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Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona. ISSN: 1138-9788. Depósito Legal: B. 21.741-98
Vol. VI, núm. 119 (91), 1 de agosto de 2002

EL TRABAJO

Número extraordinario dedicado al IV Coloquio Internacional de Geocrítica (Actas del Coloquio)
 

O (DES)COMPASSO ENTRE A MODERNIDADE GLOBAL E A REALIDADE LOCAL:
A SIEMENS DE IRATI/PR- UM ESTUDO DE CASO.

Antonio Carlos Torrens
Universidade Federal do Paraná-Brasil


O (des)compasso entre a modernidade global e a realidade local: a Siemens de Irati/pr- um estudo de caso (Resumo)

Esta investigação analisa a constituição de novos espaços produtivos, orientada pela mobilidade do capital e suas estratégias de expansão e acumulação. Partimos de revisão bibliográfica sobre as mudanças ocorridas no setor industrial nas últimas duas décadas, focalizando a flexibilização da produção, a intensificação do uso de tecnologia microeletrônica e seus desdobramentos, como o deslocamento de unidades de grandes corporações para novos espaços geográficos, a reestruturação das empresas e suas relações, e as novas formas de exploração do trabalho. Essas características vão ser encontradas no estudo de caso sobre a instalação de uma unidade Siemens,
produtora de componentes elétricos para automóveis de luxo, no município de Irati-PR, caracterizado por limitada experiência industrial dessa envergadura. A análise revela particularidades próprias da coexistência de diferentes sistemas de organização da produção, cujo elo de ligação é o aperfeiçoamento da exploração da força de trabalho, o que constitui permanente desafio para as teorias que pretendem construir modelos de análise da dinâmica industrial.

Palavras chave: novos espaços produtivos, organização da produção, dinâmica industrial


The (dis)adjustment between global modernity and the local reality: Irati/PR. A case study. Abstract

This investigation analyze the constitution of new productive spaces, oriented by the capital mobility and its expansive and accumulative strategies. We have started it by a bibliographic review related to the alterations occurred in industrial sector for the last two decades, focusing on the flexibility of production; the intensification in use of microeletronic technology and its unfolding, such as the migration of big corporation units to new geographic spaces; the companies reorganization and their relations; and the new methods of work exploitation This characteristics will be found in the study of case about the installation of a Siemens unit, in the town of Irati, producer of eletric components, used in luxurious cars. This town is characterized by limited industrial experience of this nature. The analysis reveals particularities only found in the coexistence of different production organization systems, and the link between them is the improvement of the work strength exploration, constituting permanent challenge to the theories which pretend to built analysis models of industrial dynamics.

Key-words: new productive spaces; production organization; industrial dynamics.


As organizações do trabalho apresentam-se, nas últimas décadas, como importantes objetos de investigação nas ciências humanas. Dentre algumas, destacamos as recentes transformações ocorridas no setor industrial, principalmente nas grandes corporações multinacionais, que proporcionam reflexões a respeito da utilização industrial da tecnologia microeletrônica, da introdução de novos modelos de gestão e direção das empresas, das mudanças ocorridas no controle do processo de trabalho. Dizem respeito, portanto, a todas as transformações que implicam em novas maneiras de produzir e suas conseqüências sobre a própria natureza do trabalho. Acompanham essas mudanças, a redefinição das estruturas e o redirecionamento espacial das indústrias, que trazem novos contornos aos processos produtivos e, conseqüentemente, à relação capital-trabalho.

As reflexões decorrentes desses temas tendem a estabelecer parâmetros de análise sobre a produção capitalista e suas formas de acumulação. Nosso trabalho tem o sentido de participar da discussão atual sobre essa dinâmica, na forma de estudo de caso, o qual revela-nos a riqueza e a complexidade das relações sociais e econômicas que se estabelecem em uma região periférica aos grandes centros produtores e financeiros do capitalismo, quando da instalação de uma indústria multinacional, a Siemens Automotive Systems, produtora de componentes elétricos para automóveis.

A região a que nos referimos é Irati, no interior do Estado do Paraná, no Brasil, que tem sua origem na migração holandesa, ucraniana e polonesa, nos primórdios do século XX. Terra produtora de trigo, centeio, batata-inglesa, feijão preto e erva-mate, Irati teve na abundância da madeira a principal fonte de receita, que se tornou um fator de geração de riqueza, sendo a região uma das maiores produtoras e comerciantes do Brasil entre as décadas de 40 e 50. Atualmente, Irati tem como principal atividade a agricultura, seguida da indústria de transformação e do comércio varejista. A vida econômica do município gira em torno da agricultura, pecuária, madeira, indústria de alimentos e beneficiamento de cereais.

Que nexo social existe entre o município de Irati e a Siemens? Que nexo produtivo existe entre a lavoura de feijão, a laminação da madeira e a fabricação de componentes elétricos automotivos? Que articulação foi tecida para que uma unidade Siemens viesse a se instalar em Irati, pequeno município do interior do estado do Paraná? São questões que se tornaram ponto de partida e nos possibilitaram elaborar uma pesquisa que é, ao mesmo tempo, intrigante e envolvente, na medida em que expõe as novas incursões do capital na busca de lucratividade e da própria sobrevivência.

Consideramos relevante esta investigação, primeiramente, porque são abordadas formulações teóricas sobre formas de organização da produção, que tendem a dominar a literatura especializada sobre os temas da indústria e suas transformações, tais como o taylorismo, o fordismo, o toyotismo, a produção flexível. A análise de um caso concreto revela-nos combinações e continuidades que, em alguns aspectos, se contrapõem aos esquemas explicativos, até porque esses esquemas são apresentados como resultantes de um processo que, por vezes, supõe uma espécie de evolução linear na produção industrial, no qual um sistema é substituído por outro, configurando regimes dominantes de acumulação onde não há superposições ou adaptações: produção taylorista > produção toyotista; rigidez > flexibilidade; produção baseada na economia de escala > produção baseada em economia de escopo; paradigma industrial > paradigma pós-industrial; capitalismo organizado > capitalismo desorganizado. Para nós é necessária a relativização dessas formulações, na medida em que consideramos que ocorre a coexistência de diversos aspectos de diferentes sistemas de produção no mesmo espaço produtivo.

Em segundo lugar, na medida que o trabalho expõe novas estratégias de localização dos grandes conglomerados, neste período caracterizado como de mundialização das atividades econômicas, possibilita-nos verificar os tipos de conexões que são engendradas pelos setores dominantes da economia, como o setor automobilístico. Alianças estratégicas, parceria entre empresas, join ventures, deslocamento espacial de unidades de produção são novas configurações das grandes redes produtivas e conferem novos procedimentos estratégicos ao capital, disseminados em quase todos os territórios do globo.

No terceiro ponto que consideramos relevante, queremos evidenciar a instalação de uma empresa multinacional em uma região periférica aos centros de decisão industrial e financeira, quando impõe a lógica e a dinâmica do capital, enquadrando todos os setores sociais, ávidos por soluções ao problema do desemprego e à inserção na modernidade, que esta fábrica representa. Não se trata somente de um simples processo de modernização tecnológica mas, da inserção de uma indústria de produção sofisticada numa posição estratégica, formando um novo desenho regional, o qual busca reorganizar as bases materiais para uma forma diferenciada de acumulação capitalista. Esta situação evidencia novas formas de cumplicidade entre o capital internacional e o Estado, representado aqui pelos poderes públicos locais e de alguma medida o poder estadual, que se articulam na criação de condições que favorecem a instalação da fábrica no município.

O quarto ponto e, para nós o principal, refere-se ao envolvimento dos trabalhadores nesta empreitada, frente a novos desafios profissionais e existenciais, que diferem totalmente da trajetória de vida até então experimentada no município e na região e, que, a nosso ver, provocam transformações profundas nas habilidades desenvolvidas historicamente pela força de trabalho disponível. Ao inaugurar a produção do chicote elétrico, a fábrica o faz utilizando sofisticada tecnologia, modernas técnicas de gerenciamento da produção e rigorosa disciplina fabril, com a imposição de uma cultura empresarial, cujo objetivo fundamental é a busca de lucratividade e produtividade. Constitui-se dessa forma um mercado de trabalho inserido em novas tecnologias de produção, com trabalhadores envolvidos numa forma de participação na gestão da produção e do processo de trabalho aparentemente modernizante, com parte do esforço gerencial voltada para o treinamento destinado a programas motivacionais e comportamentais, que buscam suscitar nos trabalhadores uma postura mais "cooperativa" em relação aos objetivos da empresa mas que, na verdade, apresentam formas ao mesmo tempo sutis e mais rigorosas de controle do processo de trabalho. Os trabalhadores participam dessas transformações que estão em curso e interagem como parte constitutiva e formadora desse processo. De maneira geral, a implementação das novas estratégias de gestão da força de trabalho está ocorrendo em regiões como Irati, sem uma tradição industrial que implique em história de lutas reivindicatórias ou de organização sindical e, justamente, numa conjuntura de crise de emprego.

Foram criadas condições para o estabelecimento da produção de chicotes elétricos em Irati, com a utilização de mão-de-obra despreparada para aquele tipo de trabalho, contando apenas com a experiência de vida. A empresa trouxe uma nova mentalidade de gerenciamento na fabricação de um produto estranho, sofisticado, com técnicas de produção e organização desconhecidas até então e absorvido pelo mercado externo.

Esses fatores exigiram da mão-de-obra local - habituada historicamente com baixo grau de automação, com tarefas simplificadas e certo grau de informalidade nas relações de trabalho - o desenvolvimento de novas habilidades, pelo elevado grau de automação e utilização da microeletrônica, integração das funções de produção, controle de qualidade, maior capacidade de abstração, tarefas repetitivas, horas-extras e disciplina rígida.

Três objetivos orientam nossa investigação, sendo dois mais específicos. O primeiro objetivo é evidenciar que o discurso participativo da empresa, na verdade, possibilita a intensificação do processo de trabalho e o maior controle desse processo pela gerência, reforçando o compromisso do empregado (chamado de "colaborador") com a empresa tentando formar, desse modo, um "espírito de corpo" dos trabalhadores com a mesma.

O segundo objetivo diz respeito à sofisticação da tecnologia. Em nosso entender, o uso daquele instrumental da moderna microeletrônica não exige maior qualificação da mão-de-obra, pelo contrário, facilita o manuseio das máquinas e possibilita a contratação de pessoal não qualificado, com menores custos para a empresa e com intensificação do trabalho, decorrentes do aumento da velocidade da produção e do maior controle sobre o processo de trabalho imposto pela tecnologia.

O terceiro objetivo, mais geral, é demonstrar que o arranjo conciliatório dos interesses privados do capital, dos poderes públicos e da sociedade civil, presente na instalação da Siemens em Irati para resolução do problema do desemprego, escamoteia uma contradição básica, ou seja, a realização dos objetivos da empresa tem implicações na frustração das expectativas de estabilidade e de promoção social dos trabalhadores e de todos os setores sociais envolvidos no processo de atração da empresa.
 

Mudanças no Brasil: Irati acompanha?

As mudanças no campo das relações do trabalho no Brasil devem levar em conta a reestruturação da economia internacional e os ajustamentos no plano macroeconômico. Em primeiro lugar, houve um redirecionamento das estratégias de mercado e produção, com o surgimento de novos referenciais estratégicos, como flexibilidade, qualidade e diversidade. Dentre as estratégias para o ajustamento industrial desse novo período, RUAS (1997) destaca a estratégia de adaptação global, observada principalmente em empresas voltadas para o mercado externo, como a automotiva, a eletrônica, a petroquímica, a indústria de papel e celulose. As estratégias são abrangentes, tanto internamente – automação, descentralização, controle da produção –, quanto na relação da empresa com o mercado internacional, representadas pela focalização e especialização.

Há um maior envolvimento dos trabalhadores com a empresa por meio de novas responsabilidades e atribuições, ocorrendo mudanças tanto operacionais quanto culturais, embora as organizacionais sejam identificadas com os grandes conglomerados, representantes das indústrias de ponta. O envolvimento mais acentuado dos trabalhadores significa, porém, que a difusão de uma cultura empresarial fortalece os interesses econômicos da empresa. Para garantir maior qualidade no produto e conseguir redução de custos, uma maior integração de acordo com as necessidades do processo produtivo é buscada. Em segundo lugar, referente ao quadro atual da modernização tecnológica e de relações industriais, a discussão é pautada pelo tema da imbricação da modernização tecnológica com mudanças nas relações de trabalho. LEITE (1997) considera que, por exemplo, ao final dos anos 80, em função do aprofundamento da crise econômica, tinha importante papel a inovação organizacional e os novos conceitos de produção, mas identifica o caso brasileiro com características de uma "modernização conservadora". Aqui, a reorganização da produção mantém componentes organizacionais do taylorismo e do fordismo, principalmente a manutenção de formas autoritárias de gestão de mão-de-obra, baixos salários, políticas salariais individualizantes e resistência à estabilização da mão-de-obra. Sustenta, também, que há resistência do empresariado em adotar novos métodos que ampliem a participação dos trabalhadores, revelando o caráter conflitivo e autoritário das relações de trabalho. O custo da produção continua a ser a principal discussão, ao mesmo tempo em que as políticas de gestão de mão-de-obra não estimulam o envolvimento dos trabalhadores. Além disso, as principais mudanças do processo de trabalho são isentas de regulamentação, na medida em que não há tradição em alguns setores de negociação coletiva de trabalho, a transferência e a acomodação dos trabalhadores nas linhas e grupos não são regulamentadas e a política de cargos e salários incentiva a disputa e divisão dos trabalhadores.

Em suma, para Leite (1996), as principais características do modelo conservador de modernização seriam a inovação tecnológica aliada a práticas conservadoras de gestão de mão-de-obra. Essas características nós encontramos na fábrica em questão, com a diferença de que a tentativa de envolvimento dos trabalhadores ocorre de forma retórica e unilateral. Concentra-se na busca de qualidade do produto, na garantia de prazos de entrega, de individualização de responsabilidades, incorrendo na coerção, como a ameaça de demissão para aqueles com dificuldades em adaptar-se à filosofia da empresa.

Nos anos 90, mudaram algumas estratégias empresariais, com inovações na gestão da mão-de-obra e da produção, pela busca do mercado externo e introdução de padrões internacionais de produção, afirma LEITE (1996). Se, em algumas empresas inovam as relações de trabalho e há uma preocupação para com a escolarização e a estabilização da mão-de-obra, em outras empresas, como a estudada, a tecnologia avançada não levou a inovações das relações de trabalho, nem à necessidade de mão-de-obra especializada, pela facilidade das instruções das máquinas. Tampouco a manutenção do emprego está garantida, na medida em que ocorre forte dependência da sazonalidade e instabilidades na moderna indústria automobilística.

A atuação da Siemens no Município de Irati remete-nos a uma relativização das análises que tendem a estabelecer modelos gerais para a trajetória de novos espaços industriais. Diante das exigências do novo modo de produzir e acumular, sem alteração na natureza do capitalismo no que diz respeito ao trato da mão-de-obra, o caso da Siemens de Irati é paradigmático, não em relação às grandes e genéricas tendências, mas sobretudo às adaptações e ajustes de escala de produção e construção de novas territorialidades na forma de processar a expansão do capital, globalmente integrado e integrador, em seu próprio proveito. Naquele município, o que há de mais avançado em termos de tecnologia e organização empresarial do tipo transnacional impõe-se e se articula num espaço que foi redimensionado em função da instalação da empresa, mas que continua vulnerável aos movimentos de expansão ou de evasão desses capitais itinerantes.
 

Conclusões

Passados cinco anos da instalação da fábrica de chicotes elétricos Siemens Automotive Systems, unidade do conglomerado multinacional Siemens, no município de Irati, alguns aspectos resultantes dessa experiência podem ser delineados. A inserção do município no circuito do capital internacional, na condição de sede de uma grande empresa, configura um novo espaço produtivo onde se sobrepõem características de gestão, de organização da produção e de relações de trabalho, tornando particular essa inserção. Encontramos no processo de trabalho elementos do modelo taylorista-fordista, como parcelamento de tarefas, trabalho repetitivo, fixação do trabalhador frente a uma esteira rolante, completa separação entre concepção do produto e execução do trabalho e entre escritório e chão de fábrica. Ao mesmo tempo, a dinâmica da produção é fortalecida pelo uso de máquinas automatizadas e por soluções organizacionais modernas, como o just in time e kanban. Temos então, convivendo sob a lógica da mesma fábrica: A. elementos do modelo de produção em escala, pelo processo baseado em linha de montagem, em uma grande empresa, estruturada nos princípios de integração vertical, com nítida divisão técnica e social do trabalho; B. elementos do modo de produção flexível, com introdução de tecnologias e técnicas de gestão que permitem flexibilização na produção para atender às variações da demanda do mercado.

A introdução do just in time e a utilização de novas tecnologias proporcionam ao capital a possibilidade de maximização da produção com utilização de menos mão-de-obra, buscando a adequação do processo produtivo às flutuações do mercado. A aceleração da produção decorrente condiciona o trabalhador à velocidade das máquinas e ao controle da quantidade e qualidade dos componentes que serão utilizados na montagem do chicote. Na etapa da montagem do produto, porém, é o esforço humano e o número de horas trabalhadas que garantem a produção. O que se constata na Siemens de Irati é o freqüente uso do expediente de horas-extras pelos trabalhadores, com a implantação do sistema de Banco de Horas e pela demissão periódica de trabalhadores considerados excedentes cada vez que diminui a demanda. Essa realidade confirma o quanto se torna mais eficiente o controle sobre os trabalhadores, através da modernização tecnológica e do uso de novos modelos de gestão. O controle sobre o processo produtivo deve ser analisado, também, pelo fato de que a tecnologia, se por um lado proporciona nova relação do trabalhador com a máquina, por outro, exige mais atenção e concentração, sem a contrapartida do desenvolvimento de raciocínio simbólico ou de operações abstratas. A tecnologia utilizada na Siemens de Irati prescinde de qualificação diferenciada para sua operação e não proporciona mais autonomia ao trabalhador, na medida em que não há quebra da hierarquia e maior participação dos trabalhadores nas decisões.

Ao capital, interessa a obtenção de lucro máximo no menor tempo possível e, para alcançar esse objetivo, as empresas transnacionais organizam-se à procura de oportunidades as mais vantajosas para essa realização, através de alianças estratégicas, redirecionamento espacial e reestruturação produtiva, implicando na modernização tecnológica e transformações organizacionais. Cada vez mais predomina a mobilidade do capital na busca de vantagens competitivas, o que significa o deslocamento geográfico mais acelerado, formando arranjos não duradouros na busca de lucratividade. Outra perspectiva de temporalidade é vivida pelos atores locais que identificam na presença da nova indústria, a possibilidade da resolução do desemprego, da geração de renda, da promoção social e profissional, expectativas essas que pressupõem o caráter de permanência, de estabilidade, ao contrário da lógica do capital, que tem na mobilidade, a estratégia fundamental de acumulação. É significativo que cinco anos após a instalação da empresa já possamos constatar que a articulação entre o poder público e o capital internacional não impediu ou limitou o redirecionamento dos investimentos para outra região, quando essa possibilidade revelou-se vantajosa para a empresa. Também, a significativa diminuição de postos de trabalho atesta a supremacia da lógica de acumulação, em detrimento da perspectiva que se colocou como legitimadora da ação dos poderes públicos para facilitar a instalação da Siemens em Irati.

A fábrica, apresentada pelos responsáveis pela condução da política econômica do município como a responsável pela inauguração de uma nova fase de prosperidade e distribuição de renda, ao final de cinco anos de produção do chicote elétrico muda alguns de seus equipamentos para uma nova unidade, diminui a capacidade de produção e demite trabalhadores. A contrapartida do capital distancia-se cada vez mais das facilidades encontradas para sua instalação em Irati, desvanecendo o projeto municipal de geração de renda, de incremento do comércio, de melhoria na qualificação e na escolarização, de sindicalismo forte, de fortalecimento do setor industrial, enfim, de estabelecimento de novas bases de participação no cenário da modernidade. Este é o retrato de dinâmicas integradas e (des)compassadas entre a modernidade global propiciada pelo capital itinerante e a realidade local com seu ritmo e cultura próprios, mas sedentos de integração, em busca de sobrevivência.
 

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Entrevistas

Secretário Municipal da Agricultura de Irati, Gestão 2001/2004, 09/09/2001

Secretário Municipal da Indústria e Comércio, Gestão 1997-2000, 02/05/2000

Gerente Industrial da Siemens-Irati, 10/06/200

Diretora de Recursos Humanos da Siemens-Irati, 10/06/2000

Presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Metalúrgica, Metalmecânica e elétrica de Irati-PR, 20/06/2000

Operadores de Carrossel (10), de 02/05/2000 a 10/05/2000

Operadores de Corte (4), 06/06/2000

Serventes (2), 10/05/2000

Coordenador de Produção (2), 08/05/2000
 

Fontes Indiretas

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CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, Escritório de Negócios Norte. Pesquisa "Caixa no Município,, out. 1998.
 

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© Copyright Scripta Nova, 2002
 

Ficha bibliográfica

TORRENS, A.C. O (des)compasso entre a modernidade global e a realidade local: a siemens de Irati/PR-um estudo de caso. Scripta Nova, Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, Vol. VI, nº 119 (91), 2002.  [ISSN: 1138-9788]  http://www.ub.es/geocrit/sn/sn119-91.htm


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