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Índice de Scripta Nova

Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona. ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. XVI, núm. 395 (15), 15 de marzo de 2012
[Nueva serie de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana]

 

JUSTIÇA, CULTURA E SUBJETIVIDADE: TECNOLOGIAS JURÍDICAS E A FORMAÇÃO DE NOVAS SENSIBILIDADES SOCIAIS NO BRASIL

Patrice Schuch
Departamento de Antropologia - Universidade Federal do Rio Grande do Sul
patrice.schuch@uol.com.br

Recibido: 15 de septiembre 2010. Aceptado: 21 de julio de 2011.

Justiça, Cultura e Subjetividade: tecnologias jurídicas e a formação de novas sensibilidades sociais no Brasil (Resumo)

A partir do estudo etnográfico dos processos de reforma legal no campo da infância e juventude no Brasil e da introdução da justiça restaurativa, busco compreender aspectos dos modos de governo da infância e juventude no país. Sugiro que tais dispositivos de intervenção possam ser vistos a partir de dois processos correlatos: de um lado, a ênfase na retórica dos direitos como instrumentos para a “modernização” e desenvolvimento social; de outro lado, a tentativa de criação de “sensibilidades modernas” e de novos tipos de pessoa, nos quais os valores da individualidade, autonomia e auto-responsabilidade são enfatizados. Meu interesse dirige-se ao entendimento de como novas tecnologias de construção de si intersectam com moralidades diversas e com outras tecnologias de intervenção social, complexificando retóricas unilineares sobre “modernidade”, direitos e processos de redemocratização.

Palavras chave: justiça, subjetividade, tecnologias de construção de si, infância e juventude.

Justicia, Cultura y Subjetividad: las tecnologías judiciales y la formación de nuevas sensibilidades sociales en el Brasil (Resumen)

A través del estudio etnográfico de los procesos de la reforma legal en el campo de la infancia y de la juventud en el Brasil y de la introducción de la justicia restaurativa, me propongo comprender algunos aspectos de las maneras del gobierno de la infancia y la juventud en el país. Sugiero que estos enfoques de intervención pueden ser vistos por dos procesos ligados: por una parte, los énfasis en la retórica de los derechos como instrumentos de modernización y desarrollo social; por otro, el intento de crear "sensibilidades modernas" y nuevos tipos de persona en el que los valores de la individualidad, la autonomía y la auto-responsabilidad se acentúan. Mi interés es comprender cómo estas nuevas tecnologías de la construcción del yo son relacionadas con morales diversas y con otras tecnologías de intervención social, haciendo suposiciones unilaterales sobre la modernidad, los derechos y los procesos de democratización más complejas.

Palabras clave: justicia, subjetividad, tecnologías del yo, infancia y juventud.

Justice, Culture and Subjectivity: juridical technologies and the formation of new social sensibilities in Brazil (Abstract)

Through the ethnographic study of the processes of children rights reform and the study of the restorative justice, I aim to comprehend some aspects of childhood and adolescence governance in Brazil. I suggest that these intervention approaches can be seen through two linked processes: on the one hand the emphases on the rhetoric of rights as instruments of modernization and social development. On the other hand the attempt to create “modern sensibilities” and new kinds of personhood in which the values of individuality, autonomy and self-responsibility are stressed. My interest is to understand how these new technologies of self-construction are related with diverse moralities and with other technologies of social intervention, making more complex unilateral assumptions on modernity, rights and processes of democratization.

Key words: justice, subjectivity, technologies of the self, childhood and adolescence.


Em abril de 2009, entrevistando Cinara, uma professora responsável pelo gerenciamento da implantação da “justiça restaurativa” nas escolas de Porto Alegre, ouvi as seguintes palavras sobre seu engajamento nos processos de disseminação dessa nova tecnologia jurídica de gerenciamento de conflitos[1]:

Eu sempre brinco que na verdade eu mudei literalmente a minha vida. Não só a mudança de atitude, de pessoa... Até ontem tinha uma professora que me conhecia antes, naquela fase bem explosiva, ela fez uma sindicância na minha escola. E agora ela me reencontra e não me reconhece. (...) E é verdade isso. Esse passar um ano coordenando (os encontros restaurativos) fez também essa mudança em mim, pois aí eu tive que verdadeiramente acolher. (...) Logo que eu comecei, eu comecei com a supervisão da Viviam. Então logo de início ela me disse que eu já fazia um acolhimento importante, embora eu tivesse essa característica explosiva. Então eu acho que eu já tinha o jeito de acolher as pessoas, me preocupar bastante com as pessoas, ajudar as pessoas, nem ter vida própria por isso... Até essa coisa de ser professora. Eu sempre quis ser professora. Minha mãe nunca quis que eu fosse professora, mas eu sempre quis. Porque eu acho que é uma profissão assim que se tu quiseres trabalhar com o humano, há uma aproximação com o humano, eu acho que ela oferece, eu acho que ela oferecia. A minha primeira formação foi em artes. Eu trabalhei 10 anos com um grupo de teatro. Eu também achava que era uma profissão que me aproximava do humano. Então eu sempre tive essa coisa de me importar com as pessoas, no que elas são. Eu já tinha isso.

Cinara é branca, tem cerca de 35 anos e está trabalhando no projeto de implementação da justiça restaurativa em Porto Alegre desde o ano de 2007. Tendo inicialmente se graduado em artes, vem trabalhando como professora do Ensino Fundamental por mais de 10 anos. Atualmente, dedica-se integralmente à supervisão das práticas restaurativas que são realizadas nas escolas municipais da cidade, estando cedida temporariamente ao Juizado da Infância e Juventude (JIJ), em acordo feito com a Secretaria Municipal de Educação. Seus colegas de trabalho não são professores, mas técnicos judiciários e profissionais contratados pelo Poder Judiciário para disseminar os valores e idéias da justiça restaurativa. Cinara divide, com três outros colegas, uma pequena sala localizada nas dependências de uma igreja católica perto do centro de Porto Alegre, no sul do Brasil. É lá que, desde março de 2009, fica localizada a sede do projeto da justiça restaurativa, após ter permanecido durante três anos no prédio do JIJ, vara das execuções das medidas sócio-educativas[2].

Em minha conversa com Cinara, a quem conheci em 2007 durante a etnografia das aulas do curso de iniciação de práticas restaurativas, foi possível apreender que os sentidos que atribui para a sua participação nos processos de reforma legal no campo da infância e juventude, que vêm ocorrendo no Brasil desde a implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), são eminentemente relacionados com uma vocação para o acolhimento, para a escuta e conexão humana. Segundo Cinara, há uma relação importante entre esses elementos e a educação religiosa cristã que recebeu desde criança, pois seu avô foi um dos pioneiros na abertura de um Centro Espírita em Porto Alegre. A sua espiritualidade e, principalmente, a caridade e o valor do perdão foram ressaltados por Cinara como aspectos que estabeleceram uma espécie de sincronismo entre suas experiências de vida e as práticas restaurativas. No entanto, como vimos na citação acima, se é verdade que Cinara salienta que tinha algo de si a oferecer para o desenvolvimento desse novo projeto de intervenção legal, a justiça restaurativa, também ficou claro que ela afirmou ter recebido uma retribuição importante: uma transformação subjetiva em direção ao maior controle das emoções.

Resolvi iniciar este texto trazendo o caso de Cinara por considerar que reúne uma série de elementos importantes para o entendimento dos modos como os processos de reforma legal no campo da infância e juventude estão sendo efetivados: constelações particulares que envolvem sentidos morais e religiosos, configurações legais decorrentes de processos nacionais e internacionais de expansão de direitos e a introdução de novas tecnologias de gerenciamento das subjetividades. Acredito que as transformações em curso, realizadas sob a forte ênfase no discurso dos direitos, não são apenas mudanças de princípios e regulamentos legais, mas também compreendem a gestão de sensibilidades sociais e subjetividades individuais.

Sugiro que a compreensão desses modos de gestão contemporânea da infância e juventude no Brasil possa ser vista a partir de dois processos correlatos: de um lado, a ênfase na retórica dos direitos como instrumentos para a “modernização”, desenvolvimento social e consolidação da democracia; de outro lado, a tentativa de criação de “sensibilidades modernas” e de novos tipos de pessoa, nos quais os valores da individualidade, autonomia e auto-responsabilidade são enfatizados. Saliento que esses dois feixes de relações são fundamentais para a criação de um novo personagem, o “sujeito de direitos”, assim como para a reconfiguração de um novo sentido de nação. Meu interesse dirige-se à compreensão desses processos de criação desse novo personagem social, assim como ao entendimento de como novas tecnologias de construção de si intersectam com moralidades diversas – principalmente religiosas - e com outras tecnologias de intervenção social – como, por exemplo, as chamadas práticas assistencialistas da “ajuda”, complexificando retóricas unilineares sobre “modernidade”, direitos e processos de redemocratização[3].

A base de meus argumentos provém do estudo das práticas e sentidos associados à implantação da justiça restaurativa no Rio Grande do Sul, que acompanho etnograficamente desde o ano de 2006, principalmente privilegiando as práticas restaurativas em Porto Alegre/RS, na Vara da Infância e Juventude. O material de campo trabalhado neste texto privilegia as entrevistas com agentes vinculados ao campo judicial de implantação das práticas restaurativas, mas tem como pano de fundo alguns outros dados recolhidos durante a pesquisa: a etnografia dos cursos de formação profissional dirigidos à formação de agentes da gestão da infância e juventude, entrevistas e conversas informais com o público atendido, pesquisa documental sobre os processos em curso e seus contextos institucionais e análise de dez círculos restaurativos gravados em DVD.

Tendo em vista que, em outro momento, já me detive em analisar o ideário que envolve a justiça restaurativa no Brasil, assim como as tensões na prática de sua implantação[4], minha motivação aqui é enfatizar os sentidos que envolvem a incorporação da justiça restaurativa para alguns de seus protagonistas, tentando entender a relação entre tecnologias jurídicas e a formação de novas sensibilidades sociais. Argumento que a atenção para as subjetividades individuais é fundamental para a compreensão das transformações em curso, uma vez que possibilitam o acesso às sensibilidades morais que operam nos interstícios do domínio legal. Como pretendo mostrar, o meu campo de pesquisa parece iluminar a sugestão proposta por Biehl, Good e Kleinman[5]: a subjetividade é, aqui, tanto uma categoria analítica, quanto um instrumento pelo qual novos modos de governo ganham vida.


Justiça Restaurativa e Gestão de Subjetividades

Desde 2001 eu pesquiso os processos promovidos pela mudança legal no campo da infância e juventude no Brasil, especialmente efetivados a partir da implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990[6]. O ECA foi promulgado no bojo da expansão da retórica dos direitos humanos no país, assim como no período de restabelecimento de instituições democráticas e reconstituição dos direitos de cidadania ao povo brasileiro[7]. Explicitamente, torna crianças e adolescentes “sujeitos de direitos”, tentando romper com as políticas da “menoridade”, características das legislações anteriores, e privilegiando a noção conceituada por Vianna[8], de “infância universal”, definida para além dos critérios de qualquer pertencimento social ou identidade atribuída[9]. Apesar de juristas e militantes acentuarem uma retórica da ruptura do ECA em relação aos paradigmas de intervenção anteriores, minha pesquisa de doutorado mostrou que a constituição dos sentidos para o trabalho de agentes jurídico-estatais envolvidos com o governo de crianças e adolescentes, longe de ser dominada pelo código legal, estava inscrita em valores que ensejavam o engajamento humanitário e a noção de “salvação” de crianças e adolescentes[10].

Isto me fez concluir que, mesmo num contexto de celebração da retórica dos “direitos da criança e do adolescente” e da transformação dessa população em “sujeitos de direitos”, ao contrário de uma oposição entre práticas legais modernas e uma “cultura tradicional” de gestão de crianças e adolescentes, ou uma consideração dessas últimas como resquícios ou sobrevivências de paradigmas antigos de atendimento, existia uma interseção particular entre essas matrizes de significação. O resultado dessa espécie de constelação sui generis era o reforço de um discurso da “ajuda” militante e subjetivamente engajado dos agentes jurídicos em direção à busca de uma sociedade pacificada e socialmente harmônica, legitimado exatamente pela retórica dos direitos da criança e do adolescente. Como já escrevi anteriormente[11], os agentes judiciais atribuem significados ao seu trabalho que são bem mais amplos do que os referenciados na lida judicial propriamente dita: para esses atores, a defesa e a proteção dos direitos da criança e do adolescente é, fundamentalmente, uma entrega pessoal amorosa e engajada. Se lembrarmos que, no Brasil, historicamente, a “justiça de menores” teve sua existência confrontada com uma tensão entre justiça e assistencialismo[12], vemos que, atualmente, tal dilema sofre uma reconfiguração importante: a influência da retórica dos “direitos” e um protagonismo dos órgãos de justiça como instrumentos privilegiados de resolução de demandas sociais vêm legitimando a desneutralização da justiça[13].

 Outra faceta da configuração de sentidos associados à mudança legal neste campo de intervenção pode ser evidenciada nos processos de implementação da “justiça restaurativa” no Brasil, que acompanho desde o ano de 2006. Em tais processos, fica explícito que ao saber jurídico consubstanciado em uma nova linguagem dos “direitos da criança e do adolescente” vêm a coadunar-se uma linguagem dos sentimentos, que traz a emoção para o centro do debate dos processos de reformulação da gestão da infância e juventude. Um dos privilégios de um acompanhamento etnográfico de longa duração é a possibilidade de relativizar os discursos de “ineditismo” de certas experiências. Tento como suporte a minha experiência de campo anterior, referente à pesquisa sobre a reconfiguração do campo de atenção ao adolescente infrator a partir da implantação do ECA (2001-2005), pude perceber que mesmo antes da implantação oficial dos projetos piloto da “justiça restaurativa” no Brasil - que estão acontecendo nas cidades de Porto Alegre/RS, São Caetano/SP e Núcleo Bandeirante/DF desde o ano de 2005[14] – a ênfase num tipo de emotividade “moderna” que encena as interioridades e promove o valor do indivíduo no gerenciamento dos conflitos sociais, assim como o ideal da busca de uma sociedade pacificada através de um melhor gerenciamento das subjetividades individuais, já faziam parte do repertório da formação dos profissionais do campo de intervenção de crianças e adolescentes no Rio Grande do Sul.

Profissionais da Universidade da Paz (UNIPAZ) eram presenças constantes nas capacitações profissionais, elaborando a idéia de uma “crise de significados” que somente poderia ser resolvida através da promoção da “cultura da paz”, efetivada através da maior consciência de si transformação subjetiva das pessoas. Para os agentes interventores, uma das questões básicas desse aprendizado em direção à paz era, exatamente, a necessidade de autotransformação para, posteriormente, poder transformar crianças, jovens e famílias atendidas[15]. Acredito que esse fascínio pela busca da paz através do gerenciamento das subjetividades individuais encontrou nas propostas da “justiça restaurativa” um terreno profícuo de interseção, tornando-se o elemento sedutor para o acolhimento dessa proposta de resolução de conflitos judiciais.


A Justiça Restaurativa e sua Inserção no Brasil

Sucintamente, no Brasil a “justiça restaurativa” vem sendo apresentada no Brasil como uma “justiça alternativa”, pois pretende ser uma ruptura com o sistema judicial tradicional do âmbito penal, considerado como autoritário e altamente punitivo[16]. Enfatiza a negociação e a mediação na solução das disputas, tendo como valores fundamentais a promoção da paz e a influência das recomendações da Organização das Nações Unidas (ONU) para que os países desenvolvam sistemas alternativos à justiça estatal tradicional, bem como a formulação de políticas de mediação e de justiça restaurativa[17]. A influência dessa entidade multilateral é verificada na própria viabilidade do projeto, uma vez que no Brasil o programa é desenvolvido oficialmente desde 2005 por meio de uma cooperação técnica entre o Ministério da Justiça brasileiro, a Secretaria Especial dos Direitos Humanos e o “Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento” (PNUD)[18]. A associação entre democracia, justiça e desenvolvimento nacional é clara, como explícito num relatório avaliativo dos projetos de “justiça alternativa”, publicado recentemente: “Onde não há amplo acesso a uma justiça efetiva e de qualidade, a democracia está em risco e o desenvolvimento não é possível”[19].

Seus propulsores, entretanto, ao mesmo tempo em que enfatizam o apoio das normativas internacionais de proteção de direitos e claramente associam as reformas judiciais com projetos políticos de desenvolvimento nacional, também assinalam seu elemento eminentemente “antropológico”, ao especificar que a “justiça restaurativa” foi pela primeira vez implantada na Nova Zelândia, em 1989, inspirada pelos processos comunitários maori de resolução de conflitos lá existentes. Na verdade, a gênese dessa forma de resolução de conflitos tem sido muito discutida entre antropólogos e agentes jurídicos, mas há um relativo consenso que os projetos para sua implementação no âmbito judiciário apareceram em países como os Estados Unidos, Canadá e Nova Zelândia, associando-se ao crescimento, nas décadas de 1970-1980, do que se convencionou chamar de Resoluções Alternativas de Disputas ou estilos conciliatórios de disputas[20].

Assim como em outros contextos de utilização das resoluções alternativas de disputas, no Brasil a justiça restaurativa está sendo apresentada como parte uma parte de um processo fundamental de reconfiguração das representações sobre o Estado-nação: do apartheid ao “truth telling” na África do Sul[21], “da guerra ao status quo” na Nigéria[22], da “sociedade adversatorial à harmonia social”, nos Estados Unidos[23]. Pela análise efetivada, é possível referir um movimento no vetor da “violência à paz” no Brasil que é, assim como presente em outros contextos, acompanhado de uma retórica do desenvolvimento e modernização nacional[24].


“Projetos são Utopias”: a justiça restaurativa e suas várias formas de motivação

No material de divulgação da proposta restaurativa, apresentado pelo juiz responsável pela coordenação dos projetos restaurativos em Porto Alegre, Dr. Rafael, a menção de que “projetos são utopias” revela muito do ideário envolvido nas práticas restaurativas. Dr. Rafael iniciou os estudos sobre justiça restaurativa por volta de 2002, através das suas relações com um sociólogo especialista em sociologia jurídica, Scuro Neto, o qual já escreveu sobre a tarefa de divulgar a “justiça restaurativa” no Brasil como um “apostolado”[25]. Scuro Neto teve a sua formação de pós-graduação em Praga e na Leeds University, na Inglaterra, à semelhança de outro divulgador das idéias restaurativas no Rio Grande do Sul, o jornalista e consultor em direitos humanos e ex-deputado pelo Partido dos Trabalhadores, Marcos Rolim, o qual conheceu o ideário das práticas restaurativas durante uma especialização em segurança pública realizada na Oxford University. Apesar de não associar tão fortemente um sentido religioso ao seu trabalho de explicitação das concepções da “justiça restaurativa”, tal como Scuro Neto, Rolim descreve sua experiência inicial com as noções restaurativas como um “encantamento”, assemelhando-se com as descrições de Dr. Rafael, que diz ter “se apaixonado” pelas propostas restaurativas em função de seus paradigmas humanizadores.

O juiz destaca as possibilidades de uma troca de paradigmas, isto é, mudança das “lentes” com as quais entendemos os processos de resolução dos conflitos na sociedade. Nesse sentido, empenha-se na construção de uma justiça mais próxima à população e trabalha com noções de engajamento pessoal na modificação das estruturas jurídicas que faz com que tenha alto prestígio no campo da infância e juventude, onde exerce a magistratura desde 1994. Agora, sendo um dos pioneiros na implementação das práticas restaurativas no Brasil, Dr. Rafael adquiriu uma posição de destaque nacional e até mesmo internacional. A referência ao fato de que “projetos são utopias” é significativa porque revela a percepção de uma lacuna entre o que existe e o que é imaginado e idealizado, espaço que legitima a intervenção dos agentes jurídicos e lhes atribui um sentido específico de não apenas trabalhar com fatos já constituídos – mas na realização de um futuro, de algo que existe ainda apenas enquanto virtualidade. O que se propõe é a difusão de um projeto de sociedade, particularmente caracterizada pela harmonia e paz, que pode ser realizada através da modificação nas formas de conceber o conflito entre as pessoas e de seus valores fundamentais.

A elaboração de um projeto de sociedade assemelhado a uma “utopia” reveste-se de sentidos religiosos para alguns dos participantes da implantação da justiça restaurativa. Cinara, a professora cuja história é contada no início deste texto e que está trabalhando na sua implementação desde 2007, chama a atenção para o caráter “messiânico” das práticas restaurativas, assinalando que a sua vinculação religiosa lhe proporcionou uma aproximação com a justiça restaurativa. Diz Cinara:

E eu acho que também tem outra coisa que me afina com o projeto é a minha formação religiosa, que é cristã. Eu não tenho problema nenhum com o messiânico. Que um pouco parece para as pessoas que é uma solução mágica, mas é uma solução mágica feita pelas pessoas. E é mais ou menos aquilo que Jesus veio fazer. E aí se tu cuidares, na Justiça Restaurativa há um pouco a discussão sobre o perdão judaico e o perdão cristão. No livro do Howard Zehr: “Trocando as Lentes” , há um pouco essa discussão do perdão judaico, que sempre pressupõe a restauração. Mas eu também estou bem tranqüila com meu messias, que se tem que perdoar, perdoa. Eu sou uma pessoa que não tem problema nenhum em perdoar. Eu não estou tão preocupada se a pessoa me fez alguma vez alguma coisa...

Para além dessa ênfase no aspecto messiânico da transformação social, Cinara assinala a aproximação de seus valores de acolhimento, caridade e perdão como fundamentais nessa interseção que realiza de seus fundamentos religiosos e o pertencimento à equipe de implementação da justiça restaurativa:

Com relação à Justiça Restaurativa, acho que esses princípios do acolhimento e da caridade. Essa coisa da espiritualidade, eu acho que eu tenho uma identificação total com Jesus e com o que ele diz. Eu vou simpatizar com essa questão do perdão, da espiritualidade, que eu acho que tem na Justiça Restaurativa e tem também na minha religião e sempre esteve presente na minha formação.

A associação entre práticas restaurativas e princípios religiosos ficou evidente no lançamento, em 2007, da apostila com as explicações sobre justiça restaurativa e com a descrição de um roteiro de um círculo restaurativo. A apostila foi distribuída aos vários alunos dos cursos de iniciação em práticas restaurativas, em uma espécie de encontro religioso realizado nas dependências do Fórum de Justiça de Porto Alegre. Nesse evento, Dr. Rafael distribuiu um folheto com uma oração católica do “Santo Anjo do Senhor” e pediu para que frei Lucas, administrador de um centro de proteção da criança e do adolescente de uma das regiões periféricas da cidade, abençoasse a apostila. O juiz salientou que aquela apostila era o “DNA da nova justiça” e é significativo que tenha utilizado essa expressão um pouco antes que nós todos, presentes na comemoração do lançamento dessa nova forma de fazer justiça, déssemos as mãos para orar, numa atitude que ensejava a integração entre os participantes.

Essa interseção entre religião e direito não é apenas realizada pelos implementadores do projeto, mas percebida também por aqueles que usufruem dos serviços judiciais. Rodolfo - um advogado branco de cerca de 40 anos, especialista em direito de família, atualmente voluntário como facilitador nas práticas restaurativas - assinala que sempre tentou realizar mediações em suas atividades profissionais, mesmo antes de ter contato com a justiça restaurativa. Ele, que circulou em vários cursos de graduação antes de se formar em direito (como, por exemplo, administração e informática) destaca que, em uma ocasião em que realizou a mediação em uma atividade profissional, recebeu os cumprimentos do ex-marido da cliente que estava representando. Este, brincando, perguntou se realmente Rodolfo era um advogado ou se era um padre. Em nossa conversa, Rodolfo fez uma piada com essa situação, sem disfarçar certo orgulho pela associação feita pelo ex-marido de sua cliente, afirmando que a busca da paz e a sensibilização das pessoas em direção a um maior autoconhecimento e autocontrole emotivo é imprescindível para qualquer processo de transformação social.

Especialista em educação biocêntrica e professor de biodança, Rodolfo trouxe para a justiça restaurativa a ênfase nas emoções e a importância de sua expressão através do corpo. Nos eventos de formação profissional que acompanhei, Rodolfo sempre fez questão de assinalar uma diferença entre a “mediação transformativa”, que mexeria com as sensibilidades individuais, e a “mediação da negociação”, que apenas tentaria resolver um problema pontual, sem uma maior transformação subjetiva. Nos espaços de capacitação dos agentes, Rodolfo sugeria o exercício de várias práticas de sensibilização corporal. Numa dessas ocasiões, junto com uma colega sua da prática de biodança, propôs uma “dança circular”, para integrar todos os alunos de um dos cursos de iniciação em justiça restaurativa no rito de comemoração da “formatura” dessa turma, que ocorreu na Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (AJURIS). Segundo os propulsores da atividade, a dança circular tinha por objetivo celebrar a vida, a integração e a expressão das emoções através do corpo e da repetição de movimentos. Ao mesmo tempo, colocaria o grupo em conexão com as práticas milenares indígenas, salientadas pelos coordenadores da atividade como sendo a grande inspiração para a justiça restaurativa. Nesta ocasião foi impossível não pensar em como o próprio espaço físico do evento constrangia, de modos importantes, o conteúdo da atividade, uma vez que a formalidade do auditório da AJURIS e sua característica retangular dificultou a própria configuração circular da dança. Não deixou de ser significativo, entretanto, que aquele espaço fosse ocupado por uma série de agentes de intervenção, militantes e profissionais do atendimento – e inclusive o juiz Rafael – que dançavam e repetiam movimentos de encontro corporal, embora disfarçassem os sorrisos um pouco constrangidos em função do inusitado da situação.


Novas Práticas de Controle Técnico e Racional das Subjetividades

Sendo possível salientar que vários dos participantes trouxeram ao projeto suas motivações provenientes de fundamentos religiosos e outras tecnologias de construção de si como fundamentais para a participação neste projeto de inovação legal, também é verdade que há uma insistência na relação entre o sucesso da efetivação da justiça restaurativa e o método de sua realização. Nesse sentido, as palavras de Suely, a gerente técnica da implantação da justiça restaurativa no Rio Grande do Sul, são importantes: para ela, a maior novidade da justiça restaurativa seria o seu método, que em Porto Alegre é o da Comunicação Não Violenta[26]. Suely é branca, tem cerca de 40 anos e é assistente social contratada temporariamente para atuar na gerência do projeto da justiça restaurativa. Está nesta função desde 2007. Em sua carreira profissional, trabalhou durante aproximadamente dez anos nas “Aldeias SOS”, instituição de acolhimento de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, tendo sido também presidente do Conselho Municipal de Crianças e Adolescentes da cidade. Circulando em uma rede ampla de relações sociais com profissionais diversos da área da infância e juventude, foi convidada para atuar na expansão comunitária da justiça restaurativa em Porto Alegre. Essa expansão comunitária aconteceu somente a partir de 2007, uma vez que os dois primeiros anos do projeto se restringiram à aplicação na área judicial. Tendo muita experiência em projetos de intervenção social, Suely destaca que a maior atração da justiça restaurativa é o seu método:

Tem coisas que na Justiça Restaurativa que eu recupero de muitas vivências minhas, coisas muito primitivas. Eu acho que a grande contribuição da Justiça Restaurativa é o seu método. Eu vou numas escolas e as pessoas dizem; mas isso eu já fazia! Eu digo: ah, vamos combinar! Eu acho que a grande oferta da Justiça Restaurativa é que ela sistematizou um método, e acho que nisso ela bebeu de muita fonte da Comunicação Não Violenta. Depende de como tu ofereces essa pactuação entre as partes. Bem, meu pai também fazia isso: ele colocava eu e minha irmã num quarto e dizia que a gente só ia sair dali quando a gente se entendesse. Se é para colocar vítima e ofensor e fazer que conversem, meu pai também fazia isso. Mas quando meu pai ficava cansado e saía dali, eu e a minha irmã combinávamos: vamos fazer de conta que a gente fez as pazes e depois a gente continua a brigar! Porque era um pacto nosso, e para ele aquilo ia supostamente fazer a reconciliação. Então a idéia de chamar as pessoas para resolverem seus conflitos também não é uma coisa nova, se a gente for ver as formas indígenas funcionavam assim, meu pai funcionava assim. Mas como é que meu pai oferecia esse método? Vocês são irmãs, têm que fazer as pazes. Não resolvia o conflito necessariamente, mas ele passava tantos valores para nós naquele momento... Para ele nós tínhamos que fazer as pazes e ele utilizava para isso todo um repertório que para ele fazia sentido: porque nos éramos do mesmo sangue, porque ele era o nosso pai, etc. (...) Enfim, as pessoas querem paz, as pessoas buscam a paz, como faz isso? A Justiça Restaurativa sistematizou uma metodologia para isso.

Na visão de Suely, o roteiro metodológico da justiça restaurativa proporcionaria essa oportunidade de condução de resolução de conflitos de formas não violentas, tendo certa vinculação com outras experiências do mesmo tipo – como em sua referida experiência familiar – mas em grande parte as excedendo na capacidade de sistematização dos procedimentos e práticas adequados à gestão dos relacionamentos interindividuais. Como veremos, é a metodologia da Comunicação Não Violenta que permite o engajamento das subjetividades na resolução dos conflitos sociais e, por conseqüência, na criação de uma sociedade harmônica. Essa metodologia dos encontros restaurativos enfatiza a auto-responsabilização, a encenação das interioridades dos participantes e implica a preeminência de um subjetivismo que lhe é estruturante.


A Constituição do “Universal” e a Comunicação Não-Violenta como Método para a Justiça Restaurativa

A justificação da justiça restaurativa no Brasil, diferentemente do idioma justificador das resoluções alternativas de disputas nos Estados Unidos, onde a harmonização dos conflitos justifica-se pela existência de uma sociedade muito conflitiva e legalista[27], é centrada no fato de que a sociedade brasileira está muito violenta. A violência social é tomada como um sintoma e expressão de relações não harmônicas e, sobretudo, desintegradoras. O perigo da anomia, da não existência de valores que fundamentem uma existência social comum, é chave para instaurar a procura de novas práticas que substituam o modelo conflitivo. A restauração social é, portanto, subsidiária de uma transformação individual, nesse ideário. A ênfase é colocada no valor do indivíduo, o que se coaduna com os valores que definem a sociedade americana, de onde o psicólogo construtor do modelo metodológico que vem capacitando as práticas restaurativas no Rio Grande do Sul – o método da Comunicação Não Violenta – provém.

Segundo publicações de divulgação de sua metodologia, a Comunicação Não-Violenta (CNV) foi desenvolvida por Marshall B. Rosenberg, doutor em psicologia clínica e fundador do Centro Internacional de Comunicação Não-Violenta. A CNV parte da observação de que a crescente violência é reflexo de uma lógica de ação e de uma relação divorciada com nossos verdadeiros valores, iniciando ciclos de emoções dolorosas. O método da CNV é apresentado como possibilitando mudanças estruturais no modo de encarar e organizar as relações humanas, podendo ser aplicado, então, na gestão de grupos e organizações. No entanto, a CNV é propagada para ser também utilizada no gerenciamento das relações interpessoais extra-institucionais, como um método de auto-ajuda.

Pelo material de divulgação dessa tecnologia, a CNV teria sido usada primeiramente em projetos federais do governo americano, em escolas e instituições públicas durante os anos sessenta. Com o crescimento das demandas de mediação na sociedade americana, Rosenberg contratou profissionais e criou o Centro de Comunicação Não-Violenta na Califórnia, em 1984, organização que treina pessoas para a mediação em diversos países, entre os quais a Inglaterra, onde nasceu o consultor da CNV responsável pela sua implantação no Brasil, que aqui chamarei de Michel. O consultor é um ex-ator de teatro que faz parte de uma extensa rede de profissionais que, depois de formados de forma intensiva pela CNV, tornaram-se consultores internacionais, destinados a disseminar essa tecnologia de gerenciamento da vida, que põe ênfase na expressão emocional para diagnóstico de necessidades e sua resolução. Para isso, trata-se da necessidade de suspender o julgamento e crescer no potencial da experiência da compaixão, da cooperação, entendidas como opostos à intolerância, geradora de violências. Um dos primeiros instrumentos de transformação social é a transformação de cada indivíduo nas suas habilidades de reconhecer e expressar suas emoções e necessidades. A crença é de que existem necessidades humanas universais, as quais viabilizavam a construção de um código compartilhado construído para guiar as interações sociais no âmbito dos círculos restaurativos.

Em tal código, a ênfase é colocada nos valores da harmonia e responsabilização individual na condução das respostas ao conflito. Tais valores são explícitos na configuração das etapas dos círculos restaurativos, aprendidos e vivenciados por todos que fazem os cursos e seminários acerca de justiça restaurativa - que tem que vivenciar, e não encenar ou representar -, círculos baseados em suas situações reais de vida. Cada etapa é experimentada várias vezes pelos diversos participantes dos treinamentos, sendo discutida posteriormente com o consultor da CNV, que debate os casos apresentados. Emoções como choro e relatos emocionados de vivências fazem parte do processo, eminentemente transformador daqueles que o praticam. A idéia é de que é preciso primeiramente se auto-transformar subjetivamente, para depois poder ser coordenador de círculos, ou seja, coordenar um encontro.

Os círculos restaurativos consistem em encontros entre vítima, infrator e pessoas envolvidas com o ocorrido, que acontecem guiados por um coordenador e um co-coordenador de círculo. A disposição dos locais das cadeiras, entre os participantes, é circular, valorizando-se os princípios da voluntariedade da participação e horizontalidade das relações. Os diferenciais de poder devem ficar suspensos, portanto. Acredita-se que o encontro a ser realizado é um encontro entre seres humanos, os quais devem se co-responsabilizar pelo sucesso do encontro e para a geração de relações harmônicas futuras. Cada círculo possui três diferentes etapas, cada uma das quais com uma pergunta-chave que deve ser feita pelo coordenador aos participantes, iniciando por aquele que considera como mais fragilizado pela situação, na medida em que este terá maior incapacidade para ouvir os demais, ao longo do encontro:

1) Momento da compreensão mútua – pergunta do coordenador: Como você está se sentindo hoje em relação ao fato? A questão deve ser feita ao participante A e o participante B deve, em seguida, expressar o que entendeu acerca da resposta do participante A, até que este confirme que foi entendido corretamente. Então a mesma pergunta é repetida ao participante B, com os mesmos procedimentos já descritos. Quando todos acordarem estarem bem entendidos, passa-se para o momento da responsabilização;

2) Momento da responsabilização – pergunta do coordenador: O que você buscava com essa ação? Qual era a sua necessidade naquele momento? Assim como na etapa da compreensão mútua, o coordenador pergunta para o participante A, que responde. Em seguida, pergunta ao participante B se pode repetir o que disse o participante A, na busca da verificação se este foi efetivamente entendido. Após a expressão do participante B, o participante A deve confirmar se o B entendeu o que disse. Em caso positivo, repete-se todo o procedimento, iniciando-se com o participante B. Com a finalização dessa etapa, passa-se à fase final, do acordo.

3) Acordo – pergunta do coordenador: O que você tem a oferecer ou pedir? Todos os participantes, neste momento, devem oferecer algo para o sucesso do acordo, responsabilizando-se pelo seu sucesso.

Essa metodologia não é apenas repassada aos participantes dos círculos, mas também é insistentemente treinada pelos agentes implementadores. Suely, a assistente social gestora da implantação da justiça restaurativa no Rio Grande do Sul, assinala o treinamento cotidiano em torno da metodologia e seus resultados:

Depois que a gente começa a mergulhar nesse processo a gente começa a querer ser melhor. E eu comecei a viver isso internamente. Eu me submetia a fazer o método, eu dizia para os meus filhos: a mãe está fazendo esse método! E eu pegava na minha casa pequenos conflitos e queria trabalhar a metodologia, e é muito interessante que as pessoas pensam diferente e a gente vai dando mais credibilidade ao método. E eu me identifiquei emocionalmente com esse processo. Não são todas as pessoas que se identificam emocionalmente com suas atividades profissionais e eu me identifiquei. (...) O projeto apresentou isso, é maravilhoso para saber lidar com teus conflitos. Esse é o grande potencial do projeto. E não existe ninguém que seja imune ao projeto. Temos muita matéria prima para trabalhar.

Assim como a professora Cinara, que salienta uma transformação subjetiva no sentido de estar menos “explosiva”, Suely destaca o melhoramento na sua capacidade de “escuta” e, também, a própria capacidade de se auto-transformar:

Eu sou uma pessoa falante, tenho muita habilidade para falar, e eu acho que fiquei mais atenta para escutar. Eu acho que depois do projeto eu comecei a ouvir mais. Eu procurei muito melhorar isso. (...) Eu tenho uma predisposição para não brigar, mas certamente o projeto fez com que eu ficasse mais atenta na qualidade da escuta e também me deu o desejo de me tornar uma pessoa melhor. Acho que as pessoas podem se tornar melhor, acho que a transformação é gradativa, mas todo mundo pode se transformar. Eu me sinto uma pessoa mais zen, mais centrada nas coisas.

Um dos pontos mais interessantes ressaltados por Suely diz respeito exatamente a auto-responsabilização que o método da justiça restaurativa proporciona ou conduz em seus princípios de ação. O valor do gerenciamento que o próprio indivíduo fará das coisas que recebe dos seus relacionamentos no mundo é enfatizado. Isto é, Suely assinala que o método da justiça restaurativa conduz a uma auto-responsabilização, uma nova relação dos indivíduos com seu self, seus atos e os atos de outras pessoas.

Poderíamos tratar a justiça restaurativa, desta forma, como uma tecnologia de gerenciamento das subjetividades, nos termos trazidos por Michel Foucault[28]. Este autor incita a pesquisa sobre as formas de subjetivação, entendidas como práticas pelas quais os indivíduos são levados a prestar atenção a si próprios, a se decifrar e a se reconhecer, estabelecendo consigo uma certa relação que lhes permite descobrir a verdade de seu ser. Essa problematização das formas de subjetivação está relacionada a um conjunto de práticas que Foucault[29] estudou na Antigüidade entre os gregos e romanos e denominou como “artes da existência”: práticas reflexivas e voluntárias através das quais os homens não somente fixam regras de conduta, como também procuram se transformar, modificar-se em seu ser singular e fazer da sua vida uma obra que seja portadora de certos valores estéticos e responda a certos critérios de estilo[30]. Em meu entender, Suely destaca exatamente tais aspectos da transformação de si que sofreu no processo de conhecimento e utilização da metodologia proposta pela justiça restaurativa, estabelecendo nesse mesmo processo um ideal para si: tornar-se uma pessoa melhor, numa constante prática de autotransformação reflexiva. Diz Suely:

E acho que também aprendi que a dimensão que as coisas vão ter és tu que tens o poder de dar. Isso é muito grande ou é muito pequeno depende do tamanho que tu vais colocar (...). A minha dor é como eu sinto ela. Se o outro quis me atacar é responsabilidade dele. Essa coisa da auto-responsabilização é outra coisa muito legal no projeto, pois a gente tende a responsabilizar o outro. (...) Por exemplo, se a gente recebe um tapa na cara, bem, entre milhões de possibilidades, aquela pessoa escolheu me dar um tapa na cara. Entre milhões de possibilidades eu poderei escolher dar um tapa na cara dela ou não. Mas isso é um exercício muito difícil porque requer a auto-responsabilização. E quando eu me auto-responsabilizo, eu me responsabilizo pelo grau de agressividade que tenho. Porque a auto-responsabilização nada mais e do que esse reconhecimento: eu sou uma bomba, ou não sou tão bomba assim, se me der vai levar... E isso é uma coisa de disciplina. Porque acho que a gente tem uma cultura agressiva, é como se essa cultura atribuísse ao idiota, tolo e ingênuo se a gente devolver um troco dado errado.

Note-se que o exemplo trazido por Suely para ressaltar os valores da possibilidade de escolha subjetiva acerca da reação que algum ato causará, assim como a escolha, pelo atingido, de sua própria contra-reação frente ao acontecido, é significativo por duas razões: em primeiro lugar, porque destaca a possibilidade que o gerenciamento do self atue na configuração de conflitos sociais. Nesse sentido, a dimensão de atos que são exteriores ao eu é dada pelo próprio self, havendo, portanto, uma separação entre o mundo exterior e o mundo do self, que pode reconfigurar o primeiro nos termos do segundo. Em segundo lugar, a própria forma em que é apresentada essa necessidade de trabalhar a construção de si (poder escolher a dimensão dos problemas) e a consciência de si e autodisciplina (reconhecimento de suas características pessoais e atenção para o manejo de tais elementos) traz subsídios importantes para a análise: a forma em que foi feita a explicitação dessa relação conduz o ouvinte a uma associação com a orientação cristã de receber um tapa em uma face e poder oferecer a outra. Segundo os princípios cristãos, essa passagem bíblica é utilizada para promover não apenas a noção de perdão, mas também um novo princípio de justiça: não mais a Lei de Talião - olho por olho, dente por dente - mas uma justiça misericordiosa, uma justiça do amor e da caridade. Vejamos essa associação a partir da descrição das palavras de Jesus por Mateus, no Novo Testamento da Bíblia católica:

Ouvistes o que foi dito: ‘Olho por olho e dente por dente!’ Eu, porém, vos digo: Não enfrenteis quem é malvado! Pelo contrário, se alguém te dá um tapa na face direita, oferece-lhe também a esquerda! Se alguém quiser abrir um processo para tomar a tua túnica, dá-lhe também o manto! Se alguém te forçar a andar um quilômetro, caminha dois com ele! Dá a quem te pedir e não vires as costas a quem te pede emprestado[31].

A partir das palavras de Suely, é possível entrecruzar moral e prática de si e sugiro que encontramos um princípio de leitura possível para a atração exercida pela justiça restaurativa, assim como uma analítica para sua compreensão, ao relacionarmos este processo de construção de si, acionado pelas práticas restaurativas, com uma conduta moral que entrecruza elementos religiosos, familiares e profissionais. Michel Foucault[32] já salientou que não existe ação moral que não se refira à unidade de uma conduta moral e nem conduta moral que não implique a constituição de si mesmo como sujeito moral; ao mesmo tempo, salientou que tampouco existe a constituição do sujeito moral sem “modos de subjetivação”, isto é, sem “práticas de si” que lhe apóiem.

Acredito que o estudo das percepções das pessoas que implementam as práticas restaurativas no Rio Grande do Sul acerca de seu trabalho mostra como há uma associação, feita por suas vivências e construções de sentido para as práticas restaurativas, entre códigos de comportamento (orientações religiosas, familiares e profissionais) e novas formas de subjetivação (gerenciamento das subjetividades com encenação interioridades, práticas de auto-responsabilização, etc). É essa constelação particular de elementos diversos – religião, direito, tecnologias de autogestão e gerenciamento do eu – que vem marcando os caminhos dessa nova forma de intervenção social na gestão da infância e juventude no Rio Grande do Sul.


Considerações Finais

A implementação das novas práticas de justiça da infância e juventude no Brasil vem articulando um conjunto de atores diversos que refletem, de certa forma, as próprias características da formação de um novo campo de intervenção para o desenvolvimento e modernização nacional, reunindo agentes judiciais, organizações de desenvolvimento e de proteção aos direitos humanos com abrangência transnacional, professores, líderes comunitários, especialistas e consultores internacionais, clubes de mães, etc. Tais agentes e agências formam redes não homogêneas, com poderes variados no que se refere à elaboração de significados hegemônicos sobre os processos em curso, assim como na condução das práticas. Embora o campo de implementação e disseminação de novas propostas de intervenção social seja, de fato, heterogêneo, ao menos no campo de atenção ao adolescente infrator no Rio Grande do Sul é possível perceber a hegemonia de um conjunto de discursos sobre o seu ideário que conjuga noções de autogestão e transformação individual com modernização da justiça e promoção de uma cultura de paz.

Nesse projeto de transformação social, emicamente associado a uma verdadeira missão, os agentes judiciais têm se destacado na condução de projetos e programas, assim como na elaboração de uma retórica da ruptura com práticas e valores associados à chamada “cultura tradicional de atendimento” de crianças e adolescentes. Mais do que uma realidade sociológica, a própria retórica da ruptura deve ser submetida à análise; como procurei mostrar, há uma interseção particular e dinâmica entre os sentidos trazidos pelos agentes jurídico-estatais para a implementação das mudanças legais e orientações religiosas e assistencialistas. Tais orientações formam um terreno propício para a incorporação de uma nova tecnologia legal, a justiça restaurativa, a qual trabalha com o gerenciamento das subjetividades e com os chamados modos não-violentos de resolução de disputas.

Esses circuitos entre elementos diversos sugerem que estamos em presença de dois tipos de lógicas nas políticas de intervenção à infância e juventude no Brasil: a ênfase na militância subjetivamente engajada dos agentes jurídicos subsidiada pela missão de “ajuda”, “proteção” e “salvação” de crianças e adolescente e em direção a busca de uma sociedade pacificada, que pode se exercer em plenitude por conta das garantias de legitimidade legal dos novos instrumentos de proteção de direitos presentes no Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). E, também, a evocação de um modo de construção de subjetividades que encena interioridades e promove a auto-responsabilização, a autodisciplina e a construção constante de si através de práticas reflexivas, percebidas como fundamentais para a criação de novos modos de gerenciamento de conflitos, tais como propostos pelo ideário da justiça restaurativa. Esta nova tecnologia de intervenção encontra um espaço profícuo de existência exatamente por poder conciliar-se com os ideais de harmonização social e comunitária. Há uma relação de reforço mútuo, portanto, entre códigos morais de comportamento (orientações religiosas, familiares e profissionais) e novas formas de subjetivação.

Embora os agentes judiciais tenham construído um discurso pautado pela retórica da mudança e minha análise ter sugerido uma espécie de interseção entre o que seria classificado como um código dos “direitos” e um código da “ajuda”, não gostaria de deixar a idéia de alguma espécie de “falha” ou “déficit” na disseminação dos direitos das crianças e adolescentes. Utilizando-me da mesma lógica sugerida por James Ferguson[33] ao estudar um projeto de desenvolvimento da agricultura como forma de combate à pobreza em Lesoto, acredito que o mais importante não é privilegiar o que os projetos falham em fazer, mas exatamente o que eles produzem, seus “efeitos colaterais”. Assim também os projetos de transformação legal com a introdução da retórica dos direitos da criança e adolescente podem ser vistos não apenas como transformações numa linguagem legal, mas a introdução dessa retórica é uma abertura para outros tipos de intervenção. A conjunção de elementos diversos como práticas institucionais, interações intersubjetivas e processos políticos de reforma legal é um campo profícuo de análises sobre os cenários que configuram modos e sentidos da gestão de crianças e adolescentes no Brasil. Em minha pesquisa, a interseção entre as formações morais religiosas e familiares dos agentes implementadores e outras tecnologias de construção de si e gerenciamento das subjetividades que acentuam os valores da autonomia e auto-responsabilidade produzem uma constelação sui generis entre valores universalistas e princípios individualistas que se torna um potente dispositivo de controle: a inserção nessa comunidade política que, emicamente, é sinônimo da própria “humanidade”, passa a requerer incessantes compromissos e responsabilidades individuais por parte daqueles que lhe estão sujeitos.

 

Notas

[1] Todos os nomes dos pesquisados foram substituídos, de forma a preservar sua identidade. Os nomes de pessoas reconhecidamente públicas, constantes em documentos e livros consultados durante a pesquisa, foram mantidos tal como constam originalmente.

[2] As medidas socioeducativas são destinadas aos adolescentes autores de acusados ato infracional, e, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), classificam-se em: internação em estabelecimento educacional, semiliberdade, liberdade assistida, prestação de serviços a comunidade e advertência.

[3] Essa problematização vem recebendo bastante atenção no campo da antropologia e, nesse sentido, meu trabalho intersecta o campo de diálogo dos estudos sobre governamentalidade e tecnologias de construção de sujeitos e subjetividades (por exemplo: Abu-Lughod 2003; Biehl 2004 e 2005; Biehl e Eskerod 2005 e 2007; Biehl, Good e Kleinman 2007; Fassin 2007 e Ong e Collier 2005), assim como com os estudos recentes sobre a gestão da infância e juventude no Brasil (entre outros: Fonseca 1995, 2000 e 2004; Fonseca e Schuch 2009; Pilotti e Rizzinni 1995 e Vianna 1999 e 2002).

[4] Schuch 2008a.

[5] Biehl, Good e Kleinman 2007.

[6] Schuch 2009.

[7] Este contexto de redemocratização e mudança legal é extremamente intrigante para pesquisas, uma vez que algumas análises têm mostrado que a reformulação da “justiça” e, especialmente, as políticas dirigidas pelas noções de “direitos humanos” são muito importantes para o restabelecimento de regimes democráticos em países emergentes do autoritarismo (por exemplo, Wilson 1997). Abordagens otimistas supõem que a esfera legal é relevante para as tendências antiglobalização, uma vez que trazem aos cenários correntes um poder que representa os direitos dos cidadãos, agindo contra a monopolização de poder dominante. Neste caso, trata-se de um uso anti-hegemônico de um instrumento hegemônico, o direito (Santos 2000). Entretanto, outras abordagens, como as de Comaroff e Comaroff (2006), preferem entender o aumento da visibilidade das reformas legais em países recém saídos de regimes repressivos ou países pós-coloniais com mais cautela, alertando para um duplo movimento: o “fetichismo” da lei, expresso na reformulação de novas constituições federais, cortes de justiça e uso da lei para resolver questões políticas faz-se acompanhar da disseminação do discurso da violência e de uma realidade onde se descreve a ausência de lei.

[8] Vianna 2002.

[9] Sobre a categoria “menoridade” e seus significados jurídicos e sociais, ver Vianna (1999 e 2002).

[10] Schuch 2006, 2008b e 2009.

[11] Schuch 2008b.

[12]Pilotti e Rizzini 1995.

[13] Para uma abordagem comparativa com a Argentina no que diz respeito à posição da “justiça de menores” e a tensão de sua existência no campo jurídico, ver Villalta (2004).

[14] Há ainda experiências sendo efetivadas em Santa Catarina e Recife, mas que não compõem os projetos-pilotos.

[15] Schuch 2006.

[16] Por administração alternativa de conflitos entende-se a mediação de conflitos por via da negociação, da restauração e da compensação – em contraposição aos modelos adjudicatórios e retributivos da justiça tradicional brasileira (Ministério da Justiça 2005).

[17] Ver a resolução 1999/26, de 28 de julho de 1999, do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas.

[18] Com objetivo de ajudar o governo brasileiro a modernizar a máquina do Estado e prevenir a criminalidade, o PNUD investiu US$ 150 mil neste projeto de cooperação técnica. As ações do projeto estão calcadas num diagnóstico sobre as melhores iniciativas do Judiciário brasileiro, realizado há três anos, também possibilitado através de investimento internacional – desta vez com recursos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Consideramos tais informações significativas do argumento de que as transformações judiciais brasileiras respondem a anseios nacionais, mas sem dúvida acontecem em um contexto de pressões internacionais para reformulações judiciais motivados pelo novo contexto neoliberal que, como disse Santos (2000), elege o Judiciário como salvaguarda de um Estado não-intervencionista.

[19] Ministério da Justiça 2005, p.09.

[20] Nader 1994.

[21] Buur 2001, Fassin 2007, Norval 2001, Ramphele 1997 e Ross 1997.

[22] Last 2000.

[23] Nader 1994.

[24] Simião 2007, Rodrigues Pinto 2007 e Soares 2007.

[25] Ver o texto intitulado: “Justiça Restaurativa e a cultura da paz: do conceito ao contexto” (Scuro Neto, 2007).

[26] Entre os projetos-piloto de implantação da justiça restaurativa no Brasil há diferenças quanto à metodologia utilizada nos círculos ou encontros restaurativos. Enquanto os projetos-piloto do Rio Grande do Sul e São Paulo privilegiam a “Comunicação Não-Violenta”, criada por um psicólogo americano com orientação da psicologia de Carl Rogers, famoso psicopedagogo americano que desenvolveu a abordagem humanista e a linha teórica conhecida como Abordagem Centrada na Pessoa, o projeto-piloto do Distrito Federal utiliza a metodologia da “mediação vitima infrator”, subsidiando-se desta a partir do professor de direito e especialista em mediação André Gomma. Ao contrário da ênfase na psicologia, portanto, os projetos de justiça restaurativa no Distrito Federal sofrem uma influência maior das vertentes acadêmicas relacionadas ao direito. Entretanto, mesmo a linha da mediação vítima-infrator provém de correntes teóricas jurídicas provenientes dos Estados Unidos. Maiores detalhes sobre o projeto de implantação da justiça restaurativa no Distrito Federal se encontram em: Spagna (2008).

[27] Nader 1994.

[28] Foucault 1986.

[29] Foucault 1986.

[30] Foucault 1986:15.

[31] Mateus 5, 38-42.

[32] Foucault 1986.

[33]Ferguson 2006.

 

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Edición electrónica del texto realizada por Beatriz San Román Sobrino.

 

Ficha bibliográfica:

SCHUCH, Patrice. Justiça, Cultura e Subjetividade: tecnologias jurídicas e a formação de novas sensibilidades sociais no Brasil. Scripta Nova. Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales. [En línea]. Barcelona: Universidad de Barcelona, 15 de marzo de 2012, vol. XVI, nº 395 (15). <http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-395/sn-395-15.htm>. [ISSN: 1138-9788].

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