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Índice de Scripta Nova

Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona. ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. XVIII, núm. 464, 10 de enero de 2014
[Nueva serie de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana]

 

O TRABALHO FEMININO NAS FÁBRICAS DE CONSERVA DE PESCADO: A PERMANÊNCIA DE UMA EXPLORAÇÃO LABORAL

Susana Maria Veleda da Silva[1]
Universidade Federal do Rio Grande
susanasilva@furg.br

Marcus Vinicius Spolle
Universidade Federal de Pelotas
sociomarcus@yahoo.com.br

Recibido: 15 de enero de 2013. Devuelto para correcciones: 6 de junio de 2013. Aceptado: 3 de octubre de 2013.

O trabalho feminino nas fábricas de conserva pescado: a permanência de uma exploração laboral (Resumo)

O trabalho na indústria de transformação do setor de alimentação é mundial e historicamente exercido por mulheres. A atividade está marcada pela posição que ocupam na sociedade patriarcal, (re)produzindo uma divisão sexual do trabalho oriunda das relações de gênero que as estigmatiza no mundo do trabalho remunerado. A situação das trabalhadoras das fábricas de conserva de pescado localizadas no município do Rio Grande, no sul do Brasil, representa na escala local uma situação universal de exploração do trabalho feminino. O artigo objetiva refletir sobre as discriminações e as estratégias de resistência deste coletivo de trabalhadoras através da perspectiva da geografia feminista. A pesquisa demonstrou que se por um lado as trabalhadoras estão submetidas às formas de exploração e preconceitos que dificultam processos de resistência coletivos. Por outro, o trabalho propicia autonomia econômica e aumento da autoestima que, paradoxalmente, perpetua a exploração laboral.

Palavras chave: trabalhadoras das fábricas de pescado, divisão sexual do trabalho, discriminação, resistência.

Female work in fishing industries: perpetuating work exploitation (Abstract)

Work in the food transformation industry has been historically carried out by women all over the world. This activity has been characterized by the position they hold in the patriarchal society which (re)produces the sexual division of work that results from gender relations and stigmatizes these women in the world of paid work. The case of the female workers in the fishing industries in Rio Grande, a city located in the south of Brazil, represents a universal situation of female work exploitation. This paper aims at analyzing the discrimination and the resistance strategies this group of women uses from the perspective of feminist geography. This study has shown that, on one hand, female workers have been submitted to exploitation and prejudice that make it hard to develop a collective resistance process. On the other hand, their work has enabled them to get financial autonomy and improve their self-esteem; the latter, paradoxically, perpetuates work exploitation.

Key words: female workers in fishing industries, sexual division of work, discrimination, resistance.

Las trabajadoras de las fábricas de conservas de pescado: la permanencia de una explotación laboral (Resumen)

El trabajo en el sector de la industria de alimentación ha sido históricamente y en todo el mundo ejercido por mujeres. La actividad está marcada por la posición que las mujeres ocupan en la sociedad patriarcal, (re)produciendo una división sexual del trabajo derivada de unas relaciones de género que las estigmatiza en el mundo del trabajo remunerado. La situación de las trabajadoras en las fábricas de conservas de pescado localizadas en Río Grande, en el sur de Brasil, representa a escala local una situación de explotación universal de la mano de obra femenina. El artículo pretende reflexionar sobre las discriminaciones y las estrategias de resistencia de este grupo de trabajadoras desde el punto de vista de la geografía feminista. La investigación demuestra que por un lado las trabajadoras están sometidas a formas de explotación y a prejuicios que dificultan los procesos de resistencia colectiva. Por otro lado, el trabajo proporciona el empoderamiento económico y el aumento de la autoestima que, paradójicamente, perpetúa la explotación laboral.

Palabras clave: trabajadoras de las fábricas de conservas de pescado, división sexual del trabajo, discriminación, resistencia.


A presença das mulheres no trabalho produtivo e remunerado está marcada pelas atividades exercidas e apreendidas no trabalho reprodutivo realizado no espaço doméstico e inclui os serviços ligados aos cuidados de higiene e limpeza, de assistência aos filhos e aos idosos e a alimentação familiar. Situação que representa a condição histórica em que o gênero, entendido como uma construção social do feminino e do masculino, é fator determinante para a participação de mulheres e de homens em determinadas ocupações, constituindo-se na divisão sexual do trabalho. Historicamente, as mulheres ocuparam postos de trabalho nos setores de serviços, como educação, higiene e preparação de produtos alimentícios. Na indústria, as mulheres ocuparam postos nos setores têxteis, de vestuário e de fabricação de alimentos e, a partir da década de 1970, por exemplo, na indústria de microeletrônica, indicando uma constante segmentação por sexo da força de trabalho[2]. A segmentação do trabalho por sexo é hierárquica e conduz a desvalorização do trabalho feminino refletida na menor remuneração tanto em economias centrais como nas periféricas[3].

O setor da industrialização do pescado, especificamente o da conserva[4], originou-se na Europa, principalmente na França e na Espanha, no inicio do século XIX, e teve as mulheres como principal força de trabalho[5]. No Brasil a indústria de conserva do pescado é desde a sua formação, no final do século XIX, composta pela maior presença de força de trabalho feminina nas atividades relacionadas a limpeza e a conservação do pescado realizadas no chão da fábrica. As atividades nas fábricas apresentam uma relação de trabalho que combina a formalidade através de contratos formais e de tempo indeterminado, com a eventualidade do trabalho temporário e/ou informal em função da sazonalidade e da quantidade da matéria-prima, fragilizando o trabalho feminino. As relações e as condições de trabalho das mulheres nas fábricas de conserva de pescado reproduzem relações de gênero contaminadas por concepções patriarcais[6] que pouco mudaram nos quase duzentos anos de existência do setor.

A questão que impulsionou a pesquisa foi considerar a possibilidade de que o trabalho feminino como hegemônico nas fábricas de pescado poderia ser um possível lócus de autonomia ou resistência das trabalhadoras.

O artigo[7] realiza o diálogo com as formulações advindas das geografias feministas[8] sobre trabalho desde a perspectiva das relações de gênero e a pesquisa realizada com as trabalhadoras nas fábricas de pescado no município do Rio Grande localizado no estado do Rio Grande do Sul, no sul do Brasil. As trabalhadoras compõem dois grupos: um oriundo do Rio Grande e outro do município de São José do Norte. Os municípios são limítrofes com áreas contíguas ao estuário da Laguna dos Patos e ao litoral do oceano Atlântico e estão separados por um canal que é atravessado por embarcações de passageiros que fazem viagens de trinta minutos de duração (ver figura 1).

 

Figura 1. Município do Rio Grande e de São José do Norte localizados no Brasil e no estado do Rio Grande do Sul.
Elaborado por Luciano Lucas – Geógrafo do Núcleo de Análises Urbanas (NAU) – FURG.

 

O objetivo é compreender a situação das trabalhadoras na divisão sexual do trabalho, identificando as discriminações de gênero e as estratégias de resistência e autonomia. Para tanto, optamos pela interlocução entre a metodologia qualitativa e a quantitativa, sob a perspectiva das geografias feministas utilizando as categorias: trabalho, família e divisão sexual do trabalho. O corpus da pesquisa foi construído com a aplicação de questionários fechados em quinze mulheres do grupo de trabalhadoras de São José do Norte objetivando a caracterização socioeconômica. O grupo foi escolhido por ser pequeno e por que as trabalhadoras estabeleceram uma relação conjunta com as indústrias, pois em períodos de abundância de pescado todas eram chamadas para trabalhar. O estudo qualitativo envolveu seis entrevistas em profundidade: quatro com o grupo de São José do Norte e duas com o de Rio Grande, focando principalmente as relações de família e trabalho. As entrevistas, realizadas nas casas das entrevistadas, foram gravadas e transcritas, com o objetivo de compreender as perspectivas em relação a suas vidas, experiências ou situações, tal como expressadas com suas palavras[9]. A interpretação ocorreu a partir da análise do discurso, pois permite abordar as falas das entrevistadas com ênfase no discurso como uma forma de ação, considerando todas as formas de expressão[10].

O artigo está organizado em três partes. Na primeira problematizamos os conceitos relativos a divisão sexual do trabalho e ao trabalho feminino no Brasil a partir de indicadores selecionados. Na segunda parte apresentamos as fábricas de conserva de pescado em Rio Grande que representam o maior empregador de mulheres no setor industrial local e, na terceira, o trabalho feminino nas fábricas.


Trabalho feminino e divisão sexual do trabalho

A partir da perspectiva feminista com o suporte teórico das relações de gênero, consideramos a concepção do caráter sexuado das relações sociais para pensar a situação das trabalhadoras em relação às condições de trabalho e às estratégias de superação das discriminações. O estudo ao analisar os nexos entre os preconceitos e o papel das mulheres no trabalho reprodutivo realizado no espaço privado e o trabalho produtivo, realizado principalmente no espaço público, justifica-se como um subsidio para reflexão sobre as possibilidades de resistência e busca por autonomia e igualdade.

As relações de gênero constituem-se em relações sociais de poder construídas historicamente, baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos que hierarquizam posições sociais entre mulheres e homens. A divisão sexual do trabalho refere-se a divisão tradicional patriarcal que separa o trabalho no espaço reprodutivo/privado/ não remunerado, exercido por mulheres e o trabalho no espaço produtivo/público/remunerado exercido por homens. E a divisão no espaço produtivo, como à distribuição e a alocação da força de trabalho masculina e feminina nos diferentes setores do sistema produtivo[11]. As atividades remuneradas das mulheres são frequentemente uma extensão do trabalho reprodutivo no âmbito do espaço doméstico e privado. A remuneração é complementar e sua presença é mais importante na reprodução, enquanto que aos homens lhes cabe o papel de provedores da família. Quando as mulheres trabalham como assalariadas no âmbito de espaço público, estão nas atividades informais, temporárias ou em setores de atividades formais, de baixa remuneração e são consideradas como força de trabalho secundária, ainda que as evidências empíricas demonstrem que o trabalho de muitas mulheres sustenta famílias[12].

A divisão sexual do trabalho, baseada na dicotomia espaço público e espaço privado impõe para a maioria das mulheres a responsabilidade pelos afazeres domésticos no espaço privado[13]. Porém, nos últimos quarenta anos, os movimentos feministas, o aumento da escolaridade das mulheres em relação aos homens, a participação massiva das mulheres no mundo do trabalho remunerado e os novos arranjos familiares entre outros tem propiciado a desconstrução do modelo dicotômico de divisão sexual do trabalho entre produtivo e reprodutivo. Novos arranjos familiares pós-patriarcais, nos quais a organização familiar é negociada e a distribuição dos afazeres domésticos é mais equilibrada, misturam-se com organizações familiares que sobrecarregam as mulheres e dificultam sua plena inserção no mundo do trabalho remunerado.

Estudos indicam a crescente responsabilidade econômica das brasileiras na família, contudo, a baixa remuneração e a dupla jornada de trabalho indicam que para as mulheres pobres a busca pelo trabalho remunerado representa muito mais uma motivação de luta pela sobrevivência do que de luta por uma condição de autonomia[14]. Ao fazer a relação entre gênero e pobreza, Melo, aponta que as mulheres brasileiras vivem mais e são mais pobres que os homens, e registra que a “taxa de atividade feminina passou de uma média em torno de 20% da população economicamente ativa (PEA) entre os anos de 1920 a 1960 para 40% em 2000 (...)”[15]. De acordo com o Censo demográfico o nível de ocupação das mulheres com dez anos ou mais passou de 35,4% em 2000 para 43,9% em 2010[16]. Ainda que a Relação Anual de Informações Sociais Ministério do Trabalho e Emprego (RAIS/MTE)[17] do governo brasileiro, informe um crescimento de 7,28% do nível do emprego formal da força de trabalho feminina e 6,70% da masculina para 2010, evidenciando a continuidade do processo de expansão da força de trabalho feminina nos últimos anos, as ocupações exercidas por elas são, na maioria das vezes, trabalho que não exige escolaridade formal e estão predominantes no setor informal. A RAIS disponibiliza dados sobre mercado formal de trabalho brasileiro, a partir dos registros administrativos fornecidos pelas empresas, portanto trata-se de postos de trabalho ou vínculos de emprego e não necessariamente de empregados. Na maioria das vezes, os empregos temporários em atividades formais, como ocorre com muitas trabalhadoras das fábricas de pescado, apresentam-se como trabalho “incerto, imprevisível, e no qual os riscos empregatícios são assumidos principalmente pelo trabalhador, e não pelos seus empregadores ou pelo governo”[18]. Nestes casos, o trabalho é considerado precário nas suas “duas dimensões: a ausência ou redução de direitos e garantias do trabalho e a qualidade no exercício da atividade”[19] .

O crescimento da participação das mulheres no mercado de trabalho brasileiro, nas últimas décadas, se deve a mudanças demográficas, educacionais, culturais e econômicas[20]. Em relação às mudanças demográficas podemos elencar o processo de transição demográfica com a persistente diminuição do número de filhos por mulher[21] e o consequente envelhecimento da população e o aumento da esperança de vida diferencial entre os sexos,[22] com o crescimento do número de viúvas. O processo soma-se ao crescimento de gravidezes precoces, de separações conjugais e de novos arranjos familiares que também aumentam a proporção de domicílios chefiados por mulheres de 14% em 1980 para 30,6% em 2005 e, em 2010, a proporção de domicílios permanentes chefiados por mulheres nas regiões metropolitanas do Brasil era de 40,6%[23].

Uma outra variável importante é o aumento da escolaridade formal feminina que repercute positivamente não somente na qualificação profissional, mas no acesso a informações que facilitam o uso de métodos anticonceptivos e constitui indicativo para as jovens das possibilidades ofertadas pelos espaços públicos e o mercado de trabalho. O papel dos movimentos sociais da segunda onda feminista, dos anos de 1960, foi crucial para o conhecimento, produção e reprodução de novos padrões culturais ligados a vivência da sexualidade separada da procriação e de novos papéis que as mulheres podem assumir na sociedade, e no trabalho produtivo e remunerado[24]. Nos anos oitenta e noventa do século XX as sucessivas crises econômicas, o aumento do desemprego e a queda dos salários conviveram com novas pautas de consumo e arranjos familiares que demandam a participação das mulheres do mercado de trabalho.

As mulheres mais instruídas e qualificadas das camadas médias e altas estão mais preparadas para enfrentar o mercado de trabalho e, portanto, assumem postos mais qualificados e melhor remunerados. O trabalho decente propicia uma condição melhor para um efetivo processo de emancipação, autonomia e independência econômica. Em 2003, o governo brasileiro, assumiu o compromisso com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) em promover o trabalho decente no país. Para a OIT,

trabalho decente significa a promoção de emprego e ocupação com proteção social, respeito aos direitos e princípios fundamentais no trabalho e diálogo social (...) também deve incluir necessariamente, o entendimento de que se trata de um trabalho livre de todas as discriminações.[25]

No século XXI as mudanças se acentuam aliadas a um contexto de crescimento econômico e um incremento do consumo, principalmente de alimentos, roupas e bens materiais como fogões e geladeiras. As famílias brasileiras tiveram um aumento do consumo de 1,1% em 2002 para 3,1% em 2006[26]. Estudos recentes apontam que a inserção das mulheres no mercado de trabalho está marcada por permanências e mudanças[27]. As permanências dizem respeito a responsabilidade das mulheres pelos afazeres domésticos, que se traduzem no número de horas diárias dedicadas a família[28], ocasionando uma sobrecarga para aquelas que realizam atividades econômicas remuneradas, e os baixos salários[29], a precariedade laboral e a ocupação de guetos de emprego e trabalhos marcadamente femininos tendo como corolário a redução de salários e queda de prestígio social.

Sinteticamente podemos afirmar que, as mulheres, desde a década setenta do século XX, tem presença crescente no mercado do trabalho, em especial no brasileiro e ainda ocupam principalmente postos de trabalho relacionados às funções ou papéis femininos. Estes papéis são consequência da função biológica da maternidade, fundados na concepção essencialista e no modelo de família patriarcal que estabelece ao homem o papel de provedor e a mulher o de administradora do lar, responsável pelos afazeres domésticos, o cuidado com os filhos e eventualmente com outros dependentes. Na concepção, as mulheres estão mais afeitas para as atividades apreendidas no mundo privado do lar patriarcal, tais como: a educação, a higiene e os cuidados com o outro que incluem cozinhar, lavar e servir. Como reflexo e condição, as trabalhadoras brasileiras estão presentes em maior número no setor dos serviços e do comércio[30]. No setor industrial o trabalho feminino é predominante na indústria têxtil, de calçados e na de alimentos, reflexo das posições ocupadas por mulheres e homens na divisão sexual do trabalho dentro da lógica patriarcal[31]. No setor da pesca as atividades de captura e beneficiamento também são marcadas pelas relações de gênero que impõem uma divisão sexual do trabalho. A captura é realizada principalmente por homens e o beneficiamento absorve grande parte da força de trabalho feminina do setor da indústria de transformação. As mulheres realizam em terra, no domicílio, que corresponde ao espaço privado, ou na fábrica, considerado espaço público, o beneficiamento do pescado. As tarefas estão ligadas a alimentação e a higiene e constituem-se, na ideologia patriarcal, como “um serviço para as mulheres”.


As fábricas de conserva de pescado brasileiras: o caso de Rio Grande (RS)

Em meados do século XIX, Rio Grande destacava-se no cenário sulino devido à atividade portuária, ocupando o terceiro lugar em movimentação no Brasil. Segundo o relato do viajante e comerciante John Luccock havia no município um relevante comércio de importação de produtos ingleses e europeus, além do comércio interior com outras partes da província, pois era o lugar de escoamento da produção do charque e de derivados do gado, couro, chifre, graxa, sebo e outros[32]. Em 1873, uma das primeiras indústrias modernas do Brasil, a fábrica de tecidos Rheingantz, iniciou suas atividades em Rio Grande, e empregava importante contingente de mulheres no processo produtivo[33].

A partir de 1870, migrantes portugueses da Póvoa do Varzim, iniciaram a exploração econômica dos recursos pesqueiros do estuário da Laguna dos Patos e do litoral adjacente: “portadores de capitais e de um passado vinculado à pesca, organizaram as primeiras parelhas de pesca e unidades de industrialização”[34]. No período, ocorreu um incremento das exportações de pescado para o Nordeste brasileiro e, em Rio Grande, fundaram-se duas fábricas de conservas de pescado, a Cunha Amaral S/A Indústria e Comércio (1876) e a Indústria de Alimentos Leal Santos (1889).

Na virada do século XIX até as primeiras décadas do século XX, outras empresas foram instaladas no município, transformando-o no mais importante polo industrial do Rio Grande do Sul, contribuindo para o crescimento da população urbana e a diversificação das atividades econômicas, que marcaram a formação da atividade industrial e começo da inserção da força de trabalho feminina nas industrias têxteis e de conserva de pescado.

O parque industrial pesqueiro instalado em Rio Grande foi alavancado com as capturas no litoral adjacente e uma série de políticas estatais de incentivos e financiamentos nas décadas de 1950 e 1960. No final dos anos de 1970 o setor empregava dezessete mil trabalhadores (as) numa população de cerca de 147.000 habitantes e, do total de trabalhadores empregados, aproximadamente doze mil eram temporários e mulheres[35]. No período da ditadura militar brasileira (1964-1985), o projeto de modernização conservadora, propiciou às indústrias pesqueiras do município a possibilidade de fornecer volumosa quantidade de diferentes modalidades de beneficiamento de pescado para o mercado do Sudeste e Nordeste do Brasil. Isso foi possível porque as empresas instaladas no município foram beneficiadas por cerca de 25% do total nacional dos recursos destinados para o setor, aproveitando-se dos privilégios das regulamentações estatais, “que incluíam imposições contra as importações de pescado e o uso exclusivo do Mar Territorial brasileiro”[36].

Nas décadas de 1970/80, Rio Grande abrigou o maior parque industrial pesqueiro do Brasil. No inicio do século XXI, o estado do Rio Grande do Sul era responsável por cerca de 25% do pescado industrializado, tendo sofrido uma redução, se comparado com os números até a década de 1990. De fato, “até o começo da década de noventa o parque industrial pesqueiro instalado em Rio Grande correspondia a aproximadamente cinquenta por cento da capacidade da indústria pesqueira no Brasil”[37]. As mulheres compõem uma importante fração da força de trabalho absorvida por estas empresas. Em 1990, as nove fábricas instaladas no município, empregavam 670 homens e 1.350 mulheres[38]. Nos anos de 1995-2003/2009 as trabalhadoras compunham mais de cinquenta por cento do total de trabalhadores (ver tabela 1).

 

Tabela 1.
Rio Grande, RS – empresas e trabalhadores por sexo na classe de preservação do pescado
e fabricação de produtos do pescado em
1995-2003 e 2009

Ano

Número de empresas

Trabalhadores (total)

Homens (total)

Mulheres (total)

Mulheres* (%)

1995

17

3.829

1.545

2.284

59,6

1996

17

2.255

939

1.316

58,3

1997

15

2.593

909

1.684

64,9

1998

16

1.726

648

1.078

62,4

1999

15

1.915

711

1.204

62,8

2000

13

1.741

692

1.049

60,2

2001

16

2.352

934

1.418

60,2

2002

17

1.759

809

950

54,2

2003

16

1.865

852

1.013

54,3

2009

19

1.734

728

1.006

58,0

Fonte: Martins, 2006, p. 139. * Elaborado por Susana M. V. da Silva.

 

Em 2010, o município do Rio Grande contava com uma população total de 197.228 com 94.983 homens e 102.245 mulheres[39]. De acordo com os dados disponibilizados pela RAIS/MTE, em 2009, entre as 1.589 trabalhadoras das indústrias de transformação instaladas em Rio Grande, 1.006 (63,3%) eram empregadas nas dezenove fábricas de pescado operantes, que empregavam um total de 1.734 trabalhadores e, destes, 58% eram mulheres. Importante ressaltar que o número total de trabalhadoras é sempre maior do que o registrado pela RAIS, pois dependendo da safra, os empregadores utilizam-se de contratos temporários para diaristas e tarefeiras, ou mesmo, de trabalhadoras sem nenhum tipo de contrato.

 Uma das características do trabalho nas fábricas de conserva de pescado é o trabalho por tarefa. O trabalho se caracteriza pela descontinuidade da atividade, o que possibilita um não comprometimento entre a trabalhadora e o empregador. A remuneração está relacionada a produção da trabalhadora e sua ligação com a empresa pode se dar ou não a partir de um contrato temporário. O trabalho tarefeiro é aquele “prestado por conta do tomador de serviços, com remuneração proporcional ao numero de peças produzidas ou serviços desempenhados pelo trabalhador, realizado de forma não habitual, impessoal e mediante certa subordinação (...) e não há amparo legal algum a categoria dos trabalhadores tarefeiros”[40]. Juridicamente, o tarefeiro não se configura como um trabalhador(a) empregado ou temporário, sendo considerados como trabalhadores(as) avulsos ou eventuais. Se por um lado o trabalho das tarefeiras na maioria das fábricas de pescado é um trabalho precário, marcado pela sazonalidade, insalubridade e sem amparo legal, por outro, segundo relatos das mulheres, como não são empregadas, a atividade laboral permite-lhes independência e controle com relação a produção e a jornada de trabalho. A discriminação sócio-jurídica do trabalhador(a) por tarefa no setor industrial pesqueiro evidenciou uma modificação nas características desta modalidade de tarefeiro a partir da década de 1980 e algumas tarefeiras passaram a trabalhar de forma continua em uma mesma empresa e gozarem de repousos semanais, férias, gratificação natalina sobre o valor da produção[41]. A relação de trabalho também depende das preferências pessoais do capataz ou agenciador de mão de obra e em função da sazonalidade e dos volumes que devem ser processados.

De acordo com o relato das trabalhadoras, atualmente, as fábricas de pescado operam, em média, com três esteiras, que são bancadas em inox por onde circulam os pescados. Na época da safra, em torno de vinte e cinco mulheres realizam por esteira, as seguintes tarefas: classificação dos pescados; limpeza dos pescados (peixes, camarões e siris); preparação de filés (peixes); armazenagem em banheiras com gelo; empacotamento; e armazenamento nos frigoríficos. O trabalho de classificação é feito pelas diaristas, com turno de oito horas e estendido, de acordo com a quantidade e a qualidade de matéria prima. As tarefeiras executam o trabalho mais qualificado. A preparação dos filés denomina-se popularmente de fileteamento e as trabalhadoras se autodenominam de fileteras, pois com o uso das facas e outros apetrechos preparam os filés de pescado, considerado um produto nobre que exige destreza no manuseio.[42].

As tarefas que executam requerem habilidades aprendidas, na maioria dos casos, no espaço reprodutivo, com as mulheres da casa. Na década de 1980 este tipo de aprendizagem foi denominada por Diane Elson e Ruth Pearson de “dedos ágeis”,

The famous "nimble fingers" of young women are not an inheritance from their mothers in the same way that they may inherit the colour of her skin or eyes. They are the result of the training they have received from their mothers and other female kin since early infancy in the tasks socially appropriate to woman's role.[43]

 As habilidades para executar o trabalho na fábrica de pescado com mãos ágeis, também podem ser ensinadas às aprendizes dentro das fábricas por trabalhadoras mais experientes, e não é valorizada pelo empregador. Na lógica patriarcal e capitalista constituem-se em habilidades de baixo status, que não necessitam educação formal e portanto são subvalorizadas, permitindo uma maior exploração da força de trabalho empregadas nas fábricas de pescado que também se manifesta nas condições de trabalho no chão de fábrica.

No Brasil, desde a década de 1950, as condições de trabalho no chão de fábrica, são normatizadas pelo Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (RIISPOA). As normas do RIISPOA tratam, também, das atividades das trabalhadoras em geral, pois objetivam melhorar as condições de produção que incluem melhorias sanitárias. O sistema de controle do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) concede o registro do Serviço de Inspeção Federal (SIF), que regula as condições sanitárias e permite a comercialização dos produtos de origem animal em todo o território nacional[44]. Mesmo assim, conforme observação e relato das trabalhadoras, as disposições relativas às condições no chão de fábrica muitas vezes não são adequadas, ocasionando insalubridade e doenças como cistite e varizes sobretudo em função das baixas temperaturas dos ambientes e do número de horas de trabalho em pé. As condições de precariedade e insalubridade vem sendo sanadas de forma mais constante a partir de 2008, principalmente nas fábricas que destinam sua produção para o mercado exterior. De fato, os regulamentos objetivam mais melhorar a produção e torná-la apta ao mercado exterior do que as condições de trabalho das trabalhadoras.

Em 2011 operavam em Rio Grande oito estabelecimentos com registro no Serviço de Inspeção Federal (SIF). As mulheres entrevistadas trabalham ou trabalharam em três das fábricas com SIF e em quatro fábricas que não aparecem na relação atualizada de estabelecimentos de 2011, mas possuíam registro no SIF em anos anteriores.


O trabalho feminino nas fábricas de conserva de pescado

As mulheres entrevistadas têm suas origens familiares e laborais ligadas a pesca, a agricultura ou aos serviços domésticos e trabalham nas fábricas de conserva de pescado em Rio Grande, e residem neste município ou em São José do Norte. Como vimos, Rio Grande foi estruturado como ponto estratégico e tornou-se um importante polo portuário-industrial e pesqueiro. O município de São José do Norte possui tradição pesqueira, sendo também até o final da década de 1970 o maior produtor de cebolas do Brasil. No final dos anos 1980, a concorrência da produção de outros estados brasileiros e das importações, bem como das dificuldades de transporte para os principais mercados, fez com que a produção do município entrasse em crise[45]. A concorrência de outros produtores configurou uma nova estrutura econômica e posição na divisão territorial do trabalho. Impelindo aos trabalhadores(as) a busca de alternativas de trabalho e de empregos urbanos. Para as mulheres de baixa escolaridade, o emprego nas fábricas de pescado em Rio Grande é uma opção de trabalho remunerado.

O grupo de mulheres de São José do Norte é organizado e a sua contratação é feita a partir de uma representante do grupo que aloca, através de um capataz, o número de trabalhadoras necessário para o trabalho para a demanda solicitada por uma determinada fábrica. As mulheres são representativas da discriminação, tanto em relação à exploração do trabalho, como em relação ao preconceito de mulheres trabalhadoras dos arredores do cais do porto, considerado como um espaço masculino. Quase a metade do grupo (46%) está na faixa etária de quarenta e um a cinquenta anos, a mesma porcentagem é natural de São José do Norte. Ao analisarmos a fecundidade das entrevistadas, constatamos que o número de filhos por mulher é elevado, pois, quase 60% tem de três a cinco filhos[46]. A grande maioria (82%) possui companheiro, mas se consideram chefes de família (73%), mesmo entre aquelas que dividem a renda familiar com o cônjuge ou companheiro, pois são as responsáveis pela administração da casa e das finanças. Quanto à escolaridade, a grande maioria não completou o ensino fundamental[47] (72,7%), além de uma significativa quantidade de analfabetas (18,2%), o que as caracteriza por uma baixa escolaridade.

As falas das entrevistadas[48] apresentadas a seguir, evidenciam elementos de reflexão sobre família, divisão sexual do trabalho, condições laborais, preconceitos e resistência.

A família da entrevistada C é originária da Quinta Secção da Barra, localidade de São José do Norte, onde moram famílias de pescadores. Tradicionalmente, a pesca era feita sob o regime familiar, e atualmente encontra-se em decadência, devido ao avanço dos barcos pesqueiros de grande porte com práticas pesqueiras que comprometem o ritmo de reprodução das várias espécies, bem como a qualidade das águas, em função dos problemas com emissões de poluentes urbanos e industriais, o uso de agrotóxicos e das águas por determinadas lavouras que afetam a dinâmica natural dos corpos de água. De acordo com a fala da entrevistada, nos anos de 1980, quando morava na localidade havia uma grande quantidade de barcos de pequeno porte, chamados de botes, que serviam para realizar a pesca com instrumentos simples e de base familiar. A entrevistada rememora que “o avô possuía parelha”, [49] o pai seguiu a mesma ocupação, estando a mãe e os irmãos envolvidos nesse trabalho familiar:

(...) meu avô tinha a parelha dele, os filhos todos tinham a parelha deles, meu pai tinha. Tudo pertinho uma das outras. Os irmãos, que na infância trabalhavam com a família, atualmente são empregados, e não tem nada próprio. Trabalham num barco de pesca[50].

Os reflexos da decadência do setor pesqueiro são sentidos tanto pelos homens, que se viram obrigados a se empregarem nos grandes barcos ou em outras atividades, como para as mulheres, que precisam fazer a travessia para Rio Grande para trabalhar na indústria do pescado. As entrevistadas concordam com C: "naquele tempo a pesca era mais fácil que agora".

Em relação ao trabalho feminino, as mulheres possuem um papel relevante na rotina da pesca, tanto artesanal quanto industrial. No trabalho artesanal, a atividade das mulheres era considerada uma ajuda para a família e, principalmente, ao marido ao invés de ser uma ocupação:

(...) a minha mãe eu acho que nunca trabalhou como eu (...) o máximo da minha mãe era dentro de casa. (...) E quando meu pai tinha parelha ela era cozinheira. Ela levantava quatro horas da manhã para fazer café, almoço pra quem estava chegando do mar, subia em cima do trapiche pra desmalhar peixe.[51]

A divisão sexual do trabalho tem dois princípios organizadores: a separação e a hierarquização[52], portanto há trabalhos dos homens (trabalho produtivo/remunerado) e trabalho das mulheres (trabalho doméstico/ não remunerado). O trabalho dos homens “vale” mais do que o das mulheres. Nas fábricas de pescado, a chefia, a organização e o controle das tarefas e as atividades de manutenção de equipamentos são realizadas por homens com relações formais de trabalho. A desvalorização do trabalho feminino é observada na própria fala da entrevistada, quando diz que o “máximo da mãe” era o serviço de casa. No entanto, a ocupação que a mãe possuía na rotina diária da atividade pesqueira era de extrema importância para o andamento do trabalho da pesca artesanal: enquanto os homens saiam nos barcos, tanto para a laguna quanto para o oceano, as mulheres tinham uma participação indispensável nos trabalhos de suporte, como na preparação da alimentação, nos reparos das redes, no auxílio para retirar o pescado das redes e na separação das diferentes espécies. A entrevistada considera sua atual ocupação na indústria da pesca como mais importante que aqueles executados por sua mãe na atividade em família da pesca artesanal. A importância que atribui a seu trabalho, tem dois motivos: a remuneração e a socialização ligada a uma atividade fora do espaço privado, promovendo autonomia econômica e aumento de autoestima. C diz que “é bom trabalhar fora, tenho meu dinheiro e me sinto bem”.

A entrevistada L acrescenta ao entendimento de C: “na fábrica faço muita amizade, a gente faz muita amizade, com homem, com mulher. (...). Todo mundo se da bem porque na fábrica todo mundo é uma família, porque tu sai de casa de manhã cedo e só volta de noite”[53]. Demonstrando satisfação com a socialização que o trabalho na fábrica propicia, sem perceber que a concepção de família nas relações fabris dificulta o processo reivindicativo por melhores condições de trabalho e de remuneração.

Para as entrevistadas, o trabalho reprodutivo é marcadamente feminino, e consideram que as tarefas domésticas são de sua responsabilidade, pois estão mais preparadas e fazem melhor que os outros membros da família: “faço tudo em casa, a comida, a roupa... as vezes eles ajudam... mas chego da fábrica e direto pra cozinha, as vezes minha filha limpa a casa, estou ensinando. Os homens não fazem direito”[54]. A dupla ou tripla jornada é percebida como normal e necessária para o bom andamento da rotina familiar, não há o entendimento claro de que esta divisão lhes prejudique no trabalho produtivo.

As entrevistadas de São José do Norte consideram que “são mais trabalhadoras que as do Rio Grande”. A afirmação pode ser interpretada também como uma maior tolerância às necessidades da empresa e pode ser observada quando relatam que aceitam trabalhar até vinte e quatro horas, sem descanso, para terminar o trabalho de um carregamento de pescado. Não reclamam da exploração, preferem ressaltar que “não há nenhum peixe que não conheça, nenhum que não saiba se está bom ou se está ruim"[55], refletindo a familiaridade com a pesca.

As mulheres demonstram orgulho de suas habilidades, e não se colocam em circunstâncias de reivindicar melhores salários ou melhores condições de trabalho. De fato, aumentam a renda alternando o trabalho nas fábricas com tarefas agrícolas ou emprego doméstico e não são conscientes da exploração laboral. A entrevistada M, que trabalha no cultivo da cebola e na classificação do pescado relata que: "aqui é peixe ou é cebola, quando não é peixe é cebola, quando não é cebola é peixe. (...) esse ano mesmo foi muito pouca gente cortando cebola, agora é nas máquinas".[56] M começou a trabalhar como diarista na safra da cebola e na entressafra na indústria de conserva de pescado do Rio Grande. Porém, ressalta que “desde 2009, o serviço da cebola tem diminuído, devido ao corte mecanizado”. Além disso, o trabalho no cultivo da cebola é sazonal e na época da plantação e da colheita garante aproximadamente cinco meses de trabalho. No trabalho na fábrica de pescado não há intervalos tão longos, pois a matéria-prima varia durante o ano, entre diferentes tipos de pescados e a safra do camarão. M comenta que “escolheu trabalhar na fábrica, porque é o ano todo (...) Eu posso ficar até uma semana em casa. Mas no momento em que os barcos chegam do mar, ele [capataz] já está ligando. (...) vão fazer cinco anos que eu estou ali e todos os meses do ano eu trabalhei", explica M, quando justifica a preferência pela atividade de classificação de pescados.

No universo pesquisado há mulheres que trabalharam ou trabalham de empregadas domésticas, mas consideram um “trabalho pior do que nas fábricas”. Os principais motivos apontados pelas entrevistadas são a baixa remuneração, a informalidade e o preconceito. A entrevistada L também nasceu na localidade da Quinta Secção da Barra, seu pai era pescador e a sua mãe “trabalhava na roça, com cebola e a vida era muito sofrida”. Estudou até o segundo ano, “porque lá a gente era muito pobre e com dez anos eu comecei a trabalhar como empregada doméstica”. Casou-se com catorze anos e aos dezessete se separou do marido e migrou para Rio Grande, para trabalhar nas fábricas de pescado: “trabalhei cinco anos na fábrica”[57]. Para M a experiência como empregada doméstica foi um fator de impedimento para a continuidade dos estudos: “na época em que eu trabalhava de doméstica não podia estudar, as patroas não gostavam ainda mais se estudavam a noite”. Também relata um caso de preconceito e assédio sexual: “um dia estava na casa de uma patroa e o marido dela olhou bem pra mim e disse: dizem que negra é muito boa na cama, né? Eu disse deu! Sai do serviço, já peguei cada uma”[58].

O trabalho nas fábricas de pescado, comparado ao serviço doméstico, é considerado mais atrativo: M argumenta que “na casa de família tu também leva cantada, mas é diferente porque tu vai aceitar que uma criança te jogue na cara que a mãe dela tá pagando.” Nesse sentido é bem melhor a fábrica. Odeio quando chega alguém e diz que está mal lavado e joga no chão, isso acontece e muito em casa de família”[59]. A entrevistada V afirma que “como doméstica as donas acham que são tuas donas, que somos escravas é muito humilhante e com meu temperamento não dá. (...). Nas fábricas de pescado “é diferente tens teu tempo de trabalho não é tanta pressão, e quem controlava meu horário era eu se quisesse ganhar mais trabalhava mais[60]. Nas fábricas a remuneração das trabalhadoras tem como teto máximo o salario mínimo nacional[61] e eventualmente ganham horas extras. A autonomia econômica para estas mulheres é pensada dentro da situação de pobreza que vivenciam, assim como as relações e as condições do trabalho a que estão submetidas.

As tarefas começam quando os barcos chegam do mar e são divididas por sexo do trabalhador. Os homens que conduzem o resultado da pesca para o cais. A matéria -prima é transportada lentamente pelas esteiras e desfila para as mulheres, que se alojam ao longo dela, para fazerem a separação e o depósito dos diferentes tipos de pescados nos recipientes com gelo. Muitas vezes as mulheres executam as tarefas em lugares insalubres e sem os equipamentos necessários. As entrevistadas consideram que a pior tarefa é a aquela executada “na sala fria, porque a sala fria é um túnel que se trabalha no meio do gelo, é fria mesmo, os geradores ficam ligados tempo todo. Usamos roupas, mas assim mesmo a gente sente frio”[62].

A maioria das fábricas não fornece luvas, botas ou aventais apropriados para proteger da umidade e do frio, ocasionados com o contato do gelo para a conservação dos pescados. Nestes casos, as trabalhadoras compram seus uniformes,

(...) dizem que há muito tempo, assim que abriu a firma, eles davam o uniforme, mas aí depois com o tempo já foi ficando mais ruim o serviço, porque já não é todos que tiram ali né, se dividem né, ainda há pouco serviço. Antes davam, agora não, nós é que levamos a calça branca, a bota, o blusão e o tapa-pó.[63]

A fala da entrevistada revela que foi transferido para as trabalhadoras a responsabilidade pela aquisição do uniforme de trabalho. A compra do material é feita com o salário diário de aproximadamente vinte e cinco reais[64], pelo serviço de cerca de oito horas de trabalho: "mesmo que eu pegue oito horas e solte meio dia, duas horas, quatro horas, cinco horas são os mesmos vinte e cinco, mesmo que eu não complete as oito horas"[65].

Normalmente, as dependências da empresa não são apropriadas, fazendo com que as trabalhadoras permaneçam no período de serviço em cima de um suporte de madeira ou de plástico denominado de estrado. Quando as esteiras estão com o número máximo de trabalhadoras ao seu redor, não há suporte para todas sendo preciso improvisar com as próprias bacias, onde colocam os pescados. Situação que contrasta com a atual condição de trabalho das fábricas espanholas, como podemos observar nas figuras 2 e 3.

 

Sala Fria 03

Figura 2. Interior de uma fábrica de pescado em Rio Grande, Brasil, 2009.
Fonte: Acervo pessoal de uma entrevistada que solicita sigilo.

 

Figura 3. Interior de uma fábrica de pescado na Galícia, Espanha, 2011.
Fonte: Revista Industria Conservera, ANFACO, n. 93, 2011, p. 33.

 

O número máximo de trabalhadoras ocorre quando o pescado é capturado por parelhas de arrasto, que podem conter de oitenta a cem toneladas de diferentes espécies de peixes, de “tudo quanto é qualidade e tamanho” porque “vem rapando tudo” [66], sendo necessário maior conhecimento e experiência na classificação. No caso das traineiras[67], carregadas somente de peixes grande, com média de vinte a vinte e cinco toneladas/barco, costuma ser utilizada somente uma esteira para o trabalho de classificação.

A posição das mulheres nas esteiras, durante o dia inteiro, acaba causando problemas na coluna vertebral, existindo uma certa disputa para pegar a esteira mais alta, mais fácil de se posicionar para olhar e pegar o pescado. Os estrados servem também para se adequarem à altura das esteiras. Quando há uma grande quantidade de pescado, a cansativa rotina de trabalho pode ser estendida para além das oito horas diárias. Levando-se em conta que o horário de travessia realizada por embarcações, entre Rio Grande e São José do Norte cessa à meia-noite, durante as horas extras, o serviço pode ultrapassar o horário de funcionamento. Com isso, as mulheres acabam esperando o primeiro barco da manhã nas dependências da fábrica.

Olha, peguei ontem oito horas da manhã e vim hoje às sete e meia da manhã. Ontem nós trabalhamos até a uma da manhã e não tinha lancha mais, aí o que a gente faz? Embora não dá pra vir, né. Tomamos um café, fizemos um chimarrão no refeitório e ficamos ali. Eles não pagam hotel pra nós, a gente fica ali até a primeira lancha, até a das sete[68].

A fábrica localiza-se próximo ao cais do porto velho do Rio Grande, onde a circulação noturna, segundo as entrevistadas não é recomendável: “é muito perigoso. O quintal fica aberto. E o refeitório onde a gente estava era ali no fundo. Não dá pra arriscar a vida ali, não... ali é muita droga por causa dos barcos, do porto”[69]. As trabalhadoras se unem e se protegem mutuamente e acabam ficando no refeitório, um local inadequado para o pernoite.

O espaço portuário oferece um perigo que reforça a união das mulheres, continua relatando C, pois quando saem para pegar a lancha "a gente não sai lá da firma sem estar todo mundo junto, uma por causa dos vale transporte e outra porque lá é perigoso". Apesar de relatarem que gostam do trabalho, elas reconhecem a precariedade das condições laborais: "até queria, não vou dizer que não queria um serviço melhor, mas como eu não tenho, eu tenho que me contentar com o que tem, né". A entrevistada M relata que "a minha filha mais velha vai comigo de vez em quando", enquanto não consegue um emprego melhor. A trabalhadora explica que leva sua filha para a fábrica para “pegar a prática” e para “compreender que nem sempre vai depender de pai e de mãe". Mas reconhece que "é uma coisa que eu não quero pra minha filha por eu trabalhar lá, eu não quero pra minha filha aquilo ali"[70]. A opinião é compartilhada pela entrevistada C, que mesmo gostando de trabalhar na indústria da pesca, explica que exerce a atividade "porque precisa".

Os preconceitos relatados estão ligados a atividade na fábrica e aparecem também relativos ao manuseio do pescado e o consequente cheiro, “o problema é que a peixeira é mal vista. Na lancha mesmo nos combinávamos de sentar no salão para as dondocas torcerem o nariz, depois iríamos para a borda. Eu passava açúcar na mão para sair o cheiro era muito forte”[71]. Também relatam que são consideradas “briguentas”, com o estigma de mulheres de “faca na bota”, que se fundamenta no uso de faca própria colocada na bota de plástico branco e na postura de “não levar desaforo pra casa”[72].     

Algumas das mulheres entrevistadas disseram que sofreram assédio sexual na fábrica promovido pelo gerente ou capataz. Outras alegam optar livremente em conceder favores sexuais para a obtenção de algum ganho. Quando perguntada se existe assédio na fábrica V relata[73] que “existia sempre tinha algum chefe que dava em cima das gurias, sempre. Tive até uma colega que saiu da fábrica porque o marido dela não a deixou continuar trabalhando lá. Por causa dessa fama que tem a mulher de fábrica”. Porém completa “Acho que é porque a maioria não se dá ao respeito mesmo”. Ainda segundo V, as mulheres “que se dão o respeito” o ganham porque são de “faca na bota”: “sempre fui séria e andava com umas mulheres revoltadas que andavam sempre de facão daí ninguém mexia com a gente”. As relações de gênero aparecem de duas maneiras: ora perpetuando a condição submissa das mulheres, em conceder favores sexuais para obter ganhos no trabalho, ora pela necessidade de assumir uma postura masculina para se defender na fábrica.

A precarização do trabalho na fábrica é compensada pela liberdade de ser “dona de seu nariz”[74]. Os preconceitos em relação ao trabalho são dirimidos, pois o objetivo é ter um trabalho remunerado e ter a possibilidade de sair do mundo doméstico e ampliar sua socialização. Porém quando perguntadas se gostariam que suas filhas trabalhassem na fábrica elas são unânimes em dizer que para as filhas “querem o estudo” para que através dele possam “trabalhar em algo melhor”[75].     

Por outro lado, a classificação do pescado exige experiência das trabalhadoras, adquirida na convivência com a pesca, levando as mulheres a reconhecerem a importância de seus trabalhos. Suas origens e trajetórias ajuda a entender a preferência pelo trabalho na indústria de pescado mesmo tendo que conviver com o ambiente portuário, considerado um local perigoso e masculino, por onde não se deve circular sem a companhia de outras pessoas. Uma das estratégias é andar em grupo e falarem alto, adiantando a todos que “as mulheres do peixe estão passando”. A frase é muito ouvida quando se indaga sobre elas em Rio Grande. Nas entrevistas, elas fazem questão de ressaltar a característica: “na lancha a gente senta tudo junto, tudo assim em fileirinha. Então eu vou chegando, vou largando a minha bolsa e vou marcando o lugar para cada uma. Então a gente se encontra tudo junto ali na lancha”[76]. Uma socialização saudada pelas trabalhadoras, mas que não teve como consequência uma ação efetiva de busca coletiva por melhores condições de trabalho. L responde sobre possíveis associações e /ou sindicalização:

Sou sócia do sindicato da alimentação, até hoje, mas vou te dizer uma coisa eles não fazem muito pela gente. Eles fazem mais é pelos empresários. Sabe como é aquele ditado sempre corre algum por fora. (...) eles não dão valor à gente. Eles são mais dos empresários, porque geralmente os empresários de fábrica cada um deles tem uma cadeira no sindicato, quer dizer: se o sindicato pede um aumento para nós, e o empresário vai lá e diz que esse valor ele não pode dar porque é demais, o sindicato enrola, enrola e não dá aquele valor que o empresário pediu. Sem a gente saber ,quando a gente sabe eles já negociaram[77].

Quando indagada sobre o por quê de permanecer sindicalizada L responde que:

Fiquei, ah sei lá, às vezes a gente precisa de um dentista, fim de ano tem um churrasco para nós, a gente vai de graça não precisa pagar. Às vezes por causa dos filhos também, eu tenho direito de usar, eles tem... até o meu marido pode usar[78].

A maioria das entrevistadas não é sindicalizada e quando o são, estão mais interessadas nos benefícios de saúde e de confraternização que a filiação concede e não se sentem representadas enquanto trabalhadoras e consequentemente se fragilizam como coletivo.


Considerações finais

A despeito de uma maior inserção no mercado de trabalho, um aumento da escolaridade e uma diminuição da taxa de fecundidade, as brasileiras ainda ocupam majoritariamente postos de trabalho nos setores de serviços e de comércio e, no industrial, estão empregadas principalmente nas indústrias alimentícias e têxteis, com reflexos em uma remuneração e um status laboral baixos.

O trabalho no setor da conserva de pescado está marcado por relações patriarcais que exploram a força de trabalho a partir de uma concepção tradicional e conservadora de papéis atribuídos aos homens e as mulheres. Esta concepção define uma inserção laboral baseada na divisão sexual do trabalho. Em algumas fábricas, as condições e as relações de trabalho são precárias e repetem no século XXI, relações de poder marcadas pelo gênero, que ocorriam nas fábricas europeias do século XIX. Contudo, a situação de pobreza das mulheres é amenizada pelo trabalho exercido nas fábricas de pescado e possibilita uma certa autonomia. Em São José do Norte, a decadência da pesca e da produção de cebola produziu a procura por novas oportunidades de trabalho em Rio Grande. Pescadores artesanais, pequenos produtores de cebola e empregadas domésticas, passaram para a condição de empregados industriais como é o caso das mulheres que foram entrevistadas. 

As trabalhadoras das fábricas de pescado são mulheres adultas, com baixa escolaridade e alta taxa de fecundidade e começaram a trabalhar muito jovens, nas atividades de apoio a família na pesca artesanal ou nas fábricas de conserva de pescado. O elevado número de mulheres chefes de família que sustentam a casa, inclusive em alguns casos de mulheres casadas, cujos maridos encontram-se sem trabalho, devido principalmente à crise da pesca, a baixa escolaridade e a especialização dos homens no setor, demonstra a importância da atividade feminina nas fábricas para as famílias e a valorização que as mulheres atribuem ao seu trabalho. Porém a dupla ou tripla jornada imposta por concepções patriarcais constitui-se fator de exploração do trabalho das entrevistadas e contrasta com a existência de famílias pós-patriarcais dos setores de renda média e alta.

Na pesquisa, observamos que para as trabalhadoras das fábricas de pescado a autonomia econômica e o aumento da autoestima são significativos, porém, tal situação se estabeleceria não apenas em relação a sua atual atividade de trabalho operário na indústria do pescado, mas sim em outras duas dimensões. A primeira dimensão é em relação a sua nova situação de trabalhadora assalariada da indústria do pescado frente ao tratamento que recebia como trabalhadora da pesca artesanal ou mesmo como trabalhadora do cultivo da cebola, em que o alicerce eram as relações familiares chefiadas pelo homem adulto que pescava. A segunda está em assumir a chefia da casa e ter a possibilidade de estabelecer uma relação de menor deigualdade de gênero nas decisões sobre o destino da família, consequentemente gerando uma autonomia no seu processo de socialização, mudando a visão do seu papel perante a família e da comunidade onde mora. Constatamos que o trabalho nas fábricas de pescado, ainda que longe de propiciar, para as trabalhadoras, um trabalho decente, permite o fortalecimento econômico das mulheres, pois ou são chefes de família ou a sua renda é fundamental para a sobrevivência familiar. O trabalho permite o fortalecimento da socialização e da autoestima, que também estão associados a passagem das relações de trabalho tradicionais e patriarcais, como a pesca artesanal, para as contratuais e racionais, como trabalhadoras nas fábricas de pescado, porém submetidas ao capataz.

O estigma associado ao manuseio da matéria-prima, seja pelo odor produzido ou pelo uso de facas não decisivo para que as trabalhadoras sintam-se inferiorizadas. Ao contrário, o porte da faca usada para as atividades na conserva, ligado ao fato de andarem em grupos em locais geralmente masculinizados lhes confere um aumento da autoestima. Porém a socialização que o trabalho na fábrica proporciona não é suficiente para que construam relações de trabalho que objetivem resistência e luta por melhores condições e o enfrentamento com os patrões está restrito a estratégias individuais.

O trabalho nas fabricas de conserva de pescado, pautado pela segmentação por sexo, explorando as habilidades consideradas inatas das trabalhadoras é subvalorizado tanto pelos empregadores como pelas próprias trabalhadoras. Tal como o estudado por Abeledo na Espanha da década de 1970, a mentalidade patriarcal como suporte ideológico, persiste nas fábricas brasileiras do século XXI e permite que se mantenha a exploração da força de trabalho feminina no setor.

 

Notas

[1] O artigo foi escrito durante o estágio de pós-doutorado de Susana Maria Veleda da Silva no Departamento de Geografia da UniversitatAutónoma de Barcelona (UAB), Espanha, em 2012, como bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES- Brasil).

[2] Elson e Pearson, 1981; McDowell e Pringle, 1992; McDowell e Sharp, 1997.

[3] Aoyama et al., 2012.

[4] Para a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) do Brasil a “preservação e fabricação de produtos do pescado” é um grupo dentro da divisão “fabricação de produtos alimentícios” que pertence a seção “indústrias de transformação” (ver http://www.cnae.ibge.gov.br/). Na Espanha, a Clasificación Nacional de Actividades Económicas (CNAE) inclui o grupo “fabricación de conservas de pescado” na divisão “procesado y conservación de pescados, crustáceos y moluscos”. Ver http://www.ine.es/daco/daco42/clasificaciones/cnae09/cnae2009.pdf). No artigo utilizamos, indistintamente, os termos “fábricas de pescado”, “fábricas de conserva de pescado ou “indústria de pescado” para as empresas que elaboram produtos do pescado.

[5] Abeledo, 2010.

[6] Sobre concepção patriarcal ver Patenan, 1988 e Saffioti, 2000.

[7] A pesquisa foi realizada entre 2008-2011 com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) brasileiro (VELEDA DA SILVA, et al. 2011). Uma parte do estudo foi apresentado nas 5tas. Jornadas Uruguayas de Historia Económica en Montevideo, 2011 e no International Geographical Congress, Colonia, Alemanha, 2012.

[8] Seguimos Valcárcel (2000, p. 438) ao considerar a geografia feminista e a geografia do gênero como sinônimos. Para a metodologia utilizamos Moss, 2002.

[9] Taylor e Bogdan, 1984.

[10] Bauer e Gaskell, 2008.

[11] Hirata, 2002.

[12] Estamos de acordo com Abramo quando diz que é preciso “superar a noção da mulher como força de trabalho secundária, que, apesar de todas as evidências empíricas em contrário, continua tendo uma grande persistência no imaginário social, empresarial, na teoria econômica e sociológica, e entre os formuladores de políticas públicas” (Abramo, 2010, p. 17)

[13] Loyola e Abujambra, 1985; AMB, 2011, p. 167.

[14] Anuário das Mulheres Brasileiras (AMB), 2011, p. 32-34.

[15] Melo, 2005, p. 16.

[16] IBGE, Censo demográfico, 2010. Ver página web http://www.censo2010.ibge.gov.br/en/resultados

[17] RAIS, 2011. Ver página web http://www.mte.gov.br/rais/default.asp

[18] Kalleberg, 2009, p. 21.

[19] Cattani e Holzmann, 2006, p. 203.

[20] Bruschini , 2007.

[21] A taxa de fecundidade passou de 4,4 filhos por mulher em 1980 para 2,1 em 2008 (Brito e Baeninger, 2008); em 2010, para 1,9 (IBGE, 2010).

[22]A expectativa de vida em 2003 era de 76 anos para as mulheres e 68 para os homens (Brito e Baeninger, 2008).

[23] IBGE, Censo demográfico, 2010.

[24] Louro, 1997.

[25] Marques e Sanches, 2010, p. 53-54.

[26] Fishlow, 2011, p. 186.

[27] Rocha, 2000; Kon, 2005e 2008; Bruschini, 2007

[28] Anuário das Mulheres Brasileiras (AMB), 2011, p. 167.

[29] Dados da RAIS (2011) apontam que embora a média de remuneração mensal em reais nos empregos formais tenha aumentado no período 2009-2010, a diferença salarial entre homens e mulheres ainda é significativa em todo o Brasil.

[30] Bruschini, 2007.

[31] Saffioti, 1978, 1979, 1981; Blay, 1978.

[32] Luccock, 1975.

[33] Paulitsch, 2008, p. 65.

[34] Martins, 2002, n.p.

[35] Martins, 1997.

[36] Martins, 2002, n.p.

[37] Martins, 2002, n.p.

[38] Santos, 1990.

[39] IBGE, Censo Demográfico, 2010.

[40] Pinto, 2010, n.p.

[41] Pinto, 2010.

[42] Termo utilizado por trabalhadoras que em domicílio ou na fábrica, limpam, separam e cortam os pescados em filés. A atividade não é reconhecida como uma ocupação pela Classificação Nacional de Ocupações (CBO) (ver http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/home.jsf ), mas é identificada como uma profissão pelas trabalhadoras.

[43] Os famosos "dedos ágeis" das mulheres jovens não são uma herança de suas mães da mesma maneira que elas possam herdar a cor da sua pele ou olhos. Eles são o resultado do treinamento que receberam de suas mães ou outras mulheres desde a primeira infância nas tarefas socialmente adequadas para o papel da mulher” (tradução livre dos autores), Elson e Pearson, 1981, p. 93.

[44] O RIISPOA do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), através do Decreto nº 30.691/1952, prevê normas de inspeção industrial e sanitária, recebimento, manipulação, transformação, elaboração e preparo. Em 2007, os órgãos responsáveis, atualizaram as normas e o registro no Serviço de Inspeção Federal (SIF). Ver páginas web: http://www.agricultura.gov.br/animal/mercado-interno/requisitos-sanitarios e http://sigsif.agricultura.gov.br/primeira_pagina/extranet/SIGSIF.html

[45] Fontoura, 2009.

[46] A taxa de fecundidade do Rio Grande é 2,2 filhos por mulher e a de São José do Norte de 2,5 (IBGE, Censo Demográfico, 2010).

[47] No Brasil, o ensino fundamental é uma das etapas da educação básica, com duração de nove anos e matrícula obrigatória para as crianças com idade entre seis e 14 anos.

[48] Para garantir o anonimato utilizamos a letra inicial do nome das entrevistadas.

[49] O arrasto de parelha consiste a utilização de uma rede cônica de grande dimensão cuja boca é mantida aberta pela distância entre as duas embarcações, em geral de mesmo porte. O lançamento e o recolhimento da rede são realizados por somente uma embarcação. Ver página web http://www4.icmbio.gov.br/cepsul/index.php?id_menu=247

[50] Entrevistada C, 30/05/2009.

[51] Entrevistada C, 30/05/2009.

[52] Hirata, 2002.

[53] Entrevistada L, 16/05/2010.

[54] Entrevistada AP, 17/05/2009.

[55] Entrevistada C, 30/05/2009.

[56] Entrevistada M, 28/06/2009.

[57] Entrevistada L, 16/05/2010.

[58] Entrevistada M, 19/12/2009.

[59] Entrevistada M, 19/12/2009.

[60] Entrevistada V, 04/12/2009.

[61] Em 2012, o salário mínimo era de R$ 622,00, equivalente a 230 euros.

[62] Entrevistada L, 16/05/2010.

[63] Entrevistada M, 28/06/2009.

[64] R$ 25 equivale a nove euros (cotação de dezembro de 2012).

[65] Entrevistada M, 28/06/2009.

[66] Entrevistada M, 28/06/2009.

[67] Traineira é um pequeno barco de pesca com a popa reta para facilitar o lançamento das redes de captura de peixes.

[68] Entrevistada C, 30/05/2009.

[69] Entrevistada C, 30/05/2009.

[70] Entrevistada M, 28/06/2009.

[71] Entrevistada M, 19/12/2009.

[72] Entrevistada AP, 17/05/2009.

[73] Entrevistada V, 04/12/2009.

[74] Entrevistada LM, 16/05/2010.

[75] Entrevistada AP, 17/05/2009.

[76] Entrevistada M, 28/06/2009.

[77] Entrevistada L, 16/05/2010.

[78] Entrevistada L, 16/05/2010.

 

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© Copyright  Susana Maria Veleda da Silva y Marcus Vinicius Spolle, 2013.
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Ficha bibliográfica:

SILVA, Susana Maria Veleda da; Marcus Vinicius SPOLLE. O trabalho feminino nas fábricas de conserva pescado: a permanência de uma exploração laboral. Scripta Nova. Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales. [En línea]. Barcelona: Universidad de Barcelona, 10 de enero de 2014, vol. XVIII, nº 464. <http://www.ub.es/geocrit/sn/sn-464.htm>. ISSN: 1138-9788.

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