiros populares eleitos em bairros ou regiões de Campinas. Uma ação a ser tomada consistiria na ampliação e abertura às entidades e associações de moradores de acessória jurídico-urbanística, imprescindível para acelerar os processos de regularização fundiária. Além disso, a ampliação e intercâmbio de experiências e ações locais em habitação permitiriam adotar estratégias conjuntas de lutas por moradia e reforma urbana na escala regional.

 

Em relação a áreas de risco, uma das metas do programa de regularização fundiária e urbana, ainda em estruturação, é a definição de situações de risco e o estabelecimento de critérios para remoção de famílias.  Há preocupação em inibir a reocupação ou a negociação destas áreas. Quando da produção de novos conjuntos habitacionais, a prioridade em programas de transferência, será dada aos moradores de áreas de risco.

 

Embora, as soluções para as situações de risco preconizadas no âmbito da política municipal de habitação de Campinas, preveja projetos habitacionais, preferencialmente, próximos ao local de origem, o empreendimento em análise está sendo executado em área longínqua do lugar onde estas pessoas estabeleceram sua vida cotidiana, vínculos e relações.

 

Neste sentido, Carlos (2001, pp.220) reflete que “...quando os homens se tornam instrumentos no processo de reprodução espacial, e suas casas se transformam em mera mercadoria, passíveis de serem trocadas e derrubadas, então a atividade humana do habitar, do estar com o outro, do reconhecer-se neste lugar e não no outro, reduz-se a uma finalidade utilitária”, ou ainda, como assinala Santos (2002, pp. 328) “Quando o homem se defronta com um espaço que não ajudou a criar, cuja história desconhece, cuja memória lhe é estranha, esse lugar é a sede de uma vigorosa alienação”.

 

Outro aspecto que não pode ser deixado de lado diz respeito à preocupação, que os futuros mutuários, têm de se tornarem inadimplentes com o compromisso de pagamento mensal das residências adquiridas, ainda que, achem justo o pagamento pelos benefícios proporcionados, como luz, rede de água e esgoto. Este programa não prevê nenhuma indenização pela transferência ou auxilio habitacional. Além do mais, a mudança de um espaço de urbanização consolidada para outro com características rurais implica, além de maiores custos com deslocamentos, a perda de acessibilidades advindas da localidade anterior, como escolas, creches, centros comunitários, comércio de abrangência regional, prestação de serviços, as oportunidades não serão as mesmas.

 

Com relação à geração de trabalho e renda, o programa é omisso. Muitas das famílias a serem transferidas sobrevivem da venda de material reciclável coletado no entorno, para tanto, necessitam estar próximas de residências cujos resíduos tenham maior valor comercial.

 

Um ponto bastante positivo é o atendimento social às famílias, que contam com a participação de assistentes sociais que realizaram um levantamento de dados sobre as condições de vida, origem, fontes de renda, além de orientar sobre os procedimentos de mudança e as novas formas de habitar.

 

Antevemos que o grande desafio deste programa, será assegurar a permanência da população beneficiada no novo local, a não ser que ações efetivas de inclusão socioeconômica sejam realizadas. 

 

 

Considerações Finais

 

O compromisso de implementar a recém elaborada política habitacional do município, é essencial para se buscar a superação dos problemas habitacionais e de degradação territorial, historicamente construídos na cidade. Como já referido no texto, o crescimento urbano no município de Campinas sempre esteve articulado à dinâmica econômica e a interesses da elite local, em um processo ratificado pelo poder público que não foi capaz de promover o adequado ordenamento territorial. As conseqüências dessa expansão permanecem na atualidade e se traduzem em diferentes realidades nas diversas regiões da cidade.

 

Desse modo, a parcela da população excluída do desenvolvimento econômico, se insere no território municipal em um contexto de fragmentação e segregação, que fez emergir situações de precariedade urbana, degradação ambiental e, por conseguinte, uma maior exposição a riscos ambientais e de saúde pública, expondo os indivíduos a uma vida de cidadania invertida.

 

Assim, mais uma vez nos referimos a Milton Santos (1987, pp.7), para perguntar: “Quantos habitantes, no Brasil, são cidadãos? Quantos nem sequer sabem que não o são?”.

 

Para este autor o “simples nascer investe o individuo de uma soma inalienável de direitos, apenas pelo fato de ingressar na sociedade humana. Viver, tornar-se um ser no mundo, é assumir, com os demais, uma herança moral, que faz de cada qual um portador de prerrogativas sociais. Direito a um teto, à comida, à educação, à saúde, à proteção contra o frio, à chuva, as intempéries, direito ao trabalho, à justiça, à liberdade e a uma existência digna” (Santos, 1987, pp.7).

 

No Brasil, o direito à moradia, só foi garantido por meio de Emenda Constitucional, em 2000, e incluído no rol dos direitos constitucionais, sob o Capítulo II, como Direito Social. Segundo Alexandre de Moraes (2000) apud Iglesias & Souza (2004, pp. 114), “os direitos sociais caracterizam-se como verdadeiras liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado social de direito, tendo por finalidade a melhoria das condições de vida dos hipossuficientes, visando à concretização da igualdade social, que configura um dos fundamentos de nosso Estado democrático”.

 

O atual cenário político do país tem promovido suporte à ação dos estados e municípios na implantação de programas de regularização dos assentamentos informais, mediante o fomento de programas para a produção de moradias populares. Outro fator que ressalta a necessidade de ações voltadas às reais demandas e interesses dos moradores de áreas informais é o Estatuto da Cidade, que dispõe sobre a importância de uma maior representatividade da sociedade, na constituição de organizações por região ou tipo de assentamentos.

 

Desta forma, não se pode esvaecer o papel do Estado na questão habitacional, principalmente em relação à habitação popular. Programas voltados a reduzir a informalidade urbana devem contar, prioritariamente, com a vontade política do executivo municipal, com a cooperação entre União, Estados e Municípios, bem como com parcerias de outros agentes urbanos.

 

O desafio é coletivo e implica na construção de uma nova espacialidade, que dê plena realização ao homem, tanto no sentido objetivo quanto subjetivo do ser, ou seja, a possibilidade de construir uma vida melhor, baseada em um projeto político–social que permita construir uma qualidade de vida coletiva.

 

 

Notas

 

[1] Segundo a Prefeitura Municipal de Campinas (1995), com o objetivo de planejar e gerir o crescimento urbano do município, com base em condutas voltadas para as soluções dos problemas urbanos estruturais, que a cidade apresenta, foi realizado o macrozoneamento de planejamento. O macrozoneamento abrange todo o município, compreendendo tanto a zona urbana, como a zona rural; desta forma o “município foi subdividido em 7 macrozonas, que se diferenciam por suas características de dinâmica de desenvolvimento e para as quais definiram-se diretrizes estratégicas de orientação para um desenvolvimento adequado” (PREFEITURA MUNICIPAL DE CAMPINAS, 1995).

 

 

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© Copyright Ana Luiza Roma Couto Serra, Daniella Farias Scarassatti, Fábio Giardini Pedro, Jason Patrick Katz, 2005

© Copyright Scripta Nova, 2005

Ficha bibliográfica:

COUTO, A.; FARIAS, D.; GIARDINI, F.; KATZ, J. Políticas de intervenção em áreas de risco no município de Campinas. Scripta Nova. Revista electrónica de geografía y ciencias sociales. Barcelona: Universidad de Barcelona, 1 de agosto de 2005, vol. IX, núm. 194 (75). <http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-194-75.htm> [ISSN: 1138-9788]

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